ACÓRDÃO
Recurso Administrativo n. 0040753-28.2021.8.24.0710
Relatora: Desembargadora Denise Volpato
RECURSO ADMINISTRATIVO. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE IÇARA. ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA DE FRAÇÃO DE IMÓVEL RURAL. DESQUALIFICAÇÃO REGISTRAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO INTERESSADO. REQUERIMENTO PRELIMINAR DE CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA. CARÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. CUSTAS NÃO INCIDENTES NA HIPÓTESE, CONFORME CIRCULAR CGJ N. 159/2020. RECLAMO NÃO CONHECIDO NO PONTO. MÉRITO. ELEMENTOS INDICATIVOS DE PARCELAMENTO ILEGAL DO SOLO. DISPARIDADE ENTRE A ÁREA FRACIONADA E O TODO MAIOR (ART. 715, I, DO CNCGJ). VISTORIA IN LOCO. CONSTATADA A DESTINAÇÃO DO BEM PARA FINALIDADES DISTINTAS DA SUA CARACTERÍSTICA RURAL (ART. 716 DO CNCGJ). ÓBICE AO REGISTRO CONFIRMADO. EXEGESE DO ART. 713, IV, DO CNCGJ. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Administrativo n. 0040753-28.2021.8.24.0710, da comarca de Içara, em que é recorrente José Vanor Pedro e recorrida a Oficiala de Registro de Imóveis da Comarca de Içara, Marlene Roecker Nunes.
O Conselho da Magistratura, decidiu, por votação unânime, conhecer em parte do recurso e, nesta extensão, negar-lhe provimento.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador João Henrique Blasi e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Altamiro de Oliveira, Cláudia Lambert de Faria, Gerson Cherem II, Getúlio Corrêa, Gilberto Gomes de Oliveira, Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Selso de Oliveira, Rubens Schulz e Rodolfo Cezar Ribeiro da Silva Tridapalli.
Florianópolis, 13 de junho de 2022.
DENISE VOLPATO
RELATORA
RELATÓRIO
Marlene Roecker Nunes, Oficiala designada do Registro de Imóveis da Comarca de Içara, instaurou suscitação de dúvida a pedido de José Vanor Pedro, em relação ao requerimento do registro de escritura pública de compra e venda da fração de 1.800,00 m² do imóvel rural que possui 65.000 m², matriculado sob o n. 22.469.
A suscitante afirmou que o título não merece ingresso no fólio real, pois a disparidade entre a área alienada e a área total gera suspeita de parcelamento irregular do solo. Arguiu que a porcentagem a ser transferida é ínfima em comparação à dimensão original, representando 2,76% desta. Salientou que realizou vistoria in loco e constatou a destinação do bem para finalidades distintas da sua característica rural. Observou, outrossim, a existência de novas edificações no terreno, algumas delas em fase de construção. Diante desses elementos, entendeu configurada a infração oblíqua à ordem urbanística, motivo pelo qual negou o registro, conforme prescrição do art. 713, IV, do CNCGJ (documento n. 5902950).
Apesar de regularmente notificado, o interessado quedou-se silente (documento n. 5902954).
Sobreveio a manifestação do Ministério Público (documento n. 5902963).
Ao sentenciar o feito, o Magistrado a quo julgou procedente a dúvida (documento n. 5902976).
Inconformado, o interessado José Vanor Pedro interpôs recurso administrativo de apelação. Requereu, prefacialmente, a concessão do benefício da justiça gratuita e, no mérito, a reforma da sentença para afastar o óbice ao registro imobiliário. Sustentou que: a) carece de recursos para o custeio das despesas processuais; b) a área que pretende registro ultrapassa em muito o tamanho regular de um lote; c) o imóvel de matrícula n. 22.469 é de grande proporção e, por conseguinte, comporta fracionamento; d) as fotos apresentadas pela Oficiala Registradora não parecem se localizar próximo da região alienada; e e) a finalidade agrícola da propriedade foi atestada por declaração de técnico da EPAGRI (documento n. 5902989).
Com as contrarrazões (documento n. 6156668), ascenderam os autos para julgamento.
A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do reclamo (documento n. 6207357).
Este é o relatório.
VOTO
1. Justiça Gratuita
O pedido de concessão do benefício da justiça gratuita não merece ser conhecido, dada a carência de interesse processual no ponto.
Verdade que a Lei n. 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos) dispõe, em seu art. 207, que deverá o interessado arcar com as custas do processo de suscitação de dúvida quando esta for julgada procedente. Transcreve-se:
"Art. 207 - No processo, de dúvida, somente serão devidas custas, a serem pagas pelo interessado, quando a dúvida for julgada procedente."
Todavia, diante da inexistência de permissivo semelhante na legislação estadual, a Corregedoria-Geral da Justiça desta Corte assim definiu nos autos do processo SEI! n. 0001914-02.2019.8.24.0710, em decisão exarada na data de 04-06-2020:
"EXTRAJUDICIAL. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. PROCEDIMENTO DE NATUREZA ADMINISTRATIVA. TAXA DE SERVIÇOS JUDICIAIS (TSJ). LEI ESTADUAL N. 17.654/2018. HIPÓTESE DE NÃO INCIDÊNCIA.
O procedimento administrativo de suscitação de dúvida, seja na modalidade direta ou inversa, não constitui hipótese de incidência da taxa de serviços judiciais (TSJ) criada pela Lei estadual n. 17.654/2018." (documento n. 4705646).
Tal entendimento foi publicizado por intermédio da Circular CGJ n. 159/2020, com idêntica redação (documento n. 4709287).
Forte nessa diretiva, não há, pois, se falar em cobrança de custas na hipótese vertente, de modo que sobressai prejudicada a utilidade prática do requerimento da gratuidade da justiça.
Superada a quaestio, passa-se ao mérito do recurso.
2. Mérito
Trata-se de recurso administrativo interposto em face da decisão que julgou procedente a dúvida suscitada pela Oficiala de Registro de Imóveis da Comarca de Içara e, nesses termos, confirmou a recusa do registro de escritura de compra e venda de fração do imóvel rural matriculado sob o n. 22.469.
O interessado pugna pela reforma do julgado, com o afastamento da desqualificação registral, sob argumento de que a desproporção entre a área alienada e o todo, não denota, por si só, tentativa de loteamento clandestino, bem como de que a destinação agrícola do imóvel foi atestada por técnico da EPAGRI.
Razão não lhe assiste.
Impende destacar que os atos do Oficial de Registro estão estritamente vinculados ao princípio da legalidade, ou seja, ele só poderá agir com base no que a lei determina. Daí decorre que a registrabilidade do título está consubstanciada na análise legal de aptidão, ou não, que deverá ser motivadamente fundamentada.
Segundo lição de Alberto Gentil:
"O Direito Registral Imobiliário eleva como um dos seus princípios fundamentais o princípio da legalidade [...]. O Oficial Registrador somente poderá fazer aquilo que a lei autorizar, utilizando-se dos princípios próprios do direito administrativo, uma vez que presta um serviço público.
A qualificação registral é o ato pelo qual o Oficial Registrador expressa o princípio da legalidade, uma vez que o resultado da qualificação se dá pela verificação de se determinado título está de acordo com todas as prescrições legais, normativas e jurisprudenciais aplicáveis a ele. Sua atividade é plenamente vinculada, devendo sua decisão quanto à registrabilidade ou não do título ser sempre fundamentada.
Verifica-se a vinculação à legalidade tanto nas suas funções típicas, como a de qualificar títulos e de emitir certidões, como em todos os demais atos provenientes da função pública que exerce, no recolhimento dos tributos, na prestação de informações a órgãos públicos, na conservação dos livros, no atendimento do usuário do serviço, ou seja, em todos os atos em que atua prestando o serviço público delegado, o Oficial Registrador deve seguir uma regra previamente estabelecida, em leis, normas expedidas pelo Poder Judiciário (art. 236, § 1º, da CF), instruções normativas expedidas por órgãos públicos, como a Secretária da Receita Federal, o INCRA, entre outros." (GENTIL, Alberto. Registros Públicos. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2020, p. 303). [Grifei].
A par disso, colaciona-se o comando do art. 713, IV, do CNCGJ, utilizado pela Oficiala Designada para justificar a negativa do registro da escritura pública de compra e venda:
"Art. 713. É vedado ao oficial proceder ao registro de:
[...] IV - qualquer forma de instituição de condomínio ordinário que desatenda aos princípios da legislação civil ou que, de modo oblíquo e irregular, caracterize parcelamento do solo urbano;"
Por seu turno, os indicativos de um possível loteamento clandestino estão elencados no art. 715 do mesmo Código. A teor do inciso I, um dos quesitos que deve ser valorado para se concluir pelo parcelamento irregular é a disparidade entre a área fracionada e aquela que representa o total da gleba, in verbis:
"Art. 715. Para a configuração de loteamento clandestino, deve-se considerar, dentre outros dados objetivos a serem isolada ou conjuntamente valorados:
I - a disparidade entre a área fracionada e a do todo maior; [...]"
Ainda, o art. 716, também do CNCGJ, dispõe que somente é permitida a formação de condomínio em imóvel rural desde que assegurada a sua destinação agropecuária ou extrativista. Veja-se:
"Art. 716. Somente se admitirá formação de condomínio em imóvel rural por ato inter vivos, quando preservada e assegurada sua destinação para fins de exploração agropecuária ou extrativa."
Na hipótese vertente, a área da escritura pública de compra e venda que se pretende o registro é de 1.800,00 m², enquanto a área total do imóvel é de 65.000 m²; isso significa que o apelante almeja registrar a venda de fração ideal correspondente a 2,76% da totalidade da gleba.
Consoante demonstra a matrícula do imóvel (documento n. 5902950, p. 15-22), até 1996 este era de propriedade exclusiva de Alcides Antônio Pereira e sua esposa, os quais venderam a fração ideal de 10.000 m² a José Arvelino João, seguida de outras cinco alienações fracionadas, culminando com a atual (documento n. 5902950, p. 11-14).
Nesse contexto, a Oficiala considerou a ocorrência de possível parcelamento irregular do solo. Então, em observância ao seu dever de atuar como fiscal, promoveu diligência e constatou que, com efeito, há indícios de tentativa de loteamento clandestino. A propósito, reproduz-se dos argumentos lançados na inicial (documento n. 5902950, p. 8-9):
"Observando a imagem extraída do Goole Earth (DOC 05), constatamos a existência de algumas residências, o que motivou uma visita no local. Ao visitar o local, a registradora e as escreventes Verlane Possamai e Bruna Candiotto Silveira verificaram [que havia] novas edificações no local, sendo algumas delas em fase de construção, conforme se observa das fotos anexas (DOC 06).
Inclusive uma dessas residências estava disponível para locação e, enquanto as prepostas desse serviço imobiliário tiravam fotos do local, foram questionadas por um desconhecido se tinham interesse em 'comprar um terreno' naquele local.
Portanto, analisando a soma dos elementos apresentados, entendo, salvo melhor juízo, que há infração oblíqua à ordem urbanística, motivo pelo qual não é possível efetuar o registro da escritura apresentada, com base no disposto no art. 713, IV, do Código de Normas." [Grifei].
Independentemente do que fora averbado na matrícula do imóvel ou declarado por preposto da EPAGRI, três agentes imbuídos de função pública verificaram, em vistoria in loco, que não subsiste a necessária finalidade "de exploração agropecuária ou extrativa", característica do imóvel rural.
Na verdade, os registros fotográficos dão conta da pluralidade de edificações residenciais, novas e em fase de construção (documento n. 5902950, p. 42-48), num claro processo de urbanização (finalidade de habitação), contornado pelo expediente de aparente instauração de condomínio civil; aliás, a Oficiala Registradora relatou que lhe ofertaram um terreno na oportunidade da vistoria, como se de fato houvesse um loteamento na região (documento n. 5902950, p. 9).
A Lei n. 6766/1979, que regula o parcelamento do solo urbano, estatui em seu art. 3º:
"Art. 3º. Somente será admitido o parcelamento do solo para fins urbanos em zonas urbanas, de expansão urbana ou de urbanização específica, assim definidas pelo plano diretor ou aprovadas por lei municipal."
Mais adiante, o art. 53 prescreve:
"Art. 53. Todas as alterações de uso do solo rural para fins urbanos dependerão de prévia audiência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, do Órgão Metropolitano, se houver, onde se localiza o Município, e da aprovação da Prefeitura municipal, ou do Distrito Federal quando for o caso, segundo as exigências da legislação pertinente."
Assim, o parcelamento de imóvel rural (localizado em zona rural) para fins urbanos só é possível se lei municipal redefinir o seu zoneamento, transformando a zona rural ou parte dela (onde se encontra o imóvel) em zona urbana ou de expansão urbana. Sem tal condição, o parcelamento será ilegal, incidindo sobre os responsáveis as sanções penais do art. 50 da Lei n. 6.766/79, uma vez que, desde a promulgação da referida norma, não pode mais ser autorizada a implantação de loteamento para sítios de recreio ou núcleos urbanos na zona rural.
O INCRA chancela igual intelecção, como se depreende da Nota Técnica INCRA/DF/DFC n. 02/2016, na qual a entidade apresentou as seguintes conclusões:
"a) somente é admitido o parcelamento, para fins urbanos, de imóvel localizado em zona urbana, zona de expansão urbana, zona de urbanização específica ou zona especial de interesse social, definidas pela legislação municipal, no contexto de adequado ordenamento territorial e eficiente execução da política urbana;
b) é vedado o parcelamento, para fins urbanos, de imóvel localizado fora das zonas referidas no item anterior, incluídos na vedação os empreendimentos destinados à formação de núcleos urbanos, sítios de recreio ou à industrialização, com base no item 3 da revogada Instrução 17-b/80; [...]
d) a prévia audiência do INCRA para alteração de uso do solo rural para fins urbanos, a que se refere o art. 53 da Lei 6.766/1979, deve ser interpretada como realização das operações cadastrais pertinentes, nos termos do Capítulo VI da Instrução Normativa n. 82/2015; [...]
h) em caso de loteamento rural, deverão ser observadas pelos órgãos competentes eventuais normas restritivas, incluindo os aspectos ambientais. A observância desta matéria não é atribuída ao INCRA, mas sim ao oficial registrador na ocasião do registro do empreendimento." [Grifei].
E nessa trilha, também já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, assentando que é vedado o parcelamento do imóvel rural para destinação urbana:
"ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LOTEAMENTO IRREGULAR. PARCELAMENTO DO SOLO. DESVIRTUAMENTO DO USO DE IMÓVEL RURAL. LEI 6.766/1979.
1. Trata-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul com intuito de obrigar os recorridos a regularizarem loteamento urbano. O Tribunal de origem entendeu que, por não se tratar de zona urbana ou de expansão urbana, incabível a obrigação do promovente ao parcelamento e do Município à regularização do fracionamento de terra.
2. O parcelamento rural, regido pelo Decreto-Lei 58/1937, admite o fracionamento de imóveis para fins estritamente rurais somente se:
a) observado o aspecto quantitativo, a saber, o módulo rural, variável nos Estados da Federação; e b) respeitada a finalidade, com uso voltado para fins agrícolas, pecuários, agroindustriais ou para extrativismo. A utilização de terreno, ainda que este possua tamanho inferior ao módulo rural e seja carente de obras de infraestrutura e de áreas públicas, em muitos casos com finalidade de moradia e de lazer, pode caracterizar desvirtuação da finalidade rural do imóvel e até mesmo fraude.
3. A Lei 6.766/1979 impõe o dever de regularizar loteamentos para evitar lesão aos padrões da cidade sustentável (dimensão urbanístico-ambiental) e defender direitos dos adquirentes de boa fé de lotes (dimensão consumerista). Precedentes do STJ.
4. Estar a ocupação implantada na zona rural - ainda que obedecendo o módulo mínimo, como in casu - e sem infraestrutura urbana não conduz à conclusão de que eventual parcelamento ou 'condomínio' teria, necessariamente, natureza rural. Até mesmo porque não basta a simples e nua localização (critério locacional) para definir imóvel como rural, ganhando relevante destaque a sua destinação econômica ou utilidade real (critério finalístico). Precedentes do STJ.
5. Ocupação na zona rural por loteamento ou condomínio irregular, aptos a formar núcleo urbano - com claras indicações de uso diverso da atividade rural: agrícola, pecuário, agroindustrial ou extrativista, mesmo que para lazer -, desvirtua usos lícitos do imóvel e caracteriza embrião para, no futuro, terceiros seguirem, no entorno, o (péssimo) exemplo, pondo abaixo qualquer pretensão de planejamento municipal.
6. Ressalte-se que: a) a área deve ser transformada em zona de urbanização específica, nos termos do art. 3º, caput, da Lei 6.766/1979, para que a requerida regularização seja possível; ou b) a obrigação deve ser substituída por indenização (perdas e danos), com desfazimento do condomínio irregular e recomposição do local ao estado anterior, caso o Município não altere o zoneamento para zona urbana ou de expansão urbana (mantendo assim a zona como rural).
7. Recurso Especial provido." (STJ, Recurso Especial n. 1.317.547/RS, rel. Min. Herman Benjamin, j. 26-09-2017). [Grifei].
Ora, o fracionamento excessivo do solo rural e a criação de adensamentos populacionais em zonais rurais contrariam o interesse público e desvirtuam a função social da propriedade rural, na medida em que: a) criam minifúndios, que são propriedades rurais com áreas e possibilidades inferiores ao necessário para garantir a subsistência e o progresso socioeconômico do homem do campo; b) provocam, muitas vezes, a degradação do meio ambiente natural; c) ensejam a utilização de áreas rurais para fins diversos dos quais são vocacionadas, prejudicando o desenvolvimento agrário do país; d) subvertem os planos de desenvolvimento urbano dos Municípios, levando às zonas rurais problemas próprios das áreas urbanas (relacionados ao saneamento básico, transportes, segurança, dentre outros), sem que estejam presentes a infraestrutura e os serviços públicos concentrados nas cidades.
São basicamente esses os motivos que ensejam a obstaculização ao aproveitamento do solo rural para fins não agrários.
O apelante, em contrapartida, não logrou derruir a grave constatação de que o imóvel perdeu suas características de exploração agropecuária, limitando-se a afirmar que as fotografias carreadas aos autos "sequer parecem se localizar próximo da área que busca o registro" (documento n. 5902989, p. 8).
De qualquer modo, aqui não há mesmo espaço para a produção de provas, eventualmente necessárias para o exame aprofundado da controvérsia. Bem por isso determina a Lei dos Registros Públicos que a decisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do processo contencioso competente:
"Art. 204 - A decisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do processo contencioso competente."
Resumindo, a disparidade da área fracionada com a área total (art. 715, I, CNCGJ) e o desvirtuamento do imóvel rural (art. 716, CNCGJ) corroboram a tese de que está sendo promovido um irregular parcelamento do solo para fins urbanos, sem observâncias às normas de regência, o que consectariamente veda o registro do título (art. 713, IV, CNCGJ).
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer em parte do recurso e, nesta extensão, negar-lhe provimento.
Este é o voto.