Acesso restrito
Pesquisa de Satisfação:

Excelente

Bom

Ruim

Observações:


FECHAR [ X ]



Obrigado.











TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0001397-46.2014.8.24.0039 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Carlos Alberto Civinski
Origem: Lages
Orgão Julgador: Primeira Câmara Criminal
Julgado em: Thu Sep 13 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Alexandre Karazawa Takaschima
Classe: Apelação Criminal

 


 

ESTADO DE SANTA CATARINA

       TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Apelação Criminal n. 0001397-46.2014.8.24.0039, de Lages  

 


ESTADO DE SANTA CATARINA

       TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação Criminal n. 0001397-46.2014.8.24.0039, de Lages

Relator: Des. Carlos Alberto Civinski

   PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. CRIME DE FURTO QUALIFICADO PELO ABUSO DE CONFIANÇA (CP, ART. 155, § 4º, II). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PLEITO ABSOLUTÓRIO. DESTINAÇÃO DA QUANTIA TRANSFERIDA PARA PAGAMENTO DE VERBAS TRABALHISTA. NÃO ACOLHIMENTO. VALORES TRANSFERIDOS DA CONTA CORRENTE DA EMPRESA EMPREGADORA NÃO CONDIZENTES COM O SALÁRIO DA APELANTE. PERÍCIA CONTÁBIL DENECESSÁRIA. SIMPLES CÁLCULO MATEMÁTICO SUFICIENTE PARA SOLUÇÃO DO CASO. PALAVRAS HARMÔNICAS DO REPRESENTANTE DA PESSOA JURÍDICA E DE OUTRA FUNCIONÁRIA. SENTENÇA MANTIDA. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. CONDENAÇÃO CONFIRMADA POR ESTE TRIBUNAL. PRINCÍPIO DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO. REEXAME SOBRE A MATÉRIA FÁTICA E ELEMENTOS DE PROVA ESGOTADO. CASO QUE SE AMOLDA À NOVA ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (HC 126.292/SP), RATIFICADA POR OCASIÃO DO INDEFERIMENTO DAS MEDIDAS CAUTELARES OBJETO DAS AÇÕES DECLARATÓRIAS DE CONSTITUCIONALIDADE 43 E 44.

   - O agente que, na qualidade de empregado, valendo-se desta facilidade, subtrai valores da conta corrente de seu empregador, comete o crime de furto qualificado pelo abuso de confiança.

   - Confirmada ou decretada a condenação neste Juízo ad quem, admite-se a execução provisória da pena, tendo em vista o esgotamento do revolvimento da matéria fática e dos elementos de prova, à luz do princípio do duplo grau de jurisdição, sem que se possa falar em afronta ao princípio da presunção de inocência, seguindo o entendimento do Supremo Tribunal Federal, nos autos do HC 126.292/SP, ratificado quando do indeferimento das medidas cautelares objeto das ADCs 43 e 44.

   - Parecer da PGJ pelo conhecimento e o desprovimento do recurso.

   - Recurso conhecido e desprovido.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 0001397-46.2014.8.24.0039, da comarca de Lages (2ª Vara Criminal), em que é apelante Daniela Aparecida Limas Silveira, e apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

           A Primeira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Com o pleno exercício do duplo grau de jurisdição, determina-se ao Juízo de origem a adoção das providências necessárias para o imediato cumprimento da pena. Comunicar a vítima, conforme determinação do art. 201, § 2º, do Código de Processo Penal. Custas legais.

           O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Desembargador Paulo Roberto Sartorato, com voto, e dele participou o Desembargador Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva.

           Florianópolis, 13 de setembro de 2018.

Assinado digitalmente

Carlos Alberto Civinski

relator

           RELATÓRIO

           Denúncia: o Ministério Público ofereceu denúncia em face de Daniela Aparecida Limas Silveira, dando-a como incursa nas sanções do art. 155, § 4º, II, do Código Penal, na forma do art. 71, caput, do mesmo diploma legal, em razão dos seguintes fatos:

    A denunciada Daniela Aparecida Limas Silveira na época dos fatos delituosos (anos de 2011 e 2012) exercia a função de secretária na empresa Calisul Ltda., e em razão de especial confiança mantida entre denunciada e sócio-gerente Jorge Maluche Waltrick era-lhe conferido acesso à conta bancária nº 50023-2/Ag. 360/Banco Bradesco de titularidade da pessoa jurídica, com cartão e senha, para depósitos e pagamentos a clientes, mas não para saques e transferências bancárias que não com a única finalidade de receber seu salário (cfe. boletim de ocorrência de fl. 02/ip; notícia criminal de fls. 03-07/ip; termo de rescisão de contrato de trabalho de fls. 20-23/ip; extratos bancários de -ls. 28-61/ip e 116-239/ip; ofício de fl. 96ip e termos de declaração/depoimento de fls. 08-09/ip, 81/ip e 82/ip).

    Sob tal contexto, em datas (período compreendido entre os anos de 2011 e 2012), horários e locais (nesta Comarca) a serem apurados com transcorrer da instrução criminal, ciente da ilicitude do ato e com vontade dirigida para agir conforme ele - logo, agindo conscientemente e com manifesto animus furandi -, em inúmeras oportunidades e mediante abuso de confiança Daniela subtraiu para si ou para outrem valores provenientes da conta bancária supra e pertencentes à empresa-vítima até totalizar o patamar de R$ 21.661,00 (vinte e um mil, seiscentos e sessenta e um reais) (cfe. boletim de ocorrência de fl. 02/ip; notícia criminal de fls. 03-07/ip; termo de rescisão de contrato de trabalho de fls. 20-23/ip; extratos bancários de -ls. 28-61/ip e 116-239/ip; ofício de fl. 96ip e termos de declaração/depoimento de fls. 08-09/ip, 81/ip e 82/ip). (fls. 269-272).

           Sentença: o Juiz de Direito Alexandre Karazawa Takaschima julgou procedente a denúncia para condenar Daniela Aparecida Limas Silveira pela prática do crime previsto no art. 155, § 4º, II, do Código Penal, ao cumprimento de pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos, consistentes na: a) prestação de serviços à comunidade; e b) prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo; e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos (fls. 324 e 325).

           Trânsito em julgado: muito embora não certificado pelo Juízo a quo, verifica-se que a sentença transitou em julgado para o Ministério Público.

           Recurso de apelação de Daniela Aparecida Limas Silveira: o Defensor constituído interpôs recurso de apelação (fl. 327), no qual sustentou a absolvição da apelante, seja nos termos do art. 386, III, do Código de Processo Penal, porquanto os valores transferidos para sua conta bancária correspondiam ao pagamento do seu salário, seja com fulcro no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, em razão da existência de dúvida acerca da prática da conduta, e do valor furtado.

           Requereu o conhecimento e o provimento do recurso para reformar a sentença, de modo a absolvê-la (fls. 330-337).

           Contrarrazões do Ministério Público: a acusação impugnou as razões recursais, ao argumento de que "inexistem dúvidas quanto a ocorrência do crime de furto imputado a Daniela Aparecia Limas Silveira, mormente porque a prova oral produzida corrobora a documentação existente no presente feito".

           Postulou o conhecimento do recurso e a manutenção da sentença condenatória (fls. 341-353).

           Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça: o Procurador de Justiça Jorge Orofino da Luz Fontes opinou pelo conhecimento e pelo desprovimento do recurso (fls. 361-372).

           Este é o relatório.

           VOTO

           Do juízo de admissibilidade

           O recurso preenche os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido.

           Do mérito

           A versão da defesa é de que a quantia transferida para conta bancária da apelante referia-se ao pagamento de seu salário e demais verbas trabalhistas.

           Sustentou, ainda, que a acusação não precisou o valor efetivamente subtraído, tampouco foi realizada perícia contábil para tanto.

           A acusação, em sede recursal, reforça a manutenção integral da sentença penal condenatória.

           O Magistrado a quo reconheceu a materialidade e a autoria delitivas e condenou a apelante pela prática do crime de furto qualificado pelo abuso de confiança (CP, art. 155, § 4º, II).

           O referido art. 155, § 4º, II estabelece que:

           Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

           Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

           [...]

           § 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:

           [...]

           II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;

           Examinando o conjunto probatório, verifica-se que o recurso não comporta provimento.

           Imputou-se a Daniela Aparecida Limas Silveira a prática do delito de furto qualificado pelo abuso de confiança, porquanto, durante os anos de 2011 e 2012, enquanto exercia a função de secretária na empresa Calisul Serviços Ltda., subtraiu para si ou para outrem valores provenientes da conta corrente 50023-2, agência 360, Banco Bradesco, de titularidade da pessoa jurídica, totalizando R$ 21.661,00 (vinte e um mil, seiscentos e sessenta e um reais).

           Convém esclarecer que, conquanto no relatório de fls. 3-7 a empresa vítima, por meio de seu representante legal, indique a subtração pela apelante dos pagamentos entregues pela pessoa jurídica Laminadora Catarinense e Ind. e Com. Ltda., resultando no montante de R$ 1.560,00 (um mil, quinhentos e sessenta reais), esse fatos não foram descritos na inicial acusatória, muito menos foram objeto de deliberação sob o crivo do contraditório e da sentença condenatória.

           Isso posto, verifica-se que tal valor deve ser desconsiderado do total do prejuízo apontado pelo Órgão Ministerial na denúncia.

           De plano, afasta-se a alegação de ausência de materialidade delitiva pela não realização de perícia técnica. Assim se faz porque a controvérsia em questão é relativa à destinação das transferências efetuadas pela apelante para si e, inclusive, para o seu genitor, pois, segundo sua versão, era referentes ao pagamento da sua remuneração. Não se trata de operação complexa, que demandaria a realização de cálculos contábeis para sua demonstração, bastando a simples análise dos extratos bancários e dos comprovantes de pagamento do período, o que não exige conhecimento técnico específico, mas, tão somente, meros cálculos matemáticos (de soma e subtração).

           Desta Câmara, colhe-se o seguinte precedente:

    PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. APROPRIAÇÃO INDÉBITA MAJORADA EM RAZÃO DA PROFISSÃO (CP, ART. 168, § 1º, III). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PLEITO ABSOLUTÓRIO. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE DEMONSTRADA. PRESCINDIBILIDADE DE PERÍCIA PARA AFERIR A OCORRÊNCIA DO DELITO. APROPRIAÇÃO DE VALORES RELEVADA POR SIMPLES CÁLCULO ARITMÉTICO. AUTORIA COMPROVADA PELA PALAVRA DA VÍTIMA QUE É CORROBORADA PELO RESTANTE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. TIPICIDADE DA CONDUTA. PRESENÇA DE TODAS AS ELEMENTARES DO TIPO PENAL IMPUTADO. TESE DE QUE OS FATOS TRATARAM-SE DE MERO ILÍCITO CIVIL AFASTADA. DOLO GENÉRICO EVIDENCIADO PELA MANEIRA COMO PROCEDEU O AGENTE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA A FIGURA PRIVILEGIADA (ART. 170 DO CP). IMPOSSIBILIDADE. ELEVADO VALOR DA COISA APROPRIADA E RELEVANTE PREJUÍZO PARA A VÍTIMA. [...] - Constatado, por meio de simples cálculo matemático e pelos documentos juntados aos autos, que o agente apropriou-se de quantia monetária depositada em sua conta corrente mas que pertencia à vítima, é prescindível a realização de perícia técnica para comprovar a existência do crime narrado na denúncia. [...] (Apelação Criminal 2013.035462-8, de Araranguá, desta relatoria, j. em 7.4.2015, v.u.) (grifou-se).

           De mais a mais, não se faz imprescindível a realização de exame pericial dos bens subtraídos, quando o conjunto probatório é suficiente para a sua demonstração, mormente porque a realização de diligências, incluindo-se as perícias, encontra-se na esfera de discricionariedade do magistrado.

           Logo, dispensável a realização de perícia técnica na hipótese.

           Pois bem. A materialidade e autoria delitivas estão demonstradas pelos Boletim de Ocorrência 00472-2012-11963 (fl. 2), extratos bancário da conta corrente 50023-2, agência 360, Banco Bradesco (fls. 28-61), extratos de movimentação financeira fornecidos pela própria instituição bancária (fls. 115-239), bem como prova oral colhida em ambas as fases da persecução criminal.

           A matéria, a propósito, foi analisada de forma exauriente pelo membro do Ministério Público de primeiro grau, o Promotor de Justiça Carlos Eduardo Tremel da Faria, motivo pelo qual se adota as contrarrazões de fls. 341-353 como razão de decidir, o que é permitido pelo Superior Tribunal de Justiça (EDcl no AgRg no AREsp 94.942/MG, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. em 5.2.2013, v.u.):

    [...] Cuida-se de recurso interposto por Daniela Aparecida Limas Silveira, condenada nos termos da sentença de fls. 324/325, pela prática do crime previsto no artigo.155, § 4º, inciso III, do Código Penal.

    A apelação concentra as condições objetivas e subjetivas de admissibilidade, razão porque deve ser conhecida, porém, no mérito, não provida.

    Passa-se ao enfrentamento das teses trazidas à apreciação de Vossas Excelências pela apelante, as quais não merecem guarida, conforme será exposto.

    Pois bem. Busca a apelante sua absolvição nos termos do artigo 386, inciso III, do Código Penal, sustentando que os valores transferidos para sua conta bancária correspondem ao seu ao seu salário, de modo que inexiste crime no presente caso.

    Ainda, alternativamente, pugna pela sua absolvição com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código Penal, ante a alegada existência de dúvida acerca dos valores transferidos para sua conta bancária.

    Contudo, razão não lhe socorre.

    É que, em que pese as alegações da apelante, as provas constantes nos autos mostram-se suficientes a embasar o decreto condenatório, de modo que não há qualquer reparo a ser feito na sentença de fls. 324/325.

    Extrai-se das declarações prestada pela apelante sob o crivo do contraditório:

    "(02:09): Relata que não considera como sendo verdadeira a acusação que está sendo feita de furto qualificado pelo abuso de confiança.

    (02:49): Confirma que trabalhou na empresa Calisul Ltda.

    (02:50): Eu não me recordo bem certinho quando eu entrei porque já tem alguns anos, mas foi em torno de uns três anos que eu trabalhei lá, não me recordo a data certa que entrei.

    (03:08): Confirma que no período de 2011 e 2012 trabalhou na Calisul.

    (03:12): Sobre a função que exercia na empresa: Eu era auxiliar de escritório.

    (03:26): Confirma que tinha à senha do Banco Bradesco Internet Banking, com relação a uma conta da empresa.

    (03:36): Indagada qual o tipo de movimentação fazia na conta na época: Apenas para transferências de pagamento de salário.

    (04:04): Indagada se fazia uma única transferência ou se acontecia de fazer fracionada: Não, as vezes acontecia fracionado porque como a empresa estava com muitos problemas financeiros o pagamento era pago em várias vezes.

    (04:24): Se eram muitos funcionários: Quando eu entrei era eu e a Cristiane.

    (05:09): Se houve transferências a contas de terceiros para pagamento de salários: Não, pagamento de salários seria só os nossos.

    (05:21): Indagada se teve que fazer transferências para outra conta nesse período respondeu que não se recorda.

    (06:00): Indagada qual período do mês eram efetuados os pagamentos de salários: É que não tinha uma data específica, quando tinha o dinheiro pra ser feito o pagamento era feita a transferência.

    (06:13): Se as transferências eram feitas em algum valor fixo: Aí ia depender do atraso do salário que tinha.

    (06:25): Sobre quem definia os valores: O próprio dono da empresa.

    (06:40): Se os atrasos aconteciam com o pagamento da interroganda apenas ou também com o da Cristiane: Com o da Cristiane e depois com o da outra moça que trabalhava lá também, a Sandra.

    (06:50): Indagada quanto ganhava na época: Em torno de uns R$ 1.000,00, R$ 1.200,00...

    (07:05): Se era comum haver transferências de valores que ultrapassassem o R$ 1.000 ou R$ 1.200 por mês: Só quando ele pedia alguma coisa esporadicamente pra ser entregue o dinheiro pra ele mesmo.

    (07:15): Confirma que ele transferia para sua conta, a qual sacava e entregava o dinheiro a ele.

    (07:20): Que não sabe qual a justificativa para isso.

    (07:23): A princípio sempre era para o salário.

    (07:27): Que não se recorda quantas transferências foram feitas nesse período de um ano (entre agosto de 2011 e outubro de 2012).

    (08:05): Indagada sobre a saúde financeira da empresa: A empresa sempre estava em dificuldades.

    (08:13): Confirma que Jorge sempre fazia empréstimos para cobrir despesas e salários.

    (08:28): Confirma que no período de 2011 e 2012 os pagamentos foram efetuados sempre através de transferências.

    (08:35): Confirma que eram feitas mais de uma transferência por mês.

    (08:40): Que sempre tinha salários atrasados.

    (08:47): Confirma que Jorge era uma pessoa que costumava viajar muito, e que por causa dessas viagens inclusive o salário muitas vezes atrasava.

    (09:00): Que o 13º salários e as férias também eram pagos parcelados.

    (09:19): Que o seu salário o qual relatou não era o que era registrado na contabilidade da empresa, que recebia por fora.

    (09:26): Confirma que foi demitida por justa causa por conta das acusações.

    (09:30): Indagada se pensou em processar a empresa: Até pensei mas eu não quis.

    (09:43): Confirma que chegou a ser procurada pelo seu Jorge para que devolvesse o dinheiro a ele.

    (09:46): Indagada sobre o motivo de não ter devolvido: E eu vou devolver meu pagamento? Eu trabalhei né.

    (09:53): Confirma que esses valores eram referentes a seu salário" (termo de audiência de fls. 324/325)

    Não obstante, as declarações de Daniela Aparecida Limas Silveira não encontram respaldo na prova produzida no presente feito, senão vejamos.

    Inicialmente, embora a defesa sustente insistentemente que o próprio Órgão Ministerial, em alegações finais, mencionou a existência de dúvida insolúvel acerca dos fatos, ressalta-se que, conforme bem esclarecido por ocasião da audiência ocorrida em 9 de julho do corrente ano, tal dúvida paira tão somente quanto aos valores efetivamente devidos pela apelante e os valores por ela transferidos indevidamente, de modo que não se pode precisar se toda a quantia transferida para a conta bancária de Daniela efetivamente era indevida.

    Contudo, tal fato, por si só, não obsta a condenação pela prática do crime de furto que foi imputado à apelante, sendo que somente afasta a incidência da continuidade delitiva, visto que não se pode indicar a quantidade de delitos perpetrados.

    Ora, conforme bem ressaltado na sentença de fls. 324/325, o montante total transferido para a conta bancária de Daniela Aparecida Limas Silveira (R$ 21.661,00 - vinte e um mil, seiscentos e sessenta e um reais) mostra-se totalmente incompatível com o valor por ela recebido como salário à época dos fatos.

    A vítima Jorge Maluche Waltrick, sóciogerente da empresa Calisul Ltda, declarou perante a Autoridade Policial:

    "[...] QUE o depoente é Engenheiro Químico e proprietário da Empresa Calesul Serviços; QUE Daniela foi contratada como secretária da empresa no mês de outubro de 2009; QUE de lá pra cá Daniela foi se tornando uma funcionária de confiança do declarante, tendo acesso inclusive a senha da conta da empresa junto ao banco Bradesco. Agência 0360-3, c/c 0050023-2; QUE Daniela efetuou várias transferências da conta da empresa para sua conta particular e também para a conta de seu pai, totalizando no ano de 2011, a quantia de R$ 7.505,00 (sete mil quinhentos e cinco reais), no ano de 2012, contabilizando o valor de 12.606,00 (doze mil seiscentos e seis reais), mais a quantia de R$ 1.560 (um mil quinhentos e sessenta reais), contabilizando um prejuízo total de R$ 21.661,00 (vinte e um mil seiscentos e sessenta e um reais); QUE neste ato o declarante e seu advogado solicitam a juntada dos documentos anexos que se referem a descrição pormenorizados valores transferidos e das datas que tais transferências foram efetuadas; QUE apesar de já ter havido transferência no ano de 2011 o declarante só teve conhecimento de tal fato em data próxima do registro do Boletim de Ocorrência; [...] QUE o declarante já tentou negociar a dívida com Daniela, inclusive propondo um parcelamento, mas que a mesma não quis pagar a dívida mesmo assim; QUE Daniela foi despedida da empresa por justa causa e que não trabalha mais no local desde o mês de dezembro de 2012; QUE a última tentativa de contato com Daniela ficou acertado que a mesma compareceria na cidade de Lages no dia 10 de janeiro do corrente ano, já que a mesma não reside mais nesta cidade, mas que Daniela não compareceu; QUE além disso o declarante também não conseguiu mais contato com Daniela através do telefone por ela anteriormente fornecido" (termo de declaração de fls. 8/9).

    Posteriormente, em juízo, repisou as declarações inicialmente prestadas:

    "(01:03): Indagado se a empresa foi vítima como imputa a exordial, delito de furto com continuidade por parte da Daniela: Na minha opinião sim.

    (01:13): Foi uma época que eu saía mais pra trabalhar fora, visitar clientes. E um dia eu comentei com a Daniela 'Daniela, eu tenho uma preocupação de que eu não quero deixar atrasar o pagamento de vocês, eu acho que vou no Bradesco e faço uma senha pra você, pra você fazer o pagamento dos funcionários' que e tinha três na época, então eu fui de boa índole e ela movimentava a senha do banco, agora eu jamais imaginei que ela fosse fazer o que ela fez.

    (02:07): E eu sempre disse 'Daniela, eu não gostaria de prejudicar você de maneira nenhuma', fui na casa dela, conversei com o pai dela, mas ela nunca quis falar comigo, pra nós fazer um acordo entendeu, já que o erro foi dela, mas eu confiei nela então o que que eu posso fazer?

    (02:38): Se o senhor olhar os documentos que eu tenho aqui, eu fui no Bradesco e tirei a relação, a transferências foram pra conta dela, sem pagamentos de funcionários entendeu, foi aleatório, um dia R$ 300,00, um dia R$ 600,00, outro dia R$ 500,00 e o tempo foi passando e eu naquela época tava realmente muito ocupado.

    (03:04): E um dia eu no Bradesco tirei um extrato e olhei, transferência Daniela, por exemplo R$ 300,00, R$ 400,00. A transferência tinha que ser do valor integral do salário [...]. A Cristiane por exemplo que trabalhava comigo ela recebeu o salário através do Bradesco, eu nunca paguei atrasado, sempre paguei certinho, geralmente até dia 05, e foi isso que aconteceu.

    (04:08): Sobre o período que aconteceu os fatos: Foi no ano de 2012, no inicio.

    (04:22): Se os depósitos eram feitos só na conta dela ou tinha na conta de algum familiar dela também: Eu localizei, agora precisamente não lembro porque não vi mais, um valor pequeno na conta do pai dela, e os outros todos na conta dela.

    (05:05): A única intenção que eu criei essa senha foi pra fazer o pagamento dos salários delas. Só pra isso.

    (05:30): Se tinha o acesso à senha: Eu tinha, mas era um tempo que tinha muita coisa pra eu resolver, e eu até gostava da Daniela, tinha uma certa confiança, mas a gente se decepciona né.

    (06:06): A única coisa que ela fazia fora esse Internet Banking é que eu fazia cheques, eu assinava o cheque no meu nome, então vamos dizer, ela fazia pagamento de telefone, de luz, de água [...].

    (06:21): Se os outros colaboradores também faziam isso: Não, era uma questão de organização, a Cristiane por exemplo trabalhava no laboratório, então não podia tá tirando ela, e fica difícil né uma hora um funcionário e uma hora outra, então eu disse 'não Dani, você faz os pagamentos...'.

    (06:50): Se tinha alguma confiança especial em Daniela para que ela mexesse na conta: Confiar a gente confia né, mas a gente se decepciona, eu particularmente hoje trabalho sozinho e não tenho planos nenhum de trabalhar com ninguém.

    (07:23): Indagado como eram feitos os pagamentos: Via Internet Banking, por transferência.

    (07:38): Logo que ela começou a trabalhar comigo eu não dei essa liberdade a ela, sempre era eu que fazia os pagamentos [...].

    (09:05): Indagado se a empresa tinha outra conta: Nós tínhamos uma no Itaú.

    (09:15): Confirma que a transferência de salário era feita pela Daniela através da conta do Bradesco.

    (09:50): Eu criei o Internet Banking com a intenção de garantir o pagamento delas em dia. Eventualmente eu poderia ter pago através de cheque meu [...].

    (10:33): Se além da Daniela outras funcionárias recebiam o salário por transferência bancária: A Cristiane também recebeu [...]. A Cristiane recebeu salários pelo Internet Banking, a Daniela recebeu, mas era pra salário, não era pra retirada de dinheiro [...].

    (12:01): Confirma que ela estava autorizada a fazer o pagamento dos salários.

    (12:10): Mas o salário né, porque o que acontece, se o senhor olhar ali os valores, ele vai tá entre R$ 19.000,00 e R$ 20.000,00, essa menina me deu um prejuízo tão violento. E outra coisa assim, se o senhor olhar eu fazia uns empréstimos no Bradesco, porque a gente podia fazer um empréstimo pequeno, e eu ia cobrindo aquele valor, então ela me prejudicou nos juros que eu pagava e no dinheiro que sumiu na minha conta [...].

    (13:55): Confirma que tiveram algumas dificuldades financeiras, mas que nunca atrasou salários.

    (14:20): Confirma que nesse período o salário era feito predominantemente por Internet Banking" (termo de audiência de fls. 324/325).

    Colhe-se que a vítima declarou, em ambas as fases processuais, que a conta bancária movimentada pela acusada foi criada exclusivamente com a finalidade de efetuar o pagamentos do salário dos funcionários da empresa Calisul Ltda, sendo que Daniela Aparecida Limas Silveira possuía a senha de acesso da referida conta bancária para fins de pagamentos dos empregados da empresa.

    Ressalta-se que, a palavra da vítima em crimes contra o patrimônio goza de relevante valor probatório, mormente porque as declarações de Jorge Maluche Waltrick seguiram a linha de coerência em relação a todas as demais provas constituídas no feito, sobretudo a prova documental acostada aos autos.

    Sobre os fatos, a testemunha Cristiane Sachett Bianchini relatou na Delegacia de Polícia:

    "[...] QUE a depoente era funcionária de JORGE MALUCHE WALTRICK, na empresa Calesul Serviços a época dos fatos noticiados nos presentes autos; QUE a depoente não possuía relação de amizade ou parentesco com DANIELA, sendo o relacionamento com a mesma estritamente profissional; QUE a depoente exercia a função de técnica em química e que DANIELA era auxiliar de escritório; QUE DANIELA era responsável por fazer o pagamento de contas e boletos da empresa; QUE a depoente ficou sabendo da apropriação indébita porque auxiliou JORGE na averiguação dos valores sacados do Banco por DANIELA, quando a mesma havia saído de férias, sendo então verificado que os valores gastos com pagamentos da empresa não correspondiam aos saques efetuados por DANIELA; QUE DANIELA nunca comentou nada sobre tais fatos com a depoente; QUE após isso DANIELA foi desligada da empresa por justa causa; QUE DANIELA não tinha acesso aos cartões bancários físicos da empresa, mas que tinha acesso ao banco através da internet, sendo que as operações que realizou foram dessa forma" (termo de depoimento de fl. 82).

    Posteriormente, sob o crivo do contraditório, declarou:

    "(01:43): Afirma ter trabalhado na empresa Calisul Ltda. Que o sócio gerente era o Jorge Waltrick. Que a acusada Daniela trabalhava no administrativo, ajudava no financeiro emitia notas fiscais, tinha acesso a conta, realizava os pagamentos dos funcionários. Que uma conta era do Bradesco e a outra do Itaú.

    (03:18): Na verdade assim, eu não tinha conhecimento. Só fiquei sabendo quando ela saiu de férias, e a outra funcionária precisou da senha e solicitou ao

    banco. Aí que ela percebeu algumas transferências para a conta dela. Da conta do Bradesco, para a conta da Daniela.

    (03:45): Que o fato foi percebido pela outra funcionária, que levou a conhecimento do responsável (Jorge).

    (04:03): Relata que ela não voltou após as férias, que foi dispensada.

    (04:30): Que não tem conhecimento de desacerto entre a empresa e a senhora Daniela em questões trabalhistas.

    (04:45): A respeito das transferências que foram realizados para a conta de Daniela: 'O Jorge tem todos os papéis, ele me mostrou'.

    (05:00): Relata que não teve nenhum contato com a acusada após ter conhecimento sobre esses fatos.

    (05:10): Que saiu da empresa em 2013, não recorda o mês. Foi quase um ano após o ocorrido.

    (05:38): Daí na verdade assim, a gente percebeu que haviam várias transferências durante o mês. E eram fora das datas de pagamento, foi mais de mês. Acho que foi em torno de 10 meses a 1 ano que teve as transferências, era mais de uma por mês.

    (06:23): Eu sei que na época, a Sandra que é a outra funcionária e o Jorge eles calcularam em torno de R$ 20.000,00 [...].

    (08:13): Eu não tinha muito acesso a parte financeira, mas ele sempre reclamava que estava ruim. Alguma coisa eu ficava sabendo, mas meu trabalho era mais direcionado a parte de análises.

    (08:50): As vezes a Dani falava, o Jorge falava. As vezes tinha que fazer compensação de títulos no banco, antecipava os boletos para poder pagar algumas dívidas.

    (09:39): Relata que as transferências da empresa para sua conta eram de salário [...]" (termo de audiência de fl. 322 ).

    Referida testemunha afirmou que teve acesso aos extratos da conta bancária da empresa, de modo que constatou que efetivamente haviam diversas transferências para a conta bancária da apelante, as quais ocorreram fora das datas previstas para o pagamento do salário dos funcionários da empresa Calisul Ltda, havendo mais de uma transferência por mês.

    Assim, não obstante as alegações da defesa, inexistem dúvidas quanto a ocorrência do crime de furto imputado a Daniela Aparecia Limas Silveira, mormente porque a prova oral produzida corrobora com a documentação existente no presente feito.

    Dos extratos bancários referentes à movimentação financeira da conta nº 50023-2, agência 0360, de titularidade da empresa Calisul Serviços Ltda, denota-se a existência de inúmeras transferências bancárias para a conta de titularidade da apelante, as quais ocorreram no período compreendido entre agosto de 2011 e outubro de 2012, conforme se extrai de fls. 115/239 (especificamente fls. 140 a 230).

    Embora sustente a apelante que as transferências realizadas eram referentes ao seu salário que, em decorrência do atraso no pagamento, por muitas vezes era parcelado pela vítima Jorge Maluche Waltrick, uma breve análise dos extratos bancários acostados aos autos faz com que referida alegação caia por terra, visto que, em curto período de tempo existem transferências de valores que, somados, não correspondem ao salário recebido pela apelante à época dos fatos.

    Entretanto, conforme bem destacado por este Órgão Ministerial quando de suas derradeiras alegações, não se pode negar que parte dos valores transferidos para a conta da apelante podem efetivamente ser referentes ao seu salário. Contudo, não se pode admitir que a totalidade do valor transferido diga respeito ao salário devido, visto que o montante transferido se mostra totalmente incompatível com a remuneração recebida pela apelante na época do ocorrido.

    Ademais, em que pese não se possa precisar quais são os valores referentes aos salários da apelante e quais são referentes as transferências indevidas, tal fato não obsta a condenação de Daniela pelo crime de furto que lhe foi perpetrado, porquanto não obstante as alegações da defesa, a prova oral produzida, em conjunto com a prova documental existente nos autos, mostra-se suficiente a embasar o decreto condenatório, não deixando dúvidas quanto a ocorrência do crime de furto, qualificado pelo abuso de confiança.

    No tocante ao ônus da prova, conforme bem asseverado no recurso de apelação de fls. 330/337, dispõe o artigo 156 do Código de Processo Penal que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer [...]".

    Deste modo, verifica-se que, muito embora sustente a apelante que as quantias transferidas para sua conta bancária referem-se ao seu salário, tal fato não restou devidamente comprovado nos autos, havendo apenas uma simples e rápida conta à fl. 334, a qual não se presta a comprovar a origem lícita da integralidade dos valores transferidos pela apelante.

    Sobre o assunto, colhe-se da jurisprudência do egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina:

    "APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. FURTO SIMPLES [ART. 155, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL]. CONDENAÇÃO EM PRIMEIRO GRAU. RECURSO DA DEFESA. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO PELA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. PALAVRA DA VÍTIMA CORROBORADA PELO DEPOIMENTO DOS POLICIAIS. ADEMAIS, DEPOIMENTO DOS AGENTES PÚBLICOS QUE, AUSENTE PROVA DE MÁ-FÉ, POSSUEM ESPECIAL CREDIBILIDADE. RES FURTIVA APREENDIDA NA POSSE DOS RÉUS. [...] PROVAS ROBUSTAS A SUSTENTAR O DECRETO CONDENATÓRIO. ÁLIBI NÃO COMPROVADO PELO RÉU. ÔNUS DA DEFESA. ART. 156 DO CPP" (TJSC, Apelação Criminal nº 0018643-89.2013.8.24.0039, de Lages, relª. Desª. Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer, j. 9/8/2018).

    E ainda:

    "APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO DUPLAMENTE CIRCUNSTANCIADO PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO E CONCURSO DE PESSOAS; FURTO QUALIFICADO PELO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO (ART. 157, § 2º, I E II, E ART. 155, § 4º, I, C/C O ART. 69 TODOS DO CÓDIGO PENAL) [...]. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE FURTO QUALIFICADO PARA O DELITO DE RECEPTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RÉU FLAGRADO NA POSSE DA RES FURTIVA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DEFESA QUE NÃO LOGROU COMPROVAR EVENTUAL AQUISIÇÃO DOS OBJETOS APREENDIDOS. TESE AFASTADA [...]" (TJSC, Apelação Criminal nº 0011220- 95.2016.8.24.0064, de São José, rel. Des. Luiz Néri Oliveira de Souza, j. 9/8/2018).

    Neste sentido, em que pese a defesa alegue que este Órgão Ministerial deveria ter pugnado pela realização de perícia contábil a fim de determinar o exato valor subtraído, entende-se que referida prova é completamente desnecessária, porquanto bem demonstrado nos autos a ocorrência do crime de furto, sendo que a não especificação da quantia efetivamente subtraída não constitui empecilho à condenação.

    Assim, não há que se falar em incidência do princípio do in dubio pro reo, porquanto a prova oral e documental produzida nos autos é uníssona, inexistindo qualquer dúvida quanto a ocorrência do crime de furto imputado à apelante.

           Por oportuno, a fim de evitar tautologia, transcreve-se também as conclusões exaradas pelo Procurador de Justiça Jorge Orofino da Luz Fontes:

    Inicialmente, para que possa ser estabelecido um parâmetro de comparação entre o salário da recorrente e os valores transferidos para sua conta bancária, é necessário consignar que na Rescisão de Contrato de Trabalho de fls. 20 está registrado que ela percebia o montante de R$ 971,48 (novecentos e setenta e um reais e quarenta e oito centavos).

    Primeiro, que existe considerável discrepância entre o valor do salário da recorrente (fl. 20) e os montantes que foram transferidos para sua conta bancária durante o período em que teve acesso à conta da empresa, o que leva ao reconhecimento da materialidade delitiva.

    Caso observado o cálculo apresentado pela própria recorrente nas razões recursais, de que teria direito a valores correspondentes a 16 (dezesseis) meses de salário, o valor chegaria a apenas R$ 15.543,68 (16 x 971,48), em muito inferior às importâncias transferidas para seu poder.

    De igual modo, não foi apresentada justificativa plausível para que as transferências fossem realizadas em parcelas distintas, em diversos dias de cada mês, nem para o fato de que foi realizado repasse para a conta de seu pai Pedro de Paula Silveira.

    A circunstâncias de que não foi apurado o valor efetivamente subtraído em nada lhe pode favorecer, pois a consequência jurídica de tal situação foi justamente o afastamento da continuidade delitiva em seu benefício, diante da certeza inequívoca de que, ainda que incerto o número de vezes, houve o furto de valores, mediante abuso de confiança.

    Aliás, a existência de tal qualificadora do delito, de ordem subjetiva, impede o reconhecimento da forma privilegiada do delito, conforme iterativo entendimento jurisprudencial.. Assim, a não apuração do montante total, seguramente acima do valor do salário mínimo como demonstrado, não obsta que se reconheça ser inviável tanto a figura privilegiada do crime como a aplicação do princípio da insignificância (fls. 361-372). (grifado)

           Como se vê, especialmente pela prova oral colhida, é incontroverso nos autos que a recorrente exercia a função de auxiliar de escritório na empresa vítima, sendo-lhe fornecida pelo representante legal da pessoa jurídica a senha da conta corrente 50023-2, agência 360, Banco Bradesco, a fim de que, por meio eletrônico, efetuasse os pagamentos dos salários dos funcionários.

           Compulsando extrato de movimentação financeira da conta corrente 50023-2, agência 360, Banco Bradesco, de titularidade da pessoa jurídica Calisul Serviços Ltda., infere-se que a apelante efetuou para conta de sua titularidade as seguintes transferências:

    16 de agosto de 2011, no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais), DOC 0828135 (fl. 138);

    24 de agosto de 2011, no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais), DOC 0205079 (fl. 140);

    31 de agosto de 2011, no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), DOC 0550284 (fl. 141);

    6 de setembro de 2011, no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), DOC 0916590 (fl. 142);

    20 de setembro de 2011, no valor de R$ 80,00 (oitenta reais), DOC 0748847 (fl. 143);

    21 de setembro de 2011, no valor de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), DOC 0791071 (fl. 144);

    29 de setembro de 2011, no valor de R$ 200,00 (duzentos reais), DOC 0199853 (fl. 145);

    7 de outubro de 2011, no valor de R$ 90,00 (noventa reais), DOC 0762212 (fl. 148);

    21 de outubro de 2011, no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), DOC 0566534 (fl. 151);

    31 de outubro de 2011, no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), DOC 0059181 (fl. 153);

    1 de novembro de 2011, no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), DOC 0205901 (fl. 153);

    4 de novembro de 2011, no valor de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), DOC 0332931 (fl. 154).

    18 de novembro de 2011, no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais), DOC 0232728 (fl. 157);

    24 de novembro de 2011, no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais), DOC 0505146 (fl. 159);

    9 de dezembro de 2011, no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), DOC 0636143 (fl. 161);

    19 de dezembro de 2011, no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), DOC 207008 (fl. 60);

    19 de dezembro de 2011, no valor de R$ 125,00 (cento e vinte e cinco reais), DOC 208544 (fl. 60);

    22 de dezembro de 2011, no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), DOC 0488086 (fl. 165);

    6 de janeiro de 2012, no valor de 660,00 (seiscentos e sessenta reais), DOC 0367644 (fl. 167);

    18 de janeiro de 2012, no valor de R$ 450,00 (quatrocentos e cinquenta reais), DOC 0987611 (fl. 168);

    23 de janeiro de 2012, no valor de R$ 280,00 (duzentos e oitenta reais), DOC 0235430 (fl. 170);

    24 de janeiro de 2012, no valor de R$ 380,00 (trezentos e oitenta reais), DOC 0273424 (fl. 170);

    26 de janeiro de 2012, no valor de R$ 100,00 (cem reais), DOC 0417403 (fl. 171);

    23 de fevereiro de 2012, no valor de R$ 65,00 (sessenta e cinco reais), DOC 0129460 (fl. 174);

    29 de fevereiro de 2012, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), DOC 0434086 (fl. 176);

    1 de março de 2012, no valor de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), DOC 0612761 (fl. 178);

    23 de março de 2012, no valor de R$ 792,00 (setecentos e noventa e dois reais), DOC 0102253 (fl. 182);

    30 de março de 2012, no valor de R$ 70,00 (setenta reais), DOC 0447058 (fl. 184);

    20 de abril de 2012, no valor de R$ 194,00 (cento e noventa e quatro reais), DOC 0929816 (fl. 189);

    15 de maio de 2012, no valor de R$ 240,00 (duzentos e quarenta reais), DOC 0475847 (fl. 196);

    22 de maio de 2012, no valor de R$ 280,00 (duzentos e oitenta reais), DOC 0954744 (fl. 198);

    25 de maio de 2012, no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), DOC 0170452 (fl. 199);

    31 de maio de 2012, no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), DOC 0540218 (fl. 200);

    6 de junho de 2012, no valor de R$ 273,00 (duzentos e setenta e três reais), DOC 0048120 (fl. 203);

    22 de junho de 2012, no valor de R$ 246,00 (duzentos e quarenta e seis reais), DOC 0031053 (fl. 205);

    25 de junho de 2012, no valor de R$ 582,00 (quinhentos e oitenta e dois reais), DOC 0124643 (fl. 206);

    28 de junho de 2012, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), DOC 0413699 (fl. 206);

    29 de junho de 2012, no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), DOC 0540471 (fl. 207);

    2 de julho de 2012, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), DOC 0677288 (fl. 208);

    23 de julho de 2012, no valor de R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais), DOC 0149137 (fl. 212);

    25 de julho de 2012, no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais), DOC 287991 (fl. 39);

    9 de agosto de 2012, no valor de R$ 200,00 (duzentos reais), DOC 0482705 (fl. 216);

    21 de agosto de 2012, no valor de R$ 700,00 (setecentos reais), DOC 0243611 (fl. 218);

    22 de agosto de 2012, no valor de R$ 800,00 (oitocentos reais), DOC 0369861 (fl. 219);

    27 de agosto de 2012, no valor de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais), DOC 0587015 (fl. 220);

    29 de agosto de 2012, no valor de R$ 391,00 (trezentos e noventa e um reais), DOC 0714405 (fl. 223);

    6 de setembro de 2012, no valor de R$ 982,00 (novecentos e oitenta e dois reais), DOC 0405115 (fl. 224);

    1 de outubro de 2012, no valor de R$ 26,00 (vinte e seis reais), DOC 0452037 (fl. 229);

    5 de outubro de 2012, no valor de R$ 1.317,00 (mil trezentos e dezessete reais), DOC 0054429 (fl. 230).

           Sem perder de vista, ainda, o valor de R$ 300,00 (trezentos reais) transferido em 20 de janeiro de 2012 a Pedro de Paula Silveira (fl. 169), pai da apelante.

           Do relatório elaborado pelo representante da empresa (fls. 3-7), por sua vez, verifica-se que não foram mencionados os seguintes montantes: 6 de junho de 2012, no valor de R$ 273,00 (duzentos e setenta e três reais), DOC 0048120 (fl. 203); 6 de setembro de 2012, no valor de R$ 982,00 (novecentos e oitenta e dois reais), DOC 0405115 (fl. 224); 5 de outubro de 2012, no valor de R$ 1.317,00 (mil trezentos e dezessete reais), DOC 0054429 (fl. 230).

           Observa-se que na mesma data houve transferências para também funcionária Cristiane Schett Bianchini, que ressaltou em seu depoimento judicial que os valores recebidos por esse meio referiam-se ao seu salário, cujo pagamento era efetuado até o quinto dia útil do mês. Diga-se, aliás, conforme declaração da testemunha, que às vezes a quitação era realizada pessoalmente pelo proprietário da empresa, razão pela qual não existem registros bancários.

           Essas circunstâncias permitem concluir que os valores transferidos para apelante por intermédios dos DOC 0048120 (fl. 203), DOC 0405115 (fl. 224), DOC 0054429 (fl. 230), são legais, tanto é que a própria vítima os desconsiderou quando do levantamento financeiro realizado. Isso, inclusive, reforça que não há razões para que a vítima imputasse gratuitamente os fatos à insurgente.

           Outrossim, esses elementos corroboram que as transferências ocorriam diretamente ao seu destinatário final, isto é, à empregada que receberia o salário, de modo que a apelante, através de sua conta bancária, não se tratava de intermediadora, como busca fazer crer. Ou seja, a quantia referente aos pagamentos dos salários dos demais empregados da vítima não eram primeiramente repassados primeiro para recorrente para só depois ela entregar o valor ao empregado correspondente.

           Além do mais, conforme termo de rescisão contratual (fl. 20), a remuneração da apelante era de R$ 971,48 (noventos e setenta e um reais e quarenta e oito centavos).

           Ocorre que foram transferidos para si, desconsiderando os DOCs 0048120 (fl. 203), 0405115 (fl. 224), 0054429 (fl. 230), no mês de agosto de 2011, o total de R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais); no mês de setembro de 2011, o total de R$ 1.030,00 (mil e trinta reais); no mês de outubro de 2011, o total de R$ 690,00 (seiscentos e noventa reais); no mês de novembro de 2011, o total de R$ 2.250,00 (dois mil, duzentos e cinquenta reais); no mês de dezembro de 2011, o total de R$ 1.325,00 (mil, trezentos e vinte e cinco reais); no mês de janeiro de 2012, o total de R$ 1.870,00 (mil, oitocentos e setenta reais), sem considerar os R$ 300,00 diretamente destinados ao seu genitor; no mês de fevereiro de 2012, o total de R$ 1.065,00 (mil e sessenta e cinco reais); no mês de março de 2012, o total de R$ 1.012,00 (mil e doze reais); no mês de abril de 2012, o total de R$ 194,00 (cento e noventa e quatro reais); no mês de maio de 2012, o total de R$ 1.320,00 (mil, trezentos e vinte reais); no mês de junho de 2012, o total de R$ 2.328,00 (dois mil, trezentos e vinte e oito reais); no mês de julho de 2012, o total de R$ 2.150,0 (dois mil, cento e cinquenta reais); no mês de agosto de de 2012, o total de R$ 2.341,00 (dois mil, trezentos e quarenta e um reais); no mês de outubro, o total de R$ 26,00 (vinte e seis reais).

           Não se olvida que a apelante aponta que as transferências eram referentes ao parcelamento do montante total do seu salário, no entanto, pouco crível sua alegação, na medida que as movimentações financeiras ocorriam, às vezes, no mesmo dia, ou em dias seguidos, sem que houvesse qualquer alteração positiva no saldo bancário. Se o fato da empresa estar com problemas financeiros fosse a justificativa para os valores discrepantes destinados a sua conta corrente, por certo, o representante legal aguardaria a modificação dessa condição para efetuar nova quitação.

           De igual modo, não se desconhece que no mês de abril de 2012 o valor de R$ 194,00 (cento e noventa e quatro reais) é inferior à remuneração recebida pela apelante. Porém, vale relembrar que a funcionária Cristiane declarou que às vezes o pagamento do salário era efetuado pessoalmente.

           E, repete-se, as transferências ocorreram em datas aleatórias, não condizentes com a data que a vítima e a testemunha afirmaram que os salários eram pagos.

           Logo, comprovado que Daniela Aparecida Limas Silveira subtraiu para si o montante de R$ 7.495,00 (sete mil, quatrocentos e noventa e cinco reais) no ano de 2011, e de R$ 12.306,00 (doze mil, trezentos e seis reais) no ano de 2012, além do valor de R$ 300,00 (trezentos reais) subtraído para outrem (seu genitor).

           Diga-se, à título argumentativo, ainda que considerado que parte dessa quantia lhe era devida, em virtude do pagamento de seus salários, não se pode desconsiderar que o valor total excede a remuneração por ela recebida. Nesse sentido, repisa-se as palavras do judicioso Parecerista: "Caso observado o cálculo apresentado pela própria recorrente nas razões recursais, de que teria direito a valores correspondentes a 16 (dezesseis) meses de salário, o valor chegaria a apenas R$ 15.543,68 (16 x 971,48), em muito inferior às importâncias transferidas para seu poder".

           Desse forma, a quantia excedente a esse valor configura a res furtiva. Isto é, R$ 4.557,32 (quatro mil, quinhentos e cinquenta e sete reais, e trinta e dois centavos).

           Assim, inviável a absolvição da apelante, seja nos termos do art. 386, III, do Código de Processo Penal, seja com fulcro no art. 386, VII, do Código de Processo Penal.

           Execução imediata da pena

           Reconhecida a responsabilidade penal e com o pleno exercício do duplo grau de jurisdição, deve ser adotada a nova orientação do Supremo Tribunal Federal, que passou a vigorar a partir do julgamento do HC 126.292/SP e estabeleceu ser possível o cumprimento imediato da pena quando já existente o pronunciamento judicial em segundo grau de jurisdição, ainda que não tenha ocorrido o trânsito em julgado da decisão condenatória e sem que isso caracterize afronta ao princípio da presunção de inocência. Tal entendimento foi reafirmado no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 964246, que teve repercussão geral reconhecida.

           Não obstante este Relator tenha adotado, previamente, entendimento em consonância com o precedente exarado pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça nos Embargos de Divergência 1.619.087/SC, no sentido de não estender a orientação do Supremo Tribunal Federal às penas substituídas ou com execução suspensa (conforme voto proferido nos embargos ED 0001442-50.2014.8.24.0039, julgado em 26-10-2017), pertinente a revisão de tal entendimento.

           Isso porque o STF enfrentou a questão no Agravo Regimental no Habeas Corpus 142.750/RJ em 02-6-2017, em voto da relatoria do Ministro Luiz Fux, oportunidade em que se entendeu possível a execução provisória da pena privativa de liberdade, ainda que substituída por restritivas de direitos ou concedida a suspensão condicional da pena (sursis). Esta Corte também adotou essa orientação, conforme os seguintes precedentes: Apelação Criminal 0033686-80.2014.8.24.0023, Segunda Câmara Criminal, Rel. Des. Sérgio Rizelo, j. 31-10-2017, v.u.; Apelação Criminal 0013714-18.2010.8.24.0039, Terceira Câmara Criminal, Rel. Des. Rui Fortes, j. 14-11-2017, v.u.

           Assim, plenamente possível a determinação de início imediato da execução da pena, após o julgamento do presente recurso de apelação, sobretudo porque eventual interposição de recursos para os Tribunais Superiores não impede a execução da sentença condenatória, haja vista a ausência de efeito suspensivo para tais recursos (a teor do art. 637 do Código de Processo Penal e art. 995 do Código de Processo Civil).

           Com efeito, determina-se o início imediato da execução da pena ora imposta, de modo que o juízo da condenação deverá tomar as providências necessárias, nos termos do posicionamento do Supremo Tribunal Federal.

           Ante o exposto, voto pelo conhecimento e pelo desprovimento do recurso.

           Este é o voto.


Gabinete Des. Carlos Alberto Civinski