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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 1018321-03.2013.8.24.0023 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Jaime Ramos
Origem: Capital
Orgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Público
Julgado em: Tue Dec 18 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Sérgio Luiz Junkes
Classe: Apelação / Remessa Necessária

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STJ: 378
Súmulas STF: 378

 


Apelação / Remessa Necessária n. 1018321-03.2013.8.24.0023, da Capital

Relator: Desembargador Jaime Ramos

   ADMINISTRATIVO. REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL DA PARTE AUTORA. AÇÃO ORDINÁRIA. PLEITO INDENIZATÓRIO. SERVIDOR DO PODER JUDICIÁRIO ESTADUAL. CARGO DE AGENTE DE SERVIÇOS GERAIS. EXERCÍCIO DE FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE AGENTE DE PORTARIA E COMUNICAÇÃO. DESVIO DE FUNÇÃO CARACTERIZADO. PRÁTICA NÃO RECOMENDÁVEL QUE NÃO IMPEDE A PERCEPÇÃO DA DIFERENÇA DE VENCIMENTOS. SÚMULA N. 378 DO STF. SENTENÇA MANTIDA NO PONTO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. "DIES A QUO" E "AD QUEM" DA CONDENAÇÃO. EXISTÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO APRESENTADO POR ENTIDADE SINDICAL DA CATEGORIA QUE NÃO CARREGA CONTEÚDO APTO A SUSPENDER A MARCHA PRESCRICIONAL. PRETENSÃO QUE SE ENCERRA COM A CESSAÇÃO DA IRREGULARIDADE FUNCIONAL. INEXISTÊNCIA DE DIREITO À INDENIZAÇÃO NOS PERÍODOS EM QUE O SERVIDOR ESTEVE DESIGNADO PARA SUBSTITUIÇÕES E RECEBEU COMO TAL. SENTENÇA PARCIALMENTE ALTERADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. REMESSA DESPROVIDA.

   Caracteriza desvio de função o exercício de atividades diversas daquelas do cargo no qual o servidor foi investido, circunstância que obriga a Administração a pagar as diferenças existentes entre o vencimento do cargo/função exercida e o daquele que, por força de aprovação em concurso público, deveria ter exercido. De acordo com a Súmula n. 378 do STF, "reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes". "São devidos ao servidor que trabalhou em desvio de função, a título de indenização, os valores resultantes da diferença entre os vencimentos do cargo ocupado e da função efetivamente exercida, sob pena de locupletamento indevido da Administração" (STJ, AgREsp n. 396704/RS, rela. Mina. Laurita Vaz, Quinta Turma, j. 07.06.05). A condenação do ente público ao pagamento da diferença de vencimentos, nesse caso, não afronta a Súmula n. 339, do Supremo Tribunal Federal, há pouco transformada na Súmula Vinculante n. 37, até porque não se está atribuindo vencimentos a título de isonomia, mas sim evitando o enriquecimento ilícito estatal em detrimento do direito do servidor.

   Nos termos do art. 4º do Decreto n. 20.910/1932, é a demora para o estudo de requerimento administrativo acerca da existência ou para pagamento de dívida da Administração que gera a suspensão da prescrição a favor da Fazenda Pública.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação / Remessa Necessária n. 1018321-03.2013.8.24.0023, da comarca da Capital 3ª Vara da Fazenda Pública em que é/são Apelante(s) José Murialdo Campos e Apelado(s) Estado de Santa Catarina.

           A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, dar provimento parcial ao recurso e negar provimento à remessa necessária. Custas na forma da lei.

           Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Jaime Ramos (Presidente), Ronei Danielli e Ricardo Roesler.

           Florianópolis, 18 de dezembro de 2018.

Desembargador Jaime Ramos

Relator

 

           RELATÓRIO

           José Murialdo Campos propôs "ação ordinária" contra o Estado de Santa Catarina, aduzindo que obrou em desvio de função pois, embora seja servidor público investido no cargo de Agente de Serviços Gerais, do Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina, exerceu durante muito tempo as atribuições do cargo de Agente de Portaria e Comunicação na Comarca de Orleans; que tem direito de receber indenização pelas diferenças de remuneração decorrentes do desvio de função do cargo para o qual nomeado e tomou posse, na medida em que a remuneração percebida durante o período foi menor do que aquela paga aos servidores que exercem as funções de Agente de Portaria e Comunicação, sob pena de locupletamento ilícito do ente demandando.

           Requereu a concessão da justiça gratuita e, ao final, a condenação do Estado de Santa Catarina ao pagamento de indenização por desvio de função, no valor correspondente às diferenças de remuneração e reflexos entre o cargo da sua investidura e aquele correspondente às funções que efetivamente exerceu, respeitada a prescrição quinquenal.

           O pedido de gratuidade de justiça foi deferido.

           Citado, o demandado apresentou contestação, alegando, como prejudicial de mérito, a prescrição quanto às parcelas vencidas no quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação. No mérito, defendeu que a parte autora não logrou apresentar prova suficiente a revelar que realmente exerceu atribuições de cargo diverso daquele para o qual foi nomeada em caráter efetivo; que somente por expressa previsão legal poderia ser promovida alteração em sua remuneração, motivo pelo qual, ausente lei que autorize tal pretensão, o reconhecimento do direito pleiteado não é possível. Ao final, requereu a improcedência do pedido inicial.

           A parte autora apresentou réplica.

           O Ministério Público apresentou parecer sem manifestação acerca do mérito da causa.

           Após requisição do Juízo, o órgão de lotação da parte autora apresentou informações acerca das funções por ela exercidas nos períodos compreendidos pela pretensão inicial.

           Intimadas, as partes demandas requereram o prosseguimento do feito.

           Na sequência, o MM. Juiz prolatou sentença, inscrevendo em sua parte dispositiva os seguintes termos:

    Diante disso, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil: a) declarar a prescrição da pretensão relativa às parcelas vencidas anteriormente ao quinquídio [sic] que precede o ajuizamento da ação (protocolada em 04/12/2013); b) condenar o requerido à indenização correspondente aos valores resultantes da diferença entre os vencimentos dos cargos de Agente de Serviços Gerais e do cargo de Agente de Portaria e Comunicação entre 04/12/2008 e 04/12/2013), com exceção das substituições realizadas que foram efetivamente remuneradas, acrescido os correspondentes reflexos legais.

    As verbas vencidas deverão ser acrescidas de correção monetária pelo INPC até a entrada em vigor da Lei 11.960/2009 (29/06/2009) e, a partir de 30/6/2009, pelo índice de atualização aplicável à caderneta de poupança. A contar da citação, os juros de mora e a correção monetária serão aplicados de forma conjunta, pelos índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança, nos moldes do que dispõe o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, na redação dada pela Lei n. 11.960/2009 (TJSC, AC 2012.087988-0, Rel. Des. Subst. Francisco Oliveira Neto, j. 23/6/2015).

    Considerando a mínima sucumbência por parte da requerente (art. 86, parágrafo único, do CPC), condeno o réu ao pagamento integral das custas processuais (Lei Complementar Estadual 156/1997, art. 35, 'd') e honorários advocatícios ao patrono da autora, em 10% sobre o valor da condenação, que será fixado após a liquidação do julgado.

    Sentença sujeita ao reexame necessário (Código de Processo Civil, art. 496).

    Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

    Após o trânsito em julgado, arquivem-se.

           Não conformada, a parte autora interpôs recurso de apelação em que sustentou a necessidade de alteração da sentença em relação ao prazo atingido pela prescrição quinquenal, uma vez que esta foi interrompida na data do protocolo do pedido administrativo, feito pelo Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina - SINJUSC, de correção dos desvios de função dos servidores da justiça estadual, realizado em 07/07/2008, motivo pelo qual defende que está prescrita apenas a pretensão de cobrança das parcelas anteriores a 07/07/2003; que o marco final para pagamento das diferenças é fevereiro de 2014, data em que cessou o desvio, e não 04/12/2013, como anotado na sentença.

           Com as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Superior Instância, perante a qual a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Basílio Elias De Caro, considerou ausente o interesse público na causa e deixou de intervir.

           VOTO

           Trata-se de reexame necessário e recurso de apelação contra a sentença que, nos autos da "ação ordinária" proposta por José Murialdo Campos contra o Estado de Santa Catarina, julgou procedentes os pedidos para: "a) declarar a prescrição da pretensão relativa às parcelas vencidas anteriormente ao quinquídio [rectius quinquênio] que precede o ajuizamento da ação (protocolada em 04/12/2013); b) condenar o requerido à indenização correspondente aos valores resultantes da diferença entre os vencimentos dos cargos de Agente de Serviços Gerais e do cargo de Agente de Portaria e Comunicação entre 04/12/2008 e 04/12/2013), com exceção das substituições realizadas que foram efetivamente remuneradas, acrescidos os correspondentes reflexos legais."

           O recurso da parte autora e o reexame necessário, pela semelhança da matéria, serão analisados conjuntamente.

           Do desvio de função

           Inicialmente, em relação à existência do desvio de função, a questão foi bem resolvida pelo MM. Juiz sentenciante, Dr. Sérgio Luiz Junkes, de forma que, evitando-se desnecessária tautologia, adotam-se como razões de decidir, no presente voto, os fundamentos da sentença, a seguir transcritos:

    Cuida-se no presente feito de controvérsia quanto ao direito à indenização de diferenças remuneratórias por desvio de função.

    Como é cediço, a todo cargo público corresponde um espectro de atribuições imposto por lei.

    Ao criar o cargo público a lei estabelece as competências conferidas aos seus ocupantes, limitando sua atuação uma circunscrição de poderes, atribuídos ao agente da Administração para o desempenho das funções que lhe são inerentes.

    Embora tal previsão usualmente não seja taxativa, permitindo ao agente a prática de funções outras, que não as estritamente indicadas na lei de criação do cargo correspondente, estas somente serão consideradas legítimas se abarcadas pelo espectro de competência referente ao posto ocupado.

    Nada impede, portanto, a prática, pelo servidor, de atribuições análogas às legalmente imputadas ao cargo ocupado, tampouco de atos sequer em lei indicados, desde que a sua envergadura seja compatível com os poderes concedidos ao sujeito que o pratica.

    Ultrapassada essa circunscrição de poderes, por outro lado, a atuação do agente estatal será reputada ilegítima.

    Nesse contexto, tem-se por "ilegítimo o denominado desvio de função, fato habitualmente encontrado nos órgãos administrativos, que consiste no exercício, pelo servidor, de funções relativas a outro cargo, que não o que ocupa efetivamente. Cuida-se de uma corruptela no sistema de cargos e funções que precisa ser coibida, para evitar falsas expectativas do servidor e a instauração de litígios com o escopo de permitir a alteração da titularidade do cargo" (José dos Santos Carvalho Filho. Manual de Direito Administrativo. Lúmen Iuris: Rio de Janeiro, 2011. p. 566).

    Visando impedir esta prática, o próprio Estatuto dos Servidores de Santa Catarina (Lei 6.745/85), prevê expressamente ser "vedado atribuir ao funcionário outros serviços, além dos inerentes ao cargo de que seja titular, exceto quando designado, mediante gratificação, para o exercício de função de confiança ou para integrar grupos de trabalho ou estudo, criados pela autoridade competente, e comissões legais, salvo na hipótese do art. 35, deste Estatuto" (art. 3º).

    Assim, à exceção das hipóteses acima arroladas, somente se admite que o servidor exerça funções diversas daquelas atribuídas para o cargo ao qual legitimamente investido na hipótese de readaptação funcional, em que, por modificação do estado físico ou das condições de saúde, se aconselhe o seu aproveitamento em atribuições diferentes, compatíveis com a sua condição funcional (art. 35). Na readaptação, ressalte-se, não haverá mudança de cargo, tampouco decesso ou aumento de remuneração (art. 35, § 1º, e 36), pois a alteração funcional sequer pode ser imputada à Administração.

    Por outro lado, não sendo este o caso, "caracteriza desvio de função o exercício de atividades diversas daquelas do cargo em que o servidor foi investido, circunstância que obriga a Administração Pública ao pagamento das diferenças existentes entre o vencimento do cargo/função exercida e o daquele que, por força de aprovação em concurso público, deveria ter exercido" (TJSC, AC 2013.081698-4, Rel. Des. Jaime Ramos, j. 30/04/2015).

    No mesmo sentido, a propósito, dispõe o Enunciado n. 378 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça que "reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes".

    No caso em tela, a parte autora sustenta ter direito à indenização de diferenças salariais, sob o fundamento de que, embora investida por concurso público no cargo de Agente de Serviços Gerais, teria exercido as atribuições do cargo de Agente de Portaria, no período compreendido entre o quinquênio e a data da propositura da ação (04/12/2013), com exceção das substituições realizadas que foram efetivamente remuneradas.

    O cargo de Agente de Serviços Gerais é regulamentado na Seção de Progressão Funcional do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, sujeitando-se às seguintes atribuições:

    Atividades relacionadas com serviços diversos, compreendendo os serviços de copa, cozinha, conservação e limpeza. 1) Mantém os materiais de cozinha sempre limpos; 2) Responsabiliza-se pela guarda dos mantimentos e utensílios; 3) Serve aos juízes e funcionários no horário determinado pelo diretor do Fórum; 4) Serve e atende aos juízes sempre que solicitado; 5) Efetua a limpeza de pátios, vidraças, pisos, sanitários, carpetes e enceramento de pisos; 6) Atende, quando convocado, nas sessões do tribunal do júri; 7) Exerce outras atividades correlatas.

    Por sua vez, o cargo de Agente de Portaria e Comunicação, cuja disciplina se encontra estabelecida pelo setor de Recursos Humanos do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, tem como competências:

    Atividades relacionadas com serviços externos, portaria, xerox, telex, telefonia e central de atendimento.

    Na função de telefonista: atender a chamados telefônicos internos e externos, operando em troncos e ramais; transmitir telegramas pelo telefone; pesquisar número de telefone de assinantes, quando solicitado; manter registros de ligações locais e interurbanas, bem como de ligações particulares e encaminhar relatórios ao superior imediato, para providenciar a respectiva cobrança; executar outras tarefas correlatas a critério de seu superior imediato.

    Na função de operador de telex e fac-símile: Receber e transmitir telex e fax, operando em máquina própria; entregar os telex e fax recebidos aos respectivos destinatários, bem como as cópias transmitidas; manter registros de telex e faz transmitidos e recebidos; registrar os pedidos de transmissão de telex e fax particulares, e encaminhar o respectivo relatório ao superior imediato, para providenciar a respectiva cobrança; executar outras tarefas correlatas a critério de seu superior imediato.

    Na função de operador de máquina fotocopiadora: Fotocopiar documentos e processos, mediante requisição ou comprovante de recolhimento de guia em banco autorizado; efetuar limpeza das máquinas fotocopiadoras; manter registro de fotocópias expedidas e encaminhar diariamente o respectivo relatório ao superior imediato, para as providências cabíveis; controlar o estoque de materiais necessários ao fornecimento de fotocópia, limpeza e conservação das máquinas; executar outras tarefas correlatas a critério de seu superior imediato.

    Na função de portaria e central de atendimento: receber, orientar e encaminhar o público, informando sobre localização de pessoas ou dependências do fórum; controlar a entrada e saída de pessoas no recinto de trabalho; fiscalizar as dependências destinadas ao público, para que nelas sejam mantidas a ordem, silêncio; receber e transmitir mensagens, quando solicitado; atuar na central de atendimento prestando informações sobre processos, aos advogados e público em geral, através de consulta informatizada; executar outras tarefas correlatas a critério de seu superior imediato.

    Verifica-se, portanto, que apenas o Agente de Portaria e Comunicação tem a atribuições relacionadas com serviços externos, portaria, xerox, telex, telefonia e central de atendimento.

    As funções do posto claramente não são compatíveis com a envergadura do cargo de Agente de Serviços Gerais, havendo nítida distinção entre as atribuições dos cargos.

    A ficha funcional da autora indica como sua lotação, a Comarca de Orleans neste período (fls. 59-62).

    No documento lançado a fls. 170, a Chefe de Secretaria e a Diretora do Foro de Orleans informam que:

    [...] JOSÉ MURIALDO CAMPOS, Agente de Serviços Gerais, matrícula nº 2823, lotado no Fórum da Comarca de Orleans, a fim de atender a determinação da Juíza de Direito 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital, que em pesquisa realizada no SAJ3 dele consta que o servidor está habilitado desde 30/05/2005, e é do meu conhecimento que colaborava com os serviços da secretária sendo responsável pelo recebimento e envio de malote; correspondência recebidas e enviadas, pelo atendimento ao telefone na central da Comarca; recebimento e envio de fax, e fazia fotocópia de todos os documentos dos processos necessários para acompanhar expedição de mandados; ofícios; catas precatórias etc, tendo permanecido na função até fevereiro de 2014.

    Não há dúvida de que a parte autora atuou como um verdadeiro Agente de Portaria e Comunicação, assumindo as responsabilidades precípuas deste cargo, sem contudo receber a remuneração devida, entre 04/12/2008 e 04/12/2013.

    As responsabilidades em questão, vale destacar, nem remotamente se incluem nas atribuições afetas ao cargo de Agente de Serviços Gerais, aos quais cabe a apenas a realização de atividades relacionadas a serviços de conservação e limpeza da copa, dos pátios, vidraças, pisos, sanitários e enceramento de pisos, além de manter os materiais da cozinha sempre limpos.

    Comprovado está, portanto, o exercício de atividades diversas daquelas do cargo em que foi investida a parte autora.

    Por consequência, fica a Administração obrigada a indenizá-la pelas diferenças remuneratórias existentes entre o seu cargo de investidura (Agente de Serviços Gerais) e o cargo efetivamente exercido de Agente de Portaria e Comunicação, entre 04/12/2008 e 04/12/2013, com exceção das substituições realizadas e devidamente remuneradas.

           No mesmo sentido, colhe-se da jurisprudência desta Corte de Justiça:

    DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. OCUPAÇÃO DO CARGO DE AGENTE DE SERVIÇOS GERAIS. EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES DE AGENTE DE PORTARIA E COMUNICAÇÃO. DESVIO DE FUNÇÃO CONFIGURADO. SÚMULA N. 378 DO STJ. DIREITO À INDENIZAÇÃO. A comprovação do exercício de atribuições destinadas para o cargo de Agente de Portaria e Comunicação, por servidora ocupante do cargo de Agente de Serviços Gerais, enseja o reconhecimento do desvio de função, cuja consequência é o direito de percepção das diferenças salariais devidas entre os cargos, conforme enunciado de Súmula n. 378 do STJ, em que restou pacificado o entendimento de que "reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes". REFLEXOS SALARIAIS. REFLEXO SOBRE AS FÉRIAS, 13º SALÁRIO E GRATIFICAÇÕES. PRECEDENTES. RECURSO ADESIVO PROVIDO NO PONTO. "Configurado o desvio de função em decorrência do exercício de atividade diversa daquela para a qual fora nomeado, tem o servidor o direito ao percebimento das diferenças de remuneração, com o reflexo sobre férias, 13º salário e gratificações" (TJSC, AC. n. 2007.028266-5, rel. Des. Volnei Carlin, j. 18.10.07). DIREITOS POSTULADOS PELOS SERVIDORES EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. APLICABILIDADE DO DECRETO N. 20.910/32. A prescrição aplicável na pretensão de servidor público em face do ente estatal relativamente à exigência de gratificação que entende ser devida é a quinquenal do Decreto n. 20.910/32. (...) SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA REFORMADA. APELAÇÃO CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. (TJSC, Apelação Cível n. 1018229-25.2013.8.24.0023, da Capital, Rel. Des. Francisco Oliveira Neto, Segunda Câmara de Direito Público, j. 16-10-2018).

           Como corretamente demonstrado na sentença, não há dúvida de que o apelante/autor, no tempo considerado para o cálculo da pretensão, ocupou o cargo de Agente de Serviços Gerais do Poder Judiciário e exerceu durante muito tempo as atribuições do cargo de Agente de Portaria e Comunicação na Comarca de Orleans. Por tal motivo, faz jus o autor/apelante ao percebimento das diferenças remuneratórias daí decorrentes, excluídos os períodos em que o autor exerceu substituições, por designação, consoante seu assentamento funcional (págs. 20-23), as quais foram devidamente remuneradas, como já previu o MM. Juiz na sentença.

           Da alegada suspensão do prazo da prescrição quinquenal

           Considerando que a presente ação foi proposta em 04.12.2013, o MM. Juiz excluiu da condenação as parcelas do período anterior a 04.12.2008, por considerar prescrita a respectiva pretensão de cobrança.

           Com seu recurso de apelação, objetiva a parte autora que seja considerado como fator de suspensão da marcha prescricional o requerimento administrativo apresentado pelo Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina - SINJUSC, realizado em 07/07/2008, pois que tal entidade representa a categoria do autor na busca da "correção do desvio de função dos servidores da Justiça Estadual Catarinense". Requer, também, que seja alterado o marco final para pagamento das diferenças para fevereiro de 2014, data em que teria cessado o desvio.

           Pois bem.

           Acerca da prescrição da pretensão de cobrança de dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim acerca de todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, no que interessa à análise, o Decreto n. 20.910/1932 estabelece:

    Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.

    [...]

    Art. 3º Quando o pagamento se dividir por dias, meses ou anos, a prescrição atingirá progressivamente as prestações à medida que completarem os prazos estabelecidos pelo presente decreto.

    Art. 4º Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la.

    Parágrafo único. A suspensão da prescrição, neste caso, verificar-se-á pela entrada do requerimento do titular do direito ou do credor nos livros ou protocolos das repartições públicas, com designação do dia, mês e ano.

           Ao estabelecer o marco inicial para o cálculo do crédito indenizatório reconhecido em favor do autor, determinou o MM. Juiz sentenciante que a contagem do prazo de prescrição quinquenal deveria retroagir da data do ajuizamento da ação, e não retroativamente à entrada do requerimento administrativo apresentado pelo SINJUSC, que, como sustenta o apelante, seria fator de suspensão da prescrição.

           Nesse ponto, não há reparo a ser feito na sentença, que acertadamente estabeleceu como marco inicial para a contagem retroativa do prazo prescricional quinquenal a favor da Fazenda Pública (art. 1°, Decreto n. 20.910/1932) a data do ajuizamento da ação (4/12/2013), fulminando a pretensão sobre os eventuais períodos em que laborou em desvio de função anteriormente a 4/12/2008.

           Assim ocorre porque o requerimento apresentado pelo SINJUSC, Sindicato que representa a categoria dos Servidores do Poder Judiciário de Santa Catarina, dentre os quais a parte autora, não tem por objetivo o pagamento de verbas remuneratórias decorrentes do desvio funcional reconhecido na sentença, mas sim "corrigir a situação das disfunções, unificando os grupos ocupacionais SDV (Serviços Diversos) e SAL (Serviços Auxiliares), criando um grupo ocupacional EQV (Extinto Quando Vagar), e uma tabela salarial própria e ampliando as atribuições aos ocupantes de cargos desse grupo" (p. 37).

           Desse modo, tendo em conta que o processo administrativo motivador do pleito de suspensão da marcha prescricional não tem relação com a pretensão de pagamento de verbas remuneratórias decorrentes do desvio funcional, mas tão-somente solucionar o "problema da disfunção perante o Egrégio TJ/SC" (fl. 38), não há caracterização do fator suspensivo prescricional previsto no art. 4º do Decreto n. 20.910/1932. A suspensão da prescrição prevista no referido dispositivo ocorre durante a demora para o estudo de requerimento administrativo pela respectiva repartição ou servidor encarregado de apreciar a existência ou o pagamento de dívida a favor do titular do direito postulado, o que, como aferido, não ocorre na espécie, nem coletiva, nem individualmente.

           Nesse sentido decidiu este Tribunal de Justiça no acórdão que apreciou a Apelação Cível n. 1018229-25.2013.8.24.0023, da Capital, em que foi relator o digno Desembargador Francisco Oliveira Neto, de cujos fundamentos traslada-se o seguinte:

    Pois bem. No caso em tela, restou comprovado que a autora esteve em desvio de função desde outubro de 2000. Diante disso, a considerar que a demanda foi ajuizada em 18.7.13, o MM. Juiz proferiu sentença em que declarou prescritas as parcelas anteriores a 18.7.08, razão pela qual não há o que se alterar.

    Por fim, em relação ao argumento de que a contagem do prazo prescricional desde 7.7.09 está suspensa, razão não lhe assiste.

    É que, da análise do caderno processual, observa-se que os documentos juntados pela autora não demonstram que o SINJUSC - Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina postulava, por meio de recurso administrativo, o pagamento das diferenças salariais dos servidores; ao revés, dos documentos juntados percebe-se que o pleito se refere à "correção da situação de disfunção, unificando os grupos ocupacionais SDV (serviços diversos) e SAL (serviços auxiliares), criando um grupo ocupacional EQV (extinto quando vagar)" (fl. 27), não havendo, portanto, provas de que houvesse requerimento para pagamento das diferenças.

    Aliás, verifica-se à fl. 29 que, apesar de o sindicato citar a Súmula n. 378 do STJ, que reconhece o direito à indenização daqueles que se encontram em desvio de função, o pedido final do requerente é a "solução do problema de disfunção perante o Egrégio TJ/SC".

    Em outras palavras, o que se percebe é que o objetivo do requerimento feito pelo Sinjusc é extinguir o grupo de "serviços diversos" e o de "serviços auxiliares", criando uma categoria única de servidores e ampliando as atribuições dos ocupantes de cargos dessa nova categoria, a fim de acabar com a situação de disfunção existente (fl. 28).

    Portanto, não logrou êxito a parte autora a comprovar fato constitutivo de seu direito - existência de processo administrativo pendente de julgamento que tenha o condão de suspender do prazo prescricional -, ônus que lhe incumbia, conforme art. 373, I do CPC.

    Dessa forma, agiu corretamente o magistrado de primeiro grau ao considerar prescritas as parcelas anteriores a 18.7.08, isto é, cinco anos antes da propositura da presente ação, devendo ser mantida a sentença no ponto. (TJSC - Segunda Câmara de Direito Público, j. em 16-10-2018; grifou-se).

           Portanto, ausente requerimento administrativo hábil a suspender a prescrição sobre a pretensão de pagamento de dívida decorrente de desvio funcional do cargo ocupado pela parte autora, utiliza-se a data da propositura da ação (4/12/2013) para a contagem do prazo da prescrição quinquenal, o que torna prescrita a pretensão de cobrança ou indenização das parcelas anteriores a 4/12/2008, como acertadamente apontado na sentença.

           Marco final do período indenizatório

           Em relação ao marco final para apuração do cálculo da dívida relativa ao desvio de função reconhecido na sentença, tem razão o apelante/autor.

           Isso porque, como se confere da petição inicial, o pedido apresentado pelo autor está assim formulado:

    c) ao final, após a produção de prova pelos meios em direito admitidos, ouvido o digno representante do Ministério Público, seja julgada procedente a demanda, com a condenação do réu no pagamento das diferenças remuneratórias decorrentes do desvio de função entre o cargo de Agente de Serviços Gerais e Agente de Portaria e Comunicação, parcelas vencidas e vincendas, ressalvadas aquelas do período imprescrito, bem como os reflexos nas vantagens recebidas pelo autor que tenham como base de cálculo o vencimento, tais como férias, gratificações natalinas, etc., em valores atualizados à data do pagamento e acrescido dos juros legais, ou, sucessivamente, de indenização em valor equivalente; (fl. 13).

           Como se observa, a ressalva do pedido diz com "aquelas (parcelas) do período imprescrito", de modo que o marco final para apuração do valor da condenação, relativo às parcelas dos meses em que o autor laborou em desvio de função - a contar da data de 4/12/2008, como alhures assentado - , será a data do término da irregularidade funcional, ocorrida até fevereiro de 2014, como apontado no documento acostado à página 170 do caderno processual, considerando-se, destarte, tanto as prestações vencidas quando do ajuizamento da ação, como aquelas então vincendas, que se perfectibilizaram no curso do feito (art. 290 do Código de Processo Civil de 1973; art. 323 do Código de Processo Civil de 2015).

           Logo, no ponto, a sentença segue alterada, apenas para assentar que o termo final da pretensão ocorre com o cessamento da irregularidade funcional do desvio de função, de sorte que são devidas as prestações até fevereiro de 2014.

           Dos consectários da mora

           A sentença estipulou os seguintes índices a título de correção monetária e juros de mora:

    As verbas vencidas deverão ser acrescidas de correção monetária pelo INPC até a entrada em vigor da Lei 11.960/2009 (29/06/2009) e, a partir de 30/6/2009, pelo índice de atualização aplicável à caderneta de poupança. A contar da citação, os juros de mora e a correção monetária serão aplicados de forma conjunta, pelos índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança, nos moldes do que dispõe o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, na redação dada pela Lei n. 11.960/2009 (TJSC, AC 2012.087988-0, Rel. Des. Subst. Francisco Oliveira Neto, j. 23/6/2015).

           Como se observa, a sentença fixou o INPC como índice para correção monetária até 30/6/2009, a partir de quando a correção será pelo índice de atualização aplicável à caderneta de poupança (TR). Determinou que os juros de mora e a correção monetária, a contar da citação, serão aplicados de forma conjunta pelos índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança.

           Sendo assim, em razão da impossibilidade de "reformatio in pejus" em detrimento da Fazenda Pública, já que não houve recurso de parte do autor, no particular ("tantum devolutum quantum apellattum"), os consectários legais fixados na sentença permanecem como lançados.

           Por fim, considerando que a parte autora/apelante decaiu de parte ínfima do pedido inicial apresentado, não merece alteração a distribuição da sucumbência realizada pelo Juízo sentenciante, que executou tal tarefa de modo adequado.

           A sentença, portanto, segue alterada apenas em relação ao "dies ad quem" da pretensão, permanecendo incólume em todos os seus demais aspectos.

           Pelo exposto, dá-se parcial provimento ao recurso de apelação interposto pelo autor, tão-só para assentar que o termo final da condenação ocorre com o cessamento da irregularidade funcional do desvio de função, ou seja, são devidas as prestações até fevereiro de 2014; e se nega provimento à remessa necessária.


Gabinete Desembargador Jaime Ramos