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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 4028251-24.2017.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Marcus Tulio Sartorato
Origem: Capital
Orgão Julgador: Órgão Especial
Julgado em: Wed Dec 19 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Não informado
Classe: Direta de Inconstitucionalidade

 


 


Direta de Inconstitucionalidade n. 4028251-24.2017.8.24.0000, de Tribunal de Justiça

Relator: Desembargador Marcus Tulio Sartorato

   AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 1º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 229/2017 DO MUNICÍPIO DE BARRA VELHA. CONTRIBUIÇÃO PARA O CUSTEIO DO SERVIÇO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA (COSIP). RESTRIÇÃO DA COBRANÇA AOS PROPRIETÁRIOS DE IMÓVEIS LOCALIZADOS NAS ÁREAS EFETIVAMENTE ATENDIDAS PELO SERVIÇO. IMPOSSIBILIDADE. BENEFÍCIOS DA DESTINAÇÃO DO TRIBUTO USUFRUÍDOS POR TODA A COLETIVIDADE. PROPRIETÁRIOS DE IMÓVEIS DENTRO DA MESMA ÁREA URBANA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA. ARTIGO 128, INCISO II, DA CARTA ESTADUAL CATARINENSE. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE.

   1. A concessão de tratamento privilegiado a contribuintes que, em tese, possuem igual aptidão econômica para suportar a carga tributária caracteriza uma violação ao princípio da igualdade, evidenciando vicio de constitucionalidade.

   2. "O Supremo Tribunal Federal firmou o posicionamento no sentido de que, além de constitucional, a contribuição de iluminação pública tem natureza jurídica de "contribuição sui generis". Isto significa dizer que, segundo o referido entendimento, trata-se de nova espécie tributária, com pressupostos e caracteres diferenciados, pois, segundo tal posicionamento, a COSIP não é taxa, uma vez que não exige a contraprestação individualizada de um serviço ao contribuinte, pois serve ao custeio geral. Daí porque a ausência de efetiva prestação do serviço não é obstáculo para eximir o contribuinte ao pagamento da COSIP" (TJSC, Apelação n. 0004160-22.2011.8.24.0040, de Laguna, rel. Des. Francisco Oliveira Neto, Segunda Câmara de Direito Público, j. 14-06-2016).

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Direta de Inconstitucionalidade n. 4028251-24.2017.8.24.0000, da comarca de Barra Velha em que é Requerente Prefeito do Município de Barra Velha e Requerida Câmara Municipal de Vereadores de Barra Velha - SC.

           O Órgão Especial decidiu, por unanimidade, julgar procedente o pedido inicial. Custas legais.

           O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Rodrigo Collaço, com voto, e dele participaram os Exmos. Srs. Des. Ricardo Fontes, Salim Schead dos Santos, Maria do Rocio Luz Santa Ritta, Jaime Ramos, Alexandre d'Ivanenko, João Henrique Blasi, Soraya Nunes Lins, Henry Petry Junior, Roberto Lucas Pacheco, Stanley Braga, Hélio do Valle Pereira, Pedro Manoel Abreu, Cláudio Barreto Dutra, Luiz Cézar Medeiros, Sérgio Roberto Baasch Luz e Fernando Carioni.

           Funcionou como Representante do Ministério Público o Exmo. Senhor Procurador de Justiça Aurino Alves de Souza.

           Florianópolis, 19 de dezembro de 2018.

Desembargador Marcus Tulio Sartorato

Relator

 

RELATÓRIO

           O Prefeito do Município de Barra Velha ajuizou ação direta de inconstitucionalidade com pedido de medida cautelar, objetivando a declaração de inconstitucionalidade do art. 1º da Lei Complementar Municipal nº 229/17, que alterou a parte final do caput do art. 2º da Lei Complementar nº 215/17.

           Sustentou, em síntese, que com a edição do dispositivo impugnado, o Município restringiu a exigibilidade da COSIP apenas aos contribuintes cujos imóveis estejam contidos em áreas diretamente atendidas pelo sistema de iluminação pública, muito embora a referida contribuição não se enquadre como taxa e sirva ao custeio geral do referido serviço. Requereu a concessão de medida cautelar para que fossem suspensos os efeitos dos dispositivos até julgamento definitivo da ação e, ao final, a declaração da inconstitucionalidade do dispositivo invocado.

           A medida cautelar foi indeferida por este Relator, oportunidade na qual adotou-se o rito previsto no art. 12 da Lei Estadual n. 12.069/01 (fls. 42/43).

           Conquanto notificado, o Presidente da Câmara de Vereadores do Município de Barra Velha deixou transcorrer in albis o prazo para notificação (certidão de fl. 54).

           O Procurador-Geral do Município manifestou-se pela procedência do pedido (fls. 58/60).

           A Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Ilustre Procurador Durval da Silva Amorim, manifestou-se também no sentido da procedência do pedido (fls. 65/79).

           Os autos vieram conclusos em 07.06.2018.

 

VOTO

           De início, convém destacar que o dispositivo impugnado (art. 1º da Lei Complementar nº 229/2017) alterou o art. 2º da Lei Complementar nº 215/2017, o qual passou a vigorar com a seguinte redação:

    "Art. 2º Contribuinte da Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública é o usuário de energia elétrica, o proprietário, o titular do domínio útil ou o possuidor a qualquer título de bem imóvel localizado no território do Município em áreas atendidas pelo serviço de iluminação pública".

           Originalmente a lei em questão definia o contribuinte como sendo "o usuário de energia elétrica, o proprietário, o titular do domínio útil ou o possuidor a qualquer título de bem imóvel localizado no território do Município".

           O Supremo Tribunal Federal em sede de repercussão geral, reconheceu que a contribuição de iluminação pública ostenta caráter sui generis, que não se confunde com um imposto, porque sua receita se destina a finalidade específica, nem com uma taxa, justamente por não exigir a contraprestação individualizada de um serviço ao contribuinte (RE n. 573675/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 25-3-2009).

           Aplicando tal entendimento, colhe-se da recente jurisprudência desta Corte:

     TRIBUTÁRIO. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. CUSTEIO DO SERVIÇO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA - COSIP. NATUREZA JURÍDICA FIRMADA PELO STF. "CONTRIBUIÇÃO SUI GENERIS", DESTINADO AO CUSTEIO ESPECÍFICO, SEM VINCULAÇÃO COM A EFETIVA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO INDIVIDUALIZADO. DESNECESSIDADE DE PRESTAÇÃO EFETIVA DO SERVIÇO. SENTENÇA REFORMADA. 

    O Supremo Tribunal Federal firmou o posicionamento no sentido de que, além de constitucional, a contribuição de iluminação pública tem natureza jurídica de "contribuição sui generis". Isto significa dizer que, segundo o referido entendimento, trata-se de nova espécie tributária, com pressupostos e caracteres diferenciados, pois, segundo tal posicionamento, a COSIP não é taxa, uma vez que não exige a contraprestação individualizada de um serviço ao contribuinte, pois serve ao custeio geral. Daí porque a ausência de efetiva prestação do serviço não é obstáculo para eximir o contribuinte ao pagamento da COSIP. 

    HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO EM OBSERVÂNCIA AOS PRIMADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. CAUSA NÃO COMPLEXA E SEM INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. EXEGESE DO ART. 20, §§ 3º E 4º, DO CPC/73. 

    Os honorários advocatícios deverão ser fixados, em regra, nos moldes do art. 20, § 3º, do CPC/73, levando em conta grau de zelo do respectivo profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, bem como o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA REFORMADA. RECURSO PROVIDO PARA RECONHECER A EXIGIBILIDADE DA COSIP. (TJSC, Apelação n. 0004160-22.2011.8.24.0040, de Laguna, rel. Des. Francisco Oliveira Neto, Segunda Câmara de Direito Público, j. 14-06-2016).

           Não se desconhece a existência de precedente no sentido de ser "incabível a cobrança da Contribuição para o Custeio da Iluminação Pública - COSIP, no território do Município de Treze de Maio, daqueles imóveis situados na área rural e que não usufruam do serviço de iluminação pública" (TJSC, Apelação Cível n. 0300155-26.2014.8.24.0282, de Jaguaruna, rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, Segunda Câmara de Direito Público, j. 13-03-2018). Tal raciocínio, entretanto, não se aplica ao caso dos autos porquanto a diferenciação aqui estabelecida não foi entabulada entre contribuintes da zona urbana e da zona rural. Da forma como restou estipulado, conforme bem ilustrou o Procurador de justiça, "a Lei em comento viola o princípio da isonomia ao adotar ponto de referência desarrazoado e desproporcional, que resulta em tratamento diferenciado a contribuintes que possam se encontrar em situação semelhante. Por exemplo: dois vizinhos, moradores do "bairro X", que moram em ruas paralelas (uma iluminada e outra não), mas que utilizam a mesma praça, transitam pelas mesmas ruas/avenidas. Ou seja, que usam a iluminação pública 'em situação semelhante" (fl. 77).

           Ad argumentandum, não se pode perder de vista que uma das finalidades da contribuição é justamente fazer frente aos gastos com obras para instalação, ampliação e melhoramentos da rede, o que beneficia diretamente os residentes em localidades antes não abrangidas pelo serviço, embora essa não seja o específico desígnio da exação.

           Nesse contexto, ao delimitar a hipótese de incidência da contribuição, o dispositivo em questão incorreu em manifesta afronta ao princípio da isonomia na esfera tributária, consagrado no art. 128, inciso II, da Carta Estadual Catarinense, in verbis:

    Art. 128. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado ao Estado e a seus Municípios:

    [...]

    II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

           O princípio da isonomia, particularizado no campo dos tributos conforme a norma supra mencionada, pode ser analisado sob dois aspectos. Primeiro, deve ser dirigido ao aplicador da lei, de modo a evitar o tratamento diferenciado de pessoas; em um segundo aspecto, o princípio em tela se dirige ao próprio legislador, no sentido de coibir que se dê tratamento diverso para situações iguais ou equivalentes. 

           Neste sentido, Eduardo Sabbag ressalta duas dimensões de "equidade" na tributação, verbis:

    "(a) A Equidade Horizontal: os contribuintes que possuam igual capacidade de pagar deverão contribuir com a mesma quantidade pecuniária, destinada aos cofres do Estado. É a idéia do 'tratamento igual para os iguais';

    (b) A Equidade Vertical: os contribuintes que possuam desigual capacidade de pagar deverão contribuir com diferentes quantidades pecuniárias, destinadas aos cofres do Estado. É a idéia do 'tratamento desigual para os desiguais'. Aqui despontam os critérios de concretização do postulado da capacidade contributiva, v.g., a progressividade, a seletividade, entre outros. Assim, indivíduos com rendas maiores deverão contribuir, proporcional e equitativamente, com mais recursos do que aqueles que possuem menores rendimentos. O objetivo dessa forma de tributação não é o de inverter a posição das classes de renda, mas reduzir a diferença entre elas, por sinal, exageradamente grande no Brasil." (Manual de Direito Tributário. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. P. 154/155) (grifou-se).

           Não subsiste, portanto, fundamento para diferenciar os destinatários dos serviços de iluminação de logradouros e bens públicos na medida em que o serviço é prestado a todos os cidadãos de forma genérica, não sendo possível distinguir quem dela usufrui diretamente.

           Por oportuno, extrai-se do parecer da lavra do Ilustre Procurador Durval da Silva Amorim (fls. 65/79):

    Por mais que possa soar razoável, é necessário observar que a COSIP é instituída para custear um serviço indivisível que alcança indeterminados usuários os quais não se consegue definir com exatidão.

    Isso porque, segundo a norma alterada, pressupõe-se usuário apenas quem reside/possui imóvel em área com iluminação pública. Contudo, o usuário da iluminação pública é todo e qualquer cidadão que usufrui de uma praça, rua, parque, imóvel público iluminado. Ao contrário do que o dispositivo alterado em comento leva a crer, o beneficiado não é apenas quem tem a própria rua iluminada.

    Não fosse esse argumento suficiente, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina também já se manifestou sobre os diversos aspectos de aplicação dos valores arrecadados à título de COSIP: "O custeio do serviço de iluminação pública compreende também a instalação, expansão e manutenção da rede de pública de iluminação, uma vez que a não inclusão destas providências poderia inviabilizar o próprio serviço, que exige cuidado constante, servindo, ainda, como diretriz para que a Administração Pública utilize a contribuição não só para fornecer energia elétrica mas também para a ampliação da sua rede, objetivando aumentar o rol de beneficiados com o serviço."

           A propósito, de acordo com a promoção ministerial, o pleito seria procedente por fundamento diverso daquele apontado na exordial, uma vez que o vício reside na ofensa ao princípio da isonomia tributária e não está consubstanciado no suposto tratamento tributário da COSIP como uma espécie de taxa; ocorre, entretanto, que a causa de pedir guarda relação direta com o fato de que a iluminação pública serve a toda a coletividade, motivo pelo qual seu custeio não pode ser restrito aos proprietários de imóveis inseridos nas áreas abrangidas pelo serviço e não deve ocorrer diferenciação entre os contribuintes. 

           Destarte, conclui-se que a determinação de incidência da COSIP apenas sobre a propriedade de imóveis que estejam efetivamente inseridos nas áreas abrangidas pelo serviço público em questão configura direta violação ao princípio destacado na Carta Estadual Catarinense, padecendo a norma impugnada de manifesto vício de constitucionalidade.

           Ante o exposto, vota-se no sentido de julgar procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei Complementar Municipal nº 229/2017, que alterou a parte final do caput do art. 2º da Lei Complementar nº 215/17 do Município de Barra Velha.


Gabinete Desembargador Marcus Tulio Sartorato