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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0300124-86.2018.8.24.0113 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Jânio Machado
Origem: Camboriú
Orgão Julgador: Quinta Câmara de Direito Comercial
Julgado em: Thu Dec 06 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Karina Müller Queiroz de Souza
Classe: Apelação Cível

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STF: 335

 


Apelação cível n. 0300124-86.2018.8.24.0113

Relator: Des. Jânio Machado

   APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. "CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE QUOTAS DE SOCIEDADE LIMITADA". PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO QUE É AFASTADA. PREVALÊNCIA DA CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA N. 335 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NEGÓCIO QUE FOI SUBSCRITO PELOS CREDORES, PELOS DEVEDORES E POR 2 (DUAS) TESTEMUNHAS. TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. ARTIGO 784, INCISO III, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DÍVIDA EXISTENTE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ARTIGO 783 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. POSSIBILIDADE DA COBRANÇA PELA VIA EXECUTIVA. ÔNUS PROBATÓRIO. ARTIGO 373, INCISOS I E II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. AUSÊNCIA DE QUALQUER ELEMENTO APTO A DESCONSTITUIR O TÍTULO FORMALMENTE PERFEITO. RECURSO DESPROVIDO.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível n. 0300124-86.2018.8.24.0113, da comarca de Camboriú (1ª Vara Cível), em que é apelante Jamir Luiz Luchese, e apelado Osmar Hermenegildo Silva:

           A Quinta Câmara de Direito Comercial decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Custas legais.

           O julgamento, realizado no dia 6 de dezembro de 2018, foi presidido pelo desembargador Cláudio Barreto Dutra, com voto, e dele participou a desembargadora Soraya Nunes Lins.

           Florianópolis, 10 de dezembro de 2018.

Jânio Machado

RELATOR

 

           RELATÓRIO

           Jamir Luiz Luchese opôs embargos à execução ajuizada por Osmar Hermenegildo Silva arguindo, em preliminar, a incompetência do juízo. No mérito, sustentou a ausência de título executivo extrajudicial, até porque o credor instruiu a ação de execução com um "contrato de compra e venda de quotas de sociedade limitada" apócrifo ("sem identificação de assinaturas, e muito menos assinatura do Executado"), bem ainda com 18 (dezoito) cheques, sendo que 16 (dezesseis) deles não possuem data e nem local de emissão.

           Os embargos foram impugnados (fls. 75/89) e, na sequência, a digna magistrada Karina Muller Queiroz de Souza proferiu sentença (fls. 90/92), o que fez nos seguintes termos:

    "ANTE O EXPOSTO, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado nestes embargos.

    Condeno a parte embargante ao pagamento das despesas processuais, como também em honorários advocatícios de sucumbência, estes que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da execução, devidamente atualizado, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil/2015.

    P.R.I.

    Transitada em julgado, junte-se cópia da presente na execução apensa e intime-se a parte exequente para que requeira o que entender necessário ao prosseguimento do feito.

    Após, arquive-se." (grifo no original).

           Inconformado, o embargante interpôs recurso de apelação cível (fls. 96/104) com reiteração dos argumentos expostos nos embargos à execução.

           O embargado requereu a penhora de bens por meio do sistema Bacenjud (fls. 105/122) e deixou de apresentar contrarrazões (fl. 126), vindo os autos a esta Corte.

           VOTO

           A ação de execução (autos n. 0300779-92.2017.8.24.0113) está suportada no "contrato de compra e venda de quotas de sociedade limitada", firmado na data de 4.8.2016, oportunidade em que Jalmir Luiz Luchese e Rogério Moreira da Rosa adquiriram as quotas sociais da empresa "Rosa Simas e Silva Distribuidora de Alimentos Ltda.", obrigando-se ao pagamento do financiamento no valor de R$24.000,00 (vinte e quatro mil reais), que seria pago em 21 (vinte e uma) parcelas mensais (no valor de R$1.143,00), bem ainda do valor de R$50.000,00 (cinquenta mil reais), representado por 24 (vinte e quatro) cheques (no valor de R$2.083,00), vencendo o primeiro em 20.9.2016 e o último em 20.8.2018 (fls. 12/53 e 81/87).

           De início, afasta-se a alegada incompetência do juízo. Assim se diz porque a cláusula n. 8 do contrato estabeleceu que "as partes elegem o foro da cidade de CAMBORIÚ/SC para dirimir todas as quaisquer questões oriundas do presente contrato" (fl. 14).

           A cláusula de eleição do foro é considerada válida, podendo o credor ajuizar a ação de execução no foro eleito pelas partes no contrato, conforme o disposto nos artigos 63 e 781, inciso I, do Código de Processo Civil de 2015:

    "Art. 63. As partes podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obrigações.

    § 1º A eleição de foro só produz efeito quando constar de instrumento escrito e aludir expressamente a determinado negócio jurídico.

    § 2º O foro contratual obriga os herdeiros e sucessores das partes.

    § 3º Antes da citação, a cláusula de eleição de foro, se abusiva, pode ser reputada ineficaz de ofício pelo juiz, que determinará a remessa dos autos ao juízo do foro de domicílio do réu.

    § 4º Citado, incumbe ao réu alegar a abusividade da cláusula de eleição de foro na contestação, sob pena de preclusão.

    (...)

    Art. 781. A execução fundada em título extrajudicial será processada perante o juízo competente, observando-se o seguinte:

    I - a execução poderá ser proposta no foro de domicílio do executado, de eleição constante do título ou, ainda, de situação dos bens a ela sujeitos;

    II - tendo mais de um domicílio, o executado poderá ser demandado no foro de qualquer deles;

    III - sendo incerto ou desconhecido o domicílio do executado, a execução poderá ser proposta no lugar onde for encontrado ou no foro de domicílio do exequente;

    IV - havendo mais de um devedor, com diferentes domicílios, a execução será proposta no foro de qualquer deles, à escolha do exequente;

    V - a execução poderá ser proposta no foro do lugar em que se praticou o ato ou em que ocorreu o fato que deu origem ao título, mesmo que nele não mais resida o executado.".

           No mesmo sentido tem-se a orientação contida na súmula n. 335 do Supremo Tribunal Federal: "é válida a cláusula de eleição do foro para os processos oriundos do contrato".

           O instrumento particular de compra e venda firmado pelos credores, pelos devedores e por 2 (duas) testemunhas, nele constando obrigação de pagar quantia certa em data determinada, constitui título executivo extrajudicial, conforme o disposto no artigo 784, inciso III, e artigo 786, "caput", ambos do Código de Processo Civil de 2015. E, se o contrato firmado entre as partes reveste-se das características de liquidez, certeza e exigibilidade (artigo 783 do Código de Processo Civil de 2015), mostra-se viável a cobrança pela via executiva (artigo 798 do Código de Processo Civil de 2015).

           Registra-se que o negócio foi subscrito pelo embargado (credor/vendedor) e José Guilherme Simas (vendedor), pelo embargante (devedor/comprador) e Rogério Moreira da Rosa (comprador), pela esposa do embargado Micheli Simas Silva e 1 (uma) testemunha (fl. 86).

           Não se ignora a orientação do Superior Tribunal de Justiça, de que a testemunha instrumentária deverá ser pessoa desinteressada no negócio, pois nada impede que "(...) venha a ser, posteriormente, convocada a depor sobre o que sabe a respeito do ato negocial em juízo (testemunha judicial)." (recurso especial n. 1.453.949/SP, Quarta Turma, relator o ministro Luis Felipe Salomão, j. em 13.6.2017).

           Marcus Vinicius Rios Gonçalves, a propósito, também assevera que "De nada adianta colher a assinatura de alguém que não possa testemunhar, por incapacidade, suspeição ou impedimento" (Novo curso de direito processual civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, v. III, p. 82).

           Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça vem, reiteradamente, decidindo que a demonstração do interesse das testemunhas instrumentárias na avença subscrita não basta, por si só, para retirar do título a sua força executiva se a sua finalidade é a de comprovar a existência do negócio, sendo mitigada tal exigência quando o devedor não nega tê-lo celebrado:

    "AGRAVO REGIMENTAL. EXECUÇÃO FUNDADA EM TERMO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. AUSÊNCIA DE ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS. MITIGAÇÃO. VALIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO.

    1.- Excepcionalmente, a certeza quanto à existência do ajuste celebrado pode ser obtida por outro meio idôneo, ou no próprio contexto do autos, caso em que a exigência da assinatura de duas testemunhas no documento particular - in casu, contrato de confissão de dívida - pode ser mitigada. Precedente.

    2.- Agravo Regimental improvido." (agravo regimental nos embargos de declaração no recurso especial n. 1.183.496/DF, Terceira Turma, relator o ministro Sidnei Beneti, j. em 13.8.2013).

           Ainda recentemente, a ministra Maria Isabel Gallotti enfatizou "(...) que as assinaturas por pessoas interessadas somente irão desconstituir a executividade do título extrajudicial caso haja alegação referente à falsidade do documento em si ou da declaração nele contida" (agravo em recurso especial n. 1.172.933/RS, decisão monocrática proferida no dia 27.11.2017).

           O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva foi além ao afirmar "(...) que a assinatura do avalista pode suprir" a ausência de testemunha desinteressada no negócio (recurso especial n. 1.646.142/MT, decisão monocrática proferida no dia 8.8.2018).

           No caso, embora o interesse da testemunha Micheli Simas Silva resulte da sua condição de esposa do embargado, a existência da dívida está devidamente comprovada. Ademais, conforme antes mencionado, a insurgência restrita ao aspecto formal do título executivo tem a sua relevância mitigada em face do reconhecimento da dívida.

           Na Câmara, a respeito do que foi tratado, já decidiu:

    "APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE. INSTRUMENTO PARTICULAR DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INSURGÊNCIA DA EMBARGANTE.

    EXISTÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. ARTIGO 302 DO CPC. DOCUMENTOS E FATOS DEVIDAMENTE IMPUGNADOS PELA EMBARGADA/EXEQUENTE.

    TESTEMUNHA INSTRUMENTÁRIA. ALEGAÇÃO DE VÍCIO NA FORMAÇÃO DO TÍTULO, DIANTE DO VÍNCULO EMPREGATÍCIOS DAS TESTEMUNHAS COM A CREDORA/EMBARGADA. INAPLICABILIDADE DO ART. 228 DO CC. AUSÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL QUANTO A QUALIFICAÇÃO DAS TESTEMUNHAS. POSSIBILIDADE DE VÍNCULO ENTRE AS TESTEMUNHAS E AS PARTES, FATO QUE NÃO RETIRA A CERTEZA, LIQUIDEZ E EXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. SENTENÇA MANTIDA.

    Recurso conhecido e desprovido." (apelação cível n. 2015.055744-0, de Criciúma, relator o desembargador Guilherme Nunes Born, j. em 22.10.2015).

           Nos embargos à execução, o apelante sustentou que a ação de execução foi instruída com um "contrato de compra e venda de quotas de sociedade limitada" apócrifo ("sem identificação de assinaturas, e muito menos assinatura do Executado"), bem ainda com 18 (dezoito) cheques, sendo que 16 (dezesseis) deles não possuem data e nem local de emissão.

           Contudo, tais argumentos vieram destituídos de credibilidade e de um mínimo de prova. O apelado, na impugnação aos embargos, reconheceu que "no momento de enviar cópia do contrato digitalizado, ficou faltando a última folha do contrato, no qual consta a assinatura das partes, bem como das testemunhas" (fl. 77), tendo exibido o contrato por inteiro (fls. 81/87). Logo, verifica-se que o contrato foi devidamente firmado pelo apelante, sendo sua assinatura reconhecida em cartório (fl. 86), o que confirma o negócio realizado entre as partes e a existência da dívida. Registra-se que a ação de execução está suportada no "contrato de compra e venda de quotas de sociedade limitada", sendo que os cheques, referidos na cláusula n. 1.3 (fl. 11), foram exibidos apenas para comprovar o inadimplemento dos títulos e o descumprimento do pacto (fls. 10/53).

           A distribuição do ônus probatório que prevalece é aquela ditada pela legislação processual civil: ao autor incumbe o ônus da prova dos fatos constitutivos do seu direito (artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil de 2015) e ao réu a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor (artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil de 2015).

           Acerca do ônus da prova, Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira lecionam:

    "O réu pode defender-se simplesmente negando os fatos trazidos pelo autor, quando sobre ele, a princípio, não pesa qualquer ônus de fazer prova - sem excluir a possibilidade de contraprova abaixo mencionada. Trata-se da chamada defesa direta, examinada no v. 1 deste Curso. Mas se trouxer fatos novos (defesa indireta), aptos a modificar o direito do autor, extingui-lo ou impedir que ele nasça, cabe-lhe o encargo legal de prová-los, afinal de contas é seu interesse que esse direito não seja reconhecido.

    A posição do réu é, nesse sentido, até cômoda, dentro do processo, vez que sobre ele só recairá o ônus de provar, quando demonstrado o fato constitutivo do direito do autor. Sem prova do fato gerador de seu direito, o autor inevitavelmente sucumbe - independentemente de qualquer esforço probatório do réu.

    Na verdade, só se exige esforço probatório do réu em duas situações: a) provado o fato constitutivo do direito do autor, cabe ao réu provar fato extintivo, modificativo ou impeditivo deste direito, eventualmente alegado; ou b) provado o fato constitutivo do direito do autor, se o réu limitou-se a negá-lo, sem aduzir nada de novo, cabe-lhe fazer a contraprova, de forma a demonstrar o contrário. A contraprova pode servir tanto para revelar a ilegitimidade formal ou material da prova trazida pelo autor sobre o fato, como para afastar a ocorrência do próprio fato." (o grifo está no original) (Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedente, coisa julgada e tutela provisória. 11. ed. Salvador: Editora Podivm, 2016, p. 115, V. II).

           Portanto, o "contrato de compra e venda de quotas de sociedade limitada" representa a obrigação de pagar uma importância bem definida, constituindo, sim, título executivo extrajudicial (artigo 784, inciso I, do Código de Processo Civil de 2015) e, ao contrário do afirmado nas razões recursais, mostra-se hábil para instruir o processo de execução.

           Com essas considerações, o recurso interposto é desprovido e, em razão de o advogado do apelado não ter realizado nenhum trabalho em grau de recurso, deixa-se de aplicar o disposto no artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil de 2015.

           Por último, não se faz necessária "a manifestação expressa sobre todos os argumentos apresentados pelos litigantes" e, tampouco, a "menção expressa dos dispositivos infraconstitucionais tidos como violados". (AgRg no REsp. 1.480.667/RS, rel. min. Mauro Campbell Marques, j. em 18.12.2014).


Gabinete desembargador Jânio Machado