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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0017884-71.2021 (Acordão do Conselho da Magistratura)
Relator: Gerson Cherem II
Origem: Guaramirim
Orgão Julgador:
Julgado em: Tue May 16 00:00:00 GMT-03:00 2023
Classe: Recurso Administrativo

 

ACÓRDÃO



Recurso Administrativo n. 0017884-71.2021.8.24.0710



Relator: Gerson Cherem II  



PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. OFÍCIO DO REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE GUARAMIRIM. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DOS INTERESSADOS.



PRETENDIDO PARCELAMENTO DO SOLO URBANO NA MODALIDADE DESMEMBRAMENTO. PARECER DESFAVORÁVEL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. IMÓVEL ORIUNDO DE PRÉVIA DIVISÃO DE GLEBA MAIOR. ALEGAÇÃO PELO PARQUET DE BURLA À LEI N. 6.766/79 E NECESSIDADE DE LOTEAMENTO. NÃO ACOLHIMENTO. DESNECESSIDADE DE ABERTURA DE NOVAS VIAS DE CIRCULAÇÃO E LOGRADOUROS PÚBLICOS OU PROLONGAMENTO, MODIFICAÇÃO OU AMPLIAÇÃO DAS VIAS EXISTENTES (ART. 2º, § 2º, DA LEI N. 6.766/79). REQUISITOS PARA O REGISTRO DO DESMEMBRAMENTO PREENCHIDOS. EXIGÊNCIAS REFERENTES AO LOTEAMENTO INJUSTIFICADAS. DÚVIDA PROCEDENTE.



RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.  



              Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Administrativo n. 0017884-71.2021.8.24.0710, da Comarca de Guaramirim, em que são recorrentes Valmor Domingos Gonçalves de Jesus e Maria Aparecida Grande Gonçalves de Jesus.  



              O Conselho da Magistratura decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento para autorizar o desmembramento do imóvel de matrícula n. 7.201, do Ofício do Registro de Imóveis da Comarca de Guaramirim, respeitadas as exigências legais. Custas na forma da lei.



              O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador João Henrique Blasi, com voto, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Selso de Oliveira, Denise Volpato, Altamiro de Oliveira, Rodolfo Tridapalli, Gilberto Gomes de Oliveira, Cláudia Lambert de Faria e André Carvalho.



              Participou como representante do Ministério Público o Dr. Mário Luiz de Melo.



              Florianópolis, 08 de maio de 2023.  



Gerson Cherem II



RELATOR 



              RELATÓRIO 



              Trata-se de recurso administrativo interposto por Valmor Domingos Gonçalves de Jesus e Maria Aparecida Grande Gonçalves de Jesus contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Guaramirim que, nos autos da suscitação de dúvida apresentada pelo Oficial Interino do Ofício de Registro de Imóveis, Sr. André Luiz Gonçalves, julgou procedente o pleito, nos seguintes termos (6129851):



Ante o exposto, resolvendo o mérito (art. 487, I, do CPC), JULGO PROCEDENTE a suscitação de dúvida, indeferindo o registro do referido desmembramento na forma proposta, mantendo as exigências do Oficial do Registro de Imóveis.



              Inconformados, os interessados alegaram que caberia, na hipótese, o simples desdobro do imóvel. Sucessivamente, afirmaram estar preenchidos os requisitos para o desmembramento, salientando que não poderiam ser prejudicados por suposta irregularidade perpetrada no parcelamento do imóvel originário. No mais, requereram fosse postergado o prazo de atualização das certidões e publicação de edital para após a definição da modalidade de parcelamento de solo cabível (6214275).



              Sem contrarrazões, o feito foi remetido à douta Procuradoria-Geral de Justiça que, em parecer da lavra do Dr. Alexandre Herculano Abreu, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento da insurgência (6987725).



              É o relatório.  



              VOTO 



              Presentes os requisitos legais, conhece-se do recurso.



              Os recorrentes visam à reforma da decisão que rejeitou a suscitação de dúvida, reconhecendo a validade das exigências impostas pelo Oficial Registrador do Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Guaramirim no procedimento de parcelamento do imóvel de propriedade daqueles.



              Argumentam, primeiramente, que seria possível o mero desdobro do bem. Asseveram também que estão presentes os pressupostos para o desmembramento do imóvel, sendo despiciendas as exigências relativas ao loteamento. Salientam que não podem ser prejudicados por suposta irregularidade ocorrida no prévio parcelamento do imóvel que originou o seu. 



              Melhor sorte socorre em parte os recorrentes.



              De pronto, afasta-se a alegação de possibilidade de desdobro, porque ela ultrapassa os limites da pretensão inicial.



              Com efeito, a presente suscitação de dúvida foi manejada no procedimento para buscar o desmembramento do imóvel de matrícula n. 7.201, do Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Guaramirim, porém a tese de desdobro surgiu unicamente em juízo.



              Extrai-se do requerimento juntado no documento 5524189 - fl. 14:



VALMOR DOMINGOS GONÇALVES DE JESUS [...] e sua esposa MARIA APARECIDA GRANDE GONÇALVES DE JESUS [...] na qualidade de proprietários do imóvel devidamente matriculado sob o n.º 7.201, do Ofício de Registro de Imóveis de Guaramirim/SC; vêm pelo presente REQUERER o registro de desmembramento de 04 (quatro) parcelas [...]. (Grifou-se).



              Logo, refoge totalmente ao presente procedimento o exame da possibilidade de desdobro.



              Cinge-se, pois, a controvérsia em perquirir qual a modalidade de parcelamento do solo seria adequada para o caso em comento: desmembramento, como querem os interessados, ou loteamento, como exigido pelo Oficial, em observância ao parecer do Ministério Público.



              Acerca das espécies de parcelamento do solo, leciona Luiz Antônio Scavone Júnior:



Parcelamento do solo urbano é gênero do qual são espécies o desmembramento, o loteamento e o desdobro.  
As duas primeiras espécies, sujeitas e disciplinadas pela Lei 6.766/1979 e, a última, exclusivamente, pela lei municipal. 
Loteamento é a subdivisão de gleba em lotes destinados à edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes. 
Desmembramento, por seu turno é a atividade de subdivisão de gleba em lotes destinados à edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique a abertura de novas vias e logradouros públicos, nem prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes 
Esses conceitos estão insertos no art. 2º e respectivos parágrafos da Lei 6.766/1979. 
O desdobro nada mais é que a subdivisão de um lote em lotes, conforme previsão em lei municipal. (Direito imobiliário: teoria e prática. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022. p. 159). (Grifou-se).  



              A matéria é abordada também pela Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Santa Catarina, que em sua plataforma "extrafácil" (disponível em <http://cgjweb.tjsc.jus.br/extrafacil/inicio>, acesso em 21.02.2022) assim dispõe:



Quais os tipos de parcelamento admitidos pelo ordenamento jurídico brasileiro?  
O parcelamento do solo, dependendo de suas características e destinação, pode ser dividido em: loteamento, desmembramento e desdobro.



O que é parcelamento do solo?  
É a operação registral que consiste em seccionar uma área de terreno com ou sem benfeitorias, transformando-a em dois ou mais imóveis novos.



O que é loteamento?



Considera-se loteamento a subdivisão de gleba em lotes destinados à edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes.



O que é desmembramento?



Considera-se desmembramento a subdivisão de gleba em lotes destinados à edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes.  



              In casu, está-se diante, estreme de dúvidas, de um desmembramento.



              O imóvel cuja divisão pretende-se é um terreno de 6.095,64m², localizado em zona residencial (doc. 5524189 - fl. 21) e margeado em sua maior extensão pela Rua Guilherme Zerbin (doc. 5524189 - fl. 33). O fracionamento tencionado acarretará o surgimento de quatro lotes, com 431,90m², 433,50m², 2.839,15m² e 2.391,09m², remanescendo todos com acesso à referida rua, consoante memorial descritivo (doc. 5524189 - fls. 22/26) e croqui (5545759 - fl. 4).



              Não há, na hipótese, abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes, mas apenas a divisão da gleba em lotes menores.



              Nada obstante o parecer do douto representante do Parquet (6987725) no sentido de que há tentativa de evitar o cumprimento das exigências para criação de loteamento, devido aos sucessivos desmembramentos ocorridos no local, diferentemente se verifica dos autos.



              Do histórico do imóvel em questão, extrai-se que ele se originou de parcelamento anterior do bem de matrícula n. 2.686, também do Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Guaramirim (5524189 - fls. 78/81). Referido terreno, contendo a área de 20.125m², foi, de fato, dividido por diversas vezes, consoante averbações AV-2 a AV-5 e AV-7 a AV-17 (5524189 - fls. 78/81), sendo que a averbação 10 corresponde à origem do imóvel de matrícula n. 7.201, ora em debate.



              Alega o Ministério Público que estes repetidos desdobros seriam irregulares e teriam culminado na doação de parte da área para a Municipalidade para a criação de ruas (ocorrida em em 1983, pela Lei n. 414 - 5524189 - fl. 45), tratando-se, em verdade, de loteamento, realizado sem a observância da Lei n. 6.766/79.



              Tem-se, todavia, que a gleba de aproximadamente 20.000m² não pertencia aos recorrentes. Não foram eles, pois, que supostamente parcelaram de  modo irregular o terreno, em eventual tentativa de burla à Lei n. 6.766/79.



              Como assevera o Parquet, a criação (supostamente irregular) da via pública que perpassa o imóvel, cujo desmembramento ora se pretende, deu-se em 1983. Hipotético "desrespeito ao loteamento, que deveria ter sido criado no passado" (5719550) não deve prejudicar os apelantes. Em outras palavras, não podem os recorrentes ser responsabilizados pela abertura ilegal de arruamento, ocorrida 40 anos antes, em imóvel de terceiros, mormente porque sua pretensão atual, repita-se, não implica na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação daqueles lá existentes.



              Dessarte, não se vislumbra qualquer empeço à pretensão dos demandantes em ver parcelada a área por meio do desmembramento.



              Nesse sentido:



CONSELHO DA MAGISTRATURA. RECURSO ADMINISTRATIVO. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA INVERSA. RECUSA ADMINISTRATIVA DA OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE CAPINZAL. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE PARCELAMENTO DE SOLO URBANO NA MODALIDADE DE DESMEMBRAMENTO. SISTEMA VIÁRIO EXISTENTE. DESNECESSIDADE DE ABERTURA DE NOVAS VIAS DE CIRCULAÇÃO, AMPLIAÇÕES OU MODIFICAÇÕES NA INFRAESTRUTURA URBANA. REQUISITOS PARA O REGISTRO DO DESMEMBRAMENTO QUE SE ENCONTRAM PREENCHIDOS. LOTEAMENTO PRESCINDÍVEL, SOB PENA DE INVIABILIZAÇÃO DO PARCELAMENTO DO SOLO. LEI MUNICIPAL AUTORIZATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DO MÉRITO NESTA VIA ADMINISTRATIVA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. [...]. (RA n. 0030993-55.2021, rel. Des. Altamiro de Oliveira, j. em 10.05.2022).



RECURSO ADMINISTRATIVO. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. PEDIDO DE REGISTRO DE DESMEMBRAMENTO. PARECER DESFAVORÁVEL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA MINISTERIAL. ALEGADA NECESSIDADE DE IMPOSIÇÃO DO PROCEDIMENTO CONCERNENTE AO LOTEAMENTO. [...] DESNECESSIDADE DE EXPANSÃO, PROLONGAMENTO OU CRIAÇÃO DE NOVA VIA PÚBLICA. ANUÊNCIA DO PODER PÚBLICO MUNICIPAL. REQUISITOS PARA O PARCELAMENTO DO SOLO NA MODALIDADE DESMEMBRAMENTO QUE SE ENCONTRAM PREENCHIDOS. INEXISTÊNCIA DE PROVAS DE QUE O IMÓVEL SERVIRIA PARA LOTEAMENTO IRREGULAR. AUSÊNCIA DE ÓBICE AO DEFERIMENTO DO PEDIDO DE DESMEMBRAMENTO. RECLAMO CONHECIDO E DESPROVIDO. (RA n. 0011634-22.2021, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. em 05.05.2022)



RECURSO ADMINISTRATIVO. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. PLEITO REGISTRAL DE DESMEMBRAMENTO DE IMÓVEL DENEGADO PELA OFICIALA DO OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE ARARANGUÁ. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DA DÚVIDA. INSURGÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. IMÓVEL A SER DESMEMBRADO QUE É ORIUNDO DE PRÉVIO DESMEMBRAMENTO DE TERRENO MAIOR. ALEGAÇÃO DO PARQUET DE QUE ESSE PARCELAMENTO DEVE SE DAR NA MODALIDADE DE LOTEAMENTO. NÃO ACOLHIMENTO. DESMEMBRAMENTOS QUE NÃO RESULTARÃO NA ABERTURA DE NOVAS VIAS PÚBLICAS. ÁREA COM INSTALAÇÃO DE ÁGUA, ENERGIA ELÉTRICA E ILUMINAÇÃO PÚBLICA. REQUISITOS PARA O REGISTRO DO DESMEMBRAMENTO QUE SE ENCONTRAM PREENCHIDOS. ANUÊNCIA MUNICIPAL. OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE, PROPORCIONALIDADE E DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE, PROPORCIONANDO A PLENA UTILIZAÇÃO DO SOLO URBANO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (RA n. 0033824-76.2021, rel. Des. Selso de Oliveira, j. em 12.04.2022).



              Nesse pensar, revela-se próspero o reclamo dos demandantes.



              Por fim, no que tange aos pleitos de prorrogação de prazo para atualização de certidões e publicação de edital, é certo que devem ser acolhidos e são decorrência lógica do trâmite do procedimento no Ofício de Registro de Imóveis. Ora, reconhecida a modalidade de parcelamento aplicável à espécie, é o Cartório o competente para retomar o curso do feito -- que, por consequência, exigirá tais certidões e edital -- e promover a anotação do parcelamento de acordo com as exigências legais.



              Ante o exposto, conhece-se do recurso e dá-se-lhe parcial provimento para autorizar o desmembramento do imóvel de matrícula n. 7.201, do Ofício do Registro de Imóveis da Comarca de Guaramirim, respeitadas as demais exigências legais.



              É como voto.