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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0003337-71.2013.8.24.0042 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Luiz Felipe Schuch
Origem: Maravilha
Orgão Julgador: Primeira Câmara de Enfrentamento de Acervos
Julgado em: Wed Dec 05 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Solon Bittencourt Depaoli
Classe: Apelação Cível

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STJ: 7

Apelação Cível n. 0003337-71.2013.8.24.0042  

Apelação Cível n. 0003337-71.2013.8.24.0042, de Maravilha

Relator: Des. Subst. Luiz Felipe Schuch

   APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. NOTA PROMISSÓRIA. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS PARA EXCLUIR A EMBARGANTE DO POLO PASSIVO DA AÇÃO EXECUTÓRIA. RECURSO DA EMBARGADA. PLEITO DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. VIABILIDADE. INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS DECORRENTE DA DECRETAÇÃO DA FALÊNCIA. PRECARIEDADE FINANCEIRA EVIDENCIADA. EXEGESE DO ART. 5º, XXXV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ART. 98, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. BENEPLÁCITO DEFERIDO.

   AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE RECURSAL E DESERÇÃO DO RECURSO POR FALTA DE RECOLHIMENTO DE PREPARO. PEDIDOS DE NÃO CONHECIMENTO DO APELO FORMULADOS PELA EMBARGANTE/APELADA EM CONTRARRAZÕES. NÃO CONFIGURAÇÃO. REPETIÇÃO DE ARGUMENTOS QUE POSSIBILITAM A ANÁLISE DO REQUERIMENTO DE REFORMA. COMPATIBILIDADE COM OS TEMAS DEBATIDOS NA SENTENÇA. DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA POR ESTE ÓRGÃO JULGADOR. TESES REJEITADAS. RECLAMO CONHECIDO.

   INSURGÊNCIA DA EXEQUENTE. PLEITO DE RECONHECIMENTO DA SUCESSÃO EMPRESARIAL. TESE ACOLHIDA. EXECUTADA/SUCEDIDA QUE ENCERROU AS ATIVIDADES, MAS PERMANECEU EM EXERCÍCIO COM IDÊNTICOS RAMO COMERCIAL, NOME FANTASIA E LOCAL DE FUNCIONAMENTO DA EMBARGANTE, EMBORA RESGUARDADA POR RAZÃO SOCIAL E CNPJ DIVERSOS. PERMANÊNCIA DO SÓCIO-PROPRIETÁRIO DA DEVEDORA PRIMEVA ("ADENAU INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE MÓVEIS LTDA.") COMO REPRESENTANTE LEGAL DE SÓCIA-ADMINISTRADORA DA EMPRESA SUCESSORA ("SCHIELKE & CIA LTDA."). LAÇOS FAMILIARES ENTRE OS SÓCIOS. INDÍCIOS SEGUROS DE CONFUSÃO PATRIMONIAL. CERTIDÃO EMITIDA POR OFICIAL DE JUSTIÇA ATESTANDO A IMPOSSIBILIDADE DE PROCEDER À PENHORA DOS BENS DA EXECUTADA ORIGINÁRIA, DIANTE DA NOTÍCIA DE MUDANÇA DO RESPECTIVO ESTABELECIMENTO PARA O MUNICÍPIO ONDE SE SITUA A SUCESSORA (CUNHA PORÃ/SC). TRANSFERÊNCIA PARCIAL DO FUNDO DE COMÉRCIO INCORPÓREO, CONSUBSTANCIADO NA CLIENTELA DA EMPRESA. MANUTENÇÃO DO NOME DE FACHADA "ADENAU" NA SOCIEDADE CUJA SITUAÇÃO CADASTRAL ESTÁ ATIVA, DADA A NOTORIEDADE DA MARCA NA REGIÃO. REQUERIMENTO DE BAIXA DA PESSOA JURÍDICA SUCEDIDA REALIZADO HÁ CERCA DE OITO ANOS PERANTE O ÓRGÃO COMPETENTE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA DESVINCULAÇÃO DA EMBARGANTE COM O PATRIMÔNIO DA EXECUTADA PRIMEVA. SUBSTRATO PROBATÓRIO APTO A DEMONSTRAR A CONFIGURAÇÃO DA SUCESSÃO DE FATO ENTRE AS EMPRESAS, EVIDENCIADA PELA EXPLORAÇÃO DE IGUAL ATIVIDADE ECONÔMICA E NOME FANTASIA. APLICABILIDADE DA TEORIA DA APARÊNCIA. ELEMENTOS PERMISSIVOS DO REDIRECIONAMENTO DA EXPROPRIATÓRIA EM FACE DA SUCESSORA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 133 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL E 1.146 DO CÓDIGO CIVIL. ORIENTAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRECEDENTE ESPECÍFICO DESTA CORTE, EM JULGAMENTO DE CASO IDÊNTICO ENVOLVENDO AS MESMAS PARTES. SENTENÇA REFORMADA. 

   INVERSÃO DOS ENCARGOS SUCUMBENCIAIS. CONDENAÇÃO EXCLUSIVA DA EMBARGANTE AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, CONFORME PRECEITO DO ART. 85, CAPUT E § 2º DA LEI ADJETIVA CIVIL.

   RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0003337-71.2013.8.24.0042, da comarca de Maravilha 1ª Vara em que é apelante Massa Falida de Maxi Fomento Mercantil Ltda e apelada Schielke & Cia Ltda EPP.

           A 1ª Câmara de Enfrentamento de Acervos decidiu, por unanimidade, (a) conhecer do recurso e dar-lhe provimento para (a.1) deferir o benefício da justiça gratuita à embargada, em razão da sua condição falimentar, (a.2) reconhecer a sucessão empresarial entre as empresas Adenau Indústria e Comércio de Móveis Ltda. e Schielke & Cia Ltda. (Adenau Móveis) e, por conseguinte, (a.3) determinar o redirecionamento da ação de execução n. 042.04.000448-3 contra a sucessora (Schielke & Cia Ltda.), bem como (b) redistribuir os encargos sucumbenciais para condenar a embargante ao pagamento integral das custas processuais e honorários advocatícios em favor do causídico da embargada, estes arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, caput e § 2º da Lei Adjetiva Civil. Custas legais.

           O julgamento, realizado em 5 de dezembro de 2018, foi presidido pelo Desembargador Guilherme Nunes Born, com voto, e dele participou o Desembargador Substituto José Maurício Lisboa.

           Funcionou como representante do Ministério Público o Procurador de Justiça Alexandre Herculano Abreu.

           Florianópolis, 10 de dezembro de 2018.

Luiz Felipe Schuch

RELATOR

 

           RELATÓRIO

           Acolho o relatório da sentença de fls. 110-112v, de lavra do Juiz de Direito Solon Bittencourt Depaoli, por contemplar precisamente o conteúdo dos presentes autos, ipsis litteris:

    SCHIELKE & CIA LTDA, pessoa jurídica de direito privado, CNPJ n.º 02.282.925/0001-06, estabelecida à Linha Glória do Meio, Interior do Município de Cunha Porã/SC, por procurador constituído, ajuizou os presentes Embargos à Execução em face de Massa Falida da Maxi Fomento Mercantil Ltda.

    Aduziu, em síntese: (a) preliminarmente, que a apresentação dos presentes embargos é tempestiva posto que protocolado dentro do prazo legal; (b) que é necessária a atribuição de efeito suspensivo aos embargos, eis que preenchidos os requisitos legais previsto no art. 739-A, do CPC; (c) que a parte embargante é ilegítima para figurar no polo passivo da execução apensa, posto que não caracterizada a sucessão de empresa, matéria esta que será discutida no mérito; (d) no mérito, que a embargante não é sucessora da empresa Adenau Indústria e Comércio de Móveis Ltda, não sendo obrigada a assumir seus débitos; (e) que os requisitos exigidos pelo art. 133, do Código Tributário Nacional para a caracterização da responsabilidade tributária ou de terceiros da sucessora não estão presentes no caso em apreço, porquanto não houve transferência de patrimônio, instalações, clientela ou empregados entre a executada e a embargante; (f) que muito embora ambas as empresas desenvolvam atividade econômica de comércio e fabricação com madeiras brutas e beneficiadas, possuem endereços distintos e inexiste qualquer vinculação patrimonial, sendo que a embargada não logrou êxito em comprovar que os requisitos do art. 133 do Código Tributário Nacional para a caracterização da sucessão no caso concreto; (g) que a empresa executada Adenau Indústria e Comércio de Móveis Ltda, pessoa jurídica de direito privado, CNPJ n.º 79.933.115/0001-99, tem como sede localizada na Avenida Engenheiro José Leal Filho, centro de Maravilha/SC, constituída em 01/03/1987, tendo como sócios Adenau Alvadir Schielke e Mara Rúbia Schielke Heydt, cujo patrimônio, tanto da matriz quanto da filial de Ponte Serrada/SC, foram vendidos em hasta pública em processos promovidos pela embargada contra a executada, conforme informações constantes na execução apensa; (h) que já a empresa Schielke & Cia Ltda, CNPJ n.º 02.282.925/0001-06, localizado na Linha Glória do Meio, interior de Cunha Porã/SC, iniciou suas atividades em 01/12/1997, tendo como sócios iniciais Sediane Folle Schielke, Anabel Marta Buzatto e Enio Schmidt, sendo sócios atuais Romilda Schielke e Marcos Valmor Schlee, exercendo Adenau Alvadir Schileke a função de representante através de poderes outorgados pela sócia administradora Romilda Schielke, por instrumento público, bem como funcionário admitido em 02/05/2012 como auxiliar-administrativo; (i) que verifica-se que as empresas exercem atividade há vários anos de forma concomitante e cada qual com suas instalações e equipamentos, possuindo também endereços e clientelas distintas; (j) que o simples fato de tratar-se de empresas da mesma família não é suficiente para caracterizar a sucessão e amparar o redirecionamento da execução, sendo que inexiste nos autos qualquer prova acerca da eventual aquisição, por parte da embargante, do estabelecimento da executada; (k) que a sucessão tributária, aplicada analogicamente ao caso, somente se verifica nos estritos limites do art. 133, do CTN, mediante a condição primeira e básica de transferência, a qualquer título, de fundo de comércio ou estabelecimento comercial ou industrial; (l) que sem que se demonstre o liame jurídico entre duas empresas, não há que se falar em sucessão de atividade empresarial para fins de responsabilidade tributária ou perante terceiros, recaindo sobre a parte exequente o ônus de tal prova; (m) que em caso de manutenção da decisão atinente à sucessão de empresas, devem ser excluídos do cálculo os juros de mora, eis que inexiste mora da embargante, conforme art. 396, do Código Civil.

    Em arremate, pugnou pela atribuição de efeito suspensivo aos embargos e, no mérito, pela procedência dos mesmos para excluir a embargante do polo passivo da execução apensa, eis que inexistente a sucessão de empresas, ou, ainda, em caso de manutenção, sejam afastados do calculo os juros de mora, eis que inexistente a mora, nos termos do art. 394, do Código Civil.

    Valorou a causa e juntou documentos (fls. 11/79).

    Recebidos os embargos com efeito suspensivo (fl. 83).

    Impugnação apresentada pela parte embargada (fls. 85/88),em que se alegou, em suma: (a) que a sucessão de empresa salta aos olhos no caso telado, havendo provas documentais irrefutáveis que ampara sua declaração pelo juízo, não merecendo provimento os embargos manejados; (b) que o nome da sucessora é Schielke & Cia Ltda quando o nome da sucedida era Adenau Indústria e Comércio de Móveis Ltda, de propriedade de Adenau Schielke; (c) que o ramo de negócios é idêntico, ou seja, fabricação de móveis com predominância em madeira, consoante pode ser visto no cartão de CNPJ; (d) que ambas as empresas são representadas pelo Sr. Adenau Alvadir Schielke; (e) que o Sr. Adenau Alvadir Schielke representou a empresa no troféu morada do verde do Município de Cunha Porã/SC, no ano de 2009; (e) que a oficial de justiça, que tem fé pública, certificou em cumprimento a mandado de penhora que a empresa executada teria se mudado para a Linha Glória, Interior de Cunha Porã/SC; (f) que parte dos funcionários da Adenau Indústria e Comércio de Móveis trabalha atualmente na empresa Schielke & Cia Ltda; (g) que ambas as empresas possuem o mesmo escritório contábil; (h) que a empresa Indústria e Comércio de Móveis Ltda responde por diversas ações de execução na Comarca de Maravilha/SC, não possuindo mais bens para penhora.

    Em fechamento, pugnou pela improcedência dos embargos, mantendo-se incólume a decisão que decretou a sucessão de empresa nos autos da execução.

    Houve despacho onde foi determinado a inclusão de prova emprestada junto aos autos de n.º 042.13.001430-5.

    Ao final, a embargante aportou aos autos as últimas alegações, pugnando pelo julgamento procedente do feito. (fls. 95/97).

           O Magistrado de primeiro grau procedentes os pedidos formulados nos embargos, nos seguintes termos:

    Diante de todo o exposto, com fulcro no art. 269, I, do Código de Processo Civil, julgo procedentes os presentes embargos para excluir a embargante do polo passivo da execução apensa (n.º 042.03.000561-4), eis que não evidenciada a aludida sucessão de empresas.

    Por força da sucumbência, condeno a parte embargada ao pagamento das custas processuais, bem como honorários advocatícios, estes desde já fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), atendidos os critérios estabelecidos no artigo 20, §4º, do CPC, bem como o célere trâmite processual.

    P. R. I.

    Com o trânsito em julgado, extraia-se cópia da presente e junte-se na execução apensa.

    Após, exclua-se o nome da embargante do polo passivo da execução apensa, levantando-se a constrição existente sobre os seus bens e intimando-se a credora para dar andamento ao feito executivo, no prazo de 30 (trinta) dias.

           Irresignada com a prestação jurisdicional entregue, a embargante interpôs apelação (fls. 115-117), sustentando, em suma, a necessidade de reconhecimento da sucessão empresarial ocorrida entre as empresas Adenau Indústria de Móveis Ltda. e Schielke & Cia Ltda. (embargante). Por fim, requer a inversão dos encargos sucumbenciais, com a condenação da parte adversa ao pagamento integral das custas processuais e honorários advocatícios.

           A embargada apresentou contrarrazões às fls. 121-129, pleiteando o não conhecimento do recurso da embargante por ausência de dialeticidade recursal e falta de recolhimento do preparo.

           O Ministério Público, em parecer de lavra do Procurador de Justiça Mário Gemin, opinou pelo conhecimento e parcial provimento do recurso, tão somente para conceder à apelante a gratuidade judiciária (fls. 134-136).

           É o relatório.

 

           VOTO

           De início, assinalo que, não obstante a existência de outros feitos mais antigos no acervo de processos distribuídos a este Relator, a apreciação do presente recurso em detrimento daqueles distribuídos há mais tempo não significa violação ao disposto no art. 12, caput, do novo Código de Processo Civil, uma vez que a Lei n. 13.256/2016 modificou a redação original do referido dispositivo legal para flexibilizar a obrigatoriedade de a jurisdição ser prestada em consonância com a ordem cronológica de conclusão dos autos. Observe-se que essa salutar alteração legislativa significou uma importante medida destinada à melhor gestão dos processos aptos a julgamento, pois permitiu a análise de matérias reiteradas e a apreciação em bloco de demandas ou recursos que versem sobre litígios similares sem que haja a necessidade de espera na "fila" dos feitos que aguardam decisão final, o que contribui sobremaneira na tentativa de descompressão da precária realidade que assola o Poder Judiciário em decorrência do assombroso número de lides jurisdicionalizadas.

           Trata-se de recurso de apelação interposto por Massa Falida de Maxi Fomento Mercantil Ltda. contra sentença que nos autos dos embargos à execução opostos em seu desfavor por Schielke & Cia Ltda., julgou procedentes os pedidos formulados pela embargante e condenou a embargada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais, estes arbitrados em R$ 1.000,00 (mil reais).

           A priori, adianta-se que o pedido de concessão do benefício da justiça gratuita formulado pela embargada/recorrente na peça de interposição do recurso de apelação (fl. 115) deve ser deferido, porquanto, em que pese se tratar de pessoa jurídica de direito privado, a empresa se encontra em situação de falência (autos n. 0000762-78.2002.8.24.0042), demonstrando, com isso, excessiva e justificada dificuldade para arcar com as custas, despesas processuais e honorários advocatícios, nos termos do art. 98, caput, do Código de Processo Civil c/c art. 5º, XXXV, da Constituição Federal de 1988.

           PEDIDOS FORMULADOS EM CONTRARRAZÕES

           1 Deserção e ausência de dialeticidade recursal

           Anota-se, desde já, o afastamento das preliminares suscitadas em contrarrazões relativas à ausência de dialeticidade recursal e deserção do recurso por falta de recolhimento de preparo.

           Isso porque, embora haja semelhança entre os fundamentos lançados na impugnação aos embargos e no presente recurso, compulsando as razões da apelação é possível verificar quais os argumentos de fato e de direito com os quais a apelante busca a reforma da sentença recorrida, o que se mostra suficiente para cumprimento dos requisitos de admissibilidade estabelecidos no art. 1.010, II e III, da nova Lei Processual, com equivalência no art. 514, II, do antigo Código de Processo Civil.

           De outro lado, inviável o reconhecimento da deserção do recurso, porquanto deferido o benefício da justiça gratuita à recorrente/embargada por este Órgão Julgador, em razão da sua condição falimentar.

           Logo, afastam-se as preliminares suscitadas pela recorrida e, diante do preenchimento dos requisitos de admissibilidade, conhece-se do recurso de apelação.

           APELAÇÃO DA EMBARGADA

           Busca a embargada/recorrente a reforma da sentença objurgada a fim de reconhecer a ocorrência da sucessão empresarial entre as empresas Adenau Indústria e Comércio de Móveis Ltda. (executada originária) e Schielke & Cia Ltda., ora embargante/apelada.

           Razão lhe socorre.

           Com efeito, o art. 1.146 do Código Civil dispõe que "o adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de um ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento".

           Convém transcrever, ainda, a regra tributária inserida no art. 133, incisos I e II, do Código Tributário Nacional, segundo a qual o adquirente do fundo de comércio ou estabelecimento empresarial de empresa que continua na mesma atividade é responsável pelos tributos devidos pelo estabelecimento adquirido, devidos até a data do ato. Senão vejamos:

    Art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até à data do ato:

    I - integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade;

    II - subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de seis meses a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou profissão.

           Importante determinação, também, encontra-se disposta no parágrafo único do art. 132 do CTN, na medida em que se estende a regra da sucessão tributária "aos casos de extinção de pessoas jurídicas de direito privado, quando a exploração da respectiva atividade seja continuada por qualquer sócio remanescente, ou seu espólio, sob a mesma ou outra razão social, ou sob firma individual".

           Nesse trilho, antes de se adentrar no exame específico da ocorrência da sucessão empresarial, impende conceituar o que representa o fundo de comércio. Segundo lição de Kiyoshi Harada e Marcelo Kiyoshi Harada, "pode-se dizer genericamente que o fundo de comércio é a designação que abrange a soma de bens corpóreos (instalações, máquinas, móveis, etc.) e incorpóreos (marca, nome empresarial, ponto comercial, etc.) que compõem um estabelecimento comercial, industrial ou profissional" (Código Tributário Nacional comentado, 2. ed. São Paulo: Rideel, 2016, p. 193).

           Então, é consabido que para implementação da atividade empresarial se faz necessária a reunião de bens indispensáveis ao objetivo econômico pretendido e, a todos esses bens reunidos, materiais ou imateriais, dá-se o nome de estabelecimento empresarial, também conhecido como fundo de comércio. Assim, por mais rudimentar que seja a atividade empresarial, não se concebe a existência de um empresário sem o respectivo estabelecimento.

           Acerca do tema, lecionam Marcelo M. Bertoldi e Marcia Carla Pereira Ribeiro:

    Como um complexo de bens, o estabelecimento comercial é formado por elementos materiais e imateriais. Os primeiros são todos os bens tangíveis, tais como imobiliário, maquinários, utensílios, produtos em estoque, instalações, veículos, etc. Por outro lado, são imateriais aqueles bens de propriedade do empresário que não são suscetíveis de apropriação física e que são fruto da inteligência ou do conhecimento humano, como é o caso dos bens integrantes da propriedade industrial (patente de invenção, modelo de utilidade, desenho industrial e a marca), o segredo industrial, o nome empresarial e o ponto (local onde o empresário está localizado) (Curso avançado de direito comercial, 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 113).

           Sílvio de Salvo Venosa complementa:

    Os bens que compõem o estabelecimento são todos os necessários para a exploração da atividade, incluindo bens móveis e os incorpóreos. Entre os primeiros, podem-se elencar os maquinários, estoques, instalações, matéria prima etc. e, entre os últimos, o ponto empresarial, marcas, desenhos industriais, título do estabelecimento, softwares, entre outros. A organização de todos esses bens forma o aparato para a exploração da empresa.

    A reunião desses bens de forma organizada cria a capacidade de gerar resultados econômicos para o empresário, proveito esse que não obteria sem tal organização. Essa aptidão de gerar resultados denomina-se aviamento, fundo de comércio ou, no sentido empresarial, goodwill. [...] (in Código Civil Interpretado. 3. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2013, pp. 1326-1327).

           Dessarte, significa dizer que se um empreendedor adquire o prefalado conjunto de bens e continua a explorá-los, mesmo que sob outra razão social, torna-se responsável pelas obrigações da empresa que lhe transferiu o instrumento daquela atividade empresarial.

           Por outro lado, para configuração da sucessão empresarial é necessária a comprovação da aquisição do fundo de comércio ou do estabelecimento comercial, admitindo-se, contudo, a sua presunção quando existentes indícios da transferência. Assim, "se alguém ou mesmo uma empresa adquire de outra os bens do ativo ¿xo e o estoque de mercadorias e continua a explorar o negócio, presume-se que houve aquisição de fundo de comércio, con¿gurando-se a sucessão  e a transferência da responsabilidade tributária" (COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018. p. 534).

           De outro tanto, além dos casos expressamente previstos em lei, a sucessão empresarial, excepcionalmente, pode ser presumida quando a sucessora, tendo o mesmo objeto social, mesmo endereço, identidade de sócios, prossegue explorando idêntica atividade da empresa sucedida e utilizando a mesma clientela e nome fantasia. Ou seja, o fenômeno sucessório pode ser presumido a partir da prova indiciária convincente (matéria de fato, caso a caso), quando então nasce para a exequente o direito de requerer o redirecionamento da ação expropriatória.

           É que não raras vezes as empresas encobertam-se por artifícios fraudulentos a fim de lesar credores, atuando nas entrelinhas da legislação comercial, precipuamente diante das peculiaridades da criação e extinção das pessoas jurídicas no ordenamento pátrio.

           Nesse sentido, confira-se: TJSC, Agravo de Instrumento n. 4001934-86.2017.8.24.0000, de Joinville, rel. Des. Fernando Carioni, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 31-7-2018; Apelação Cível n. 0008419-84.2010.8.24.0011, de Brusque, rela. Desa. Janice Goulart Garcia Ubialli, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 5-9-2017 e Agravo de Instrumento n. 4009031-74.2016.8.24.0000, de Fraiburgo, rel. Des. Luiz Fernando Boller, Primeira Câmara de Direito Público, j. 24-10-2017.

           A propósito, colhe-se de precedentes do Superior Tribunal de Justiça:

    TRIBUTÁRIO - SUCESSÃO EMPRESARIAL - ART. 133 DO CTN - SÚMULA 7/STJ.

    1. O art. 133 do CTN é de aplicação restrita aos casos em que uma pessoa natural ou jurídica adquire de outra fundo de comércio ou estabelecimento.

    2. In casu, verifica-se que o Tribunal a quo reconheceu não ter havido comprovação de qualquer aquisição de fundo de comércio ou de estabelecimento comercial.

    3. Para concluir que houve sucessão empresarial, apta a ensejar a responsabilidade tributária da recorrida, faz-se mister o reexame de aspectos fáticos; inviável na instância especial, à luz da Súmula 7/STJ.

    Recurso especial não-conhecido.

    (REsp 768.499/RJ, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, j. 3-5-2007, grifou-se).

    TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. ALIENAÇÃO DE FUNDO DE COMÉRCIO. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DA EMPRESA SUCESSORA. ART. 133, I, DO CTN.

    I - O art. 133, I, do CTN responsabiliza integralmente o adquirente do fundo de comércio, pelos débitos tributários contraídos pela empresa até a data da sucessão, quando o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade.

    II - Comprovada a alienação do fundo de comércio, a execução deverá ser dirigida primeiramente ao sucessor deste.

    III - Recurso especial improvido.

    (REsp 706.016/RS, rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, j. 26-4-2005, grifou-se).

           Em resumo, se houver indícios da ocorrência de sucessão de empresas, é plenamente aceitável o redirecionamento da execução em desfavor da empresa sucessora.

           Pois bem.

           A controvérsia encontra-se adstrita à (i)legitimidade da empresa Schielke & Cia Ltda. para figurar no polo passivo da ação de execução n. 042.03.000561-4, diante da possível sucessão empresarial ocorrida entre esta e a empresa Adenau Indústria e Comércio de Móveis Ltda. (executada primeva), cuja baixa fora requerida no ano de 2010 perante o órgão competente - segundo declarações do seu representante legal, Sr. Adenau Alvadir Schielke (CD de mídia audiovisual de fl. 104).

           Ao arrazoar o recurso, a embargada Massa Falida Maxi Fomento Mercantil Ltda., aventou diversas teses, das quais cumpre ressaltar resumidamente (fl. 117):

    "a) o nome da sucessora é SCHIELKE & CIA LTDA quando o nome da sucedida era ADENAU INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE IMÓVEIS LTDA., de propriedade de ADENAU SCHIELKE;

    b) O ramo de negócios é idêntico, ou seja, FABRICAÇÃO DE MÓVEIS COM PREDOMINÂNCIA EM MADEIRA, consoante pode ser visto no cartão de CNPJ;

    c) Ambas as empresas são representadas pelo Sr. ADENAU ALVADIR SCHIELKE;

    d) O Sr. Adenau Alvadir Schielke representou a empresa no troféu morada do verde do Município de Cunha Porã/SC no ano de 2009;

    e) A Oficial de Justiça, que tem fé pública, registrou um mandado expedido nos autos de processo de exceução movida pela Massa Falida contra a empresa executada, que deixava de proceder à penhora em razão de que a empresa havia de mudado para a Linha Glória, no Município de Cunha Porã/SC [...];

    f) Parte dos funcionários da Adenau Indústria e Comércio de Móveis hoje trabalha na Schielke & Ltda., o que pode ser facilmente comprovado mediante a determinação para que as empresas apresentem seu Livro de Registro de funcionários;

    g) Ambas as empresas possuem o mesmo escritório contábil;

    h) A sócia proprietária da empresa SCHIELKE & CIA, ou seja, a Sra. Sediane Folle Schielke era esposa do Sr. Adenau Alvadir Schielke;

    i) A empresa Adenau Industria e Comércio de Moveis Ltda. Responde a diversas ações de execução na comarca de Maravilha e não possui mais bens para penhora".

           De plano, impende destacar que esta Corte, por meio do julgado de relatoria do eminente Desembargador Álvaro Luiz Pereira de Andrade, analisou os mesmos fatos narrados no presente processo, em ação envolvendo as mesmas partes e com idêntica discussão - sucessão empresarial entre Schielke & Cia Ltda. e Adenau Indústria e Comércio de Móveis Ltda. -, no qual, por unanimidade, a Câmara decidiu conhecer do recurso interposto pela embargante Schielke e negar-lhe provimento, mantendo incólume a sentença de primeiro grau que, naquele caso, reconheceu a sucessão das empresas. Colaciona-se a ementa:

    APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA DE UMA MÁQUINA LIXADEIRA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA (CPC/1973, ART. 269, I). 

    PRELIMINARES DE NULIDADE DA SENTENÇA. ADUZIDA OFENSA AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E ABSTENÇÃO DE APRECIAÇÃO DA TESE TRAZIDA NA EXORDIAL. NÃO ACOLHIMENTO. DOCUMENTOS APRESENTADOS PELA APELADA QUE JÁ INTEGRAVAM OS AUTOS. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO. DESNECESSIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 398 DO CPC/1973. PREAMBULAR REMANESCENTE QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO. 

    É prescindível a aplicação do disposto no art. 398 do CPC/1973 quando os documentos apresentados já constam dos autos, porquanto trazidos a par da petição inicial pela própria inconformada. 

    MÉRITO. SUSCITADA AUSÊNCIA DE SUCESSÃO EMPRESARIAL A PERMITIR A CONSTRIÇÃO IMPUGNADA. TESE AFASTADA. IDENTIDADE DO RAMO DE NEGÓCIO. NÃO COMPROVAÇÃO DA DESVINCULAÇÃO COM O PATRIMÔNIO DA EXECUTADA. CONTINUAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO DE FATO PELO SÓCIO DE OUTRORA. CONTRATO DE COMODATO QUE NÃO LHE OUTORGA A PROPRIEDADE. PRECEDENTES. 

    SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (Apelação Cível n. 0001654-33.2012.8.24.0042, de Maravilha, rel. Des. Álvaro Luiz Pereira De Andrade, 2ª Câmara de Enfrentamento de Acervos, j. 5-7-2018, grifou-se).

           Igual solução deve ser adotada no presente caso.

           Em análise detida ao processo de execução em apenso (n. 042.03.000561-4), verifica-se que o Magistrado singular também havia reconhecido a sucessão empresarial, em decisão interlocutória proferida naqueles autos, momento no qual constatou ser "no mínimo improvável que parentes haveriam de constituir outra pessoa jurídica voltada à exploração da mesma atividade econômica (fabricação de móveis), quando já havia instalada a empresa antiga/sucedida" (fl. 160).

           Ocorre que, quando da prolação da sentença objurgada, o Juiz a quo reconsiderou a orientação outrora adotada e julgou procedentes os pedidos formulados pela embargante para fins de excluí-la do polo passivo da ação de execução, com os seguintes fundamentos (fl. 111v):

      (a) a empresa Adenau Indústria e Comércio de Madeiras Ltda foi fundada em 1989, tendo encerrado suas atividades em 2010, quando foi declarada como "inativa", enquanto a empresa Schielke & Cia Ltda foi fundada em 1999, portando, funcionando as duas empresas concomitantemente, em locais distintos e com funcionários também distintos, tendo em vista que aquela tem sua sede no município de Cunha Porã/SC e esta em Maravilha/SC;

    (b) a empresa embargante transferia matéria prima à empresa Adenau mediante pagamento, não havendo confusão, portanto, do patrimônio de ambas, muito embora ambas pertencerem à mesma família e com o mesmo ramo de atuação;

    (c) ainda, o esvaziamento do patrimônio da devedora Adenau não deu-se em virtude da transferência deste à empresa embargada, mas sim pelas diversas alienações em hasta pública originadas pelas execuções existentes face àquela Empresa (grifos no original).

           Com a devida vênia, tenho que o Togado agiu com desacerto ao elencar as situações fáticas acima transcritas, pois forçoso reconhecer que outros elementos amealhados no presente feito e também no processo de execução em apenso eram preponderantes e recomendavam o reconhecimento da sucessão empresarial.

           Isso porque restou devidamente comprovado que a executada, até então sediada na comarca de Maravilha/SC, encerrou suas atividades no ano de 2010, quando requerida a baixa da pessoa jurídica perante o órgão competente, permanecendo, contudo, em exercício na comarca de Cunha Porã/SC - local onde se situava a embargante/sucessora -, com idêntico ramo comercial e nome fantasia (Adenau Móveis), embora resguardada por razão social e CNPJ diversos.

           Nesse contexto, verifica-se que a Oficiala de Justiça, em cumprimento ao mandado de penhora e intimação expedido nos autos da expropriatória em apenso, deixou de proceder à penhora, "em virtude de que a empresa executada não se encontra mais estabelecida no endereço indicado", sendo que ao procurar informações para localizar o representante legal da referida, soube por meio de familiares que "a empresa executada mudou-se para o município de Cunha Porã" (fl. 154).

           Demais disso, é incontroverso (art. 334, III, CPC/73) que o Sr. Adenau Alvadir Schielke (proprietário da devedora primeva) atuava, em concomitância como representante legal da embargante/sucessora, consoante procuração que lhe fora outorgada no ano de 2005 para exercer tal múnus, "com amplos poderes para gerir e administrar todos os negócios e interesses da outorgante [...]" (fl. 33).

           Como se não bastasse, durante a audiência de instrução e julgamento (CD de mídia audiovisual de fl. 104), tanto o Sr. Adenau quanto a testemunha Nilton Buzzatto (sócio da empresa Schielke & Cia Ltda. entre os anos de 1999 e 2003) confirmaram que a Sra. Sediane Regina Folle Schielke (sócia majoritária da Schielke), era esposa de Adenau, revelando a existência de laços familiares entre os administradores e/ou membros societários das empresas.

           Além disso, há seguros indícios de confusão patrimonial - até mesmo porque a empresa Schielke & Cia Ltda., como visto alhures, utilizava-se do nome de fachada "Adenau Móveis", dada a notoriedade da marca na região. Diante de tal situação, aliada ao fato de que a embargante não comprovou suficientemente a desvinculação do seu patrimônio com o da executada primeva, resulta imperioso o reconhecimento da sucessão empresarial.

           Na mesma senda, cumpre destacar do corpo do voto do recurso de apelação cível n. 1999.021346-3, de relatoria do Desembargador Newton Janke, o qual reconheceu, em caso análogo, a sucessão empresarial de fato:

    A identidade de endereço das empresas envolvidas, a constituição de uma com os bens adjudicados pelos ex-empregados da outra, a composição societária formada pelos ex-empregados antes litigantes na Justiça Trabalhista e próprio mandatário, a coincidência da criação e alteração da empresa apelada com a desativação implícita da devedora sem qualquer dissolução regular, a conservação do nome "Rank" na razão social, a ocorrência de todos estes fatos na mesma época em que as execuções fiscais foram ajuizadas compõem, sem dúvida, um eloqüente mosaico de artifícios fraudulentos a autorizar o redirecionamento da execução fiscal para os efeitos do art. 133 do Código Tributário Nacional e, por conseqüência, a manutenção da penhora impugnada. De fato, persiste a responsabilidade da pessoa jurídica de direito privado que adquirir outra e continuar na exploração da atividade pelos tributos devidos pela empresa adquirida.

    Artimanha, como a que vem retratada no processo, não pode ser chancelada pelo Judiciário. Por certo, semelhantes artifícios, engendrados para confundir e lesar os credores, especialmente o Fisco, dificilmente são formalizados por contratos de compra e venda do fundo de comércio ou do estabelecimento comercial, precisamente para obviar o art. 133 do CTN. O mais provável - e é esta a hipótese ora estudada - é a criação de outra empresa, com o mesmo objeto social, para a qual são transferidos todos os clientes, patrimônio, funcionários e saldos credores, restando à originária, tão somente, as dívidas. É o que se chama de "processo de canibalização".

    José da Silva Pacheco, ao tratar do tema, orienta que "no caso de extinção de pessoas jurídicas de direito privado, quando a exploração da respectiva atividade seja continuada por qualquer sócio remanescente ou seu espólio, sob a mesma ou outra razão social, ou sob firma individual, destes será a responsabilidade" (in Comentários à Lei da Execução Fiscal, 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 1997, p. 78).

    Em razão das peculiaridades da criação e extinção de empresas, muitas vezes encobertas pela malícia daquelas que atuam nas entrelinhas da legislação comercial, a prova da continuidade do negócio, independente da compra do fundo de comércio; pode limitar-se a indícios, como o mesmo endereço, composição societária, objeto e razão social.

    Não destoa deste entendimento o magistério de Sacha Calmon Navarro Coelho, segundo quem "a sucessão não precisa ser formalizada, admitindo a jurisprudência a sua presunção desde que existentes indícios e provas convincentes (matéria de fato, caso a caso). Assim sendo, se alguém ou mesmo uma empresa adquire de outra os bens do ativo fixo e o estique de mercadorias e continua a explorar o negócio, presume-se que houve aquisição de fundo de comércio, configurando-se a sucessão e a transferência da responsabilidade tributária" (in Curso de Direito Tributário Brasileiro, 2ª ed., Rio de Janeiro, 1999, p. 624).

    Assim sendo, a situação de fato revelada pela consistente prova documental apresentada é suficiente para caracterizar a sucessão empresarial e, em conseqüência, autorizar a penhora dos bens da empresa Industrial Moveleira Rank Ltda., em sintonia com os pronunciamentos da jurisprudência:

    "Direito Tributário. Débitos de ICM. Sucessão dissimulada de empresas, suscetível de ser demonstrada por meio de indícios e presunções. Responsabilidade da sucessora. Art. 133 do CTN. Caso em que o v. acórdão impugnado evidenciou circunstâncias suficientes para autorizarem a presunção de que houve, efetivamente, a alegada transferência do estabelecimento comercial. Erro de valoração da prova, que redundou em negativa de vigência do dispositivo legal acima citado. Recurso provido" (STJ, REsp n. 3828-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, DJU de 22.10.90, p. 11657).

    [...] Operando nova empresa no mesmo lugar e ramo de atividades, cujo imóvel foi adquirido após o deflagramento da execução fiscal, inegável que há incidência do art. 133, caput, do Código Tributário Nacional, autorizando a constrição requerida, porque ocorreu a compra do Fundo de Comércio" (TJSC, AI n. 01.003515-4, rel. Des. Francisco Oliveira Filho, j. 31.5.01, grifou-se).

           De igual norte, colacionam-se os seguintes precedentes, mutatis mutandis:

    1) Agravo de instrumento. Fraude à execução. Indícios veementes conducentes à fraudulenta sucessão empresarial. Comprovada a utilização da pessoa jurídica como instrumento para a prática de fraude. Alteração do nome empresarial, atividade econômica e sede, cinco meses após a citação e intimação da penhora. Constituição de nova sociedade quatro meses após a citação e intimação da penhora, explorando o mesmo ramo de atividade, com a instalação da sede no mesmo endereço da executada. Sucessão de empresas fraudulenta configurada. Continuidade dos negócios da pessoa jurídica executada. Responsabilidade por sucessão. Confusão patrimonial perante credores bem delineada. Crime de fraude à execução. Art. 179 do CP. Crime de ação penal privada. Descabimento do pedido de envio de peças ao Ministério Público. Incumbência da parte de ingressar com queixa crime. Recurso a que se dá parcial provimento. (TJSP, Agravo de Instrumento 0271521-07.2012.8.26.0000, rel. Des. Mauro Conti Machado, j. 18-2-2013).

    2) AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. [...] 1. A moderna jurisprudência pátria tem entendido que, além dos casos expressamente previstos em lei, a sucessão empresarial, excepcionalmente, pode ser presumida quando a sucessora, tendo o mesmo objeto social e o mesmo endereço, prossegue explorando idêntica atividade da empresa sucedida. Ou seja, admite-se a presunção do fenômeno sucessório a partir da prova indiciária convincente. 2. Nesse sentido, encontrando-se a empresa no mesmo ramo da antecessora e no mesmo local, tendo como sócio-gerente-administrador pessoa da família do quadro societário da empresa antecessora, fato que denota sucessão de empresas, devendo-se reconhecer a ocorrência do fenômeno e, consequentemente, os efeitos legais e materiais dela decorrentes. [...] (TJDF, Agravo de Instrumento n. 844337, rel. Des. Alfeu Machado, j. 28-1-2015).

    3) Embargos à execução. Inexistência de trespasse entre a empresa anteriormente instalada no imóvel e aquela que atualmente o ocupa. Improcedência. Apelação. Inteligência dos arts. 1.143, 1.144 e 1.146 do Código Civil. Requisitos para o trespasse. A jurisprudência vem admitindo o reconhecimento do trespasse, ainda que ausente o seu requisito formal de registro e ampla publicidade, em situações em que se verifica o intuito de fraude contra credores. Situação que espelha a realidade fática dos autos. Modificação das sedes empresariais na mesma data, mesmo ramo de atividade e aquisição dos caminhões que indicam a sucessão. Indícios suficientes de ligação entre a antiga e a nova empresa. Recurso desprovido. Sentença mantida. (TJSP, Apelação Cível n. 0002099-16.2010.8.26.0123, rel. Virgilio de Oliveira Junior, j. 28-1-2013).

           Dessarte, resultando inequívoca a sucessão de empresas ocorrida entre Schielke & Cia Ltda. (Adenau Móveis) e Adenau Indústria e Comércio de Móveis Ltda., reforma-se a sentença de primeiro grau in totum para fins de determinar o redirecionamento da ação de execução n. 042.04.000448-3 contra a sucessora (Schielke & Cia Ltda.).

           Por fim, diante da reforma do decisum que julgou procedentes os pedidos formulados nos embargos, a distribuição dos encargos sucumbenciais deverá ser reformulada, para condenar a embargante, de forma exclusiva, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em benefício dos causídicos da embargada Massa Falida de Máxi Fomento Mercantil Ltda., os quais fixo no importe de 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, caput e § 2º da Lei Adjetiva Civil.

           Com relação à verba honorária, seu arbitramento considerou o trabalho desenvolvido pelos causídicos da embargada em ambas as instâncias judiciais, o tempo de duração do processo, a natureza e a importância da demanda, além do valor econômico da causa. 

           Ante o exposto, voto no sentido de (a) conhecer do recurso e dar-lhe provimento para (a.1) deferir o benefício da justiça gratuita à embargada, em razão da sua condição falimentar, (a.2) reconhecer a sucessão empresarial entre as empresas Adenau Indústria e Comércio de Móveis Ltda. e Schielke & Cia Ltda. (Adenau Móveis) e, por conseguinte, (a.3) determinar o redirecionamento da ação de execução n. 042.04.000448-3 contra a sucessora (Schielke & Cia Ltda.), bem como (b) redistribuir os encargos sucumbenciais para condenar a embargante ao pagamento integral das custas processuais e honorários advocatícios em favor do causídico da embargada, estes arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, caput e § 2º da Lei Adjetiva Civil.

           É o voto.


Gabinete Des. Subst. Luiz Felipe Schuch