Acesso restrito
Pesquisa de Satisfação:

Excelente

Bom

Ruim

Observações:


FECHAR [ X ]



Obrigado.











TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0021657-61.2020 (Acordão do Conselho da Magistratura)
Relator: Hélio do Valle Pereira
Origem: Chapecó
Orgão Julgador: Conselho da Magistratura
Julgado em: Tue Oct 20 00:00:00 GMT-03:00 2020
Classe: Recurso Administrativo

 

ACÓRDÃO


Recurso Administrativo n. 0021657-61.2020.8.24.0710. 
Relator: Desembargador Hélio do Valle Pereira 


REGISTRO DE IMÓVEIS - DÚVIDA - INSTITUIÇÃO DE CONDOMÍNIO EDILÍCIO - INDIVIDUALIZAÇÃO DAS UNIDADES AUTÔNOMAS NÃO APRESENTADA EM MOMENTO OPORTUNO - INSTITUIÇÃO DE CONDOMÍNIO COMUM SOBRE UNIDADES INDIVIDUALMENTE CONSIDERADAS - RETIFICAÇÃO DO ATO INDEPENDENTEMENTE DE PERMUTA - POSSIBILIDADE - PARTICULARIDADES DO CASO.


No ato da instituição do condomínio edilício é possível atribuir desde logo aos proprietários as unidades autônomas respectivas. À falta de especificação nesse sentido, subsiste o domínio conjunto, transladadas as proporções para cada unidade individualmente considerada.


No caso, todavia, independentemente de permuta, é possível permitir a retificação do ato para que haja a correta acomodação, atribuindo cada unidade a um proprietário específico. A intenção dos particulares nesse sentido era evidente desde o início - tanto que a divisão foi assim registrada em instrumento público e na qualificação apresentada para o registro de imóvel já constava que residiam nos respectivos apartamentos -, não sendo razoável o apego ao formalismo se daí não resultara prejuízo a terceiros.


Recurso provido.  


              Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Administrativo n. 0021657-61.2020.8.24.0710, da comarca de Chapecó em que são recorrentes Gonçalo Gomes Soares Coelho, Renata Frandoloso, Redovino Tortelli, Ivanite Ana Biazzi Tortelli, Ângelo Thadei Ghiggi, Fabiana Matte Ghiggi, Mario Lanznaster e Edirce Lanznaster e interessado o Oficial de Registro de Imóveis de Chapecó.


              O Conselho da Magistratura decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso para permitir a retificação do registro, possibilitando a divisão nos termos da escritura pública de atribuição de unidades autônomas, como se houvesse sido apresentada concomitantemente ao registro de instituição do condomínio edilício. Custas legais.


              O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador RICARDO JOSE ROESLER, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores  Ricardo José Roesler, Julio Cesar Machado Ferreira de Melo, José Agenor de Aragão, João Henrique Blasi, Soraya Nunes Lins, Dinart Francisco Machado, Volnei Celso Tomazini, Salim Schead dos Santos, Carlos Adilson Silva e Odson Cardoso Filho. 


              Florianópolis, 19 de outubro de 2020.


Desembargador Hélio do Valle Pereira 
 
Relator 


RELATÓRIO


              Este recurso foi apresentado por Gonçalo Gomes Soares Coelho, Renata Frandoloso, Redovino Tortelli, Ivanite Ana Biazzi Tortelli, Ângelo Thadei Ghiggi, Fabiana Matte Ghiggi, Mario Lanznaster e Edirce Lanznaster ante sentença que manteve as exigências postas em nota de oposição apresentada pelo Oficial do Registro de Imóveis de Chapecó.


              Os recorrentes instituíram condomínio edilício com a abertura de unidades autônomas. Na oportunidade, à falta de especificação, o oficial de registro estabeleceu a copropriedade de todos os registrantes sobre as unidades, formando um condomínio ordinário entre eles. Tempos depois, apresentaram escritura pública de atribuição de unidades autônomas, mas o registro foi negado, alegando-se que àquela altura só era viável a acomodação por meio de escritura pública de permuta, com o recolhimento do tributo de transmissão.


              Os recorrentes sustentam que a interpretação equivocada partiu do Oficial. A intenção óbvia era de que houvesse condomínio apenas sobre as áreas comuns, sendo que as unidades autônomas deveriam ser direcionadas de forma exclusiva a cada coproprietário. Tivesse alguma dúvida dessa intenção, argumentam, o oficial deveria ter suscitado esclarecimentos.


              A partir daí, para que não sejam prejudicados pelo equívoco, pedem que se proceda à retificação da instituição do condomínio, atribuindo-se cada imóvel integralmente ao respectivo possuidor em vista da excepcionalidade do caso.


              No mais, destacam, o proceder afronta os princípios da especialidade, instância e legalidade, noticiando, além disso, que recentemente aquele ofício modificou o procedimento, passando a alertar os usuários sobre a possibilidade de divisão já no ato do registro da convenção de condomínio.


              Subsidiariamente, não sendo viável a retificação, quer que se reconheça a nulidade do ato uma vez que a declaração de vontade padece de erro (art. 138 e 139 do CC).


              Houve contrarrazões.


              A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pela anulação da sentença ante a falta de intimação dos agora recorrentes para apresentar impugnação na origem (art. 198, inc. III, da Lei de Registros Públicos). Esses, por sua vez, peticionaram nos autos negando interesse na declaração da nulidade.


              Originalmente distribuídos à Terceira Câmara de Direito Público, a competência foi declinada para cá.


 
VOTO


              1. Deixo de tratar do vício de procedimento levantado pela Procuradoria-Geral de Justiça, uma vez que, estivesse configurado, cuidar-se-ia de nulidade relativa e a própria parte supostamente prejudicada negou interesse na declaração.


              Como o recurso será favorável aos particulares, adianto, dispensa-se a apreciação, dando-se preponderância à declaração de mérito (art. 282, § 2º e art. 488 do CPC).


              2. É possível que a atribuição das unidades autônomas em um condomínio edilício ocorra no momento de sua instituição.


              Não há disposição expressa nos arts. 1.332 do Código Civil e 7° da Lei 4.591/64 vedando que isso ocorra em momento posterior, mas a interpretação dos dispositivos deixa que ver que, à falta de especificação, subsistirá o domínio conjunto, transladadas as proporções para cada unidade individualmente considerada. Depois do ato, naturalmente, a nova acomodação implicará outro negócio jurídico do qual poderá decorrer o pagamento de outros tributos pela transmissão da propriedade.


              Eis o teor dos dispositivos mencionados:


Art. 1.332. Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato, além do disposto em lei especial:


I - a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns;


II - a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns;


III - o fim a que as unidades se destinam.


              E


Art. 7º O condomínio por unidades autônomas instituir-se-á por ato entre vivos ou por testamento, com inscrição obrigatória no Registro de Imóvel, dele constando; a individualização de cada unidade, sua identificação e discriminação, bem como a fração ideal sobre o terreno e partes comuns, atribuída a cada unidade, dispensando-se a descrição interna da unidade.


              Foi o que ocorreu no caso dos autos. Discriminaram-se as unidades e houve a abertura de novas matrículas em fevereiro de 2017, mas só em abril do ano seguinte foi apresentada no Registro de Imóveis a escritura pública de atribuição de unidades autônomas.


              Daí decorre que o silêncio implicou instituição de um condomínio ordinário sobre cada unidade na proporção daquilo que já havia (art. 1.314, caput, do CC e art. 6° da Lei de Registros Públicos), que depois poderia ser desfeito com a permuta das frações ideais correspondentes (art. 167, inc. I, 30, da Lei de Registros Públicos), como sugeriu o oficial.


              Não houve, portanto, ofensa àqueles princípios registrais invocados (especialidade, instância e legalidade), tampouco se pode falar em erro substancial quanto ao ato que dependia, antes de tudo, de manifestação de vontade das partes (art. 138 do CC). Os proprietários deixaram de observar o procedimento correto para o que desejavam, mantendo-se apenas as proporções existentes até então para a divisão das novas unidades.


              Nessa linha, aliás, frise-se que o art. 9°, § 3°, alínea 'a', da Lei  4.591/64 diz que a convenção de condomínio deverá conter "a discriminação das partes de propriedade exclusiva, e as de condomínio, com especificações das diferentes áreas", mas esse instrumento se destina unicamente a regular as questões internas, não se prestando para fins de divisão, de modo que era mesmo inviável a correção do vício pela simples discriminação naquele ato.


              3. No caso, todavia, porque a escritura pública de atribuição de unidades autônomas - que deveria ter sido apresentada no momento da instituição do condomínio - fora registrada poucos dias depois no tabelionato de notas, em 31 de março de 2017 (embora só tenha sido apresentada no registro de imóveis em 2018), bem como porque não se vislumbra que a retificação do ato trará prejuízos a terceiros, tenho que seja viável o ajuste para permitir que se atribua, naqueles termos, cada unidade independentemente da permuta.


              A medida é salutar porque toda a documentação trazida aponta que a intenção dos particulares era mesmo atribuir a cada casal uma unidade autônoma e o apego ao formalismo geraria um ônus desproporcional àqueles que, de boa-fé, buscavam meramente adequar a manifestação ao que já era da vontade e que já ocorria de fato.


              Aliás, tanto é sincera a versão de que houve mero equívoco que já no ato da instituição cada proprietário fora qualificado como residente no apartamento respectivo, como se vê da cópia apresentada nas fls. 4 do apelo administrativo.


              4. Assim, conheço e dou provimento ao recurso para permitir a retificação do registro, possibilitando a divisão nos termos da escritura pública de atribuição de unidades autônomas, como se houvesse sido apresentada concomitantemente ao registro de instituição do condomínio edilício.  


              É o voto.