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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0002922-29.2011.8.24.0052 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Norival Acácio Engel
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Segunda Câmara Criminal
Julgado em: Tue Jun 22 00:00:00 GMT-03:00 2021
Classe: Recurso em Sentido Estrito

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STJ: 387, 182








Recurso em Sentido Estrito Nº 0002922-29.2011.8.24.0052/SC



RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL


RECORRENTE: JULIO VIEIRA DE LARA (ACUSADO) ADVOGADO: JONATHAN MOREIRA DOS SANTOS (OAB SC028144) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


RELATÓRIO


Na Comarca de Porto União, o Ministério Público ofereceu denúncia contra Júlio Vieira de Lara e Charles William Thiel, dando-os como incursos no art. 121, caput, c/c art. 14, inc. II, do Código Penal (por duas vezes), em razão dos fatos assim descritos:
[...] Infere-se do incluso Inquérito Policial que no dia 18 de março de 2011, por volta das 23 horas, na Rua localizada em frente ao Cemitério Jardim da Saudade, Bairro São Pedro, neste Município de Porto União/SC, os denunciados JÚLIO VIEIRA DE LARA e CHARLES WILLIAM THIEL, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, um aderindo à conduta do outro, imbuídos de manifesto animus necandi, tentar matar as vítimas LUIZ CARLOS SOARES DE OLIVEIRA e MAURÍCIO GARCIA DA SILVA. 
Extrai-se dos autos que no dia e hora acima citados, as vítimas LUIZ CARLOS e MAURÍCIO caminhavam pela Rua localizada em frente ao Cemitério Jardim da Saudade, Bairro São Pedro, neste Município de Porto União/SC, oportunidade em que foram surpreendidas pelo veículo VW Gol, cor branca, placas ARB 2111, de propriedade e conduzido pelo denunciado CHARLES e em cujo interior também se encontrava o denunciado JÚLIO, o qual parou muito próximo a elas. 
Ato contínuo, o denunciado JÚLIO desembarcou do referido veículo e de posse de uma arma de fogo tipo revólver (não apreendido), efetuou disparos em direção das vítimas, vindo 2 (dois) deles a atingir MAURÍCIO, causando-lhe as lesões descritas nos Laudos Periciais de fls. 11/12 e de fl. 63. 
Em seguida, JÚLIO embarcou no veículo conduzido por CHARLES, o qual permaneceu a todo momento nas proximidades com o objetivo de garantir o sucesso da empreitada criminosa, e ambos empreenderam fuga eficaz do local dos fatos. 
Há de se ressaltar que o crime contra a vida de LUIZ CARLOS somente não se consumou por circunstâncias alheias à vontade dos denunciados, pois, por erro de pontaria de JÚLIO, nenhum dos disparos efetuados veio a atingi-lo. O crime contra a vida de MAURÍCIO também não se consumou por circunstâncias alheias à vontade dos denunciados, já que após ser atingido pelos disparos efetuados por JÚLIO, foi prontamente socorrido e encaminhado ao Hospital do Município de União da Vitória/PR, local em que recebeu tratamento médico eficaz. [...] (Evento 220, do feito originário).
Encerrada a instrução, a acusação foi admitida para pronunciar Júlio Vieira de Lara e Charles William Thiel, por infração ao art. 121, caput, c/c art. 14, inc. II, do Código Penal, por duas vezes.
O réu Charles conformou-se com o decisum (Evento 229 - fls. 275/276 e 252 - origem). 
De outra parte, a Defesa de Júlio Vieira de Lara interpôs Recurso em Sentido Estrito (evento 247), em cujas Razões (evento 254) postula, preliminarmente, a nulidade do reconhecimento fotográfico realizado na fase extrajudicial, porquanto não observou as regras do art. 226, do Código de Processo Penal. No mérito, requer a despronúncia do réu, por ausência ou insuficiência de provas, com base no princípio in dubio pro reo. 
Apresentadas as Contrarrazões (evento 257), e mantida a decisão por seus próprios fundamentos (evento 259), os autos ascenderam ao Segundo Grau, oportunidade em que a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Carlos Henrique Fernandes, manifestou-se pelo conhecimento e não provimento da insurgência. (Evento 15). 
Este é o relatório. 

VOTO


O recurso merece ser conhecido, por próprio e tempestivo.
Preliminar
O Recorrente alega, preliminarmente, a nulidade do reconhecimento fotográfico realizado na etapa extrajudicial, em decorrência da inobservância das regras do art. 226 do Código de Processo Penal. Sem razão.
Inicialmente, cumpre frisar que, não obstante os argumentos apresentados pela Defesa a doutrina e jurisprudência têm se manifestado, de forma majoritária, no sentido de que o artigo 226 do Código de Processo Penal possui caráter meramente orientador e, portanto, sua não observância "[...] implica mera irregularidade, não invalidando o ato, tampouco afetando seu poder de convencimento". (AVENA, Norberto. Processo penal - 10ª edição - Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 607)
E prossegue o supracitado autor:
Veja-se que a legitimidade do reconhecimento efetuado por meio de fotografia na fase do inquérito policial, se confirmado por outras provas, não apenas é capaz de justificar o recebimento da denúncia e da queixa, como também de permitir a imposição de medidas cautelares restritivas, inclusive a prisão preventiva.
Poderá, ainda, nestas mesmas condições, contribuir para a formação do convencimento do juiz visando à prolação de sentença condenatória.
No mesmo sentido, manifestou-se a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do AgRg no RHC de n. 124.504/MG, de relatoria do Ministro Felix Fischer, em 12/05/2020:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. JUSTA CAUSA PRESENTE. NULIDADE. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO. AUSÊNCIA. ART. 226 DO CPP. NÃO ENFRENTAMENTO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA 182/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. [...] III - O reconhecimento fotográfico pode ser utilizado pelo Delegado de Polícia para o esclarecimento da infração penal, conforme autoriza o art. 6º, III, do Código de Processo Penal, independentemente da utilização, por analogia, das regras previstas no art. 226 do mesmo Código, de modo que a inobservância não causa, por si só, a nulidade do ato. Precedentes. [...] Agravo regimental desprovido. (grifou-se)
Não destoa o posicionamento adotado por esta Câmara Criminal, consoante se verifica da Apelação Criminal n. 0008021-03.2014.8.24.0075, relatoria da Desembargadora Salete Silva Sommariva, julgada em 30-03-2021:
APELAÇÃO CRIMINAL - ROUBO SIMPLES (CP, ART. 157, CAPUT) - SENTENÇA CONDENATÓRIA - PRELIMINAR - NULIDADE DO RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO - INOBSERVÂNCIA AO DISPOSTO NO ART. 226 DO CPP QUE NÃO AFASTA A EFICÁCIA PROBATÓRIA DO RECONHECIMENTO - PREFACIAL REJEITADA - MÉRITO - MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS - PALAVRAS DA VÍTIMA UNÍSSONAS E EM CONSONÂNCIA COM O RESTANTE DO CONJUNTO PROBATÓRIO - VERSÃO DO ACUSADO ISOLADA NO CONTEXTO DOS AUTOS - CONDENAÇÃO MANTIDA - DOSIMETRIA - CULPABILIDADE - ACUSADO QUE GOLPEIA A VÍTIMA COM UMA FACA - SENTENCIANTE QUE AFASTOU A CAUSA DE AUMENTO DO ART. 157, § 2º, I, DO CÓDIGO PENAL, E EFETUOU A MIGRAÇÃO DO USO DE ARMA BRANCA PARA A PENA-BASE - EXASPERAÇÃO MANTIDA - ALMEJADO AFASTAMENTO DO VALOR ARBITRADO NA SENTENÇA A TÍTULO DE REPARAÇÃO DE DANO MATERIAL (CPP, ART. 387, IV) - DESCABIMENTO - DESFALQUE FINANCEIRO COMPROVADO POR MEIO DE PROVA TESTEMUNHAL - PLEITO FORMULADO NA DENÚNCIA - QUANTUM INDENIZATÓRIO DEVIDO - RECURSO DESPROVIDO. (Grifou-se).
Não se desconhece a existência de julgado recente, proferido pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Habeas Corpus n. 598.886-SC, Relatoria do Ministro Rogerio Schietti Cruz, julgado em 27/10/2020 (Informativo 684), adotando o posicionamento de que "o reconhecimento de pessoas deve observar o procedimento previsto no art. 226 do Código de Processo Penal, cujas formalidades constituem garantia mínima para quem se encontra na condição de suspeito da prática de um crime".
No entanto, filio-me à corrente doutrinária e jurisprudencial, anteriormente mencionada, no sentido de que as disposições contidas no art. 226 do Código de Processo Penal configuram uma recomendação legal, e não uma exigência absoluta, sendo válido o ato mesmo que realizado de forma diversa da prevista em lei, de modo que, nesses casos, o reconhecimento passa a ter valor de prova testemunhal.
Outrossim, é de se destacar que a identificação do Recorrente foi posteriormente confirmada pela prova oral apresentada sob o crivo do contraditório, de modo que não foi exclusivo elemento de convicção considerado para a pronúncia do acusado, bem como porque não restou demonstrado pela defesa eventual prejuízo na sua realização.
Desse modo, inexiste qualquer mácula no reconhecimento fotográfico realizado na etapa administrativa. 
Mérito
O pedido defensivo de despronúncia do acusado Júlio Vieira de Lara não comporta provimento, pelas razões abaixo alinhadas.
Sabe-se que, por força do artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição da República, compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, dentre os quais se inclui o homicídio, tentado ou consumado (art. 74, §1º, do Código de Processo Penal).
É exatamente por isso, inclusive, que vigora na primeira fase do procedimento escalonado dos crimes da alçada do Tribunal do Júri, disciplinado entre os artigos 406 e 421 do Código de Processo Penal, o brocardo in dubio pro societate, no sentido de que, na dúvida, compete ao Conselho de Sentença deliberar sobre a matéria.
Nesse sentido, colhe-se desta Câmara o Recurso em Sentido Estrito n. 0000012-58.2012.8.24.0031, rel. Des. Salete Silva Sommariva, julgado em 13-06-2017:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO POR TRÊS VEZES ( CP, ART> 121, § 2º, II E IV, C/C 14, II - PRONÚNCIA - INCONSTITUCIONALIDADE DO BROCARDO IN DUBIO PRO SOCIETATE - INOCORRÊNCIA - PREVALÊNCIA DO CARÁTER POPULAR E DEMOCRÁTICO DAS DECISÕES PROFERIDAS PELO TRIBUNAL DO JÚRI - PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA - PRETENSO RECONHECIMENTO DA LEGÍTIMA DEFESA - AUSÊNCIA DE PROVA INDUVIDOSA ACERCA DA EXCLUDENTE DE ILICITUDE - PEDIDO DE AFASTAMENTO DAS QUALIFICADORAS - INVIABILIDADE - MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA NÃO DEMONSTRADA - RECURSOS DESPROVIDOS. - grifei
Do corpo do acórdão, extrai-se:
A compatibilidade do brocardo in dubio pro societate com o texto constitucional decorre da própria garantia constitucional atribuída à instituição do Júri, prevista no art. 5º, XXXVIII, da CF, no qual se privilegia o caráter popular e democrático dos veredictos em situações que se viole o bem jurídico vida.
Desse modo, a observância à tal máxima no momento da decisão de pronúncia, cuja índole é de um juízo de admissibilidade acerca da imputação levada a cabo pela acusação, a fim de submeter o feito à apreciação pelo Tribunal do Júri, não significa uma decisão de mérito a respeito do caso, senão uma forma de assegurar o exercício da garantia fundamental por aqueles que, constitucionalmente, detêm a prerrogativa de julgar crimes dolosos contra a vida, isto é, a sociedade ou comunidade.
Portanto, no microssistema do Tribunal do Júri, não há falar-se em incompatibilidade ou prevalência de um princípio sobre outro, pois, enquanto na etapa de admissibilidade a dúvida é resolvida em benefício da sociedade, na fase de julgamento do mérito a incerteza sobre a autoria de crime doloso contra a vida conduz à absolvição do réu, em que incide a máxima do in dubio pro reo.
Diante disso, os brocardos em referência não podem ser considerados mutuamente excludentes justamente porque, nesse procedimento autônomo, a sua incidência opera-se em etapas distintas, nas quais são proferidas decisões de natureza diversas, de modo a justificar a aplicação de tais princípios em cada uma delas.
Isso posto, descabe cogitar de inconstitucionalidade do art. 413 do CPP, pois sua aplicação visa enaltecer o preceito constitucional contido no art. 5º, XXXVIII, "d", proibindo-se a interferência do juiz singular em hipóteses nas quais a Constituição assegura a participação popular e democrática. - grifei
Fixada esta premissa, isto é, de que na fase do judicium accusationis deve-se adotar postura deferente à competência constitucional do Tribunal do Júri, passa-se à análise da insurgência recursal. 
Pois bem.
A materialidade e os indícios de autoria defluem incontestes do boletim de ocorrência (fls. 224-226), Laudo Pericial de exame de corpo de delito (fls. 231-236), Laudo Pericial Complementar (fls. 283-284), Termo de Reconhecimento Fotográfico (fl. 245), Relatório Preliminar (fls. 285-287), todos acostados no evento 221, do feito originário, e da prova oral colhida no curso da persecução criminal.
Os laudos periciais acostados ao feito atestaram que o ofendido apresentou "a - Ferimento perfuro-contundente na região carotidiana esquerda b - Ferimento perfuro-contundente no joelho esquerdo c - Equimose na região poplítea esquerda d - Projétil palpável no subcutâneo da região supra-escapular esquerda", lesões que causaram perigo de vida, em especial pelo "ferimento causado por projétil de arma de fogo próximo à artéria carótida", além de incapacidade para ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias.
A vítima Maurício Garcia da Silva narrou na etapa extrajudicial:
[...] Que no dia 18 deste mês e ano, por volta das 23 horas, caminhava em companhia de seu amigo Luiz Carlos de Oliveira, pela Rua existente em frente ao Cemitério Jardim da Saudade, desta cidade, ocasião em que passou pelo declarante o veículo marca VW/Gol não deste modelo novo, parou há uns trinta metros, sendo que o acompanhante desceu do veículo e veio em direção do declarante e de Luiz, com arma na mão, desferindo tiros, hora que comentou a Luiz: "o cara está atirando e creio que me atingiu a perna esquerda", ocasião em que o declarante e Luiz ficaram parados no local, e o autor dos disparos se aproximou e fez mira em direção ao rosto do declarante, e fez o disparo acertando o pescoço, lado esquerdo; Que o veículo deu marcha ré, tendo o autor dos disparos adentrado no veículo e empreenderam fuga; Que o autor dos disparos nada disse, simplesmente desceu do veículo e passou a disparar tiros em sua direção e do amigo; Que Luiz Carlos foi quem pediu por socorro e que chamassem no local o Resgate dos Bombeiros; Que, ainda no local, Luiz Carlos reconheceu o autor dos disparos como sendo Juliano, vulgo "Gordo", o qual trabalhava na Empresa "InBrasil", localizada no Bairro São Gabriel de União da Vitória/PR, Que o declarante relata que não tinha rixa com "Juliano, Vulgo Gordo", mas afirma que no dia dos fatos, por volta das 22 horas, presenciou pessoas em luta corporal com "Juliano", alegando que nada tem a ver com os agressores, Que o declarante foi socorrido pelos Bombeiros e conduzido à Maternidade de União da Vitória/PR, ficando internado por três dias na UTI, mais dois dias no quarto; Que até a presente data não foi possível a extração de projéteis, por se localizarem em área de risco [...] (Termo de Declaração fls. 229-230).
Em Juízo, corroborou a versão anteriormente apresentada, nos seguintes termos:
[...] (indagado se sabe o que ocorreu na data dos fatos, envolvendo os acusados, respondeu) eu só vi o Júlio, o Charles eu nem conhecia e nem o vi, a gente se estranhou na festa da faculdade, eu estava indo na casa de um amigo meu, ele parou o carro e me atirou, (indagado sobre onde era a festa, respondeu) na Uniguaçu, festa a fantasia, (perguntado como foi o desentendimento, respondeu) nós saímos no soco, só eu e o Júlio, aí eu saí para ir embora, eu e meu compadre, o Luiz, a gente estava indo embora a pé, ele atravessou o carro na minha frente e me atirou, (indagado sobre quanto tempo já tinha caminhado da saída da festa, respondeu) uns 20 minutos, aí ele parou o carro na frente, (indagado se ele estava dirigindo, respondeu)  não cheguei a ver no momento, só vi que ele me atirou no momento, (indagado se viu o carro, respondeu) eu vi que era um gol branco e nós conseguimos marcar a placa, aí ele atirou e seguiu, (indagado sobre quantas vezes ele disparou, respondeu) duas, uma no pescoço e outra no joelho, (perguntado se ele chegou a falar alguma coisa, respondeu) não, (indagado se ele atirou em direção ao Luiz, respondeu) não, (indagado se ele chegou a dar outros tiros, respondeu) não, (perguntado o que aconteceu depois, respondeu) aí ele foi embora e eu fiquei lá, [...] (perguntado se declarou na fase investigatória que não teve briga anterior na festa, respondeu) mas a gente tinha brigado sim, só eu e ele [...] (indagado se foi fácil de remover os projéteis, respondeu) o do joelho está aqui ainda, eu fiquei três meses encostado, eu trabalhava naquela época [...] (indagado sobre o outro rapaz que estava no carro, respondeu) não cheguei a ver, não sei se tinha [...] (Registro audiovisual do evento 228, vídeo 318).
No mesmo norte, o ofendido Luiz Carlos Soares de Oliveira narrou sob o crivo do contraditório:
[...] Nesse dia, eu estava em casa e o Maurício ele fazia pintura, ele foi lá em casa, me chamou para buscar umas tintas no amigo dele num amigo dele, perto do Jardim da Saudade ali,  e nós fomos, ali próximo a Uniguaçu estava ocorrendo uma festa, e tinha uma briga nessa festa, nós esperamos passar essa briga, aí quando terminou aquela briga nós passamos, e fomos conversando nós dois normalmente, e ao fundo do Jardim da Saudade passou por nós um gol branco, insulfilmado preto, e cerca de uns 10 ou 15 metros deu dois tiros, que acertou o Maurício, eu gritei lá, saiu mais gente, chamaram o corpo de bombeiros e levaram ele para o Hospital, foram dois tiros que atingiu no pescoço e outro no joelho, não chegou a pegar em mim, mas podia ter pegado, (indagado se conhecia os réus, respondeu) esse moço (Charles) eu não vi, mas acho que não tinha encrenca com ninguém [...] (perguntado quem deu os tiros, respondeu) foi o Júlio, (indagado sobre a participação de Charles, respondeu) não vou falar porque eu não vi, o vidro era escuro [...] (Registo audiovisual do evento 224).
A informante Edna Lúcia Pires relatou na fase judicial:
[...] (indagada sobre como ficou sabendo que seu esposo havia sido baleado, respondeu) quando a polícia me acordou em casa, (indagada se sabe se ele tinha algum desentendimento anterior com os acusados, respondeu) não, não conheço nenhum deles, (perguntada se sabe onde seu marido estava antes, respondeu) também não, (indagada onde ele levou os tiros, respondeu) aqui no pescoço, abaixo da veia do pesçoco e no joelho esquerdo, ele tem até hoje o projétil, ele ficou 3 dias na UTI e 3 dias no quarto, (indagada se ele ficou bastante tempo sem trabalhar, respondeu) ele ficou um pouco mais de 30 dias sem trabalhar, (indagada se o Luiz Carlos estava junto, respondeu) isso eu sei que estava junto [...] (perguntada se sabe o que aconteceu, respondeu) ninguém respondeu nada, o porquê, [...] (Registro audiovisual do evento 228, vídeo 317).
O Apelante Júlio Vieira de Lara, por outro lado, apresentou sua versão apenas na etapa administrativa, uma vez que modificou de residência sem comunicar o Juízo. Naquela ocasião, narrou: 
[...] Que, no dia 18/03/2011 por volta das 23h30min, alega ter saído de sua casa, com finalidade de ir na festa da Uniguaçu em União da Vitória, sendo que no trajeto se deparou com aproximadamente umas 14 pessoas, onde que um falou "é esse ai que me deve...Mexeu com minha mulher" e do nada, passaram lhe agredir fisicamente com "socos e ponta-pé" e quando passou a gritar pararam de lhe agredir; QUE, foi para frente da Uniguaçu, a fim de se proteger; QUE, por volta das 1h30min, retornou para sua casa a pé; QUE, afirma que Charles namorado de sua tia Eliane Vieira de Lara, possui um veículo marca VW/Gol cor branca; QUE, Charles é soldado do Exército (5º BECmB); Que nega ter feito disparo com arma de fogo contra a vítima Maurício Garcia da Silva, alega que não o conhece; QUE, alega que não possui arma de fogo; QUE, segundo comentários, quem teria atirado contra a vítima seria um tal de "Tiago Gordo", que possui um veículo marca VW/Gol cor branca e reside no Bairro São Cristóvão em União da Vitória/PR, segundo informação que lhe foram repassadas por sua amiga Prisciele (Termo de interrogatório de fls. 258-259 - evento 221).
O acusado Charles Willian Thiel, por sua vez, declarou perante a Autoridade Judiciária:
[...] (indagado se estava nesse gol na data dos fatos, respondeu) nesse dia a única coisa que eu fiz foi ir na festa na Uniguaçu, eu estava na festa mesmo, o Júlio não estava com nós, o Júlio nem foi  para a festa com nós para falar a verdade, estava eu mais minha esposa, (indagado se houve alguma briga naquele dia, respondeu) lá dentro onde nós estava não tinha nada, (indagado se possuía um gol branco à época, respondeu) eu tinha, (perguntado qual era a placa do automóvel, respondeu) ARB 21-11, (indagado se nesse dia da festa lembra de ter passado por alguém, ouvido tiros, ou ter emprestado o carro para alguém, respondeu) não, não, o carro ficou estacionado, fui para a festa, de lá eu voltei para o carro e fomos para casa, (indagado que horas saiu da festa, respondeu) por volta das 3 horas, já era tarde, o carro ficou estacionado, nós nem saímos de dentro da festa, (indagado se conhece o Júlio, respondeu) sim, conheço, (perguntado se ele tem algum envolvimento com os fatos, respondeu) não sei dizer, não conheço muito da vida particular dele, eu sei que nesse dia a única coisa que eu soube é que ele estava na casa da amiga, não sei se amiga ou namorada dele, aí na festa ele não foi com nós, eu não sei dizer onde ele estava depois [...] (perguntado se conhecia o Luiz ou o Maurício, respondeu) nenhum dos dois [...] (Registro audiovisual do evento 228, vídeo 316).
Nesse contexto, embora a Defesa afirme o contrário, das provas acima colacionadas, não se pode excluir, com absoluta certeza, a hipótese sustentada pelo Ministério Público, isto é, de que os acusados, por ocasião dos fatos, tentaram ceifar as vidas das vítimas Maurício e Luiz Carlos. 
Diz-se isso porque, sem delongas, há elementos que corroboram a assertiva de que os Recorrentes atacaram os ofendidos de forma gratuita, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, cada um contribuindo de uma maneira, um sendo o responsável pelos disparos de arma de fogo (Júlio), causando as lesões corporais na vítima Maurício, apresentadas nas imagens acostadas à fl. 233 (Evento 221), e o outro (Charles) fornecendo seu veículo automotor para a suposta prática delituosa e dando cobertura ao corréu. 
Nesse sentido, ambos os Ofendidos narraram que o Recorrente foi o autor dos disparos de arma de fogo que atingiram a vítima Maurício, na noite do dia 18 de março de 2011, na Rua localizada em frente ao Cemitério Jardim da Saudade, Bairro São Pedro, no Município de Porto União/SC, e que foi possível identificar o automotor utilizado por ele naquela data.
Ainda, da análise do interrogatório judicial de Charles, infere-se que embora ele tenha afirmado que não encontrou com o Apelante na data dos fatos, confirmou que possui relação de amizade com Júlio e, também, corroborou que possuía o veículo automotor VW Gol, cor branca, placas ARB 2111, à época. 
Assim, da análise das referidas declarações e das demais provas amealhadas até o presente momento, é possível constatar a presença de indícios suficientes da autoria do delito de homicídio praticado pelos denunciados, de modo que a tese da acusação encontra respaldo nos autos.
Por essas razões, compete ao Conselho de Sentença, juiz natural da causa, a deliberação a respeito da responsabilidade dos agentes, motivo pelo qual não há falar em impronúncia (despronúncia) dos acusados.
Destaca-se que eventuais inconsistências entre as versões das vítimas não possuem o condão de macular a decisão proferida na origem, mormente porque suas declarações serão devidamente analisadas pelos jurados por ocasião do julgamento submetido ao Tribunal do Júri. 
Da mesma forma, não cabe decretar a absolvição sumária do Recorrente, porquanto não restou comprovado, de maneira inequívoca, a configuração de quaisquer das hipóteses descritas no art. 415 do Código de Processo Penal no caso em tela. 
Assim, existindo uma versão, no caso, a do Ministério Público, subsidiada em elementos informativos e judiciais da ocorrência de crime doloso contra a vida (tentativa de homicídio), há de ser confirmada a decisão de pronúncia, porquanto se constitui, ela, em um juízo fundado de simples suspeita, que apenas admite a acusação para levar o acusado à julgamento pelo Tribunal do Júri, juiz natural da causa em crimes deste jaez.
Nesse sentido, colhe-se desta Câmara o Recurso em Sentido Estrito n. 0003719-48.2013.8.24.0015, de Canoinhas, rel. Des. Sérgio Rizelo, julgado em 17-04-2018:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO QUALIFICADO (CP, ART. 121, § 2º, III E IV). DECISÃO DE PRONÚNCIA. RECURSO DO ACUSADO. PLEITO DE IMPRONÚNCIA. INVIABILIDADE. PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. INFORMES COLHIDOS EM AMBAS AS FASES PROCEDIMENTAIS QUE DÃO AZO À POSSIBILIDADE, EM TESE, DE O ACUSADO TER PRATICADO O CRIME NARRADO NA DENÚNCIA.   Satisfeitos os requisitos do art. 413 do Código de Processo Penal e havendo duas versões sobre os fatos em debate, uma delas se prestando a agasalhar a tese acusatória, correta é a decisão de pronúncia que remete o julgamento da matéria ao Tribunal do Júri, a quem compete soberanamente o exame aprofundado da prova relativa aos crimes dolosos contra a vida.   RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 
Outrossim, não se observou, no curso do feito, qualquer violação aos princípios da presunção da inocência, da isonomia processual, e do devido processo legal, uma vez que foi assegurado ao acusado e ao seu Defensor o direito de manifestar-se sobre a prova produzida, sendo este devidamente intimado de todos os atos judiciais.
Ademais, inexiste a alegada afronta aos artigos 197 e 414, ambos do Código de Processo Penal, eis que a decisão proferida na origem encontra amparo nos elementos probatórios até então produzidos.
A propósito, consoante restou enfatizado alhures, a materialidade e indícios de autoria defluem das declarações das vítimas e dos Laudos Periciais amealhados, os quais, em conjunto, são capazes de corroborar a tese acusatória.
Nesse contexto, ficam afastados os pleitos de despronúncia e de decretação de nulidade da decisão proferida na origem.
Assim, considerando a eficácia objetiva da decisão de pronúncia, mantém-se o juízo de admissibilidade da acusação, para submissão do Recorrente ao Tribunal do Júri, em todos os seus termos e extensão.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do recurso, afastar a preliminar arguida e, no mérito, negar-lhe provimento. 

Documento eletrônico assinado por NORIVAL ACACIO ENGEL, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1079213v27 e do código CRC 354ef744.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): NORIVAL ACACIO ENGELData e Hora: 22/6/2021, às 19:58:51

 

 












Recurso em Sentido Estrito Nº 0002922-29.2011.8.24.0052/SC



RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL


RECORRENTE: JULIO VIEIRA DE LARA (ACUSADO) ADVOGADO: JONATHAN MOREIRA DOS SANTOS (OAB SC028144) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)


EMENTA


RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA. DUPLA TENTATIVA DE HOMICÍDIO (ART. 121, "CAPUT", C/C ART. 14, INCISO II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). DECISÃO DE PRONÚNCIA. RECURSO DEFENSIVO.
PRELIMINAR. SUSTENTADA NULIDADE DO RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO EFETUADO NA FASE ADMINISTRATIVA. NÃO ACOLHIMENTO. PROCEDIMENTO PREVISTO NO ARTIGO 226, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, QUE CONSTITUI MERA RECOMENDAÇÃO. PRECEDENTES. PREAFACIAL AFASTADA. 
MÉRITO. PLEITO DE DESPRONÚNCIA, COM FUNDAMENTO NA AUSÊNCIA OU INSUFICIÊNCIA DE INDÍCIOS QUANTO À AUTORIA. NÃO ACOLHIMENTO. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS APTOS A CORROBORAR A TESE ACUSATÓRIA. VERSÃO DO RECORRENTE NÃO DEMONSTRADA DE MANEIRA INCONTROVERSA. DÚVIDA QUE DEVE SER DIRIMIDA PELO CONSELHO DE SENTENÇA. ANÁLISE APROFUNDADA DA PROVA INVIÁVEL NESTA ETAPA PROCESSUAL. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DO "IN DUBIO PRO SOCIETATE". 
RECURSO CONHECIDO, PRELIMINAR AFASTADA E, NO MÉRITO, NÃO PROVIDO.

ACÓRDÃO


Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso, afastar a preliminar arguida e, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 22 de junho de 2021.

Documento eletrônico assinado por NORIVAL ACACIO ENGEL, Desembargador Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1079214v3 e do código CRC b402c88a.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): NORIVAL ACACIO ENGELData e Hora: 22/6/2021, às 19:58:51

 

 










EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 22/06/2021

Recurso em Sentido Estrito Nº 0002922-29.2011.8.24.0052/SC

RELATOR: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL

PRESIDENTE: Desembargador SÉRGIO RIZELO

PROCURADOR(A): GENIVALDO DA SILVA
RECORRENTE: JULIO VIEIRA DE LARA (ACUSADO) ADVOGADO: JONATHAN MOREIRA DOS SANTOS (OAB SC028144) RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (AUTOR)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 22/06/2021, na sequência 66, disponibilizada no DJe de 04/06/2021.
Certifico que o(a) 2ª Câmara Criminal, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 2ª CÂMARA CRIMINAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO, AFASTAR A PRELIMINAR ARGUIDA E, NO MÉRITO, NEGAR-LHE PROVIMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGEL
Votante: Desembargador NORIVAL ACÁCIO ENGELVotante: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHOVotante: Desembargadora SALETE SILVA SOMMARIVA
FELIPE FERNANDES RODRIGUESSecretário