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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 4025750-97.2017.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Ernani Guetten de Almeida
Origem: Joinville
Orgão Julgador: Segundo Grupo de Direito Criminal
Julgado em: Wed Apr 25 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Não informado
Classe: Revisão Criminal

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STJ: 231

 

ESTADO DE SANTA CATARINA

       TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Revisão Criminal n. 4025750-97.2017.8.24.0000


 

ESTADO DE SANTA CATARINA

       TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Revisão Criminal n. 4025750-97.2017.8.24.0000, de Joinville

Relator: Desembargador Ernani Guetten de Almeida

   REVISÃO CRIMINAL. REVISIONANDO CONDENADO PELA PRÁTICA DOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTS. 317, § 1º, E 344, AMBOS C/C 59, CAPUT, E 69, CAPUT, TODOS DO CÓDIGO PENAL, À PENA DE 4 (QUATRO) ANOS, 3 (TRÊS) MESES E 21 (VINTE E UM) DIAS DE RECLUSÃO, EM REGIME INICIAL SEMIABERTO.

    PRETENSÃO DE READEQUAÇÃO DA REPRIMENDA NA PRIMEIRA FASE DOSIMÉTRICA. AVENTADA MAJORAÇÃO INIDÔNEA DA PENA-BASE EM RAZÃO DA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL 'CULPABILIDADE' NO CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA. INOCORRÊNCIA. FACILITAÇÃO DE FUGA DE PESSOA PRESA POR AGENTE PENITENCIÁRIO. PRERROGATIVAS INERENTES À FUNÇÃO QUE EXCEDEM O TIPO PENAL. FUNDAMENTAÇÃO, ADEMAIS, QUE AFASTA A ALEGADA OCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM DIANTE DA CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DO CRIME PREVISTO NO ART. 301, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. VALORAÇÃO NEGATIVA QUE NÃO SE CONFUNDE COM OS ELEMENTOS INERENTES AO TIPO PENAL PRATICADO POR QUALQUER FUNCIONÁRIO PÚBLICO.

   ALEGADA NEGATIVAÇÃO INDEVIDA DA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL 'CONSEQUÊNCIA' QUANTO AO CRIME DE COAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO. INOCORRÊNCIA. OFENDIDO QUE ALTEROU SUA NARRATIVA COM O INTUITO DE AFASTAR A CONDENAÇÃO DO ORA REVISIONANDO. CRIME FORMAL. OBTENÇÃO DA FINALIDADE QUE ENSEJA A MAJORAÇÃO DA REPRIMENDA. 

   PERDA DO CARGO PÚBLICO. TESE ANALISADA NA SENTENÇA E CONFIRMADA EM APELAÇÃO CRIMINAL. INADMISSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DA VIA REVISIONAL COMO TERCEIRA INSTÂNCIA. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO.

   REVISIONAL PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA EXTENSÃO, INDEFERIDA. CORREÇÃO, DE OFÍCIO, DE ERRO MATERIAL NA SOMA DAS PENAS.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Revisão Criminal n. 4025750-97.2017.8.24.0000, da comarca de Joinville (2ª Vara Criminal) em que é/são Requerente(s) Euclides Woitexem Neto.

           O Segundo Grupo de Direito Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer parcialmente e, nesta extensão, indeferir a Revisão Criminal; de ofício, corrigir erro material na soma das penas. Custas legais.

           Presidiu o julgamento, realizado nesta data, a Exma. Sra. Desa. Salete Silva Sommariva, com voto, e dele participaram os Exmos. Srs. Deses. Volnei Celso Tomazini, Cinthia Beatriz da S. Bittencourt Schaefer, Luiz Cesar Schweitzer, Sidney Eloy Dalabrida, Luiz Antônio Zanini Fornerolli, Carlos Alberto Civinski e Getúlio Corrêa. Funcionou como Representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Francisco Bissoli Filho.

           Florianópolis, 25 de abril de 2018.

Desembargador Ernani Guetten de Almeida

Relator

 

RELATÓRIO

           Trata-se de revisão criminal formulada por Euclides Woitexem Neto, condenado pela prática dos crimes previstos nos arts. 317, § 1º, e 344, ambos c/c 59, caput, e 69, caput, todos do Código Penal, à pena de 4 (quatro) anos, 3 (três) meses e 21 (vinte e um) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, ao pagamento de 25 (vinte e cinco) dias-multa e à perda do cargo público (agente penitenciário), contra acórdão proferido pela Quarta Câmara Criminal, que negou provimento aos recursos de apelação formulados, conforme ementa que se transcreve:

    CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CORRUPÇÃO PASSIVA. CORRUPÇÃO ATIVA. FACILITAÇÃO DE FUGA DE PESSOA PRESA. COAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO. CRIMES CONTRA A SAÚDE E INCOLUMIDADE PÚBLICAS. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. POSSE E PORTE DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO E RESTRITO. CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. USO DE DOCUMENTO FALSO. ARTS. 297, §1º; 304; 317, §1º; 333, PARÁGRAFO ÚNICO; 344; 351, §3º, TODOS DO CP. ARTS. 33 E 35 DA LEI N. 11.343/2006. ARTS. 12, 14 E 16 DA LEI N. 10.826/2003. OITO RÉUS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DA DENÚNCIA. INTERPOSIÇÃO DE RECURSO POR QUATRO ACUSADOS. IRRESIGNAÇÕES PONTUAIS E QUE NÃO ABRANGEM TODOS OS CAPÍTULOS DA SENTENÇA. DELITOS COMETIDOS NO PRESÍDIO REGIONAL DE JOINVILLE. FUGA DE DETENTO QUE DESENCADEOU OPERAÇÃO "AGENTE DUPLO" PELO GRUPO DE ATUAÇÃO ESPECIAL DE COMBATE AO CRIME ORGANIZADO - GAECO. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. OCORRÊNCIA DE DESCOBERTA FORTUITA DE OUTROS DELITOS. 

    1. RECURSOS DOS RÉUS EUCLIDES E MÁRCIO. CONDENAÇÃO PELOS DELITOS DE CORRUPÇÃO PASSIVA (EUCLIDES E MÁRCIO) E COAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO (EUCLIDES). ALEGAÇÃO COMUM DE NEGATIVA DE AUTORIA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA PLENAMENTE DEMONSTRADAS. RÉUS QUE NA CONDIÇÃO DE AGENTE PENITENCIÁRIO E VIGILANTE, RESPECTIVAMENTE, ACEITARAM PROMESSA DE VANTAGEM INDEVIDA PARA FACILITAR A FUGA DE DETENTOS. PROVA TESTEMUNHAL SÓLIDA E UNÍSSONA NA FASE INVESTIGATIVA E EM JUÍZO. EXISTÊNCIA DE DIVERSOS INDÍCIOS QUE CONFORTAM OS TESTIGOS JUDICIAIS. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO. MEDIDA IMPOSITIVA. 

    1.1 RÉU EUCLIDES. COAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO. PLEITO ABSOLUTÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. PROVA TESTEMUNHAL QUE CORROBORA A EXISTÊNCIA DE AMEAÇAS PROFERIDAS CONTRA OS CORRÉUS EM VIRTUDE DE SUA PRISÃO. EFEITOS PROCESSUAIS PRÁTICOS DECORRENTES DA COAÇÃO. RETRATAÇÃO DO RÉU JEFERSON. IRRELEVÂNCIA. EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS QUE COMPROVAM A PRÁTICA DELITIVA. DECRETO CONDENATÓRIO MANTIDO. IMPOSSIBILIDADE DE RETORNO AO EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES DE AGENTE PENITENCIÁRIO. NEXO FUNCIONAL CONFIGURADO. DELITO QUE GUARDA RELAÇÃO COM O OFÍCIO EXERCIDO PELO RÉU. 

    2. RECURSO DO RÉU JEFERSON. 

    2.1. CRIME DE POSSE ILEGAL DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DE CONDUTA. RÉU QUE, NA CONDIÇÃO DE AGENTE PENITENCIÁRIO, POSSUI PORTE DE ARMA. IRRELEVÂNCIA NO CASO CONCRETO. INTELIGÊNCIA DO ART. 6º DO ESTATUTO DO DESARMAMENTO, DEC. N. 5.123/2004, PORTARIA N. 548/2014 DA SECRETARIA DE ESTADO DA JUSTIÇA E CIDADANIA DE SANTA CATARINA E PORTARIAS N. 10/2005 E N. 16/2015 DA DIRETORIA DE FISCALIZAÇÃO DE PRODUTOS CONTROLADOS DO COMANDO LOGÍSTICO DO EXÉRCITO BRASILEIRO. GUARDAS PRISIONAIS QUE SOMENTE PODEM PORTAR/POSSUIR ARTEFATOS COM CALIBRES ESPECÍFICOS. ARMA DE FOGO QUE DEVE ESTAR REGISTRADA E CADASTRADA PELO SERVIDOR NO SISTEMA DE GERENCIAMENTO MILITAR DE ARMAS (SIGMA). NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE UM PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PRÓPRIO PARA A EXPEDIÇÃO DO CERTIFICADO DE REGISTRO DE ARMA DE FOGO (CRAF). RÉU QUE ESTAVA NA POSSE IRREGULAR DE 50 (CINQUENTA) CARTUCHOS DE MUNIÇÃO .40, 4 (QUATRO) PROJÉTEIS CALIBRE .38 E 2 (DUAS) MUNIÇÕES CALIBRE 9MM. MERA CONDIÇÃO DE AGENTE PÚBLICO QUE, POR SI SÓ, NÃO AUTORIZA O SERVIDOR A PORTAR/POSSUIR QUALQUER ARMA DE FOGO OU MUNIÇÂO INDISTINTAMENTE. ATIPICIDADE DE CONDUTA. TESE NÃO ACOLHIDA. 

    Não é possível que o agente público porte/possua qualquer arma de fogo ou munição sem que haja regular processo administrativo que acabe por vincular um artefato específico ao servidor. Se o réu não possui nenhum armamento funcional .38 ou .40, não há justificativa alguma para que levasse munição de ditos calibres do estande de tiros de sua corporação para a sua residência. Além disso, também foi apreendido na posse do acusado munições 9mm, calibre que nem sequer possui autorização legal para manusear, restando configurado o delito previsto no art. 16 da Lei n. 10.826/2003. 

    2.2. CRIME DE POSSE ILEGAL DE MUNIÇÃO DE USO RESTRITO. AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE DELITIVA. INOCORRÊNCIA. DESNECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE EXAME PERICIAL DE POTENCIALIDADE LESIVA NOS PROJÉTEIS. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. POSICIONAMENTO ADMITIDO NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E NESTA CORTE. ADEMAIS, TESE INSUBSISTENTE TAMBÉM, ANTE A EFETIVAÇÃO DO LAUDO PERICIAL RESPECTIVO. 

    A despeito da divergência presente nos tribunais superiores, as câmaras criminais desta Corte de Justiça firmaram posicionamento de que o porte ilegal de arma de fogo (Lei n. 10.826/03, art. 14), sendo crime de perigo abstrato, prescinde de perícia a demonstrar a potencialidade lesiva da arma ou munição [...] (Apelação Criminal n. 2014.049164-4, de São João Batista, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, j. 07-05-2015). 

    3. DELAÇÃO PREMIADA. 

    3.1. RÉU JEFERSON. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA DELAÇÃO PREMIADA. IMPOSSIBILIDADE. ACUSADO QUE SE RETRATOU EM JUÍZO. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. 

    Não pode ser beneficiado com a delação premiada o réu que, na polícia, nega a participação na empreitada criminosa e, em juízo, confessa a autoria delitiva, fato esse, portanto, que não contribuiu para a elucidação do crime por parte da autoridade policial. A confissão, nesse caso, apenas serve para reduzir a pena na segunda fase da dosimetria. [...] (Apelação Criminal n. 2010.078633-8, de Joinville, rel. Des. Roberto Lucas Pacheco, j. 28-11-2013, mutatis mutantis, sem grifo no original). 

    3.2. RÉ DEISE. REQUERIMENTO DE EXTENSÃO DO BENEFÍCIO PARA TODOS OS DELITOS. INVIABILIDADE. ASSUNÇÃO DOS FATOS QUE NÃO FOI DECISIVA PARA A ELUCIDAÇÃO DOS DEMAIS CRIMES. REDUÇÃO DA PENA QUE NÃO PODE PREVALECER EM RELAÇÃO AOS CRIMES DE CORRUPÇÃO PASSIVA, TRÁFICO DE DROGAS E POSSE ILEGAL DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO, POIS OS CORRÉUS "DELATADOS" NEM SEQUER PRATICARAM AS CONDUTAS DEFINIDAS NO SEGUNDO FATO NARRADO NA DENÚNCIA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA QUE NÃO SE CONFUNDE COM O INSTITUTO DA DELAÇÃO PREMIADA, PREVISTO NA LEI 9.807/99. RECURSO NEGADO NO PONTO. 

    A delação premiada é um instituto previsto em diversos diplomas legais que pode acarretar na redução da pena ou no perdão judicial caso ocorra a identificação dos demais autores do delito, o salvamento da vítima ou a recuperação do produto do crime, a depender do caso concreto. Em não tendo o depoimento prestado sido decisivo para a elucidação dos outros crimes, não pode a ré ser beneficiada com o instituto, pois confissão espontânea não se confunde com delação premiada. 

    4. DOSIMETRIA DAS PENAS. 

    4.1. RÉU JEFERSON. TRÁFICO DE DROGAS. 

    4.1.1. PRIMEIRA FASE. PLEITO DE FIXAÇÃO DA PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. INVIABILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME VALORADAS NEGATIVAMENTE. DELITO PRATICADO EM CONCURSO DE AGENTES. FATO QUE NÃO É ELEMENTO DESCRITIVO DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS TAMPOUCO AGRAVANTE GENÉRICA PREVISTA NOS ARTS. 61 E 62 DO CP. ACRÉSCIMO À PENA-BASE. VALIDADE. 

    No que pertine às circunstâncias do crime, "são os elementos acidentais não participantes da estrutura do tipo, embora envolvendo o delito. Quando expressamente gravadas na lei, as circunstâncias são chamadas de legais (agravantes e atenuantes, por exemplo). Quando genericamente previstas, devendo ser formadas pela análise e pelo discernimento do juiz, são chamadas de judiciais. Um crime pode ser praticado, por exemplo, em local ermo, com premeditação, para dificultar a sua descoberta e apuração do culpado, constituindo circunstância gravosa" (NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: Parte Geral. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 421). 

    4.1.2. TERCEIRA FASE. REDUTOR PREVISTO NO ART. 33, §4º, DA LEI DE DROGAS. REQUERIMENTO DE ELEVAÇÃO DA FRAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MAGISTRADO DE PRIMEIRO GRAU QUE FIXOU A REDUÇÃO DA PENA EM 1/6 (UM SEXTO) COM BASE NA NATUREZA E, EM ESPECIAL, NA QUANTIDADE DE DROGA. APREENSÃO DE MAIS DE 1,5 KG DE MACONHA. INVIABILIDADE DE CONCESSÃO DO REDUTOR NO PATAMAR MÁXIMO. CASO CONCRETO. INOCORRÊNCIA DA DÚPLICE APLICAÇÃO DO FATOR NA PENA. AUSÊNCIA, POR CONSEGUINTE, DE CONFRONTO COM POSICIONAMENTO RECENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. QUANTIDADE DA DROGA UTILIZADA COMO FATOR DE AFERIÇÃO APENAS UMA VEZ NA DOSIMETRIA. 

    Consoante já decidiu o STF, em havendo a concessão do benefício de redutor da pena previsto no § 4º, do art. 33, da Lei de Drogas, as circunstâncias estabelecidas no art. 42 do mesmo diploma (qualidade, diversidade e quantidade de drogas) deve ser utilizada ou na primeira fase, para o fito de estabelecer a pena-base, ou na derradeira fase da dosimetria, como fator a influenciar a fração de mitigação. Sua dúplice utilização é vedada, por incorrer na censura do non bis in idem. 

    COMPROVAÇÃO, ADEMAIS, DE PRÁTICAS REITERADAS, O QUE DEVERIA INVIABILIZAR A MERCÊ LEGAL. AUSÊNCIA DE RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, QUE IMPEDE A ADOÇÃO DE PROVIDÊNCIA CORRETIVA. 

    4.2. RÉ DEISE. REVISÃO DA DOSIMETRIA. 

    4.2.1. PRIMEIRA FASE. CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO ANALISADAS NEGATIVAMENTE. PLEITO DE FIXAÇÃO DA PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. INVIABILIDADE. CONCURSO DE PESSOAS QUE PODE ENSEJAR O AUMENTO DA REPRIMENDA. ARGUMENTO IDÔNEO. PLURALIDADE DE AGENTES. VETOR DE FACILITAÇÃO PARA A CONSUMAÇÃO DO DELITO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO SINGULAR. 

    4.2.2. CRIMES DE CORRUPÇÃO ATIVA E TRÁFICO DE DROGAS. SEGUNDA FASE. RECONHECIMENTO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. DEMANDA DE REDUÇÃO DA PENA AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 65 DO CP. INVIABILIDADE. SÚMULA 231 DO STJ. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE. "A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal, nos termos da Súmula 231 do STJ, razão pela qual impossível a redução da pena pelo reconhecimento da confissão espontânea" (STJ, HC 313.640/SP, Rel. Ministro Gurgel De Faria, Quinta Turma, j. 3-3-2015). 

    4.2.3. TERCEIRA FASE. DELAÇÃO PREMIADA. PEDIDO DE REDUÇÃO DA PENA NO PATAMAR MÁXIMO DE 2/3. INVIABILIDADE. CRITÉRIO DE DIMINUIÇÃO DA PENA. INTELIGÊNCIA DO ART. 14 DA LEI N. 9.807/99. IDENTIFICAÇÃO DOS COAUTORES DO DELITO. CONTRIBUIÇÃO DA RÉ QUE NÃO FOI EXCLUSIVA PARA A IDENTIFICAÇÃO DOS DEMAIS ENVOLVIDOS. CASO CONCRETO. RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA ENTRE OS CRIMES DE CORRUPÇÃO ATIVA. FICÇÃO LEGAL QUE É MAIS BENÉFICA À RÉ. AUMENTO DE PENA QUE É MENOR DO QUE A INCIDÊNCIA DO CÚMULO MATERIAL. 

    5. NEGATIVA DE PROVIMENTO AOS RECURSOS. (TJSC, Apelação n. 0035586-24.2012.8.24.0038, de Joinville, rel. Des. Jorge Schaefer Martins, Quarta Câmara Criminal, j. 10-03-2016).

           Diante do trânsito em julgado da decisão condenatória o Requerente ajuizou a presente ação impugnativa, com supedâneo no art. 621, inc. I, do Código de Processo Penal, pleiteando: a) a revisão da dosimetria da pena referente ao crime de corrupção passiva no tocante à valoração negativa da circunstância judicial 'culpabilidade', ao argumento de que a condição de agente penitenciário é elementar do tipo penal, além de o aumento da pena caracterizar bis in idem em razão da aplicação da causa especial de aumento prevista no § 1º do art. 317 do Código Penal; b) a redução da reprimenda concernente ao crime de coação no curso do processo na primeira fase dosimétrica quanto às 'consequências' do delito, uma vez que a alteração da versão do ofendido seria exaurimento do crime de coação; c) a fixação do regime aberto em razão da diminuição das penas; d) o afastamento da condenação à perda do cargo público, por ausência de fundamentação concreta, de acordo com o previsto no art. 92, parágrafo único, do Código Penal.

           Lavrou parecer pela douta Procuradoria de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo de Tarso Brandão, pelo parcial provimento da revisional (pp. 208/214).

           Este é o relatório.

 

VOTO

           Trata-se de revisão criminal formulada por Euclides Woitexem Neto que, com supedâneo no art. 621, inc. I, do Código de Processo Penal, pretende a reanálise da dosimetria da pena, a alteração de regime de cumprimento e o afastamento da pena de perda do cargo público.

           Inicialmente, destaca-se que o artigo 621 do Código de Processo Penal delimita o cabimento da revisão criminal da seguinte forma: "art. 621. A revisão dos processos findos será admitida: I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena."

           No tocante à pretensão de reanálise da dosimetria da pena imposta, ressalta-se que a jurisprudência vem admitindo a revisão criminal nas situações em que esta revela-se equivocada, pautada em erro técnico ou injusta, conforme julgados desta Seção Criminal: Revisão Criminal n. 2015.049586-5, de Caçador, rel. Des. Marli Mosimann Vargas, j. 28.10.2015; Revisão Criminal n. 2015.007622-5, de Blumenau, rel. Des. Salete Silva Sommariva, j. 30.09.2015.

           No caso concreto, o Magistrado a quo consignou:

    [...] V. EUCLIDES WOITEXEM NETO não registra antecedentes. A conduta social e a personalidade não foram investigadas. V.a) Quanto ao crime de corrupção passiva, o motivo, as circunstâncias e consequências não extrapolaram a normalidade do tipo. Porém, a culpabilidade - em razão da condição pessoal de agente penitenciário, encarregado não apenas de zelar pela ordem e disciplina da massa carcerária, mas sobretudo de impedir a fuga de pessoas presas, tal qual vedar o acesso a bens de uso proibido no interior do presídio -, é tanto mais grave justificando a exasperação das penas. Logo, pela culpabilidade acentuada, as sanções são fixadas em 02 anos e 04 meses de reclusão e 11 dias-multa. Não há circunstâncias agravantes ou atenuantes. Na terceira fase, incide o aumento previsto no § 1º do art. 317 do Código Penal, resultando nas penas de 03 anos, 01 mês e 10 dias de reclusão, mais 14 dias-multa. V.b) Quanto ao crime de coação no curso do processo, o motivo, a culpabilidade, as circunstâncias não extrapolaram a normalidade do tipo. As consequências foram diferenciadas a medida que o ofendido alterou suas declarações perante a autoridade policial logo após a coação havida. Em face disso, as penas são fixadas em  01 ano e 02 meses de reclusão, mais 11 dias multa. Não há circunstâncias agravantes ou atenuantes, nem causas especiais de aumento ou diminuição de pena. V.c) Quanto ao concurso de infrações (02), os crimes decorreram de fatos e desígnios autônomos, as penas devem ser somadas em atenção ao art. 69, caput, do Código Penal, resultando em 04 anos, 03 meses e 21 dias de reclusão, mais 25 dias-multa.

    Como a pena privativa de liberdade superou a 04 anos, o cumprimento deverá se iniciar no regime semiaberto. O valor do dia multa é o mínimo diante da atual capacidade financeira do acusado. [...] (pp. 20/21 - grifos no original).

           A irresignação referente ao aumento da pena-base pela valoração negativa da 'culpabilidade' no crime de corrupção passiva não merece prosperar.

           Com efeito, o Juiz a quo majorou a reprimenda na primeira fase dosimétrica em razão da culpabilidade do agente exceder aquela inerente ao tipo penal.

           Como bem ressaltou o Procurador de Justiça Dr. Paulo de Tarso Bransão, que se adota como parte das razões de decidir:

           "[...] Ainda é preciso considerar que o cargo que o condenado exercia tinha prerrogativas específicas, não inerentes a qualquer função pública, que exigiam dele um maior zelo em relação às condições do sistema penitenciário. Por isso, a exasperação da pena não está pautada em elementos do tipo penal, pois não há menção genérica à função pública, mas sim ao cargo ocupado pelo requerente.

           Ainda que qualquer servidor público possa responder criminalmente pelo delito de corrupção passiva, nem todo sujeito ativo do crime possui as prerrogativas do requerente, que exercia a função de agente penitenciário. Por isso, há maior reprovabilidade em sua conduta delitiva, sendo a fundamentação idônea para o agravamento da sua reprimenda pela circunstância da culpabilidade. [...]" (p. 211).

           Pelos mesmos motivos, afasta-se a alegação de ocorrência de bis in idem, uma vez que o disposto no parágrafo primeiro do art. 317 do Código Penal refere-se à prática de ato, em razão do recebimento ou promessa de vantagem indevida, "infringindo dever funcional" de forma geral no âmbito do funcionalismo público.

           No caso concreto, no entanto, a culpabilidade exacerbada na infringência de dever funcional por agente carcerário está vinculado às suas atribuições específicas, diversamente da causa especial (geral) de aumento do tipo penal, conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça no REsp 1251621/AM, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 16/10/2014, DJe 12/11/2014:

    [...] 4. Vale como circunstância judicial desfavorável, a ensejar maior grau de reprovabilidade da conduta, o fato de o crime de corrupção passiva ter sido praticado por Promotor de Justiça, em ato diretamente vinculado às suas específicas atribuições (promessa de que pediria arquivamento de inquéritos policiais que apurariam homicídios), as quais são distintas e incomuns, se equiparadas aos demais servidores públicos lato sensu.

    5. Assim, o fundamento considerado pelo Tribunal de origem para justificar o desvalor da culpabilidade não se confunde com os elementos inerentes ao próprio tipo penal, devendo, portanto, ser mantida a majoração da pena-base. [...]

           Afasta-se, assim, a pretensão.

           No tocante ao pleito de redução da reprimenda em razão da prática do crime de coação no curso do processo na primeira fase dosimétrica, quanto às 'consequências' do delito, o pleito tampouco comporta acolhida.

           O Magistrado pontuou que o acréscimo seria devido diante da efetiva alteração de versão apresentada pelo coagido, o que excederia a normalidade do tipo penal.

           Com efeito, tratando-se de crime formal, cujo resultado não é considerado para sua tipificação, não se cogita de erro técnico ou teratologia.

           Sobre o tema, CLEBER MASSON em Código Penal Comentado, 4. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016, p. 1.486 esclarece:

    Consumação: Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se no momento em que o sujeito ativo usa de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra uma ou mais pessoas indicadas no tipo penal. Prescinde da obtenção da finalidade almejada pelo agente.

           Ademais, ainda que a dosimetria da pena não tenha sido objetivamente analisada no julgamento da apelação criminal, o Exmo. Sr. Des. Jorge Schaefer Martins ponderou:

    "[...] Com relação ao crime de coação no curso do processo, o réu Euclides foi acusado de ter praticado duas condutas: uma ameaça contra o réu Thelmo e outra contra o acusado Jeferson, tendo sido condenado apenas pelo delito cometido contra este último.

    Sobre este ponto, como já visto acima, Jeferson afirmou, mais de uma vez, na fase inquisitiva, com detalhes, qual seria a função de Euclides no plano de fuga. Entretanto, em juízo, retificou parcialmente suas declarações inocentando Euclides, inclusive escrevendo uma carta com a seguinte mensagem: "após ler a bíblia" resolveu "corrigir seus pecados" (fl. 528).

    Por outro lado, igualmente em juízo, na parte final de seu depoimento, o corréu Moisés mencionou expressamente ter ouvido Euclides falar para Jeferson na penitenciária que "quem arrastou ele para ali iria pagar de uma forma ou de outra" (mídia de fl. 1.695). Tais declarações estão em consonância com aquelas prestadas pelo corréu Joel, na delegacia de polícia (fl. 435).

    Assim, a condenação pelo delito de coação exercida no curso do processo deve ser mantida, até porque, de fato, redundou efeito prático, na medida em que Jeferson retratou-se judicialmente das imputações feitas contra Euclides. Daí porque, a sentença condenatória, neste ponto, deve manter-se imaculada em sua integralidade. [...]" (p. 161).

           Logo, o pleito não merece prosperar no ponto.

           Mantidas as penas aplicadas, resta prejudicada a análise da pretensão no tocante ao regime inicial de cumprimento da reprimenda, uma vez que a condenação deu-se em patamar superior a 4 (quatro) anos (art. 33, § 2º, 'b', do Código Penal).

           Por fim, o revisionando almeja o afastamento da condenação à perda do cargo público, por ausência de fundamentação concreta, de acordo com o previsto no art. 92, parágrafo único, do Código Penal.

           In casu, consta da sentença condenatória:

    "[...] O acusado é servidor público (agente penitenciário) e como os crimes foram praticados a partir do exercício da função pública inerente ao cargo, com significativo prejuízo à administração prisional e à segurança pública, além do que a pena privativa de liberdade ultrapassou a 04 anos, impõe-se a condenação acessória à perda do cargo público, com base no art. 92, I, a e b, do Código Penal. [...]" (p. 75).

           A matéria foi amplamente analisada em apelação criminal, conforme trecho que se transcreve:

    "[...] Diante da manutenção da condenação do réu Euclides, por evidente que resta inviável o retorno ao exercício de sua função de agente penitenciário.

    A propósito, já decidiu a Seção Criminal desta Corte em recente julgamento:

    EMBARGOS INFRINGENTES. 1. CABIMENTO. FUNDAMENTAÇÃO. ADSTRIÇÃO AO VOTO VENCIDO. 2. PERDA DE CARGO PÚBLICO (CP, ART. 92, INC. I, "A"). BOMBEIRO MILITAR. FALSO TESTEMUNHO (CP, ART. 342). 1. A fundamentação dos embargos infringentes não fica limitada às razões expostas no voto vencido. Pode o recorrente, desde que não extrapole a conclusão do voto divergente, apresentar arrazoado que não foi abordado no julgamento anterior, sem que isso represente óbice à admissão do recurso. 2. Não configura violação de dever para com a Administração, de modo a justificar a perda do cargo público, o fato de bombeiro militar prestar declarações falsas em juízo, pois o delito que lhe foi imputado não guarda relação com o ofício que exerce. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Embargos Infringentes n. 2015.042798-9, de Chapecó, rel. Des. Sérgio Rizelo, j. 30-09-2015).

    E do corpo do acórdão se extrai:

    [...]

    A divergência cinge-se à perda do cargo público, de bombeiro militar, ocupado pelo Embargante. A Excelentíssima Desembargadora Marli Mosimann Vargas destacou que o delito imputado a Andrigo é arrolado como crime contra a administração pública e que os vetores do art. 59 do Código Penal não lhe são favoráveis, e por tais motivos manteve o afastamento determinado em Primeira Instância (no que foi acompanhada pelo Excelentíssimo Des. Paulo Roberto Sartorato). A motivação do Excelentíssimo Desembargador José Everaldo Silva para divergir da maioria pode ser sintetizada nos seguintes termos:

    [...]

    A perda do cargo público, como efeito extrapenal de sentença condenatória, é possível "quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública".

    Não há óbice no que diz respeito ao quantum da sanção corporal (Andrigo foi condenado a 1 ano, 6 meses e 20 dias de reclusão); quanto ao restante da exigência legal, porém, não se constata a necessária adequação típica.

    Isso porque a conduta proibida perpetrada pelo Embargante não tinha qualquer relação com seus deveres de ofício, e isso é exigido para a incidência da medida prevista no art. 92, inc. I, "a", do Código Penal:

    Para a aplicação do dispositivo deve considerar-se não só o conceito de funcionário público previsto no art. 327 do CP, como também ter sido o ilícito praticado no exercício das funções do agente, sendo irrelevante, porém, tratar-se de crime funcional próprio ou impróprio. Dando relevância ao desvalor da conduta praticada nas atribuições que são próprias do agente público, não se aplica o dispositivo ao funcionário que agiu na qualidade de particular, fora de suas funções (MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato M. Código Penal interpretado. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 490).

    Luiz Flavio Gomes também assevera que "exige-se nexo funcional, isto é, crime cometido no exercício da função" (Direito penal: parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. v. 2. p. 747), e em idêntico sentido é a lição de Fernando Capez, que aponta que perda de cargo "decorre da prática de crimes funcionais, previstos no CP, arts. 312 a 326" (Curso de direito penal: parte geral. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. v. 1. p. 547).

    Cezar Roberto Bitencourt, por sua vez, é mais eloquente e categórico em sua lição:

    É imprescindível que a infração penal tenha sido praticada com abuso de poder ou violação de dever inerente ao cargo, função ou atividade pública. É necessário que o agente, de alguma forma, tenha violado os deveres que a qualidade ou condição de funcionário público lhe impõe.

    [...]

    No entanto, ao contrário do que afirmam alguns penalistas, a perda não pode abranger qualquer cargo, função ou atividade eventualmente exercidos pelo condenado. Ao contrário, deve restringir-se somente àquele(a) no exercício do(a) qual praticou o abuso, porque a interdição pressupõe que a ação criminosa tenha sido realizada com abuso de poder ou violação de dever que lhe é inerente (Tratado de direito penal: parte geral. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. v. 1. p. 845).

    Ainda que o Superior Tribunal de Justiça reconheça a possibilidade de decretação da medida em caso de crimes comuns, com pena entre 1 e 4 anos, desde que cometidos em razão da função (e não apenas no caso de crimes funcionais, próprios, previstos nos arts. 312 a 327 do Código Penal (cf. AgRg no Resp 1392559, Relª. Minª. Maria Thereza de Assis Moura, j. 18.12.14)), o fato é que se exige, no mínimo, que o delito guarde relação com o múnus público exercido pelo acusado.

    Sem mencionar os casos óbvios (que tratam das infrações penais dos arts. 312 a 327 da Lei Substantiva), o entendimento da Corte da Cidadania, salvo uma única exceção (Resp 665.472, Relª. Minª. Laurita Vaz, j. 4.12.09), também segue esse caminho. A perda do cargo público só é decretada, em casos nos quais a pena é superior a 1 ano de privação de liberdade e não excede a 4, se a prática delitiva representa um desvirtuamento do encargo estatal que fica sob incumbência do agente (cf. AgRg no Resp 1392559, Relª. Minª. Maria Thereza de Assis Moura, j. 18.12.14; AgRg no Ag 1364262, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 20.8.13; e AgRg no Resp 824.721, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 11.5.10).

    Até a exceção registrada acima (Resp 665.472) tem a particularidade de que o crime, ainda que não fosse ligado à atividade do funcionário público, representava gritante incompatibilidade com o cargo que ocupava, como se vê em parte da ementa do julgado:

    6. O Magistrado sentenciante, com propriedade, declinou fundamentação idônea e adequada, justificado sua decisão de afastar dos quadros da polícia pessoa envolvida em delito da natureza do tráfico ilícito de entorpecentes, por ferir dever inerente à função de policial militar, pago pelo Estado justamente para combater o crime.

    Mas não é esse o caso em análise. O crime praticado por Andrigo diz respeito à circunstância de ter falseado enquanto servia como testemunha em ação penal, e não como bombeiro militar. Nem sequer os fatos sobre os quais ele perjurou têm liame com o cargo que ocupa (em verdade, estão mais ligados à sua condição de usuário de entorpecentes).

    E também não é inconcebível, como seria manter nos quadros da Polícia Militar um sujeito que alienava entorpecentes ou admitir um que foi condenado por porte ilegal de arma de fogo de uso restrito (cf. STJ, RMS 33.183, Rel. Min. Sérgio Kukina, j. 12.11.13), permitir que permaneça integrado ao Corpo de Bombeiros o indivíduo que falseou em Juízo. Naturalmente, a conduta atribuída a Andrigo é reprovável, mas é por tal motivo que a prestação jurisdicional repressiva, na forma de pena privativa de liberdade, foi-lhe imposta. Esta é a principal resposta estatal à prática do delito, e não se vê necessidade de aplicação de efeito extrapenal outro.

    A apontada violação ao dever de probidade, previsto no Estatuto dos Policiais Militares do Estado de Santa Catarina (Lei Estadual 6.218/83, art. 32, inc. III), aplicável ao Embargante por força do art. 42 da Constituição Federal, também não se constata.

    A exemplo do conceito de probidade administrativa, que consiste no "dever de o funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções sem aproveitar os poderes ou facilidades dela decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer" (BERTONCINI, Mateus. Ato de improbidade administrativa. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 51-52), a obrigação de manter probidade imposta aos policiais militares diz respeito à atividade que exercem. É uma proibição do uso das prerrogativas funcionais para alcançar escuso benefício próprio. E, como dito, não foi o que se verificou neste caso, pois o depoimento falso prestado por Andrigo não teve relação com seu ofício.

    Ademais, o objeto juridicamente tutelado pelo art. 342 do Código Penal é a "administração da justiça" (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal comentado. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 1348), e não a probidade administrativa.

    É oportuno registrar, por fim, que o resultado deste julgamento não representa garantia invariável de que o Embargante deve remanescer nas fileiras do Corpo de Bombeiros Militar. Caso se repute que Andrigo é presumivelmente incapaz de permanecer na ativa, pode ser instaurado Conselho de Disciplina para afastar o Recorrente do cargo. Apenas não se verifica justificativa para a imposição de tal gravame ao Acusado como consequência da sentença condenatória.

    Ante o exposto, vota-se pelo conhecimento e provimento do recurso, a fim de afastar da condenação à perda do cargo público imposta a Andrigo Amarante Ribeiro.

    A contrario sensu do julgado transcrito acima, no caso dos autos houve o chamado nexo funcional, isto é, o crime cometido por Euclides guardou estreita ligação com o exercício de suas funções já que aceitou promessa de vantagem indevida para facilitar a fuga de preso enquanto estava na condição de agente penitenciário.

    Portanto, a perda do cargo de agente penitenciário como efeito da condenação é medida impositiva. [...]". (pp. 161/165 - grifos no original).

           Observa-se que a tese foi examinada quando da prolação da sentença e confirmada, após reanálise, em julgamento colegiado, de forma que se torna inviável, neste momento, novo exame da pretensão.

           Acerca da impossibilidade de reexame da matéria apreciada durante o trâmite da ação penal, leciona GUILHERME DE SOUZA NUCCI, em Código de Processo Penal Comentado. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. pg. 621:

    [...] o objetivo da revisão não é permitir uma terceira instância de julgamento, garantindo ao acusado mais uma oportunidade de ser absolvido ou ter reduzida sua pena, mas, sim, assegurar-lhe a correção de um erro judiciário. Ora, este não ocorre quando um juiz dá a uma prova uma interpretação aceitável e ponderada. Pode não ser a melhor tese ou não estar de acordo com a turma julgador da revisão, mas daí aceitar a ação revisória somente para que prevaleça peculiar interpretação é desvirtuar a natureza do instituto.

           Sobre o tema, esta Corte Estadual de Justiça já decidiu na Revisão Criminal n. 4009728-95.2016.8.24.0000, de Chapecó, rel. Des. José Everaldo Silva, Seção Criminal, j. 26-07-2017, mutatis mutandis:

    REVISÃO CRIMINAL. ROUBO IMPRÓPRIO CIRCUNSTANCIADO PELO EMPREGO DE ARMA, FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DE AGENTES, FURTO QUALIFICADO PELO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO E CORRUPÇÃO DE MENORES (ARTIGOS 157, §1º E §2º, INCISO I, 155, §4º, INCISO IV, 155, §4º, INCISO I, TODOS DO CÓDIGO PENAL E ARTIGO 244-B DA LEI N. 8.069/1990, NA FORMA DOS ARTIGOS 69 E 70, DO CÓDIGO PENAL). ALEGAÇÃO DE QUE O ACÓRDÃO CONTRARIA A EVIDÊNCIA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO AMPLAMENTE ANALISADO EM SEGUNDA INSTÂNCIA. REDISCUSSÃO DA PROVA VEDADA EM SEDE REVISIONAL. PEDIDO REVISIONAL INDEFERIDO. 

    "A ação revisional não se presta à nova avaliação da prova, e, tampouco, ao reexame de decisão já apreciada pelo Juízo ad quem." (TJSC, Revisão Criminal n. 2010.048517-5, de Chapecó, rel. Des. Rui Fortes, j. 27-07-2011).

           Logo, inviável a reanálise da tese aventada.

           Por fim, observa-se que a reprimenda imposta ao apenado na sentença foi de 4 (quatro) anos, 3 (três) meses e 21 (vinte e um) dias de reclusão. No entanto, o reeducando foi condenado às penas de 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão, mais 14 dias-multa, pela prática do crime de corrupção passiva, e de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de reclusão, mais 11 dias-multa, pelo delito de coação no curso do processo, o que resulta, em razão do concurso material, na pena de 4 (quatro) anos, 3 (três) meses e 10 (dez) dias, razão pela qual corrige-se o erro material no ponto.

           Ante o exposto, conhece-se parcialmente e, nesta extensão, indefere-se o pedido revisional. De ofício, corrige-se o erro material na soma das penas.

           Este é o voto.


Gabinete Desembargador Ernani Guetten de Almeida