Acesso restrito
Pesquisa de Satisfação:

Excelente

Bom

Ruim

Observações:


FECHAR [ X ]



Obrigado.











TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0018150-24.2022 (Acordão do Conselho da Magistratura)
Relator: Denise Volpato
Origem: Santa Rosa do Sul
Orgão Julgador:
Julgado em: Thu Sep 15 00:00:00 GMT-03:00 2022
Classe: Recurso Administrativo

 

ACÓRDÃO



Recurso Administrativo n. 0018150-24.2022.8.24.0710



Relatora: Desembargadora Denise Volpato  



RECURSO ADMINISTRATIVO. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SANTA ROSA DO SUL. DISTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. DESCRIÇÃO PRECÁRIA DO IMÓVEL. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ESPECIALIDADE OBJETIVA E DA SEGURANÇA JURÍDICA. ARTS. 1º, 176 E 225 DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS (LEI N. 6.015/1973). NEGATIVA REGISTRAL LEGÍTIMA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.  



              Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Administrativo n. 0018150-24.2022.8.24.0710, da comarca de Santa Rosa do Sul, em que é recorrente Moacir Raimundo Ramos e recorrido o Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Santa Rosa do Sul, José Alceu Trajano.



              O Conselho da Magistratura, decidiu, por votação unânime, negar provimento ao recurso.



              O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador João Henrique Blasi e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores André Carvalho, Cláudia Lambert de Faria, Getúlio Corrêa, Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Selso de Oliveira, Rubens Schulz e Rodolfo Tridapalli.



Florianópolis, 12 de setembro de 2022.  



DENISE VOLPATO



RELATORA 



              RELATÓRIO



              José Alceu Trajano, Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Santa Rosa do Sul, instaurou suscitação de dúvida a pedido de Moacir Raimundo Ramos, em vista da exigência de regularização do distrato de promessa de compra e venda que o interessado pretende averbar.



              O suscitante afirmou que não é possível o registro do título apresentado enquanto ausente a descrição pormenorizada do imóvel de matrícula  n. 44.509, pela ofensa aos princípios da especialidade objetiva e da segurança jurídica. Asseverou que já é a terceira nota devolutiva do requerimento de registro, remanescendo pendente tal requisito para a qualificação do título. Salientou que o interessado não figura como parte no negócio de compra e venda (documento n. 6289699).



              Apresentada a impugnação (documento n. 6289956), sobreveio a manifestação do Ministério Público (documento n. 5902963).



              Ao sentenciar o feito, o Magistrado a quo julgou procedente a dúvida (documento n. 6289985).



              Inconformado, o interessado Moacir Raimundo Ramos interpôs recurso administrativo de apelação. Nas razões de insurgência, aduziu que: a) "a falta de identidade exata da descrição do imóvel não compromete a segurança [jurídica], já que os demais elementos do título permitem aferir que se trata do mesmo imóvel negociado no [contrato] datado de 18-10-1995, registrado no R.1 na matrícula 44.509"b) "à luz do Código Civil (art. 104) o distrato é plenamente válido"; e c) "há também a impossibilidade [...] de aditamento do distrato nos moldes solicitados pelo registrador, em razão da falta de localização do compromissário comprador e da morte do representante da empresa compromissária vendedora" (documento n. 6290005).



              Transcorreu in albis o prazo para oferecimento das contrarrazões (documento n. 6290025). 



              A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do reclamo (documento n. 6307408).



              Este é o relatório. 



              VOTO



              Trata-se de recurso administrativo interposto por Moacir Raimundo Ramos contra a decisão que julgou procedente a suscitação de dúvida apresentada pelo Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Santa Rosa do Sul e, assim, confirmou a exigência de descrição pormenorizado do imóvel de matrícula n. 44.509 no instrumento particular de distrato de promessa de compra e venda.



              O interessado pugna pela reforma do julgado, com o afastamento da desqualificação registral, sob argumento de que o título contém elementos suficientes para identificar o imóvel negociado.



              Razão não lhe assiste.



              Sabe-se que a premissa principal do sistema de registro imobiliário é conferir segurança jurídica às transações que envolvam imóveis, de modo a garantir o direito de propriedade.



              É o que alude Sarmento Filho:



"A existência de um sistema organizado decorre da necessidade de tornar mais confiável o tráfego imobiliário, de forma a acelerar o tempo de realização dos negócios, além de reduzir os custos, protegendo titulares dos direitos reais nele inscritos, especificamente o direito de propriedade." (SARMENTO FILHO, Eduardo Sócrates Castanheira. Direito registral imobiliário. Curitiba: Juruá, 2013, p. 24).



              A matrícula imobiliária precisa, portanto, ser capaz de garantir a credibilidade e a confiança para a prática de atos de disposição da propriedade. Isso se aufere em especial por meio da produção criteriosa dos atos de registro e averbação.



              De conseguinte, a fim de retratar informação sobre o imóvel de forma mais completa e segura o possível, a qualificação registral deve observar todos os princípios e regras aplicáveis, sejam legais, sejam administrativos.



              Volvendo ao caso concreto, a exigência formulada pelo Oficial tem amparo no princípio da especialidade objetiva, segundo o qual o imóvel levado a registro deve estar plenamente identificado.



              Referido princípio é traduzido nos arts. 176, §1º, II, 3, e 225, caput e § 1º, de Lei n. 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos), verbis:



"Art. 176 - O Livro nº 2 - Registro Geral - será destinado, à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos relacionados no art. 167 e não atribuídos ao Livro nº 3.



§ 1º A escrituração do Livro nº 2 obedecerá às seguintes normas:



[...]



II - são requisitos da matrícula:



[...]



3) a identificação do imóvel, que será feita com indicação:



a - se rural, do código do imóvel, dos dados constantes do CCIR, da denominação e de suas características, confrontações, localização e área;



b - se urbano, de suas características e confrontações, localização, área, logradouro, número e de sua designação cadastral, se houver.



[...]



Art. 225 - Os tabeliães, escrivães e juizes farão com que, nas escrituras e nos autos judiciais, as partes indiquem, com precisão, os característicos, as confrontações e as localizações dos imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes e, ainda, quando se tratar só de terreno, se esse fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos interessados certidão do registro imobiliário.



§ 1º As mesmas minúcias, com relação à caracterização do imóvel, devem constar dos instrumentos particulares apresentados em cartório para registro." [Grifou-se].



              Por oportuno, colaciona-se o ensinamento da doutrina sobre a matéria:



"A lei registral exige uma identificação precisa do imóvel, para fins de que se cumpra o Princípio da especialidade na sua vertente objetiva, ou seja, o princípio é aplicado no imóvel, objeto da situação jurídica.



A especialidade objetiva determina que todo imóvel de registro deva estar precisamente descrito, na forma exigida pela lei, com suas características, confrontações, área e denominação, se rural, ou logradouro e número, se urbano e sua designação cadastral.



O princípio da especialidade tem por objetivo resguardar o Registro Imobiliário de possíveis equívocos e inexatidões que possam confundir a matrícula e o registro das propriedades imobiliárias, causando embaraço à segurança dos negócios jurídicos." (ARRUDA ALVIM NETO, José Manuel de; CAMBLER, Everaldo Augusto; CLÁPIS, Alexandre Laizo. Lei de Registros Públicos comentada: Lei n n. 6.015/1973. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 994). [Grifou-se].



              Forte nessas diretivas, inarredável concluir que a exigência do Oficial Registrador foi acertada.



              Realmente não se mostra possível o ingresso do título à míngua de descrição suficiente do imóvel objeto do negócio jurídico, sem a indicação de elementos seguros que permitam identificar a unidade imobiliária.



              Conforme determina o § 1º do art. 225 da Lei n. 6.015/1973, a caracterização completa do imóvel tal qual feita na matrícula deve constar dos instrumentos particulares apresentados para registro.



              Todavia, o distrato de compra e venda que o apelante almeja averbar limita-se a detalhar o imóvel como "lote de terreno 07, da quadra nº 121, situado no loteamento denominado "PRAIA MIRATORRES", município de São João do Sul/SC" (documento n. 6289736, p. 1-2).



              Ou seja, não há indicação da matrícula, nem designação da área, confrontações e logradouro, a fim de que se possa confrontar o documento com o registro do imóvel.



              Além disso, a localização apontada no instrumento particular destoa daquela contida no registro da matrícula; no primeiro, consta o município de São João do Sul/SC, e no segundo, o município de Passo de Torres/SC (documentos n. 6289736, p. 1-3).



              Ora, a arguição de que o Distrato de Compra e Venda é plenamente válido não autoriza por si só seu registro se o competente instrumento não contempla os requisitos legais aplicáveis na lei de registros públicos.



              Logo, decorrendo da Lei n. 6.015/1973, deve o apelante providenciar a descrição correta e pormenorizada do imóvel no distrato de promessa de compra e venda que pretende averbar.



              Ainda, convém destacar que "lesão ou ameaça a direito" (Constituição Federal, art. 5º, XXXV) pode ser levada ao conhecimento da jurisdição, de forma que o direito do apelante poderá ser exercido mediante a proposição da competente ação declaratória de cunho jurisdicional (mediante a conformação do contraditório), oportunidade em que poderá ser chancelada a validade do instrumento como distrato da anterior promessa de compra e venda levada a registro.



              Assim estabelece o artigo 204, da Lei de Registros Públicos:



"Art. 204 - A decisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do processo contencioso competente."



              Desse modo, por não preencher os requisitos autorizadores de registro (a preservar a segurança do fólio mesmo sem a conformação de contraditório judicial), o instrumento apresentado ao Ofício de Imóveis não merece ser averbado na matrícula imobiliária.



              Em reforço, segue precedente análogo da Segunda Câmara de Direito Civil desta Corte:



"APELAÇÃO CÍVEL. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. OFICIAL DE REGISTRO. FORMAL DE PARTILHA APRESENTADO PELOS SUSCITADOS COM IRREGULARIDADES QUE IMPEDEM O REGISTRO. NECESSIDADE DE DESCRIÇÃO PORMENORIZADA DO IMÓVEL OBJETO DA TRANSCRIÇÃO. EXIGÊNCIA PREVISTA NOS ARTIGOS 176 E 225 DA LEI N. 6.015/1973 E NO ARTIGO 777 DO CÓDIGO DE NORMAS DOS FOROS JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL DO ESTADO DE SANTA CATARINA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO." (TJSC, Apelação Cível n. 2005.025718-5, Segunda Câmara de Direito Civil, rel. Mazoni Ferreira, j. 06-08-2009).



              No mesmo norte, do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo:



"REGISTRO DE IMÓVEIS. ESPECIALIDADE OBJETIVA. DESCRIÇÃO DO IMÓVEL DIVERSA DA EXISTENTE NA MATRÍCULA. IMPOSSIBILIDADE DE INGRESSO DO TÍTULO. A VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO POR VÍCIO DE FORMA DEVE SER AVALIADA NO MOMENTO DE SEU APERFEIÇOAMENTO. NULIDADE POR VÍCIO DE FORMA. IMPOSSIBILIDADE DE PEDIDO DE DESDOBRO COM BASE EM CONTRATO NULO. RECURSO NÃO PROVIDO." (CSMSP, Apelação Cível n. 1000267-95.2018.8.26.0204, rel. Des. Pinheiro Franco, j. 16-05-2019).



"REGISTRO DE IMÓVEIS. DÚVIDA. IMÓVEL RURAL. NÃO IDENTIFICAÇÃO COMO CORPO CERTO. DESCRIÇÃO PRECÁRIA. QUEBRA DO PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE OBJETIVA. IMPOSSIBILIDADE DE REGISTRO DE ESCRITURA PÚBLICA DE VENDA E COMPRA. RECURSO DESPROVIDO." (CSMSP, Apelação Cível n. 0005085-94.2014.8.26.0189, Rel. Des. Elliot Akel, j. 07-10-2015).



              Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento ao recurso.



              Este é o voto.