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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0004428-13.2009.8.24.0019 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Hélio do Valle Pereira
Origem: Concórdia
Orgão Julgador: Quinta Câmara de Direito Público
Julgado em: Thu Dec 06 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: João Bastos Nazareno dos Anjos
Classe: Apelação Cível

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STJ: 362, 54

 


Apelação Cível n. 0004428-13.2009.8.24.0019, de Concórdia

Relator: Desembargador Hélio do Valle Pereira

   RESPONSABILIDADE CIVIL - FORNECIMENTO EQUIVOCADO DE MEDICAMENTO POR FARMÁCIA MUNICIPAL - TRANSPLANTE DE CÓRNEA - CEGUEIRA EM UM OLHO - PERDA DE UMA CHANCE - PROVA SUFICIENTE.

   1. Não existe, à exceção do campo filosófico, certeza. A prova processual pode mirá-la, mas como uma pretensão audaciosa, mais precisamente para se obter versão tão verossímil quanto possível.

   No caso, ainda que não haja demonstração absoluta da relação causal entre a falha administrativa (fornecimento errado de remédio) e o resultado, há um conjunto muito plausível, que supera a dúvida razoável que se deve exigir para condenação (mesmo no campo cível).

   2. A possibilidade de sucesso é indenizável. Não será o caso de reparar meras expectativas, desejos apenas subjetivos. Se o réu, porém, por sua conduta ilegítima, corta uma real perspectiva de êxito, a situação cria o direito à reparação - que não será integral, mas proporcional à estimativa do bom resultado.

   Encampação da teoria da perda de uma chance.

   3. A medicina é ciência, mas figurativamente pode ser ainda lembrada como arte: há fatores de difícil prognóstico, que dasafiam a convicção plena.

   Ainda que se admita a existência de inúmeros fatores para rejeição de transplante, a utilização de remédio diverso do receitado pelo médico pode ter contribuído de forma relevante para a rejeição.

   4. Recurso provido em parte.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0004428-13.2009.8.24.0019, da comarca de Concórdia - 2ª Vara Cível em que é Apelante Charles Coldebella e Apelado o Município de Concórdia.

           A Quinta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, conhecer e dar provimento em parte ao recurso para condenar o réu ao pagamento de danos morais. Custas legais.

           Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Denise de Souza Luiz Francoski e Vilson Fontana.

           Florianópolis, 6 de dezembro de 2018.

Desembargador Hélio do Valle Pereira

Presidente e relator

 

           RELATÓRIO

           Esta apelação foi apresentada por Charles Coldebella em relação ao Município de Concórdia nos autos da ação de indenização em que os pedidos foram julgados improcedentes.

           Insiste na tese que trouxe com a petição inicial: após transplante de córnea, necessitou de prednisona e se dirigiu à farmácia municipal para obtê-lo uma vez que é fornecido apenas pela Secretária de Saúde. Por um equívoco do servidor público que o atendeu, o medicamento disponibilizado foi o piroxicam. Em consequência, ocorreu rejeição do transplante que resultou em cegueira de um olho. Defende a responsabilidade objetiva estatal, enfatizando que o lote de piroxicam que recebeu foi vendido apenas para o réu, o que ratifica que foi o Poder Público quem o distribuiu. Quer o provimento para que seja reparado material e moralmente.

           Houve contrarrazões em que a municipalidade nega que haja prova do fornecimento de medicamento errado. Aponta que mesmo que fosse assim, não está tampouco demonstrado que aquele fato poderia ser o causador do transplante mal sucedido.

            A Procuradoria-Geral de Justiça negou interesse no feito.

           VOTO

           1. O autor foi submetido a transplante e lhe foi prescrito prednisona (fls. 180-182), circunstâncias também referendadas pelo laudo pericial.

           Tem-se igualmente como certo que que a mãe do acionante esteve na farmácia municipal e lá foi atendida, haja vista confirmação pelas testemunhas. Sabe-se, ainda, que se deu a cegueira do olho transplantado, deixando o então adolescente com visão monocular.

           2. O eminente julgador compreendeu que não se demonstrou o vínculo etiológico entre a conduta administrativa e o padecimento do autor.

           São argumentos esgrimidos e que repito:

           (...)

           É certo que o autor padece de patologia denominada cerotocone e que, após a segunda cirurgia de transplante de córnea - dado o insucesso da primeira -, ao autor foi receitado o fármaco Prednisona, a fim de enfrentar o risco de rejeição.

           Para obter o tal medicamento, a mãe do autor se dirigiu à farmácia municipal (policlínica), ocasião em que surge as primeiras controvérsias deste feito: 1. Foi entregue algum medicamento no lugar do Prednisona? 2. Se sim, forneceu-se o Piroxicam?

           Para resolver essas duas inconsistências, foram colhidos depoimentos testemunhais a seguir:

           Ana Paula de Aguiar, preposta do Município, não presenciou a entrega do medicamento ao autor, tampouco soube explicar a ausência de data na fl. 17 no espaço atinente ao fármaco Prednisona.

           Por sua vez, Ivanete Pelizzari (informante), técnica de enfermagem, relatou que: trabalhava na farmácia da policlínica; entregava remédios mediante receita médica; recorda-se de ter atendido a mãe do autor, pois ela frequentava constantemente a farmácia; não se lembra exatamente do caso do autor; que se não assinou ao lado do nome do medicamento Prednisona, à fl. 17, é porque não o forneceu; o Piroxican pode ser encontrado em qualquer farmácia; trabalhou nessa farmácia por 11 ou 12 anos; não lembra se a discussão travada com a mãe do autor foi motivada pela troca de medicamentos; todas as receitas têm que passar por outro colega para conferência, antes de entregar o remédio.

           Jeter Leopoldo Slongo, farmacêutico, disse que não sabe o porquê de ter sido carimbado e não assinado ao lado do Prednisona (fl. 17), mas afirma ser improvável que alguém tenha fornecido e não tenha sido assinado. Não se lembra do teor da conversa que teve com a mãe do autor.

           Marineusa Boscatto Schinack diz ser amiga da família e conhece o autor há 20 (vinte) anos. Afirmou que acompanhou a mãe do autor até a policlínica, e viu que ela discutia com a funcionária da farmácia por ser a embalagem do medicamento diferente daquela primeira apanhada no mesmo local. Disse que a pessoa que entregou o medicamento à mãe do autor foi Ivonete. Noticiou que foi retirar o medicamento com a mãe do autor só na segunda vez, a qual disse que as embalagens não eram iguais.

           Impende salientar que, em resposta a ofício, a "Prati, Donaduzzi e Cia Ltda", laboratório fabricante do Piroxicam, confirmou que o lote 08F902 (o mesmo da cartela anexada à fl. 20) foi remetido ao Fundo Municipal de Saúde de Concórdia, em 03/07/2008 (fls. 162-163).

           Diante do quadro probatório delineado neste caderno processual, tenho que não ficou demonstrado que algum medicamento foi entregue no lugar do Prednisona, dado que, conforme denoto no documento de fl. 17, à frente do nome do fármaco não se apôs data ou assinatura, ao contrário do que ocorreu com o remédio da linha acima (Paracetamol).

           A cartela vazia de Piroxicam à fl. 20, malgrado tenha sido fornecida pelo ente municipal, não há prova de que o tal medicamento foi dispensado à mãe do autor naquela oportunidade em que buscava obter o Prednisona. Ressalto que, conforme ficou evidenciado na instrução, a genitora do autor frequentava constantemente a farmácia municipal, de sorte que pode ter obtido tal fármaco em outra ocasião.

           Porém, ainda que se admita a remota hipótese de fornecimento equivocado do medicamento, além de não haver prova de que o autor ingeriu o Piroxicam, o laudo pericial é sobremodo elucidativo ao expor que a rejeição da córnea recebida no transplante decorre de uma multiplicidade de fatores. Ademais, a perita também esclarece que a chance de sucesso do segundo transplante é menor que a do primeiro, bem como afirma que o autor ainda pode se submeter a um novo transplante de córnea.

           De mais a mais, oportuno gizar que o documento de fl. 18 apenas atesta o que foi afirmado ao médico, não servindo para provar que o autor, de fato, fez uso do Piroxicam.

           Em suma, a própria conduta consubstanciada na entrega do remédio errôneo não está bem demonstrada, haja vista que o que ficou provado é que o Prednisona não foi entregue (fl. 17), o que não significa necessariamente que o Piroxicam foi dispensado em seu lugar.

           3. Não obstante esses respeitáveis fundamentos, vejo o caso de forma diversa.

           O lote constante na cartela de fls. 48 - em posse do autor - foi vendido à Administração Pública (fls. 223). Então, não existe outra explicação possível que não a entrega do medicamento ao demandante (ou a alguém em seu nome). Sendo mesmo insistente: o remédio inaplicável ao mal de saúde foi da posse do Poder Público para o paciente.

           Há mais: o piroxicam não é vendido a farmácias particulares (fls. 216-217).

           Não era aquele, porém, o fármaco prescrito.

           Adito que a prova testemunhal confirmou uma discussão entre a mãe do acionante e a farmacêutica que disponibilizou o medicamento e, também, que o motivo do desentendimento foi a diferença de embalagem do medicamento fornecido em relação aos anteriores (fls. 237).

           Ainda que o Município diga que o remédio pudesse ter sido obtido a propósito de outra situação, a asserção não tem plausibilidade e seria mesmo de ônus de prova de quem alega o evento. Não se pode supor que não haja um controle quanto aos remédios dados à população; quer dizer, se houve, anteriormente, a disponibilização do produto ao autor, não parece inviável que a farmácia local não pudesse descrever como isso ocorreu.

           De se acrescentar que não houve o apontamento característico ao lado da receita, dando-se a assinatura que valeria, por assim dizer, por uma demonstração de que o compromisso fazendário com o paciente fora atendido.

           4. A partir daí, surgem duas versões (uma admitida pela sentença; outra que trago e resumi no item precedente).

           Estou convencido que a segunda tem maior força de persuasão, ainda que não tenha a ambição da certeza. Aliás, "a certeza é outro dogma, zelosamente guardado e cultivado entre os juristas e na teoria do processo. Ela tem muito a ver com a verdade, da qual constitui manifestação subjetiva. Considera-se que existe certeza quanto a determinada proposição, quando a mente afasta todos os motivos divergentes, ou seja, aqueles que conduziram a desacreditá-la, para então racionalmente aceitar os motivos convergentes (diz-se também: a certeza está em nós, a verdade nos fatos" (Cândido Rangel Dinamarco, A Instrumentalidade do Processo, RT, 1987, p. 336).

           Mais adiante pondera o autor: "em todos os campos do exercício do poder, contudo, a exigência da certeza é somente uma ilusão, talvez uma generosa quimera. Aquilo que muitas vezes os juristas se acostumaram a interpretar como exigência de certeza para as decisões nunca passa de mera probabilidade, variando somente o grau de probabilidade exigida e, inversamente, os limites toleráveis dos riscos" (p. 339).

           Como diz Ovídio Baptista da Silva, "a veracidade dos fatos judiciais, em verdade, não passa de simples verossimilhança" (Curso de Direito Processual Civil, v. I, Fabris, 1987, p. 57). Destarte, "não existe verdade, pois a verdade está no campo do impossível. A verdade varia de acordo com a subjetividade de cada um. A certeza seria a manifestação subjetiva de alguém a respeito de um dado, de onde pode surgir a verdade para ela, mas não para os outros ou para todos. Essa certeza - mesmo porque a subjetividade do próprio ser cognoscente pode mudar - não existe, ou existirá, como absoluta nem àquele que um dia afirmou. Toda certeza, pois, não passa de uma verossimilhança. Mas o juiz, nada obstante, deve procurar encontrar, por assim dizer, a verdade do caso concreto. A certeza acerca da afirmação de um fato" (Luiz Guilherme Marinoni, Novas Linhas do Processo Civil, Malheiros, 1996, p. 72).

           O fato é que - recapitulando - ainda que não se tenha conseguido reconstruir com exatidão os fatos, é muito verossímil a tese do autor, ou seja, que a repartição pública lhe deu o remédio errado e que ele então foi evidentemente usado.

           5. Ainda que assuma tais premissas, há mais outro aspecto: o erro administrativo foi de molde a causar o dano?

           O laudo pericial (fls. 180-181) no item 7 afirma que "o único tratamento para tentar reverter a rejeição do botão corneano é o corticosteróide" e o prednisona se encaixa nesta classe. No item 2 de fls. 182, a perita foi categórica ao responder "sim" sobre a contribuição do fornecimento equivocado do remédio para a rejeição do transplante.

           Dessa forma, resta comprovado que o tratamento com o prednisona teria, se não evitado a rejeição, pelo menos diminuído a perspectiva de sua ocorrência.

           Não se pode intuir que o autor viria a obrigatoriamente lograr êxito no transplante. Assim fosse, estaria o Judiciário se substituindo à opinião técnica dos especialistas e ao senso comum sobre os riscos de um transplante. É impossível que se faça julgamento baseado na convicção plena de que o transplante seria necessariamente exitoso, tal qual se fizesse o uso da medicação correta, submetido sempre e invariavelmente a resultado unívoco.

           Só que é mais evidente ainda que a possibilidade de uma aceitação da córnea era palpável. Ela não era certa, mas havia nítida probabilidade, visto que o laudo pericial e o atestado médico foram convergentes ao afirmar que a utilização de prednisona serve justamente para evitar a rejeição de transplante que maculou a visão do olho direito.

           Aplico a teoria relativa à perda de uma chance e como reforço trago, sempre uma satisfação, a doutrina de Fernando Noronha:

           Quando se fala em chance, estamos perante situações em que está em curso um processo que propicia a uma pessoa a oportunidade de vir a obter no civil, é porque esse processo foi interrompido por um determinado fato antijurídico e, por isso, a oportunidade ficou irremediavelmente destruída.

           (...)

           Essa perda de chance, em si mesma, caracteriza um dano, que será reparável quando estiverem reunidos os demais pressupostos da responsabilidade civil; em especial, será exigida culpa do agente quando a hipótese for de responsabilidade subjetiva e prescindir-se-á dela quando a responsabilidade for objetiva.

           (...)

           Como se vê, nos casos em que se fala em perda de chances parte-se de uma situação real, em que havia a possibilidade de fazer algo para obter uma vantagem, ou para evitar um prejuízo, isto é, parte-se de uma situação em que exista uma chance real, que foi frustrada. Já a situação vantajosa que o lesado podia almejar, se tivesse aproveitado a chance, é sempre de natureza mais ou menos aleatória. Todavia, apesar de ser aleatória a possibilidade de obter o benefício em expectativa, nesta caso existe um caso real, que é constituído pela própria chance perdida, isto é, pela oportunidade, que se dissipou, de obter no futuro a vantagem, ou de evitar o prejuízo que veio a acontecer. A diferença em relação aos demais danos está em que esse dano será reparável quando for possível calcular o grau de probabilidade, que havia, de ser alcançada a vantagem que era esperada, ou inversamente, o grau de probabilidade de o prejuízo ser evitado. O grau de probabilidade é que determina o valor da reparação." (Direito das Obrigações, 2ª ed. Saraiva, 2007, p. 669 e 671)

           Pelas razões há pouco postas, tenho que essa construção tem plena aplicabilidade à situação.

           A dificuldade óbvia está na apuração da indenização, posto que não se estará diante de um dano objetivamente delimitado. Deve-se apurar qual, por assim dizer, a estimativa pecuniária dessa chance perdida.

           Aí, socorro-me outra vez mais de Fernando Noronha:

           Em segundo lugar, nos casos em que a chance era real e séria, vai ser necessário estimar o valor desta. Para tal feito, é preciso considerar a álea de probabilidade, que havia, de vir a concretizar-se o resultado que estava em expectativa. Ainda aqui haverá que ocorrer às 'regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece', mesmo que agora também sejam importantes 'as regras experiência técnicas', também referidas no art. 335 do Código de Processo Civil. A probabilidade poderá ser alta ou reduzida; poderá até ser tão desprezível que nem possa ser tida como correspondendo a um interesse digno de tutela jurídica, se se considerar a função social das obrigações [1.3.3].

           A determinação do quantitativo a ser atribuído ao lesado vai depender da probabilidade, maior ou menor, que havia de que o resultado se concretizasse.

           Esse cálculo será relativamente fácil somente nos caos em que existam condições de determinar quais seriam o valor do dano total e o percentual de probabilidade. Assim, aproveitando um exemplo de Yves Chartier, reproduzido por Peteffi da Silva [2001, p. 28], se um advogado deixa de interpor um recurso em ação que, se tivesse sido julgada favoravelmente, traria uma vantagem econômica de dez mil reais, e se havia 30% de chances de reverter a sentença, a indenização final pela perda da chance deveria ser de três mil reais.

           Nos demais casos, o cálculo da probabilidade nunca será fácil, mas seguramente sem ser mais difícil do que nos casos de arbitramento de reparação por danos não patrimoniais [8.1.2; v. 2, cap 10].

           Note-se que o fato de a reparação ser concedida sob a forma de percentagem incidente sobre o valor que teria o dano final não significa que se esteja concedendo uma indenização parcial. A reparação, mesmo aqui, tem como medida a extensão do dano (cf. Código Civil, art. 944), ou seja, é integral. O que acontece é ter a chance perdida um valor menor do que o dano dito final." (op. cit., p. 680)

           No caso, a perícia descreveu que existe uma oscilação de 13,6% a 29,2% de rejeições de transplantes (fls. 181).

           Apanhada uma média entre as frações, tem-se uma perspectiva de 21,4% (ponto intermediário entre os citados 13,5% e 29,2%), ou (obviamente) 78,6% de êxito. Em outros termos, mesmo que tudo corresse conforme a técnica, ainda assim poderia haver fracasso. Não se tem como precisar a exata contribuição do medicamento para um possível sucesso, razão pela qual a arbitro em 50% as chances (mais exatamente, 50% de 78,6%), o que atinge uma chance de 39,3%.

           5. Os danos morais são presumidos.

           Não há o que se questionar acerca do sofrimento em perder totalmente a visão de um olho, ainda na fase da adolescência, acrescido dos tormentos de realizar não um, mas dois transplantes de córnea para tratar a sua enfermidade, além das preocupações das circunstâncias posteriores à cirurgia.

           Indiscutível que a visão monocular causa extremo padecimento.

           No contexto, atribuo à situação o valor de R$ 100.000,00, ponderando que evidentemente a quantia não vale como uma plena compensação pela perda; mas se deve ponderar que se está diante da responsabilidade fazendária objetiva, o que mitiga a reprovabilidade.

           Incidindo o posto no item anterior (39,3%), reduzo o valor para R$ 39.299,00.

           6. O autor ainda postulou danos materiais, meramente dispondo entre os pedidos isto: a) despesas de tratamento para a total recuperação, b) pensão vitalícia (parcelas passadas e futuras (fls. 34 e 35, alíneas ("a" a "c").

           Não consta, porém, que haja alguma sorte de tratamento que não seja atendido pelo serviço público. Não se apontou, ainda, despesa que já tenha ocorrido ou efetivamente redução do potencial de trabalho. Tudo que constou na inicial, a esse respeito, foi de tal modo lacônico que não permite juízo de valor desfavorável à Fazenda Pública.

           7. Assim, conheço e dou provimento ao recurso para condenar o réu ao pagamento de R$ 39.299,00, os quais serão corrigidos pela TR desde a sessão de julgamento deste acórdão (Súmula 362 do STJ, acrescentando-se juros de mora pela caderneta de poupança desde o fato - Súmula 54 do STJ).

           Esclareço que sigo a Lei 11.960/2009, haja vista o efeito suspensivo conferido pelo ao Temas 810 pelo STF, mas sem prejuízo que, na execução, se assim deliberado conclusivamente pelo STF quando da modulação daquele precedente, se aplique índice de correção monetária mais vantajoso.

           O réu pagará honorários advocatícios de 10% sobre aquele montante. Alerto que a pretensão de danos morais, ainda que maior, não gera efeitos para o cálculo da honorária, por ser meramente estimativa. A municipalidade não suportará custas.

           Já o autor, quanto à derrota relativa aos danos materiais, pagará honorários advocatícios de R$ 1.000,00, o que faço por equidade ante a dificuldade para quantificar a sua pretensão. Arcará ainda com 50% das custas, mas sempre respeitada a gratuidade.

           É o voto.


Gabinete Desembargador Hélio do Valle Pereira