Acesso restrito
Pesquisa de Satisfação:

Excelente

Bom

Ruim

Observações:


FECHAR [ X ]



Obrigado.











TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0002079-76.2014.8.24.0014 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Sidney Eloy Dalabrida
Origem: Campos Novos
Orgão Julgador: Quarta Câmara Criminal
Julgado em: Thu Sep 06 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Paulo Eduardo Huergo Farah
Classe: Apelação Criminal

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STJ: 83

 


Apelação Criminal n. 0002079-76.2014.8.24.0014

Relator: Desembargador Sidney Eloy Dalabrida

   APELAÇÃO CRIMINAL. POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO (ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, IV, DA LEI N. 10.826/03). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA.

   CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA. MATÉRIA QUE DEVE SER APRECIADA PELO JUÍZO A QUO, SOB PENA DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NÃO CONHECIMENTO.

   PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO PREVISTO NO ART. 14, CAPUT, DA LEI DE ARMAS. IDENTIFICAÇÃO POSTERIOR DA NUMERAÇÃO SUPRIMIDA. IRRELEVÂNCIA. FATO QUE NÃO DESCARACTERIZA A TIPICIDADE. MANUTENÇÃO DO DECISUM.

   "A posterior descoberta, por perícia técnica, da numeração da arma de fogo que foi suprimida por instrumento abrasivo não retira a tipicidade do art. 16, parágrafo único, inciso IV, do Estatuto do Desarmamento, porquanto a norma visa assegurar que o Estado tenha imediato controle das armas de fogo existentes no país, dando condições para que seus agentes consigam identificar o cadastro respectivo do artefato sem depender de buscas por outras instituições" (TJSC, Apelação Criminal n. 0001383-27.2013.8.24.0062, de São João Batista, rel. Des. Luiz Cesar Schweitzer, Quinta Câmara Criminal, j. em 3/5/2018).

   RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0002079-76.2014.8.24.0014, da comarca de Campos Novos Vara Criminal em que é Apelante Reinaldo Weber de Souza e Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

           A Quarta Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

           O julgamento, realizado na data de 6 de setembro de 2018, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador José Everaldo Silva, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Zanini Fornerolli. Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Lio Marcos Marin.

           Florianópolis, 10 de setembro de 2018.

Desembargador Sidney Eloy Dalabrida

Relator

 

           RELATÓRIO

           Na comarca de Campos Novos, o órgão do Ministério Público ofereceu denúncia em face de Reinaldo Weber de Souza, imputando-lhe a prática do delito capitulado no art. 16, parágrafo único, IV, da Lei n. 10.826/03, pois, segundo consta na inicial:

    No dia 29 de maio de 2014, por volta das 6h30min, em cumprimento ao mandado de busca e apreensão expedido nos autos n. 014.14.001964-6, Policiais Civis deslocaram-se até a residência do denunciado Reinaldo Weber de Souza, situada na localidade de Rio do Pinto, interior do Município de Brunópolis/SC, oportunidade em que localizaram, no interior da referida morada, 1 (um) revólver calibre .38, marca Rossi, com numeração suprimida, 54 (cinquenta e quatro) munições calibre .38, estando 9 (nove) deflagradas e 45 (quarenta e cinco) intactas, 39 (trinta e nove) munições calibre .380, 1 (uma) munição calibre .9mm de uso restrito, conforme art. 16, inciso II, do Decreto n. 3.665/200, 6 (seis) cartuchos calibre .36, sendo 1 (um) intacto e 5 (cinco) deflagrados, 2 (duas) munições calibre .32, 1 (um) carregador de pistola calibre .380, 1 (um) cabo emborrachado de revólver calibre .38, marca Rossi, 1 (uma) lanterna de pistola e 1 (um) coldre de tecido, cor preto, objetos estes que o agente tinha posse sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, em virtude da ausência de registro de propriedade, conforme auto de apreensão de fl. 14 (fls. 1-2).

           Finalizada a instrução, o Magistrado a quo julgou procedente o pedido formulado na denúncia, para condenar o réu ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 3 (três) anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas medidas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, na importância de 2 (dois) salários mínimos, além do pagamento de 10 (dez) dias-multa, fixados no mínimo legal, por infração ao art. 16, parágrafo único, IV, da Lei n. 10.826/2003 (fls. 151-159).

           Inconformado com a prestação jurisdicional, o réu interpôs apelação criminal, mediante a qual sustentou a inocorrência da figura prevista no art. 16, parágrafo único, IV, da Lei n. 10.826/03, requerendo a desclassificação para o crime disposto no art. 14 da mesma Lei. Ao final, postulou a suspensão do pagamento das custas processuais (fls. 203-208).

           Apresentadas as contrarrazões (fls. 212-214), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio do Exmo. Dr. Alexandre Carrinho Muniz, manifestou-se pelo conhecimento parcial e não provimento do reclamo (fls. 241-243).

           VOTO

           1 De partida, não se conhece do pleito visando a concessão do benefício da justiça gratuita, porquanto a matéria deve ser decidida no primeiro grau de jurisdição, sob pena de supressão de instância.

           Nesse sentido:

    APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, "CAPUT", DA LEI N. 11.343/2006). SENTENÇA CONDENATÓRIA E INCONFORMISMO DA DEFESA. PEDIDO DE JUSTIÇA GRATUITA FORMULADO EM SEDE RECURSAL. INADMISSIBILIDADE. TEMA AFETO AO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU. NÃO CONHECIMENTO. A jurisprudência deste Tribunal está consolidada no sentido de que "cumpre ao juízo de primeiro grau, ao apurar o valor das custas finais, averiguar a situação de hipossuficiência do apenado, concedendo-lhe, se for o caso, os benefícios da justiça gratuita" (Apelação Criminal n. 0006882-38.2016.8.24.0045, de Palhoça, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, Quarta Câmara Criminal, j. 14- 9-2017) [...] (TJSC, Apelação Criminal n. 0002139-74.2017.8.24.0004, de Araranguá, rel. Des. Alexandre d'Ivanenko, Quarta Câmara Criminal, j. em 17/5/2018).

           No mais, o reclamo preenche os pressupostos de admissibilidade, pelo que é conhecido.

           2 Sustenta o apelante que a possibilidade de identificação da arma por meio da numeração do tambor afasta a incidência da figura prevista no art. 16, parágrafo único, IV, da Lei n. 10.826/03, requerendo a desclassificação para o crime do art. 14 da Lei n. 10.826/03.

           Sem razão.

           Verifica-se que o laudo pericial acostado às fls. 77-88 foi conclusivo no seguinte sentido: "foi procedido o exame de metalografia com a utilização de reagentes químicos, onde foi possível identificar o número de série da arma 'J2018Y1'".

           Não obstante, o fato de a numeração da arma ter sido revelada durante a perícia não autoriza a desclassificação almejada, porquanto, conforme bem consignado pelo Magistrado sentenciante, "a dificuldade imposta para impossibilitar a identificação da arma era real e só foi afastada graças a eficiente atuação do perito que por meio de reagentes químicos logrou êxito em decifrá-la" (fl. 154).

           Ademais, o tipo penal, previsto no art. 16, parágrafo único, I, da Lei n. 10.826/03, para sua configuração, exige que haja efetivamente a supressão ou alteração de "marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato", sem afastar a responsabilidade criminal se, mais tarde, por meio de perícia técnica, descobre-se o número respectivo.

           Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

    PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL E NEGATIVA DE VIGÊNCIA AOS ARTS. 12 E 16, AMBOS DA LEI Nº 10.826/03, E 1º DO CP. POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO SUPRIMIDA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O TIPO DESCRITO NO ART. 12 DA LEI N.º 10.826/03. NÃO CABIMENTO. ADULTERAÇÃO DO NÚMERO DE SÉRIE COMPROVADA. TIPICIDADE RECONHECIDA. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL. SÚMULA 83/STJ. ENUNCIADO INCIDENTE SOBRE RECURSOS INTERPOSTOS POR AMBAS AS ALÍNEAS DO PERMISSOR CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Conforme julgados desta Corte, estando o número de série da arma de fogo raspado ou suprimido (situação essa comprovada nos autos), a conduta do agente será equiparada à posse ou porte de arma de fogo de uso restrito, sendo irrelevante a identificação posterior pela perícia técnica da numeração, pois a intenção da lei foi punir com maior severidade aquele que, de qualquer modo, anula marca ou sinal distintivo da arma, permitindo- se sua transmissão a terceiros ilegalmente e obstaculizando/ dificultando a identificação do verdadeiro proprietário do arm am ento. I ncidência do enunciado 83 da Súm ula deste Tribunal. [...] (AgRg no AgRg no AREsp 864.075/SC, rela. Mina Maria Thereza de Assis Moura, j. em 7/6/2016).

           E desta Corte:

    APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA. PORTE DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO SUPRIMIDA (LEI 10.826/2003, ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, IV). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGIMENTO DA DEFESA. PRELIMINAR. NULIDADE DECORRENTE DA JUNTADA DE MÍDIA PRODUZIDA POR MEIO DE CARTA PRECATÓRIA POSTERIORMENTE ÀS ALEGAÇÕES FINAIS, ÁUDIOS DE DOIS POLICIAIS MILITARES CORROMPIDOS E IMPRESSÃO DA ÚLTIMA PEÇA DEFENSIVA PELO CARTÓRIO JUDICIAL COM IMPERFEIÇÕES. IMPERTINÊNCIA. DEFENSOR QUE SABIA DO RETORNO DA DEPRECATA, NÃO ARROLOU OS AGENTES DO ESTADO COMO TESTEMUNHAS DE DEFESA E DERRADEIRAS ALEGAÇÕES COM TEOR IDENTIFICÁVEL. PREJUÍZO INEXISTENTE. MÉRITO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA A CONDUTA DO ART. 14, CAPUT, DA LEI DE REGÊNCIA. APONTADA POSSIBILIDADE DE IDENTIFICAR A NUMERAÇÃO DA ARMA DE FOGO. INVIABILIDADE. PERÍCIA TÉCNICA E POLICIAL MILITAR OUVIDO EM JUÍZO QUE CONFIRMARAM QUE A SUPRESSÃO DEU-SE POR INSTRUMENTO ABRASIVO. PROVA TÉCNICA QUE NÃO IDENTIFICOU A INTEGRALIDADE DA SÉRIE. POSTERIOR DESCOBRIMENTO, ADEMAIS, IRRELEVANTE. NORMA QUE VISA GARANTIR O CONTROLE DO ESTADO ACERCA DAS ARMAS EXISTENTES NO PAÍS. ELEMENTARES DO DELITO IMPUTADO APERFEIÇOADAS. A posterior descoberta, por perícia técnica, da numeração da arma de fogo que foi suprimida por instrumento abrasivo não retira a tipicidade do art. 16, parágrafo único, inciso IV, do Estatuto do Desarmamento, porquanto a norma visa assegurar que o Estado tenha imediato controle das armas de fogo existentes no país, dando condições para que seus agentes consigam identificar o cadastro respectivo do artefato sem depender de buscas por outras instituições. [...] RECURSO EM CONHECIDO E DESPROVIDO (TJSC, Apelação Criminal n. 0001383-27.2013.8.24.0062, de São João Batista, rel. Des. Luiz Cesar Schweitzer, Quinta Câmara Criminal, j. em 3/5/2018).

           Outrossim, além de a arma de fogo, verifica-se que foi apreendida em poder do apelante uma munição de calibre restrito - .9mm -, circunstância que confirma que a conduta perpetrada se amolda ao comando do art. 16 da Lei n. 10.826/03.

           A propósito:

    APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO (ART. 16 DA LEI N. 10.826/2003). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DO RÉU. PRETENDIDA A ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS, POR MEIO DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS MILITARES QUE ATENDERAM À OCORRÊNCIA. RÉU QUE PORTAVA UMA PISTOLA, CALIBRE 9MM, DE USO RESTRITO, CARREGADA COM CINCO MUNIÇÕES 9MM. VERSÃO DEFENSIVA ISOLADA, SEM AMPARO NOS DEMAIS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. [...] (TJSC, Apelação Criminal n. 0001076-55.2015.8.24.0013, de Campo Erê, rel. Des. Volnei Celso Tomazini, Segunda Câmara Criminal, j. em 26/6/2018).

    APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA. POSSE DE MUNIÇÃO DE ARMA DE USO RESTRITO (ART. 16, CAPUT, DA lEI N. 10.826/2003). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. PLEITO ABSOLUTÓRIO POR INEXISTÊNCIA DE LESÃO AO BEM JURÍDICO. NÃO ACOLHIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. CONFISSÃO DO ACUSADO CORROBORADA PELO DEPOIMENTO DO POLICIAL QUE PARTICIPOU DA OCORRÊNCIA. APREENSÃO DE QUATRO MUNIÇÕES CALIBRE 9MM NO INTERIOR DA RESIDÊNCIA. LAUDO PERICIAL QUE CONCLUIU PELA EFICIÊNCIA DOS PROJÉTEIS PARA O FIM QUE SE DESTINAM. DELITO DE MERA CONDUTA E PERIGO ABSTRATO QUE SE CONFIGURA INDEPENDENTE DA COMPROVAÇÃO DO EFETIVO RISCO À SEGURANÇA PÚBLICA, O QUAL É PRESUMIDO PELA NORMA. CONDENAÇÃO MANTIDA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA INAPLICÁVEL AO CASO. ACUSADO SURPREENDIDO NA POSSE DE QUATRO MUNIÇÕES DE USO RESTRITO. ELEVADA REPROVABILIDADE DA CONDUTA. PARADIGMA DESTA CÂMARA QUE POSSIBILITA A APLICAÇÃO DA BAGATELA AO INFRATOR SURPREENDIDO COM PEQUENA QUANTIDADE DE MUNIÇÃO DE ARMA DE USO PERMITIDO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. [...] RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO (TJSC, Apelação Criminal n. 0000459-65.2015.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Leopoldo Augusto Brüggemann, Terceira Câmara Criminal, j. em 26/6/2018).

           De mais a mais, não prospera a tese de que desconhecia a supressão da numeração da arma de fogo "ou até mesmo que possuía uma munição calibre .9mm" (fl. 206). Isso porque, bastava o manuseio dos artefatos para constatar que a arma era desprovida de numeração e que na munição havia inserção do seu calibre.

           Aliás, o apelante não trouxe aos autos qualquer prova para respaldar a sua justificativa, ônus que lhe incumbia, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal.

           Portanto, devidamente comprovado nos autos que Reinaldo Weber de Souza mantinha em sua posse artefato bélico com numeração suprimida, além de munições de uso permitido e restrito, não há que se falar em desclassificação ou absolvição.

           3 Ante o exposto, o voto é no sentido de conhecer parcialmente do recurso e negar-lhe provimento.

           Para os fins do disposto no art. 1º, I, "e", da Lei Complementar n. 64/90, proceda o Secretário da Câmara à inclusão dos dados do réu no CNCIAI - Cadastro Nacional de Condenados por Ato de Improbidade Administrativa e por Ato que Implique Inelegibilidade.


Gabinete Desembargador Sidney Eloy Dalabrida