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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 4008671-37.2019.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Paulo Henrique Moritz Martins da Silva
Origem: Içara
Orgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Público
Julgado em: Tue Dec 10 00:00:00 GMT-03:00 2019
Juiz Prolator: Fernando Dal Bó Martins
Classe: Agravo de Instrumento

 

Agravo de Instrumento n. 4008671-37.2019.8.24.0000, de Içara

Relator: Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

   AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INTERDIÇÃO LIMINAR DE INSTITUIÇÃO DE LONGA PERMANÊNCIA PARA IDOSOS PORQUE: 1) JÁ HAVIA PARALISAÇÃO DAS ATIVIDADES DETERMINADA EM ATO DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA; 2) O PÚBLICO-ALVO ATENDIDO É DIVERSO DAQUELE CONSTANTE DOS ATOS CONSTITUTIVOS E AUTORIZATIVOS DE FUNCIONAMENTO; 3) OS REQUISITOS DE SEGURANÇA NÃO ESTAVAM SENDO OBSERVADOS E 4) HÁ SUSPEITA DE MAUS-TRATOS A IDOSOS.

   ESTABELECIMENTO EM PROCESSO DE ALTERAÇÃO PARA RESIDÊNCIA TERAPÊUTICA (VOLTADA A (PESSOAS COM DEFICIÊNCIA FÍSICA E/OU INTELECTUAL). ADEQUAÇÃO DOS ATOS CONSTITUTIVOS E DA ESTRUTURA FÍSICA. QUESTÕES QUE, POR SI SÓS, PODERIAM NÃO SER SUFICIENTES À INTERDIÇÃO LIMINAR.

   SUSPEITA DE TRATAMENTO INADEQUADO, TODAVIA, QUE RECOMENDA A MEDIDA. DENÚNCIA CRIMINAL OFERTADA EM FACE DA REPRESENTANTE LEGAL DO ESTABELECIMENTO, SEU ESPOSO E UMA FUNCIONÁRIA COMO INCURSOS NO ART. 99, § 1º, DA LEI N. 10.741/2003 E ART. 129, § 7º, DO CÓDIGO PENAL. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA QUE PRECISA SER SOPESADA COM A PROTEÇÃO DO DIREITO À VIDA E À INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA DAS PESSOAS QUE A CASA LAR VISA ATENDER NO FUTURO.

   A Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo foram ratificados pelo Congresso Nacional (DL n. 186/2008) e promulgados pelo Decreto n. 6.949/2009. A Convenção dispõe que "os Estados Partes tomarão todas as medidas efetivas de natureza legislativa, administrativa, judicial ou outra para evitar que pessoas com deficiência, do mesmo modo que as demais pessoas, sejam submetidas à tortura ou a tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes" (art. 15) e que "os Estados Partes tomarão todas as medidas apropriadas de natureza legislativa, administrativa, social, educacional e outras para proteger as pessoas com deficiência, tanto dentro como fora do lar, contra todas as formas de exploração, violência e abuso, incluindo aspectos relacionados a gênero" (art. 16).

   A Lei n. 13.146/2015, que tem a Convenção e seu Protocolo como bases (art. 1º, parágrafo único), determina, no art. 5º, que "a pessoa com deficiência será protegida de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, tortura, crueldade, opressão e tratamento desumano ou degradante" e no parágrafo único que "são considerados especialmente vulneráveis a criança, o adolescente, a mulher e o idoso, com deficiência".

   É certo que o Estatuto deixa clara a plena capacidade e igualdade das pessoas com deficiência - art. 4º: "Toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação".

   A igualdade será exercida na paridade de oportunidades, no tratamento isonômico perante a lei, na consideração da pessoa com necessidades especiais como sujeito de direitos e deveres e com igual dignidade a todos os demais.

   Mas isso não pode implicar retrocesso. Quando houver situação digna de especial atenção, haverá sim "vulnerabilidade", não como fator limitante de vida plena, mas como reforço do papel que o Estado e a sociedade devem desempenhar para que essa vida plena se concretize.

   Daí prever o Estatuto que "em situações de risco, emergência ou estado de calamidade pública, a pessoa com deficiência será considerada vulnerável, devendo o poder público adotar medidas para sua proteção e segurança" (art. 10, parágrafo único).

   Há, portanto, deveres de abstenção (não discriminação) e deveres de efetivação (promoção da dignidade).

   A respeito, Cristiano Chaves de Farias, Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto escrevem:

   "Pessoa com deficiência como vulnerável. Havendo situações de risco, de emergência ou estado de calamidade, a pessoa com deficiência será enquadrada no conceito de vulnerável para fins de proteção diferenciada. No ponto, exige-se especial cuidado para que não se confunda vulnerabilidade com incapacidade. A nova redação dedicada aos arts. 3° e 4° do Código Civil de 2002 é de clareza solar ao afastar qualquer tipo de incapacidade jurídica decorrente de deficiência. Assim, a deficiência, de qualquer ordem, não implica em incapacidade para a prática de atos jurídicos. Todavia, a pessoa com deficiência pode reclamar uma proteção diferenciada em determinadas situações, como estado de risco, emergência ou calamidade. Bem por isso, é enquadrada, nessas situações, como vulnerável, merecendo atenção e tutela prioritárias. Além de atendimento prioritário, devem ter proteção compatível com o tipo de deficiência respectivo, garantindo a sua dignidade.

   "Caráter exemplificativo das hipóteses de vulnerabilidade. A pessoa com deficiência pode ser reputada vulnerável em situações diversas, não apenas nos casos de situações de risco, de emergência ou de estado de calamidade, aludidos pelo Parágrafo Único da norma sub examine. Em toda e qualquer hipótese na qual a deficiência se mostre como um fator justificador de atenção diferenciada, é possível considerar a pessoa como vulnerável". (Estatuto da Pessoa com Deficiência Comentado. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 69)

   O caso dos autos configura uma dessas hipóteses em que as pessoas com necessidades especiais - o futuro público-alvo da Casa Lar Monte das Oliveiras - devem ser tratadas como vulneráveis, no sentido de merecer especial atenção e proteção do Estado.

   Esse valor prepondera em relação à presunção de inocência dos responsáveis e funcionários daquele estabelecimento quanto à acusação de maus-tratos e lesões corporais.

   Há que se adotar, neste momento, postura cautelosa, evitando-se expor esses sujeitos vulneráveis à possibilidade de serem vítimas de tratamento incompatível, desumano ou inadequado.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4008671-37.2019.8.24.0000, da comarca de Içara 2ª Vara em que são Agravantes Casa Lar Monte das Oliveiras e outro e Agravado Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

           A Primeira Câmara de Direito Público decidiu, à unanimidade, desprover o recurso. Custas legais.

           Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Pedro Manoel Abreu e Luiz Fernando Boller (Presidente).

           Florianópolis, 10 de dezembro de 2019.

Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Relator

 

           RELATÓRIO

           O Ministério Público propôs "ação civil pública" em face de casa lar Monte das Oliveiras, Fernanda Nascimento Dias Valentim e Município de Balneário Rincão.

           Sustentou que: 1) instaurou inquérito civil (n. 06.2016.00007455-5) a fim de apurar o funcionamento irregular de "instituição de longa permanência para idosos [ILPI] no Município de Içara/SC" - Residencial Bethânia; 2) o procedimento teve início a partir da interdição do local pela Vigilância Sanitária Municipal "devido ao funcionamento sem a necessária prévia regularização perante os órgãos administrativos competentes"; 3) em 2017, foi comunicado que o estabelecimento havia "mudado" para Balenário Rincão, estava funcionando com a denominação "Pousada Monte das Oliveiras" e não foi registrado como ILPI; 5) recebeu informações de que um idoso que estava sob os cuidados no novo empreendimento foi vítima de maus-tratos (o que deu ensejo à instauração do Inquérito Policial n. 0002220-14.2018.8.24.0028); 6) a Vigilância Sanitária Municipal de Balneário Rincão informou ter emitido alvará provisório autorizando o funcionamento e 7) porém, Vigilância Sanitária Estadual, que tem competência para autorizar atividades daquela natureza, interditou o estabelecimento.

           Prosseguiu:

    Em razão da interdição e diante da completa ilegalidade no funcionamento da instituição - que até o momento nem sequer definiu sua natureza jurídica ou nem mesmo ramo de atuação, o Ministério Público emitiu a Recomendação n. 0009/2018/01PJ/ICA à Presidente da Casa Lar Monte das Oliveiras para que, em 48 (quarenta e oito) horas informasse o nome das pessoas acolhidas no estabelecimento; a partir da data do recebimento da Recomendação não acolhesse mais nenhuma pessoa, até a necessária regularização da atividade; e, no prazo de 15 (quinze) dias, contados da interdição pela Vigilância Sanitária Estadual, realizasse a entrega de todos os internos aos seus familiares.

    Ainda, foi oficiado o CREAS de Balneário Rincão para que, em 7 (sete) dias, realizasse vistoria no local e informasse ao Ministério Público quais internos permaneciam na Casa Lar Monte das Oliveiras.

    Em resposta, o CREAS informou que a Casa Lar Monte das Oliveiras permanece com os mesmos 9 (nove) acolhidos e que, de acordo com a responsável pelo local, Fernanda Nascimento Dias Valentim, não entrou em contato com os familiares das pessoas acolhidas, seguindo orientação de seus advogados.

    A Presidente da Casa Lar Monte das Oliveiras, em resposta à Recomendação, informou que o objeto social da associação seria modificado, visando a inclusão do estabelecimento em programa de residência inclusiva, na forma da Resolução n. 109/2009 do Conselho Nacional de Assistência Social e Decreto n. 6.949/2009 e que, como não havia nenhum idoso acolhido, não iria atender a Recomendação n. 0009/2018/01PJ/ICA, por entender que nenhum dos que se encontram acolhidos está em situação de risco.

    Após ser reiterado o pedido, a responsável pela associação informou o nome e qualificação daqueles que se encontram acolhidos no estabelecimento.

    Designada data para reunião, a pedido da responsável pelo estabelecimento, conforme consta em ata, Fernanda Nascimento Dias Valentim informou que pretendem enquadrar a associação como uma Residência Terapêutica, realizando a modificação do seu enquadramento no CNPJ. Ainda, afirmou que não iria cumprir a Recomendação n. 0009/2018/01PJ/ICA.

    Diante disso, tendo em vista a irregularidade total do estabelecimento, o qual não possui mínimas condições de segurança para as pessoas que lá se encontram acolhidas, diante da completa irregularidade e ilegalidade do funcionamento da instituição, seja adotando-se as regras para uma ILPI, seja adotando-se as regras de uma residência terapêutica ou de uma residência inclusiva, alternativa não resta ao Ministério Público senão a propositura da presente demanda para compelir os responsáveis pela associação a devolver os internos aos seus familiares e não acolher mais nenhuma pessoa até que haja a completa regularização de sua situação.

           Alegou que: 1) a Casa Lar não se adequa a nenhuma modalidade de estabelecimento específico e, justamente por isso, "jamais foi observada pelos conselhos fiscalizadores"; 2) a indefinição do tipo de serviço a ser prestado é obrigatória, pois não se pode tolerar que as pessoas atendidas sejam distintas (ex.: atendimento simultâneo de idosos e egressos de internação psiquiátrica); 3) o estatuto da instituição prevê que serão recebidas pessoas de todas as idades; 4) para cada atividade (internação voluntária/compulsória, serviço residencial terapêutico ou comunidade terapêutica, residência inclusiva, acolhimento institucional para idosos) é necessário o registro no órgão correspondente (CRM/SC, Conselho Municipal de Saúde, Conselho Municipal de Assistência Social, Conselho Municipal de Direitos do Idoso); 5) a instituição iniciou "sua definição como entidade que presta o serviço de residência terapêutica, analisando o quadro clínico das pessoas que lá se encontram acolhidas, fica claro que não são compatíveis para ingressar em Serviço Residencial Terapêutico, pois há um interno autista, um com de Síndrome de Down, um com Parkinson, dois que sofreram acidente e ficaram com sequelas neurológicas, uma pessoa sem qualquer tipo de doença que incorra na dependência de terceiro, uma come esquizofrenia e dois que possuem transtorno mental"; 6) o Serviço Terapêutico Residencial foi instituído pela Portaria n. 106/2000, do Ministério da Saúde, "são uma alternativa para reabilitação das pessoas com transtornos mentais" e estão vinculadas ao CAPS; 7) além de outros requisitos não preenchidos pela parte ré, "ressalta-se que ela é impedida de desenvolver o referido serviço pela norma disposta no art. 5º, alíneas "a" e "b", da Resolução [rectius: Portaria] n. 106 - MS, que restringe a atuação a instituições de natureza exclusivamente pública ou privada sem fins lucrativos, mas desde que possuam Projetos Terapêuticos específicos, aprovados pela Coordenação Nacional de Saúde Mental"; 8) mesmo que a Casa Lar altere seus estatutos, "isso não é o suficiente para a sua regularização e autorização de funcionamento, haja vista serem necessárias diversas modificações estruturais para segurança dos internos, contratação do corpo técnico exigido pela legislação, além da aprovação pela Coordenação Nacional de Saúde Mental de Projetos Terapêuticos específicos" e 9) a requerida também não se qualifica como Residência Inclusiva (Portaria Interministerial n. 3/2012) pois, para isso, deveria integrar a rede socioassistencial do Sistema Único da Assistência Social e dispor de estrutura e corpo técnico adequados.

           Esclareceu também:

    Importante destacar que, independente do tipo de serviço que pretendam prestar - além das irregularidades legais já mencionadas - o relatório elaborado pelo representante do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura que participou da vistoria conjunta realizada no dia 22 de outubro, enumera diversas irregularidades encontradas no prédio físico, tais como:

    1 - pontos nos banheiros sem cerâmica, o que permite infiltração de água na estrutura e pode ocasionar corrosão na armadura, diminuindo a resistência da estrutura de concreto armado da edificação;

    2 - chuveiros energizados sem isolamento total dos fios, apresentando risco a quem utiliza o chuveiro;

    3 - infiltração em um dos dormitórios, o que pode provocar manifestações patológicas e fragilização da estrutura;

    4 - o corrimão instalado na escada de acesso ao segundo pavimento não é contínuo, apresenta problemas na instalação e está em desacordo com as normas do Corpo de Bombeiros;

    5 - o guarda corpo existente no lado do vão da escada também não está de acordo com a norma do Corpo de Bombeiros, pois tem altura mínima inferior à indicada;

    6 - a instalação da máquina de lavar roupas apresenta risco de curto, devido à proximidade da mangueira que abastece água na máquina e a extensão utilizada para energização;

    7 - na parte exterior do prédio há exposição da armadura, o que causa corrosão da parte externa e interna, diminuindo a área de resistência da armadura;

    8 - os pilares da área de acesso à edificação apresentam trincas provenientes de corrosão da armadura, o que provoca expansão na área de aço e surgimento de trincas;

    9 - na parte frontal existem pontos onde o reboco foi arrancado da alvenaria, o que contribui para infiltração de água e diminuição da resistência dos elementos estruturais existentes;

    10 - o botijão de gás utilizado na cozinha está desprotegido das intempéries, trazendo riscos aos ocupantes da edificação, além de não haver ventilação permanente exigida pelo Corpo de Bombeiros para o caso de vazamento de gás no interior do edifício.

           Requereu:

    b) a concessão de antecipação dos efeitos de tutela, sem justificação prévia, para:

    b.1) fixar a obrigação de fazer, consistente em compelir a Casa Lar Monte das Oliveiras, Fernanda Nascimento Dias Valentim e o Município de Balneário Rincão a entregar todas as pessoas acolhidas na Casa Lar Monte das Oliveiras (identificadas em fls. 331 a 333 do Inquérito Civil anexo) aos seus familiares ou, em caso de impossibilidade, que o Município de Balneário Rincão, mediante contato com os municípios de onde os internos são provenientes, localize estabelecimento adequado para o qual possa encaminhar os internos;

    b.2) fixar a obrigação de não fazer, consistente na proibição da instituição em receber quaisquer pacientes, internos ou acolhidos, crianças ou adolescentes, jovens ou adultos, até que adeque o seu estatuto, a estrutura física da instituição e a modalidade do serviço prestado, tornando-a apta a receber o público-alvo ao qual se destinará;

    c) com fulcro nos art. 297 do Código de Processo Civil, art. 11 da Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347/85), em conjugada interpretação com o artigo 84, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90), independentemente das sanções penais por desobediência e eventual omissão de socorro, a fixação de multa diária em valor não inferior a R$ 1.000,00 (mil reais), para o caso de descumprimento da decisão, devendo esta multa recair solidariamente sobre a Associação Casa Lar Monte das Oliveiras e na pessoa da atual representante legal - a Presidente Fernanda Nascimento Dias Valentim, pelos fundamentos acima explicitados, cujo valor será revertido em favor do Fundo de Recuperação dos Bens Lesados de Santa Catarina;

    [...]

    g) a procedência do pedido inicial, com a confirmação da tutela de urgência, para o fim de condenar os requeridos Casa Lar Monte das Oliveiras, Fernanda Nascimento Dias Valentim e o Município de Balneário Rincão na obrigação de fazer, consistente na entrega de todas as pessoas acolhidas na Casa Lar Monte das Oliveiras (identificadas em fls. 331 a 333 do Inquérito Civil anexo) aos seus familiares ou, em caso de impossibilidade, que o Município de Balneário Rincão, mediante contato com os municípios de onde os internos são provenientes, localize estabelecimento adequado para o qual possa encaminhar os internos, e obrigação de não fazer, consistente na proibição da instituição em receber quaisquer pacientes, internos ou acolhidos, crianças ou adolescentes, jovens ou adultos, até que adeque o seu estatuto, a estrutura física da instituição e a modalidade do serviço prestado, tornando-a apta a receber o público-alvo ao qual se destinará; [...].

           Foi proferida decisão cuja conclusão é a seguinte:

    Ante o exposto, DEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA para:

    (a) DETERMINAR aos réus Casa Lar Monte das Oliveiras, Fernanda Nascimento Dias Valentim e Município de Balneário Rincão que providenciem a entrega de todas as pessoas acolhidas na Casa Lar Monte das Oliveiras aos seus familiares ou, em caso de impossibilidade, que o Município de Balneário Rincão, mediante contato com os municípios de onde os internos são provenientes, localize estabelecimento adequado para o qual possa encaminhar os internos;

    (b) DETERMINAR à ré Casa Lar Monte das Oliveiras que não acolha novas pessoas até que adeque seu estatuto, a estrutura física da instituição e a modalidade de serviço prestado, tornando-a apta a receber o público-alvo conforme a atividade que desempenhará.

    Serão consideradas cumpridas as condições impostas no item 'b' somente quando a entidade obtiver as licenças necessárias de todos os órgãos administrativos competentes, o que deverá ser demonstrado nos presentes autos, sobre o que, após préiva manifestação do Ministério Público, este Juízo decidirá.

    Fixo o prazo de 5 (cinco) dias para o cumprimento do item 'a'. O prazo aparentemente exíguo ao menos sob o ponto de vista dos réus justifica-se pelo fato de que os réus Casa Lar Monte das Oliveiras e Fernanda Nascimento Dias Valentim, desde a data da interdição pela Vigilância Sanitária Estadual (22/10/2018 págs. 487-491), já estão devidamente cientes da impossibilidade de continuarem exercendo a atividade, ou seja, estão infringindo a ordem administrativa.

    Para a hipótese de descumprimento de qualquer das determinações acima, comino multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais) em favor do Fundo de Recuperação dos Bens Lesados de Santa Catarina FRBL.

           Casa Lar Monte das Oliveiras e Fernanda Nascimento Dias Valentim interpuseram agravo de instrumento, sustentando que: 1) a agravante Fernanda e seu esposo trabalharam por um período apenas como funcionários do Instituto Residencial Bethânia; 2) "não correspondem à realidade as alegações de que os representantes legais do 'Instituto Residencial Bethânia' transferiram a sede do estabelecimento para o Município de Balneário Rincão e mudaram o nome para 'Pousada Monte das Oliveiras'"; 3) em reunião com o MP/SC realizada em 27-9-2018, deixaram claro que, há algum tempo, já não abrigavam mais nenhum idoso, mas apenas jovens e adultos, entre 18 e 59 anos, com alguma deficiência e em situação de vulnerabilidade social e/ou sem familiares dispostos a assisti-los; 4) nessa oportunidade, concordaram em adaptar-se integralmente ao seu público alvo: pessoas com deficiência física e/ou intelectual associada ou não a transtornos mentais, que tenham entre 18 e 59 anos e estejam em vulnerabilidade social, sem condições de auto-sustentabilidade, não possuindo familiares, ou cujos laços estejam rompidos ou, ainda, cujos familiares não possam exercer os cuidados de que necessitam, nos termos da Resolução do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) n. 109/2009; 5) no momento da interdição pela Vigilância Sanitária Estadual (22-10-2018) já atendiam o público-alvo descrito no tópico anterior, mas a documentação estava em fase de modificação, conforme foi ressaltado na mencionada reunião; 6) em 29-10-2018, o CREAS foi informado da adaptação e, em 30-10-2018, houve a mudança no CNPJ; 7) têm uma estrutura física adequada, número mínimo de profissionais contratados para cada área de saúde exigida e projeto específico aprovado, tanto que o Conselho Municipal de Assistência Social de Balneário Rincão entendeu presente a qualificação necessária e inscreveu a Casa Lar (dez/2018); 8) as irregularidades no espaço físico levantadas pelo representante do CREA foram consertadas; 9) houve impugnação administrativa ao auto de infração que deu origem à interdição; 10) a resposta encaminhada pela Gerente de Inspeção e Monitoramento de Serviços de Saúde, Lucélia Scaramussa Ribas Kryckyj, à Vigilância Sanitária Estadual, informa que "não localizaram nas legislações disponíveis enquadramento objetivo que permita licenciar uma residência inclusiva - estabelecimento privado que abrigam em caráter residencial e tenham como clientela menores de 60 anos com transtornos mentais" e "recomendou que, se a associação Agravante tiver entendimento da possibilidade do enquadramento, poderá manifestar-se formalmente junto a Autoridade Sanitária, apontando o respectivo enquadramento legal, com a devida fundamentação que entenda ser aplicável e evidências que caracterizem o enquadramento proposto"; 11) porém, a resolução n. 109/209 do Conselho de Assistência Nacional de Assistência Social prevê de forma expressa a modalidade de residência inclusiva; 12) neste Estado, inclusive, há entidade privada dessa natureza que desempenha o serviço há mais de duas décadas "com o reconhecimento e indicação do Poder Judiciário e do Ministério Público" e 13) não houve maus-tratos a nenhuma pessoa no estabelecimento - as informações prestadas nesse sentido são mentirosas.

           A medida urgente foi indeferida (f. 103/127).

           Com as contrarrazões (f. 153/162), a d. Procuradoria-Geral de Justiça se manifestou pelo desprovimento do recurso, em parecer da lavra do Dr. Rogê Macedo Neves (f. 168/176).

 

           VOTO

           Tal como já destacado na decisão de indeferimento do efeito suspensivo, em agravo de instrumento só se discute o acerto ou desacerto da decisão atacada - os temas não apreciados, salvo questões de ordem pública, não podem ser objeto de análise, sob pena de supressão de instância.

           1. Da decisão agravada

           1.1. Sanção administrativa de interdição

           A respeito, colhe-se da interlocutória:

    De início, importa observar que a Vigilância Sanitária Estadual lavrou auto de infração e impôs sanção administrativa de interdição do estabelecimento (págs. 487-491).

    Trata-se de ato administrativo praticado por órgão competente no exercício do poder de polícia sanitária, de modo que goza da presunção de legitimidade inerente aos atos administrativos em geral. Não consta informação de que o ato tenha sido impugnado nem consequentemente de que tenha sido suspenso, seja na via administrativa ou na judicial (a propósito, em consulta ao SAJ, não se localizou nenhuma demanda com tal pretensão).

    Portanto, o ato é válido e eficaz, do que se depreende que as rés Casa Lar Monte das Oliveiras e Fernanda Nascimento Dias Valentim estão desobedecendo a uma sanção administrativa regularmente aplicada (assim presumida).

    Este motivo, por si só, já é suficiente para a concessão da tutela de urgência, cujo objeto coincide com as determinações impostas pela Vigilância Sanitária Estadual por ocasião da lavratura do auto de infração.

           Pelo que se vê do relatório de "fiscalização em instituições de longa permanência para idosos - ILPI" a interdição decorreu justamente do fato de que, embora a princípio direcionada ao atendimento de idosos (mais de 60 anos), nenhuma das pessoas atendidas enquadrava-se no público-alvo e a instituição não cumpria as exigências para se qualificar com ILPI (f. 321/328 dos autos de origem).

           Na sequência, o parquet emitiu recomendação para que os "internos" fossem entregues aos seus familiares, ao que a ré Fernanda respondeu que: 1) já tinha providenciado a alteração do CNPJ para se adequar ao real objetivo (atendimento de pessoas entre 18 e 59 anos); 2) as suas atividades passaram a ser a assistência a deficientes físicos, imunodeprimidos e convalescentes, associação e defesa dos direitos sociais e centro de assistência psicossocial; 3) iniciaram o processo de inserção no programa de Residência Inclusiva e 4) necessitavam de mais tempo para as mudanças necessárias que "seriam fazer um (sic) rampa de acesso, colocar barras nos banheiros e contratar uma assistente social e uma psicóloga" (f. 337/340 dos autos de origem).

           Data venia, a princípio não parece que a interdição do estabelecimento como ILPI possa justificar a paralisação de outras atividades mais adequadas ao público-alvo - Residência Inclusiva, no caso.

           Havia, no momento da inspeção, uma realidade diversa daquela estampada nos documentos - CNPJ, estatuto etc. Com a atuação do Ministério Público e da Vigilância, a instituição passou a adequar-se às normas regentes da atividade que, de fato, realizava.

           A interdição apenas impossibilita o acolhimento de idosos, mas não pode ser utilizada para impedir todo e qualquer atendimento se, é claro, essas outras atividades forem exercidas dentro da legalidade.

           É necessária nova inspeção pelo órgão administrativo para apurar, sob a ótica da nova atividade (já antes realizada, mas agora em processo de formalização), se a Casa preenche os requisitos para atuar como Residência Terapêutica.

           Isso ainda não foi feito.

           Repita-se: uma interdição para atuar como ILPI não pode impedir o desempenho de atividade diversa, qual seja, Residência Terapêutica.

           1.2. Diversidade do público-alvo em desconformidade com a legislação

           Consignou o magistrado a quo:

    Para além da sanção administrativa de interdição do estabelecimento, convém acrescentar outros fatos abordados na petição inicial.

    Como bem observado pelo Ministério Público, o estatuto da Casa Lar Monte das Oliveiras não é claro ao definir o público-alvo da entidade.

    Veja-se que o art. 4º, IV, estabelece que: "A Casa Lar Monte das Oliveiras tem por finalidades: [...] IV. Acolherá e manterá pessoas de todas as idades, executando serviços, programas definidos pelo corpo diretivo." (págs. 281-282 grifei).

    Na sequência, o art. 5º trata de direitos do "idoso" (pág. 282).

    Já o art. 6º, numa redação de difícil compreensão, menciona "idoso", "paciente portador de transtornos mentais e neurológicos", "indivíduo que necessita de promoção a saúde seja ela causada por acidente domestico de transito ou cirurgias em geral que necessitam de um espaço adequado para reabilitação de casos temporários" e "pacientes com imobilidade físicas prejudicadas ou pacientes com patológicas, que recebam alta hospitalar, e que necessitam de reabilitação com profissionais qualificados" (pág. 282; sic).

    O regimento interno da entidade segue a mesma linha errante. O art. 2º diz que a entidade é destinada à "moradia coletiva de pessoas com idade acima de 30 anos, com ou sem suporte familiar" (pág. 270 grifei). Já a partir do seu art. 4º, o regimento interno passa a referir-se apenas a "idosos", sejam eles independentes ou com algum grau de dependência, abrangência esta que fica clara no art. 7º (págs. 270-271).

    Consta nos autos outra versão do regimento interno, cujo art. 2º diz que a entidade é destinada à "moradia coletiva de pessoas com idade 18 a 59 anos 11 meses e 31 dias, com ou sem suporte familiar" (pág. 499 grifei; sic). Já no art. 4º, o regimento interno refere-se apenas a "idosos" (pág. 499). Depois, no art. 11, 'a', dá a entender que não admite pessoas com "idade acima de 59 anos 11 meses e 31 dias" (pág. 500; sic), ao passo que, no art. 14, volta a falar em "idosos" (págs. 500-501).

    Não se sabe ao certo qual versão do regimento interno está em vigor, pois nenhuma das duas está datada.

    De todo modo, o ato constitutivo da entidade é o estatuto (ver págs. 518-536), o qual, como se viu, do que se consegue compreender de sua má redação, abrange uma diversidade de pessoas assistidas bastante ampla.

    E, de fato, segundo informado pela própria entidade, a entidade acolhe um interno autista, um portador de Síndrome de Down, um portador de Parkinson, dois que sofreram acidente e ficaram com sequelas neurológicas, um sem qualquer tipo de doença que incorra na dependência de terceiro, um portador de esquizofrenia e dois que possuem transtorno mental (págs. 350-352).

    Ocorre que a legislação vigente (assim compreendidas as leis e atos normativos infralegais regulamentadores) distingue os tipos de entidades de assistência social, conforme o público-alvo e o serviço prestado, especialização esta que não tem sido observada pela Casa Lar Monte das Oliveiras.

    Sobre o tema, importa destacar a Resolução n. 109/2009, que aprova a tipificação nacional de serviços socioassistenciais.

    A propósito, convém destacar a manifestação da Vigilância Sanitária Estadual, por sua Gerente de Inspeção e Monitoramento de Serviços de Saúde, que consta às págs. 539-540, que reforça o entendimento de que a Casa Lar Monte das Oliveiras não se enquadra em nenhum dos tipos de entidade atualmente regulamentados pela legislação.

    Ainda sobre este ponto, valho-me da exposição apresentada pelo Ministério Público na petição inicial, especificamente às págs. 6-13, em que delineia o conjunto normativo pertinente a alguns tipos de entidades. Sobre as 'residências inclusivas', aliás, a inicial veio instruída com material governamental elaborado para orientar os gestores e demais pessoas envolvidas no desempenho da atividade, o qual compila em formato didático as regras aplicáveis (págs. 366-457), regras estas que não são inteiramente cumpridas pela Casa Lar Monte das Oliveiras. Cabe aqui considerar o formulário de vistoria às págs. 321-328.

    Portanto, a Casa Lar Monte das Oliveiras vem funcionando em desconformidade com a legislação que disciplina os serviços de assistência social, uma vez que as atividades previstas em seu estatuto abrangem um público-alvo excessivamente amplo, estando a prestar, de fato, serviços não especializados para uma diversidade de pessoas que não poderiam estar sendo atendidas em conjunto dentro de uma mesma entidade.

           Não há dúvida de que, ao menos durante a fase extrajudicial, havia inúmeras incongruências a respeito da inadequação da Casa Lar ao serviço efetivamente prestado.

           Embora criada para atender idosos, acabou por acolher pessoas com idade inferior a 60 anos com as seguintes moléstias/deficiências: autismo, sequelas neurológicas, síndrome de Down, Parkinson, transtorno mental e esquizofrenia (f. 350/352).

           Mas, como já sinalizado no item anterior, os requeridos estão tomando inúmeras providências para regularizar a situação.

           Além da alteração do CNPJ, a Casa Monte das Oliveiras obteve, em 13-12-2018, certificado de inscrição no Conselho Municipal de Assistência Social, pois está cumprindo suas finalidades estatutárias e sociais (f. 473 dos autos de origem).

           O magistrado a quo citou o formulário de vistoria de f. 321-328 dos autos de origem como prova de que a casa não preenche os requisitos para atuar como Residência Terapêutica. Porém, como visto, esse relatório foi feito para averiguar a presença dos requisitos de uma "instituição de longa permanência para idosos" (ILPI) e não como uma RT.

           Para isso, reitera-se, é preciso que haja uma nova vistoria, com esse escopo.

           A RT, além disso, está prevista na Resolução n. 109/2009 do Conselho Nacional de Assistência Social:

    [...]

    III - Serviços de Proteção Social Especial de Alta Complexidade:

    a) Serviço de Acolhimento Institucional, nas seguintes modalidades:

    [...]

    - Residência Inclusiva.

    5. SERVIÇOS DA PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL - ALTA COMPLEXIDADE

    NOME DO SERVIÇO: SERVIÇO DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL.

    DESCRIÇÃO GERAL: Acolhimento em diferentes tipos de equipamentos, destinado a famílias e/ou indivíduos com vínculos familiares rompidos ou fragilizados, a fim de garantir proteção integral. A organização do serviço deverá garantir privacidade, o respeito aos costumes, às tradições e à diversidade de: ciclos de vida, arranjos familiares, raça/etnia, religião, gênero e orientação sexual.

    O atendimento prestado deve ser personalizado e em pequenos grupos e favorecer o convívio familiar e comunitário, bem como a utilização dos equipamentos e serviços disponíveis na comunidade local. As regras de gestão e de convivência deverão ser construídas de forma participativa e coletiva, a fim de assegurar a autonomia dos usuários, conforme perfis.

    Deve funcionar em unidade inserida na comunidade com características residenciais, ambiente acolhedor e estrutura física adequada, visando o desenvolvimento de relações mais próximas do ambiente familiar. As edificações devem ser organizadas de forma a atender aos requisitos previstos nos regulamentos existentes e às necessidades dos usuários, oferecendo condições de habitabilidade, higiene, salubridade, segurança, acessibilidade e privacidade. ou da noite, enquanto se realiza um estudo diagnóstico detalhado de cada situação para os encaminhamentos necessários.

    [...]

    PARA JOVENS E ADULTOS COM DEFICIÊNCIA:

    Acolhimento destinado a jovens e adultos com deficiência, cujos vínculos familiares estejam rompidos ou fragilizados. É previsto para jovens e adultos com deficiência que não dispõem de condições de autosustentabilidade, de retaguarda familiar temporária ou permanente ou que estejam em pro cesso de desligamento de instituições de longa permanência.

    Deve ser desenvolvido em Residências Inclusivas inseridas na comunidade, funcionar em locais com estrutura física adequada e ter a finalidade de favorecer a construção progressiva da autonomia, da inclusão social e comunitária e do desenvolvimento de capacidades adaptativas para a vida diária.

    [...]

    PROVISÕES:

    AMBIENTE FÍSICO: Espaço para moradia, endereço de referência, condições de repouso, espaço de estar e convívio, guarda de pertences, lavagem e secagem de roupas, banho e higiene pessoal, vestuário e pertences. Acessibilidade de acordo com as normas da ABNT.

    ESPECÍFICOS:

    PARA ADULTOS E FAMÍLIAS: Conforme a realidade local.

    RECURSOS MATERIAIS: Material permanente e material de consumo necessário para o desenvolvi mento do serviço, tais como: mobiliário, computador, impressora, telefone, camas, colchões, roupa de cama e banho, utensílios para cozinha, alimentos, material de limpeza e higiene, vestuário, brinquedos, entre outros. Materiais pedagógicos, culturais e esportivos. Banco de Dados de usuários de benefícios e serviços socioassistenciais; Banco de Dados dos serviços socioassistenciais; Cadastro Único dos Programas Sociais; Cadastro de Beneficiários do BPC.

    RECURSOS HUMANOS: De acordo com a NOB-RH/SUAS.

    [...]

    TRABALHO SOCIAL ESSENCIAL AO SERVIÇO: Acolhida/Recepção; escuta; desenvolvimento do convívio familiar, grupai e social; estudo Social; apoio à família na sua função protetiva; cuidados pessoais; orientação e encaminhamentos sobre/para a rede de serviços locais com resolutividade; construção de plano individual e/ou familiar de atendimento; orientação sociofamiliar; protocolos; acompanhamento e monitoramento dos encaminhamentos realizados; referência e contrarreferência; elaboração de relatórios e/ou prontuários; trabalho interdisciplinar; diagnóstico socioeconômico; Informação, comunicação e defesa de direitos; orientação para acesso a documentação pessoal; atividades de convívio e de organização da vida cotidiana; inserção em projetos/programas de ca pacitação e preparação para o trabalho; estímulo ao convívio familiar, grupai e social; mobilização, identificação da família extensa ou ampliada; mobilização para o exercício da cidadania; articulação da rede de serviços socioassistenciais; articulação com os serviços de outras políticas públicas setoriais e de defesa de direitos; articulação interinstitucional com os demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos; monitoramento e avaliação do serviço; organização de banco de dados e informações sobre o serviço, sobre organizações governamentais e não governamentais e sobre o Sistema de Garantia de Direitos.

    AQUISIÇÕES DOS USUÁRIOS:

    SEGURANÇA DE ACOLHIDA:

    Ser acolhido em condições de dignidade;

    Ter sua identidade, integridade e história de vida preservadas;

    Ter acesso a espaço com padrões de qualidade quanto a: higiene, acessibilidade, habitabilidade, salubridade, segurança e conforto;

    Ter acesso a alimentação em padrões nutricionais adequados e adaptados a necessidades específicas; Ter acesso a ambiência acolhedora e espaços reservados a manutenção da privacidade do usuário e guarda de pertences pessoais.

    [...]

    SEGURANÇA DE CONVÍVIO OU VIVÊNCIA FAMILIAR, COMUNITÁRIA E SOCIAL:

    Ter acesso a benefícios, programas, outros serviços socioassistenciais e demais serviços públicos;

    Ter assegurado o convívio familiar, comunitário e/ou social.

    SEGURANÇA DE DESENVOLVIMENTO DE AUTONOMIA INDIVIDUAL, FAMILIAR E SOCIAL:

    Ter endereço institucional para utilização como referência;

    Ter vivências pautadas pelo respeito a si próprio e aos outros, fundamentadas em princípios éticos de justiça e cidadania;

    Ter acesso a atividades, segundo suas necessidades, interesses e possibilidades;

    Ter acompanhamento que possibilite o desenvolvimento de habilidades de autogestão, autossustentação e independência;

    Ter respeitados os seus direitos de opinião e decisão;

    Ter acesso a espaços próprios e personalizados;

    Ter acesso a documentação civil;

    Obter orientações e informações sobre o serviço, direitos e como acessá-los;

    Ser ouvido e expressar necessidades, interesses e possibilidades;

    Desenvolver capacidades para autocuidados, construir projetos de vida e alcançar a autonomia;

    Ter ampliada a capacidade protetiva da família e a superação de suas dificuldades;

    Ser preparado para o desligamento do serviço;

    Avaliar o serviço.

    [...]

    CONDIÇÕES E FORMAS DE ACESSO:

    [...]

    Adultos e famílias:

    Por encaminhamento de agentes institucionais de Serviço Especializado em Abordagem Social; - Por encaminhamentos do CREAS ou demais serviços socioassistenciais, de outras políticas públicas setoriais e de defesa de direitos;

    Demanda espontânea.

    (grifos no original)

           Como destacado pelos agravantes, há no mínimo uma pessoa jurídica de direito privado que presta o serviço de Residência Terapêutica nesse Estado: Cagere Casa Assistencial Ltda.:

 

           Portanto, ao menos a princípio, é plenamente possível que a instituição requerida desempenhe a atividade de Residência Terapêutica, podendo o Cagere, inclusive, servir de parâmetro para a pretendida regularização das atividades.

           1.3. Estabelecimento edificado em desacordo com requisitos de segurança

           O MM. Juiz consignou:

    Por fim, cabe mencionar também o relatório técnico de engenharia que consta às págs. 353-364, emitido pelo CREA, que apontou diversas irregularidades no edifício onde funciona a entidade e em equipamentos que o guarnecem.

    É certo que as rés Casa Lar Monte das Oliveiras e Fernanda Nascimento Dias Valentim buscaram demonstrar que vieram a corrigir as falhas de segurança preventiva apontadas pelo CREAS, juntando fotografias aos autos (págs. 474-479), o que, porém, ao menos neste momento processual, não é suficiente para o convencimento deste Juízo, já que se trata de prova técnica que transcende a esfera jurídica, não bastando meras fotografias. Assim, é necessário que se aguarde o momento oportuno da instrução, quando se poderá requisitar nova vistoria ao CREA ou outra prova técnica apta a demonstrar se os requisitos de segurança passaram a ser cumpridos.

           Como bem destacado, a apuração da regularidade do espaço físico depende de prova técnica.

           1.4. Suspeitas de maus tratos

           Colhe-se da decisão agravada:

    Não bastassem os fundamentos acima expostos, foram registradas duas suspeitas de maus tratos contra pessoas residentes na Casa Lar Monte das Oliveiras, quais sejam, Crispim Machado Gonçalves (pessoa nascida em 20/02/1954, com epilepsia e retardo mental segundo descrição à pág. 163) e Rosana Vieira Guerreira (pessoa nascida em 01/08/1977, com esquizofrenia e dependente do uso de drogas segundo descrições às págs. 352 e 616).

    Sobre os supostos maus tratos contra Crispim Machado Gonçalves, vejam-se os documentos às págs. 163-227 e 308-318. Consta ainda informação de que ele veio a falecer em 16/06/2018 (certidão de óbito à pág. 261). Sobre os fatos, foi instaurado inquérito policial, que veio a subsidiar a instauração de processo criminal (autos n. 0002220-14.2018.8.24.0028 deste Juízo).

    Sobre os supostos maus tratos contra Rosana Vieira Guerreira, vejam-se os documentos às págs. 616-617.

    Essas suspeitas vêm ao encontro dos fundamentos acima, reforçando a conclusão em juízo de cognição sumária, naturalmente de que a entidade não está devidamente qualificada para prestar os serviços a que se propõe.

           Nesse ponto, a interlocutória deve ser mantida.

           É bem verdade que os recorrentes juntaram aos autos de origem áudios em que é revelada desavença financeira com o Sr. Gelson Gonçalves, irmão do Sr. Crispim Gonçalves.

           Mas os supostos maus-tratos ao mencionado idoso (Sr. Crispim) estão sendo apurados em processo criminal contra a representante legal da entidade (Fernanda), seu esposo (Fernando) e Ana Maria Garcia Albino Vieira (funcionária da Casa).

           Relatou o Ministério Público na denúncia que:

    Do crime de maus tratos

    No período entre setembro de 2017 e 19 de fevereiro de 2018, no estabelecimento denominado como Pousada/Residencial/Casa Lar/ILPI Monte das Oliveiras, localizado na Rua Araranguá, n. 42, Centro, Município de Balneário Rincão, nesta Comarca de Içara, os denunciados Ana Maria Garcia Albino Vieira, Fernando Francisco Valentim e Fernanda Nascimento Dias Valentim expuseram a perigo a integridade e a saúde física e psíquica do idoso Crispim Machado Gonçalves, residente no estabelecimento, que lá se encontrava para que recebesse cuidados em razão de sua idade avançada, submetendo-o a condições degradantes e privando-o de alimentação e de cuidados indispensáveis, quando obrigados a fazê-lo, ação que resultou nas lesões corporais registradas nas fotografias anexas e prontuários médicos.

    Ana Maria era funcionária do local e tinha dentre suas atribuições cuidar dos idosos que lá residiam. Fernando e Fernanda eram proprietários e administradores do local, possuído também poder sobre a primeira denunciada.

    Do crime de lesão corporal

    No mesmo local mas em momento específico, entre setembro de 2017 e 19 de fevereiro de 2018, a denunciada Ana Maria Garcia Albino Vieira, funcionária da Pousada/Residencial/Casa Lar/ILPI Monte das Oliveiras, ofendeu a integridade corporal do idoso Crispim Machado Gonçalves, agredindo-lhe com tapas no rosto e deixando-o cair da cama voluntariamente.

    Concorreram para a prática deste delito os denunciados Fernando Francisco Valentim e Fernanda Nascimento Dias Valentim, na medida em que, como proprietários e administradores da dita Pousada/Residencial/Casa Lar/ILPI tinham obrigação de cuidado, proteção e vigilância dos idosos acolhidos, mas nada fizeram para impedir o resultado lesão corporal. (grifou-se)

           Concluiu requerendo a condenação dos denunciados Ana Maria Garcia Albino Vieira, Fernando Francisco Valentim e Fernanda Nascimento Dias Valentim nas penas previstas no art. 99, § 1º, da Lei n. 10.741/2003, e no art. 129, § 7°, do Código Penal.

           No Inquérito Policial, apurou-se que a vítima, depois de passar alguns meses na Casa Monte das Oliveiras, foi internada com "múltiplas escaras em sacro, trocanter bilateral, orelha esquerda, ombro esquerdo, joelho bilateral", além de "quadro de desnutrição" (f. 48 dos autos do processo-crime).

           As fotografias revelam que as escaras eram realmente graves. As lesões tinham "odor fétido" e havia necrose, caracterizando úlcera de grau III (f. 200/210, 158/159 e 161 dos autos do processo-crime)

           Há depoimentos no sentido de que o Sr. Crispim passava muito tempo deitado, o que teria gerado as lesões.

           A existência de culpa ou dolo dos acusados só será desvendada durante o processo penal. Por ora, há presunção de inocência (CF, art. 5º, LVII).

           Mas esse princípio precisa ser ponderado com outros valores.

           Os réus pretendem atuar com "pessoas com deficiência física e/ou intelectual associado ou não a transtornos mentais, que tenham entre 18 e 59 anos e estejam em vulnerabilidade social, sem condições de autossustentabilidade, não possuindo familiares, ou cujos laços estejam rompidos ou, ainda, cujos familiares não possam exercer os cuidados de necessitam" (f. 9).

           A Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo foram ratificados pelo Congresso Nacional (DL n. 186/2008) e promulgados pelo Decreto n. 6.949/2009.

           A Convenção prevê:

    Artigo 15

    Prevenção contra tortura ou tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes

    1.Nenhuma pessoa será submetida à tortura ou a tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes. Em especial, nenhuma pessoa deverá ser sujeita a experimentos médicos ou científicos sem seu livre consentimento.

    2.Os Estados Partes tomarão todas as medidas efetivas de natureza legislativa, administrativa, judicial ou outra para evitar que pessoas com deficiência, do mesmo modo que as demais pessoas, sejam submetidas à tortura ou a tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.

    Artigo 16

    Prevenção contra a exploração, a violência e o abuso

    1.Os Estados Partes tomarão todas as medidas apropriadas de natureza legislativa, administrativa, social, educacional e outras para proteger as pessoas com deficiência, tanto dentro como fora do lar, contra todas as formas de exploração, violência e abuso, incluindo aspectos relacionados a gênero.

    2.Os Estados Partes também tomarão todas as medidas apropriadas para prevenir todas as formas de exploração, violência e abuso, assegurando, entre outras coisas, formas apropriadas de atendimento e apoio que levem em conta o gênero e a idade das pessoas com deficiência e de seus familiares e atendentes, inclusive mediante a provisão de informação e educação sobre a maneira de evitar, reconhecer e denunciar casos de exploração, violência e abuso. Os Estados Partes assegurarão que os serviços de proteção levem em conta a idade, o gênero e a deficiência das pessoas.

    3.A fim de prevenir a ocorrência de quaisquer formas de exploração, violência e abuso, os Estados Partes assegurarão que todos os programas e instalações destinados a atender pessoas com deficiência sejam efetivamente monitorados por autoridades independentes.

    4.Os Estados Partes tomarão todas as medidas apropriadas para promover a recuperação física, cognitiva e psicológica, inclusive mediante a provisão de serviços de proteção, a reabilitação e a reinserção social de pessoas com deficiência que forem vítimas de qualquer forma de exploração, violência ou abuso. Tais recuperação e reinserção ocorrerão em ambientes que promovam a saúde, o bem-estar, o auto-respeito, a dignidade e a autonomia da pessoa e levem em consideração as necessidades de gênero e idade.

    5.Os Estados Partes adotarão leis e políticas efetivas, inclusive legislação e políticas voltadas para mulheres e crianças, a fim de assegurar que os casos de exploração, violência e abuso contra pessoas com deficiência sejam identificados, investigados e, caso necessário, julgados.

    Artigo 17

    Proteção da integridade da pessoa

    Toda pessoa com deficiência tem o direito a que sua integridade física e mental seja respeitada, em igualdade de condições com as demais pessoas.

           A Lei n. 13.146/2015, que tem a Convenção e seu Protocolo como bases (art. 1º, parágrafo único), determina:

    Art. 5º A pessoa com deficiência será protegida de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, tortura, crueldade, opressão e tratamento desumano ou degradante.

    Parágrafo único. Para os fins da proteção mencionada no caput deste artigo, são considerados especialmente vulneráveis a criança, o adolescente, a mulher e o idoso, com deficiência. (grifou-se)

           É certo que o Estatuto deixa clara a plena capacidade e igualdade das pessoas com deficiência - art. 4º: "Toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação".

           A igualdade será exercida na paridade de oportunidades, no tratamento isonômico perante a lei, na consideração da pessoa com necessidades especiais como sujeito de direitos e deveres e com igual dignidade a todos os demais.

           Mas isso não pode implicar retrocesso. Quando houver situação digna de especial atenção, haverá sim "vulnerabilidade", não como fator limitante de vida plena, mas como reforço do papel que o Estado e a sociedade devem desempenhar para que essa plenitude se concretize.

           Daí prever o Estatuto que:

    Art. 10. Compete ao poder público garantir a dignidade da pessoa com deficiência ao longo de toda a vida.

    Parágrafo único. Em situações de risco, emergência ou estado de calamidade pública, a pessoa com deficiência será considerada vulnerável, devendo o poder público adotar medidas para sua proteção e segurança.

           Há, portanto, deveres de abstenção (não discriminação) e deveres de efetivação (promoção da dignidade).

           A respeito, Cristiano Chaves de Farias, Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto escrevem:

    Pessoa com deficiência como vulnerável. Havendo situações de risco, de emergência ou estado de calamidade, a pessoa com deficiência será enquadrada no conceito de vulnerável para fins de proteção diferenciada. No ponto, exige-se especial cuidado para que não se confunda vulnerabilidade com incapacidade. A nova redação dedicada aos arts. 3° e 4° do Código Civil de 2002 é de clareza solar ao afastar qualquer tipo de incapacidade jurídica decorrente de deficiência. Assim, a deficiência, de qualquer ordem, não implica em incapacidade para a prática de atos jurídicos. Todavia, a pessoa com deficiência pode reclamar uma proteção diferenciada em determinadas situações, como estado de risco, emergência ou calamidade. Bem por isso, é enquadrada, nessas situações, como vulnerável, merecendo atenção e tutela prioritárias. Além de atendimento prioritário, devem ter proteção compatível com o tipo de deficiência respectivo, garantindo a sua dignidade.

    Caráter exemplificativo das hipóteses de vulnerabilidade. A pessoa com deficiência pode ser reputada vulnerável em situações diversas, não apenas nos casos de situações de risco, de emergência ou de estado de calamidade, aludidos pelo Parágrafo Único da norma sub examine. Em toda e qualquer hipótese na qual a deficiência se mostre como um fator justificador de atenção diferenciada, é possível considerar a pessoa como vulnerável. (grifou-se) (Estatuto da Pessoa com Deficiência Comentado. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 69)

           O caso dos autos configura uma dessas hipóteses em que as pessoas com necessidades especiais - o público-alvo da Casa lar Monte das Oliveiras - devem ser tratadas como vulneráveis, no sentido de merecer especial atenção e proteção do Estado.

           Esse valor prepondera em relação à presunção de inocência dos responsáveis e funcionários daquele estabelecimento quanto à acusação de maus-tratos e lesões corporais.

           Há que se adotar, neste momento, postura cautelosa, evitando-se expor esses sujeitos vulneráveis à possibilidade de serem vítimas de tratamento incompatível, desumano ou inadequado.

           Supondo que se comprove a inocência dos acusados, a consequência para os réus será muito menos grave.

           2. Risco de dano

           Nos itens 1.1 e 1.2 ficou consignado que as irregularidades formais, a princípio, poderiam ser solucionadas ao longo do processo.

           Quanto ao espaço físico, uma nova vistoria, antes da abertura da fase de instrução, também poderia atestar que os problemas foram sanados, permitindo-se o prosseguimento das atividades.

           Essas questões (formais e estruturais), a meu sentir, não seriam razões suficientes para interditar o estabelecimento - ao revés, parece-me que o caminho seria buscar a adequação da Casa de forma cooperativa entre os réus, o Ministério Público, o juízo e o poder público.

           Mas a suspeita de que a requerida, seu esposo e uma funcionária foram responsáveis - por negligência, ou mesmo de forma dolosa - por maus-tratos e lesões corporais a idoso que estava sob seus cuidados não pode ser ignorada.

           Como já foi dito, entre a presunção de inocência e a especial proteção que as pessoas com deficiência devem receber, esta prevalece.

           O risco financeiro para a Associação não se compara ao de maus-tratos e tratamento inadequado.

           Quanto às pessoas atualmente acolhidas, o juízo a quo determinou:

    Ante o exposto, DEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA para:

    (a) DETERMINAR aos réus Casa Lar Monte das Oliveiras, Fernanda Nascimento Dias Valentim e Município de Balneário Rincão que providenciem a entrega de todas as pessoas acolhidas na Casa Lar Monte das Oliveiras aos seus familiares ou, em caso de impossibilidade, que o Município de Balneário Rincão, mediante contato com os municípios de onde os internos são provenientes, localize estabelecimento adequado para o qual possa encaminhar os internos; (grifou-se)

           Portanto, o Município (que também é réu na ACP), em conjunto com os demais requeridos, tem a incumbência de entregar os residentes às duas famílias e, não sendo isso possível, o ente político deverá localizar estabelecimento para encaminha-los.

           Não há risco, portanto, de que fiquem desabrigados.

           A eventual falta de vagas será debatida entre a municipalidade e o juízo e, pelo que se verifica até agora, há dificuldade para cumprimento da decisão apenas pela renitência dos requeridos.

           O Município peticionou:

    A decisão exarada por Vossa Excelência é de difícil cumprimento no momento, isto porque o Município para que consiga entregar os internos a seus familiares necessita do endereço dos mesmos.

    Ocorre que a Casa Lar entregou tão somente uma listagem com o nome dos internos e a cidade que são provenientes, sendo eles os seguintes:

    - Roberto Luiz - Balneário Rincão;

    - Gisele de Souza - Balneário Rincão;

    - Jeovany Moraes - Sangão;

    - Ivanir Moreira - Mato Grosso;

    - Graziela da Silva - Laguna;

    - Carlos Oscar - Sangão e;

    - Felipe Oliveira - Morro da Fumaça.

    A entidade informou que neste primeiro momento só prestará tais informações e caso este juízo entendesse que era competência do Município a realização do acolhimento forneceria mais dados (informações da Psicóloga Angelita Ferrão Barriquel).

    Sem as informações, o Município não tem como cumprir o determinado na decisão, que seria a entrega das pessoas para seus familiares ou na impossibilidade o contato com os Municípios de origem dos pacientes que por certo não terão tais informações.

    No caso dos moradores de Balneário Rincão, o Município já encontrou local para colocá-los na cidade de Maracajá.

    Ante o exposto, requer que seja determinado por Vossa Excelência que a ré Casa Lar informe o endereço dos pacientes e seus familiares para o início de cumprimento da decisão.

    Requer também, que seja concedido prazo maior para o cumprimento por parte do Município, haja vista que os pacientes são provenientes de vários Municípios, sendo inviável o cumprimento no prazo de tão somente 05 (cinco) dias.

    Por fim, que seja determinado por Vossa Excelência a imediata entrega dos pacientes Gisele de Souza e Roberto Luiz para o Município realizar a internação, pois até o momento não houve a liberação dos internos. (f. 655/656 dos autos de origem)

           4. Cumprimento da decisão

           Uma última ponderação.

           Reforça-se a recomendação já constante da decisão de f. 103/127 ao juízo de origem e ao Ministério Público que fiscalizem, com especial atenção, o cumprimento da decisão, mormente quanto ao destino dado às pessoas acolhidas.

           Há relatos de que alguns não têm família ou seus familiares não podem ou não querem dispensar os cuidados necessários.

           É preciso, portanto, averiguar o seu destino e, no curso do processo, com periodicidade, coletar informações sobre o tratamento que estão recebendo, se estão bem acolhidas e recebendo o tratamento digno de que são titulares.

           5. Conclusão

           Nega-se provimento ao recurso.


Gab. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva