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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0305129-39.2016.8.24.0023 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: André Carvalho
Origem: Capital
Orgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Civil
Julgado em: Thu Mar 08 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Humberto Goulart da Silveira
Classe: Apelação Cível

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STJ: 43, 188, 7

 


Apelação Cível n. 0305129-39.2016.8.24.0023, da Capital

Relator: Desembargador André Carvalho

   APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CONDENATÓRIA AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO REGRESSIVA. DANO A UTENSÍLIOS DOMÉSTICOS RESULTANTE DE ANOMALIAS NA REDE ELÉTRICA. PLEITO DEDUZIDO POR SEGURADORA CONTRA A CONCESSIONÁRIA. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. INSURGÊNCIA DA CELESC.

   INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. FATO DO SERVIÇO. INCIDÊNCIA OPE LEGIS (ART. 14, § 3º, DO CDC). BENESSE QUE NÃO DISPENSA A APRESENTAÇÃO DE UM LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO. SUBSTRATO INICIAL IDÔNEO À CONFORMAÇÃO DA PROVA INDICIÁRIA. ENCARGO PROBANTE CORRETAMENTE ATRIBUÍDO À CONCESSIONÁRIA RÉ (ART. 373, II, DO CPC/2015).

   Sobretudo em demandas tratando de reparação por fato do serviço, a apresentação de um lastro probatório mínimo, evidenciando o dano e o nexo de causalidade, autoriza a inversão do encargo probante, conforme disposto no art. 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor.

   OBRIGAÇÃO INDENITÁRIA. FALHA NO SERVIÇO PRESTADO SOB A MODALIDADE DE CONCESSÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA EM RELAÇÃO AOS DANOS CAUSADOS AOS USUÁRIOS (ART. 37, § 6º, DA CRFB/1988 E ART. 14 DO CDC).

   Seja em face do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, ou à luz do disposto no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, remanesce a responsabilidade objetiva nos casos de falha na prestação dos serviços por concessionária de energia elétrica.

   NEXO CAUSAL. LIAME INCONTESTE ENTRE OS DANOS SUPORTADOS E A OSCILAÇÃO NA MALHA DISTRIBUTIVA. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE NÃO VERIFICADAS. ADEQUAÇÃO ADMINISTRATIVA DA REDE QUE NÃO ILIDE A OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. INEXISTÊNCIA DE DEVER DO USUÁRIO À AQUISIÇÃO DE EQUIPAMENTOS PROTETIVOS. PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS QUE INCUMBE À CONCESSIONÁRIA RÉ. REPARAÇÃO QUE SE IMPÕE.

   A conformidade ao marco regulatório do setor elétrico não afasta, por si só, a obrigação de reparar os danos causados aos consumidores em decorrência da prestação anômala dos serviços.

   Não há que se falar em dever do consumidor à aquisição de equipamentos protetivos às oscilações da rede, porquanto incumbe à concessionária de energia elétrica a adequada prestação dos serviços.

   HONORÁRIOS RECURSAIS. ELEVAÇÃO EM FAVOR DO PATRONO DA PARTE AUTORA (ART. 85, §§ 1º E 11, DO CPC/2015).

   SENTENÇA MANTIDA INCÓLUME. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0305129-39.2016.8.24.0023, da comarca da Capital (3ª Vara Cível), em que é Apelante Celesc Distribuição S/A e Apelado Sul América Companhia Nacional de Seguros.

           A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso de apelação e negar-lhe provimento, majorando-se a verba advocatícia em R$ 200,00 para o patrono da parte autora, à guisa de honorários recursais. Custas na forma da lei.

           Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Des. Raulino Jacó Brüning, presidente com voto, e a Exma. Sra. Desa. Hildemar Meneguzzi de Carvalho.

           Florianópolis, 08 de março de 2018

Desembargador André Carvalho

Relator

 

           RELATÓRIO

           Na comarca Capital, Sul América Companhia Nacional de Seguros moveu a presente ação regressiva em desfavor de Celesc Distribuição S/A, lastreando-se nos prejuízos decorrentes de suposta falha no fornecimento de energia elétrica, cujo ressarcimento dos danos aos segurados subrogaria a demandante nos direitos de credor, legitimando-a à pretensão indenitária em escopo (fls. 01-88).

           Aduziu a companhia de seguros, em suma, que as unidades consumidoras dos segurados foram submetidas à forte oscilação de tensão, com espeque em anomalia verificada junto à rede de distribuição de energia elétrica, implicando danos a diversos utensílios domésticos que guarneciam os referidos imóveis. A mais disso, inferiu que o liame entre o fenômeno na rede elétrica e os danos aludidos estaria evidenciado em opinião técnica, cujos pareceres acompanham a exordial (fls. 66-69 e fls. 79-81).

           Nesse contexto, pleiteou: (i) a condenação ao pagamento de indenização regressiva no valor de R$ 2.854,00 (dois mil, oitocentos e cinquenta e quatro reais), com acréscimo dos respectivos consectários da mora; (ii) a condenação em custas processuais e honorários advocatícios; (iii) e a inversão do encargo probante.

           Protestou provar o alegado por todos os meios legais, valorando a causa em R$ 2.854,00 (dois mil, oitocentos e cinquenta e quatro reais).

           Considerando o desinteresse de ambas as partes, dispensou-se a realização da audiência de conciliação (fl. 90).

           A empresa ré apresentou peça de resistência. Em resumo, alegou: (i) preliminarmente, que o foro não teria competência ao processamento da demanda; (ii) ainda à guisa de preliminar, que a pretensão reparatória estaria prescrita; (iii) no mérito, que não haveria responsabilidade da concessionária, mormente pela ausência de nexo etiológico; (iv) que a prestação dos serviços ocorrera dentro da normalidade, não havendo comprovação acerca da falha no fornecimento de energia elétrica; (v) que os danos experimentados teriam origem exclusiva no circuito interno das unidades consumidoras; (vi) e que o ônus da prova seria imputável à demandante. Manifestou-se, alfim, pela improcedência total dos pedidos (fls. 96-122).

           Houve réplica, tendo a parte autora rebatido os argumentos declinados acima, além de repisar o que afirmara à exordial (fls. 126-196).

           Sobreveio sentença, na qual o togado singular julgou o pedido procedente em parte, cujo dispositivo, por oportuno, transcreve-se (fls. 209-219):

    Ante o exposto:

    I - julgo extinto o processo, com resolução do mérito, com fulcro no art. 487, II, do CPC, porque prescrita a pretensão da parte autora com relação ao pedido de ressarcimento do pagamento do seguro ao segurado Flor da Manhã Condomínio Residencial.

    II - julgo procedentes os pedidos formulados por por Sul América Companhia Nacional de Seguros contra Centrais Elétricas de Santa Catarina S/A - CELESC em relação ao segurado Condomínio Edifício Edelweiss, sentenciando o processo com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do CPC e, em consequência, condeno a ré ao pagamento de indenização no valor de R$ 1039,00 (mil e trinta e nove reais), com atualização monetária a partir do desembolso e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (arts. 405 do CC e 161, § 1º, do CTN).

    Diante da sucumbência recíproca, os ônus processuais deverão ser distribuídos entre as partes, a teor do disposto no art. 86 do Código de Processo Civil, arcando o autor com 50% das custas processuais e a ré com os 50% restantes. Fixo os honorários advocatícios em R$ 2.000,00 (dois mil reais), a teor do §8º do art. 85 do mesmo diploma legal, divididos entre os patronos das partes na proporção antes estabelecida.

    Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

    Transitada em julgado, dê-se baixa e arquive-se, observado o art. 320 e seguintes do CNCGJ/SC no tocante às custas pendentes.

    Florianópolis (SC), 28 de setembro de 2017.

           Irresignada, a concessionária ré interpôs o presente apelo. Afirma, em suma: (i) que não há prova conclusiva acerca da origem dos danos nos equipamentos, inexistindo nexo causal entre a suposta falha na prestação dos serviços e os prejuízos suportados; (ii) que o exame do caderno processual não revela a existência de oscilação na rede elétrica capaz de ocasionar tais avarias; (iii) que, em caso de sobretensão na rede elétrica, um número expressivo de unidades consumidoras é atingida pelo evento, circunstância não evidenciada no caso concreto; (iv) que a responsabilidade da concessionária de energia elétrica cinge-se ao ponto de entrega, não se afigurando razoável imputar à ré quaisquer falhas no âmbito do circuito interno das residências; (v) que há culpa exclusiva do consumidor à hipótese, porquanto omisso na obrigação de instalar dispositivos de proteção às oscilações da rede, bem como na adequação do circuito residencial aos padrões normativos; (vi) que o ônus da prova pertence à parte autora, restando inviável a sua inversão; (vii) e que os laudos trazidos à exordial não se prestam a provar o alegado, porquanto elaborados unilateralmente. Por tais razões, requer o integral provimento do recurso e a improcedência in totum da pretensão autoral (fls. 223-234).

           Contrarrazões às fls. 238-285.

           Após, vieram os autos conclusos (fls. 287-288).

           É a síntese do essencial.

           VOTO

           Inicialmente, considerando que a decisão recorrida foi publicada já na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (fl. 222), convém anotar que o caso será analisado integralmente sob o regramento da novel codificação, em consonância ao Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça.

           No que tange à competência para o julgamento do incidente, é consabido que desde a publicação do Ato Regimental n. 135/2016-TJ, os recursos pertinentes às ações de direito privado manejadas em desfavor das concessionárias de serviços públicos pertencem à alçada das Câmaras de Direito Civil desta Corte, consoante testifica recente julgado do Órgão Especial:

    CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. INCIDENTE SUSCITADO PELA SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO EM FACE DA QUARTA CÂMARA DE DIREITO CIVIL. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. DEMANDA OBJETIVANDO INDENIZAÇÃO PELOS PREJUÍZOS MATERIAIS ADVINDOS DA INTERRUPÇÃO DO SERVIÇO MOVIDA CONTRA A CELESC DISTRIBUIÇÃO S/A. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. COMPETÊNCIA DAS CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO ADSTRITA AO JULGAMENTO DE RECURSOS E AÇÕES EM QUE FOREM PARTES PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO. ATO REGIMENTAL N. 135/2016. CONFLITO PROCEDENTE. (TJSC, Conflito de competência n. 1002240-43.2016.8.24.0000, de Canoinhas, rel. Des. Ronei Danielli, Órgão Especial, j. 01-02-2017 - grifou-se).

           Na esteira do precedente em tela, e considerando que o Ato Regimental n. 149/2017-TJ, publicado em 27/03/2017, não procedeu a alterações significativas no regramento anterior, não vislumbro óbice à imediata apreciação do apelo por este Colegiado.

           Isso posto, uma vez satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido.

           Como visto, trata-se de apelação cível interposta por Celesc Distribuição S/A em ação indenizatória regressiva movida por Sul América Companhia Nacional de Seguros em desfavor da concessionária de energia elétrica, tendo o magistrado sentenciante julgado procedentes os pedidos declinados à inicial.

           Em relação à matéria controvertida, é cediço que as concessionárias de serviço público, via de regra, respondem objetivamente pelos danos decorrentes de sua atividade, conforme previsto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, in verbis: "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".

           A propósito, convém trazer a lume ensinamento da eminente publicista Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

    A regra da responsabilidade objetiva exige, segundo o artigo 37, § 6º, da Constituição:

    Que o ato lesivo seja praticado por agente de pessoa jurídica de direito público (que são as mencionadas no art. 41 do Código Civil) ou pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público (o que inclui empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações governamentais de direito privado, cartórios extrajudiciais, bem como qualquer entidade com personalidade jurídica de direito privado, inclusive as do terceiro setor, que recebam delegação do Poder Público, a qualquer título, para a prestação do serviço público);

    Que as entidades de direito privado prestem serviço público, o que exclui as entidades da administração indireta que executem atividade econômica de natureza privada; as que prestam serviço público respondem objetivamente, nos termos do dispositivo constitucional, quando causem dano decorrente da prestação de serviço público; mesmo as concessionárias e permissionárias de serviço público e outras entidades privadas somente responderão objetivamente na medida em que os danos por elas causados sejam decorrentes da prestação de serviço público (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23ª Edição. São Paulo: Atlas, 2010, p. 649-650).

           Nesta senda, apenas a título de argumentação, ainda que se considere o infortúnio enquanto conduta omissiva, defronte à teoria do risco administrativo, denota-se que o descumprimento da obrigação de prestar o serviço adequado encerra omissão específica (art. 6º da Lei n. 8.987/1995), com liame causal indiscutível ao eventus damni - dano a utensílios domésticos resultante de anomalias na rede elétrica -, acarretando, inexoravelmente, o dever de reparar os prejuízos aos consumidores.

           Acerca da temática em liça, sobreleva-se o magistério preciso de Sergio Cavalieri Filho:

    A regra é a responsabilidade objetiva, fundada na teoria do risco administrativo, sempre que o dano for causado por agentes do Estado nessa qualidade; sempre que houver relação de causa e efeito entre a atuação administrativa (comissiva ou por omissão específica) e o dano. (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 11ª Edição. São Paulo: Atlas, 2014, p. 317 - grifou-se).

           Nesse sentido, da jurisprudência catarinense, veja-se:

    APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. INTERRUPÇÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. INEFICIÊNCIA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. AUSÊNCIA DE PRÉVIA COMUNICAÇÃO AO CONSUMIDOR. MORTE DE FRANGOS EM AVIÁRIO CAUSADA PELA TEMPERATURA ALTA, AUSÊNCIA DE VENTILAÇÃO E NEBULIZAÇÃO DO AVIÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA POR OMISSÃO ESPECÍFICA DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 14 E 22 DO CDC E 37, § 6º DA CF/88. DEVER DE INDENIZAR CARACTERIZADO. DANO MATERIAL COMPROVADO. PRETENSÃO DE INDENIZAÇÃO PELO ABALO ANÍMICO. MERO DISSABOR. SENTENÇA MANTIDA NO PONTO.

    EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS CONTRA A SENTENÇA. APLICAÇÃO DE MULTA DE 1%. PENALIDADE QUE NÃO ENCONTRA JUSTIFICATIVA NO CASO CONCRETO. REMOÇÃO.

    RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0002574-39.2013.8.24.0020, de Criciúma, rel. Des. André Luiz Dacol, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 25-04-2017 - grifou-se).

           Até porque, com base na relação de consumo sobre a qual repousa a lide, inarredável concluir que a demanda atrai a aplicação do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que dispensa a caracterização do elemento culpa para fins de responsabilidade civil, senão vejamos: "O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos".

           No mesmo norte, trago à baila valiosa lição de Rui Stoco:

    Portanto, a companhia energética de geração ou distribuição, embora possa se constituir em sociedade de natureza privada, será sempre uma concessionária de serviço público, prestando-o por delegação do Estado.

    Nessa condição, é alcançada pela disposição, muito mais garantidora, do art. 37, § 6º, a CF, ao dispor que 'as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa'.

    Desse modo, as empresas ficam enquadradas na teoria do risco administrativo, sendo, assim, objetiva a sua responsabilidade pelos danos causados a terceiros.

    Evidentemente, não se descarta a incidência obrigatória do Código de Defesa do Consumidor, naquilo que favoreça e proteja a vítima, considerando que o fornecimento de energia elétrica para consumo enquadra-se nos conceitos ali estabelecidos, devendo a energia elétrica ser considerada como produto, posto que é um bem consumível ou fungível. (STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 7ª Edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 980 - grifou-se).

           Em suma, quer em face da normativa administrativa (art. 37, § 6º, da CRFB/1988), quer em face do diploma consumerista (art. 14 do CDC), remanesce a modalidade objetiva de responsabilidade a ser aplicada ao caso concreto, dispensando-se maiores digressões.

           Aliás, mutatis mutandis, desta Câmara, veja-se:

    APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. SECAGEM DE FUMO EM ESTUFA. SUPOSTOS DANOS À PRODUÇÃO OCORRIDOS EM VIRTUDE DE INTERRUPÇÕES INJUSTIFICADAS NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. DEMANDA PROPOSTA PELO FUMICULTOR CONTRA CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA RÉ. AUTOR QUE ENCONTRA-SE EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AO CASO CONCRETO. SERVIÇO PRESTADO NA MODALIDADE DE CONCESSÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA POR EVENTUAIS DANOS CAUSADOS EM DECORRÊNCIA DA PRESTAÇÃO DE SEUS SERVIÇOS. EXEGESE DO ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. NEXO CAUSAL ENTRE AS INTERRUPÇÕES NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA E OS DANOS EXPERIMENTADOS PELO AGRICULTOR, DEVIDAMENTE COMPROVADOS. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE NÃO DEMONSTRADOS. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. VALIDADE DO LAUDO PERICIAL ACOSTADO À EXORDIAL. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DE FORMA ESPECÍFICA E DETALHADA PELA RÉ. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO ÂMBITO DESTE TRIBUNAL. DECISÃO MANTIDA NO PONTO. PRETENDIDA A APLICAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS A CONTAR DA FIXAÇÃO DA INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RELAÇÃO CONTRATUAL. JUROS MORATÓRIOS QUE DEVEM INCIDIR DESDE A CITAÇÃO. EXEGESE DO ART. 405 DO CC. CORREÇÃO MONETÁRIA QUE DEVE SER APLICADA DESDE A DATA DO EFETIVO PREJUÍZO (DATA DA INTERRUPÇÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA). SÚMULA N. 43 DO STJ. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0301893-83.2016.8.24.0054, de Rio do Sul, rel. Des. Saul Steil, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 23-02-2017 - grifou-se).

           Por conseguinte, o caso em tela pauta-se pela modalidade objetiva de responsabilização, devendo as razões recursais serem submetidas à análise sob essa perspectiva.

           Além disso, considerando a prova acerca do pagamento efetuado ao segurado "Condomínio Edifício Edelweiss" (fl. 82), desvela-se que seguradora demandante sub-roga-se nos direitos de credor em relação ao fornecedor, assumindo, enquanto consectário da sub-rogação, a posição em que o segurado ocupava na relação contratual originária - mormente quanto à incidência do pergaminho consumerista -, desde que preenchidos os requisitos da legislação civil e da Súmula n. 188 do Pretório Excelso: "O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até o limite previsto no contrato de seguro".

           Com fulcro nessa compreensão, do Superior Tribunal de Justiça, destaca-se recente julgado:

    AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REGRESSIVA. SEGURADORA CONTRA O CAUSADOR DO DANO. SUB-ROGAÇÃO NOS DIREITOS DO SEGURADO. EXTRAVIO DE BAGAGEM EM VOO NACIONAL. PRAZO DE PRESCRIÇÃO APLICÁVEL À RELAÇÃO JURÍDICA ORIGINÁRIA. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

    1. Conforme reiteradas decisões desta Corte, ao efetuar o pagamento da indenização ao segurado em decorrência de danos causados por terceiro, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, nos limites desses direitos, ou seja, não se transfere à seguradora mais direitos do que aqueles que o segurado detinha no momento do pagamento da indenização. Assim, dentro do prazo prescricional aplicável à relação jurídica originária, a seguradora pode buscar o ressarcimento do que despendeu com a indenização securitária.

    2. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ, AgInt no REsp 1.613.489/SP, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 19-09-2017 - grifou-se).

           Em idêntico sentir, desta Corte:

    APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO REGRESSIVA DA SEGURADORA CONTRA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. ENERGIA ELÉTRICA. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO PROCESSO COM FUNDAMENTO NO ART. 487, II, DO CPC. INSURGÊNCIA. PRESCRIÇÃO INCORRETAMENTE RECONHECIDA. SEGURADORA QUE SE SUB-ROGOU NO DIREITO DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO AO CASO DO PRAZO PRESCRICIONAL PREVISTO NO CDC (ART. 27), E NÃO DO CÓDIGO CIVIL, MAIS BREVE. PRECEDENTES DO STJ. CAUSA EM CONDIÇÃO DE IMEDIATO JULGAMENTO. PARECER TÉCNICO APRESENTADO PELA PARTE AUTORA NÃO IMPUGNADO ESPECIFICAMENTE PELA PARTE RÉ. DOCUMENTO SUFICIENTE PARA DEMONSTRAR O DANO E O NEXO CAUSAL ENTRE ELE E OS SERVIÇOS PRESTADOS PELA CONCESSIONÁRIA RÉ (OSCILAÇÕES DE TENSÃO NA REDE DE ENERGIA ELÉTRICA). INTELIGÊNCIA DO ART. 472 DO CPC. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. APLICAÇÃO DO 37, § 6º, DA CF/88 E 786, CAPUT, DO CÓDIGO CIVIL. INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS E FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS PARA REMUNERAR OS SERVIÇOS PRESTADOS NESTA INSTÂNCIA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO.

    "Esta Corte já firmou entendimento de que, ao efetuar o pagamento da indenização ao segurado em decorrência de danos causados por terceiro, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, podendo, dentro do prazo prescricional aplicável à relação jurídica originária, buscar o ressarcimento do que despendeu, nos mesmos termos e limites que assistiam ao segurado" (AgRg no REsp 1169418/RJ, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cuevas, Terceira Turma, julgado em 06/02/2014). (TJSC, Apelação Cível n. 0305463-73.2016.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 29-08-2017 - grifou-se).

           Superado este introito, uma vez fixadas as premissas teóricas inerentes ao caso concreto, mister adentrar ao exame dos argumentos encartados no apelo da empresa ré.

           A título preliminar, a concessionária afirma que a inversão do encargo probante seria incabível à espécie, considerando que "o litigante assume o risco de perder a causa se não provar os fatos alegados e do qual depende a existência do direito subjetivo que pretende resguardar através da tutela jurisdicional" (fl. 232).

           Entretanto, não merecem guarida tais ponderações.

           O Código de Defesa do Consumidor estabelece, ao menos em três passagens distintas, hipóteses de inversão do ônus da prova que dispensam o preenchimento dos requisitos previstos em seu art. 6º, inciso VIII - quais sejam: verossimilhança das alegações ou hipossuficiência -, eis que encerram verdadeira modalidade ope legis de inversão do encargo probatório.

           Quanto ao assunto em discussão, conveniente trazer à baila os ensinamentos de Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpção Neves:

    A inversão legal vem prevista expressamente em lei, não exigindo o preenchimento de requisitos legais no caso concreto. Significa dizer que para sua aplicação do caso concreto basta a tipificação legal, não sendo, portanto, exigível qualquer decisão judicial determinando tal inversão. Na realidade, a decisão judicial nesse sentido é desnecessária, porque a inversão não decorre de análise a ser realizada pelo juiz no caso concreto, mas da própria previsão legal. (TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito do Consumidor. 6ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 699 - grifou-se).

           No que concerne ao litígio em deslinde, inequivocamente relativo a fato do serviço (art. 14, § 3º do CDC), a doutrina destacada elucida que, "havendo um consumidor no polo ativo da demanda, e sendo sua pretensão fundamentada na alegação" de fato do serviço, caberá ao fornecedor o ônus de "de provar que o serviço não é defeituoso ou que há culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro" (TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito do Consumidor. 6ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 700).

           Noutra dicção, tratando-se de demanda condenatória lastreada em fato do serviço - dano a utensílios domésticos resultante de anomalias na rede elétrica -, a distribuição do ônus da prova inverte-se de maneira automática (ope legis), tornando prescindível o atendimento às condicionantes do art. 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor.

           Não é outro o entendimento que o Superior Tribunal de Justiça vem registrando a respeito do tema. Verbi gratia, colhe-se:

    AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA OPE LEGIS. FORMA OBJETIVA. FATO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. QUANTUM INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE.

    1.- A Segunda Seção deste Tribunal, no julgamento do REsp 802.832/MG, Rel. Paulo de Tarso Sanseverino, DJ de 21/09.2011, pacificou a jurisprudência desta Corte no sentido de que em demanda que trata da responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço (arts. 12 e 14 do CDC), a inversão do ônus da prova decorre da lei.

    2.- "Diferentemente do comando contido no art. 6º, inciso VIII, que prevê a inversão do ônus da prova "a critério do juiz", quando for verossímil a alegação ou hipossuficiente a parte, o § 3º, do art. 12, preestabelece - de forma objetiva e independentemente da manifestação do magistrado -, a distribuição da carga probatória em desfavor do fornecedor, que "só não será responsabilizado se provar: I - que não colocou o produto no mercado; II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste; III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro". É a diferenciação já clássica na doutrina e na jurisprudência entre a inversão ope judicis (art. 6º, inciso VIII, do CDC) e inversão ope legis (arts. 12, § 3º, e art. 14, § 3º, do CDC). Precedente da Segunda Seção." (REsp 1095271/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 07/02/2013, DJe 05/03/2013).

    3.- Em âmbito de recurso especial não há campo para se revisar entendimento assentado em provas, conforme está sedimentado no enunciado 7 da Súmula desta Corte.

    4.- A intervenção do STJ, Corte de caráter nacional, destinada a firmar interpretação geral do Direito Federal para todo o país e não para a revisão de questões de interesse individual, no caso de questionamento do valor fixado para o dano moral, somente é admissível quando o valor fixado pelo Tribunal de origem, cumprindo o duplo grau de jurisdição, se mostre teratológico, por irrisório ou abusivo.

    5.- Inocorrência de teratologia no caso concreto, em que, para o defeito na prestação do serviço - não entregou a documentação regular do veículo no momento da contratação -, foi fixado o valor de indenização de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de dano moral, consideradas as forças econômicas do autor da lesão.

    6.- Agravo Regimental impróvido. (STJ, AgRg no AREsp 402.107/RJ, rel. Min. Sidnei Beneti, Terceira Turma, j. 26-11-2013 - grifou-se).

           E deste Egrégio Tribunal, destaca-se:

    DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. LITÍGIO DECORRENTE DE RELAÇÃO NEGOCIAL (RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA) SUBMETIDA ÀS NORMAS PROTETIVAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DECISÃO QUE IMPÕE A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.

    01. Por força do disposto no art. 12 do Código de Defesa do Consumidor, "a responsabilidade da incorporadora, promovente e realizadora da construção dos edifícios do condomínio, é objetiva, dispensando a comprovação de culpa" (STJ: T-4, REsp n. 1.625.984, Min. Marco Buzzi; T-3, REsp n. 334.829, Mina. Nancy Andrighi; T-4, AgRgREsp n. 1.085.123, Min. Marco Buzzi; TJSC: 1ª CDCiv, AC n. 2013.069446-7, Des. Sebastião César Evangelista; 3ª CDCiv, AC n. 0302158-69.2014.8.24.0082, Des. Gilberto Gomes de Oliveira; 3ª CDCiv, AC n. 2012.015982-9, Des. Saul Steil; 3ª CDCiv, AC n. 2008.022369-5, Des. Marcus Tulio Sartorato; 5ª CDCiv, AC n. 0014294-37.2012.8.24.0020, Des. Luiz Cézar Medeiros).

    02. Em relação ao ônus probatório nas relações consumeristas, é preciso atentar que, "diferentemente do comando contido no art. 6º, inciso VIII, que prevê a inversão do ônus da prova 'a critério do juiz', quando for verossímil a alegação ou hipossuficiente a parte, o § 3º do art. 12 preestabelece - de forma objetiva e independentemente da manifestação do magistrado -, a distribuição da carga probatória em desfavor do fornecedor, que 'só não será responsabilizado se provar: I - que não colocou o produto no mercado; II - que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste; III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro'. É a diferenciação já clássica na doutrina e na jurisprudência entre a inversão ope judicis (art. 6º, inciso VIII, do CDC) e inversão ope legis (arts. 12, § 3º, e art. 14, § 3º, do CDC)" (REsp n. 1.095.271, Min. Luis Felipe Salomão).

    03. "Compete ao construtor a prova da existência de causa excludente da responsabilidade objetiva decorrente de defeito de construção, à luz do artigo 12, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor, hipótese de inversão do ônus da prova ope legis, a qual se configura desde a propositura da demanda, não traduzindo regra de instrução" (STJ: T-4, AgRgREsp n. 1.085.123, Min. Marco Buzzi; T-3, REsp n. 334.829, Min. Nancy Andrighi). (TJSC, Agravo de Instrumento n. 0177148-04.2013.8.24.0000, de São José, rel. Des. Newton Trisotto, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 12-12-2016 - grifou-se).

           Insubsistentes, portanto, as alegações da Apelante no que toca à impossibilidade de inversão do ônus da prova, cumprindo-me negar provimento ao recurso nesse aspecto.

           Avançando nas razões declinadas no apelo da concessionária de energia, tem-se que a Recorrente infere não haver prova conclusiva da origem dos danos aos equipamentos do consumidor, rompendo o nexo etiológico que a demandante considera hialino em relação a falha na prestação dos serviços.

           Em adicional, a Apelante aduz que sequer restou demonstrada a existência de oscilações na rede elétrica capazes de ocasionar as avarias descritas na petição inicial, cujo implemento certamente teria atingido uma gama maior de residências - circunstância não verificada à hipótese.

           Novamente, a tese da concessionária não demanda abrigo.

           Embora não haja substrato probatório indiscutível acerca da causa dos prejuízos em controvérsia, forçoso concluir que a demandante fundamentou minimamente o pleito condenatório, constituindo o que a atividade pretoriana convencionou chamar de "lastro probatório mínimo", o qual, somado à inversão do ônus da prova determinada na origem (fl. 213), conduz, no caso em apreço, à inarredável procedência da pretensão autoral.

           Sobre o tema, pertinente colacionar os ensinamentos de Humberto Theodoro Júnior:

    O mecanismo da inversão do ônus da prova se insere na Política Nacional das Relações de Consumo, com o objetivo de tutelar o consumidor, e deve ser aplicado até quando seja necessário para superar a vulnerabilidade do consumidor e estabelecer seu equilíbrio processual em face do fornecedor. Não pode, evidentemente, ser um meio de impor um novo desequilíbrio na relação entre as partes, a tal ponto de atribuir ao fornecedor um encargo absurdo e insuscetível de desempenho.

    Ressalte-se que não pode resultar da inversão o ônus para o fornecedor de provar o fato constitutivo do direito pretendido pelo consumidor. O que se impõe ao fornecedor é a prova dos fatos que, segundo sua defesa, excluiriam a responsabilidade que o demandante lhe imputa. Fatos esses que normalmente não se teriam de ser provados, se não existisse nem mesmo o começo de prova das alegações do demandante. Se a inicial nada demonstra que, pela verossimilhança ou pela experiência da vida, se pode ter como indícios da veracidade dos fatos constitutivos do direito, nenhum sentido teria a inversão de que cogita o CDC. O consumidor sucumbirá pela completa ausência de suporte fático-jurídico capaz de sustentar sua pretensão. (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Direitos do Consumidor. 9ª Edição. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 59 - grifou-se).

           Noutra dicção, a inversão do ônus da prova não implica procedência automática dos pedidos do consumidor, que permanece obrigado a comprovar, no plano fático, o direito que afirma possuir em relação ao fornecedor, sem que a redistribuição do encargo probante resulte em providência instrutória inexequível ao demandado.

           Com espeque em tais premissas, deste Sodalício, colhe-se:

    APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NEGATIVA DE CONCESSÃO DE CRÉDITO. - IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM.

    (1) CONTRATAÇÃO. AUTONOMIA DA VONTADE. AUSÊNCIA DE CONDUTA ILÍCITA. DANO MORAL NÃO CONSTATADO. DEVER DE INDENIZAR INEXISTENTE. - Na ausência de desdobramentos outros que não os próprios do aborrecimento experimentado pela não realização da compra e venda pretendida, não há falar em dever de indenizar, pois ausente conduta ilícita, quando, após análise cadastral, a empresa conclui por não conceder o crédito pretendido.

    (2) INSCRIÇÃO NO SRC. COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA. - Inexistindo comprovação da inscrição do nome do consumidor no Sistema de Informações de Crédito (SRC), não se mostra possível a concessão de indenização por danos morais, porquanto a inversão do ônus da prova não exime o consumidor de apresentar provas, ou, pelo menos, indícios, dos fatos constitutivos de seu direito, mormente quando o próprio Banco Central informa a viabilidade do consumidor acessar tais informações por simples cadastro via internet.

    (3) HONORÁRIOS RECURSAIS. PRESSUPOSTOS PRESENTES. CABIMENTO. - Observados os pressupostos incidentes (quais sejam: sentença na vigência do CPC 2015; deliberação no ato recorrido sobre honorários; e labor na fase recursal), necessária a fixação de honorários advocatícios recursais.

    SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0302628-66.2015.8.24.0082, da Capital - Continente, rel. Des. Henry Petry Junior, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 18-04-2017 - grifou-se).

           Em reforço, também desta Corte, veja-se:

    APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E LUCROS CESSANTES. ALEGAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE INCÊNDIO EM VEÍCULO. IMPOSIÇÃO DE RESPONSABILIDADE À DEMANDADA POR APROVAÇÃO EM VISTORIA DE SEGURANÇA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. ANEMIA PROBATÓRIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA OCORRÊNCIA DO PRÓPRIO DANO. PRETENSÃO DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. IMPOSSIBILIDADE. PROVIDÊNCIA QUE NÃO AFASTA A NECESSIDADE DA PRESENÇA DA PROVA DO FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DO AUTOR. ÔNUS DA PROVA DESATENDIDO. INEXISTÊNCIA DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. INTELIGÊNCIA DO ART. 373, I, DO CPC. SENTENÇA MANTIDA.

    Eventual operacionalização de inversão do ônus da prova não tem o condão de retirar dos ombros do autor a obrigação de provar o mínimo, a saber, o fato que constitui o seu direito. Ausente prova da existência mesma do dano afirmado, não se há falar em responsabilidade civil.

    RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0007893-16.2014.8.24.0064, de São José, rel. Des. Saul Steil, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 19-12-2017 - grifou-se).

           E ainda, deste mesmo órgão fracionário, destaca-se:

    APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. 1. RECURSO DA AUTORA. 1.1. ALEGADO FURTO DE CARTEIRA NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL. 1.2. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. EXEGESE DO ARTIGO 6º, VIII, DA LEI N. 8.078/1990. PRERROGATIVA QUE, NO ENTANTO, NÃO EXIME O HIPOSSUFICIENTE DE DEMONSTRAR MINIMAMENTE O FATO CONSTITUTIVO DO SEU DIREITO. 1.3. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS QUE INDIQUEM QUE O DELITO OCORREU NAS DEPENDÊNCIAS DA LOJA. BOLETIM DE OCORRÊNCIA. DECLARAÇÃO UNILATERAL DA VÍTIMA. INEXISTÊNCIA DE PRESUNÇÃO JURIS TANTUM DE VERACIDADE. PROVA TESTEMUNHAL QUE, IGUALMENTE, NÃO CORROBORA AS ASSERTIVAS DA AUTORA. 1.4. ADEMAIS, PROPALADO FURTO DE OBJETO PESSOAL QUE ESTAVA SOB A GUARDA DIRETA DA CONSUMIDORA. IMPOSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO OBJETIVA DA FORNECEDORA. AUSÊNCIA DE PROVAS DE FALHA NA SEGURANÇA DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL. DEVER DE INDENIZAR AFASTADO. 1.5. POR FIM, AVENTADO ABALO MORAL DECORRENTE DO TRATAMENTO INADEQUADO DOS VENDEDORES NÃO VERIFICADO. MERA INDELICADEZA DOS PREPOSTOS QUE NÃO CONDUZ À RESPONSABILIZAÇÃO DA LOJA. 1.6. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 0011937-86.2013.8.24.0008, de Blumenau, rel. Des. Raulino Jacó Brüning, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 02-06-2016 - grifou-se).

           Compulsando os autos, vislumbra-se que, junto à peça vestibular, a parte autora carreou o pertinente relatório de regulação do sinistro, descrevendo os prejuízos sofridos com a oscilação na rede de energia elétrica pelo segurado "Condomínio Edifício Edelweiss" (fls. 57-65). Adicionalmente, há opinião técnica atestando que os danos foram causados em decorrência de anomalias na rede de distribuição de eletricidade (fls. 66-69), resultando em um prejuízo total de R$ 1.039,00 (mil e trinta e nove reais), devidamente depositados pela seguradora em favor do segurado (fl. 82).

           Dessa feita, delineado um conjunto mínimo de provas acerca da pretensão reparatória - pois demonstrados a contento tanto a ocorrência dos danos quanto o nexo de causalidade -, arrazoado admitir-se a inversão do ônus probatório prevista no art. 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor, transferindo à concessionária o gravame de derruir as alegações da parte autora, sem implicar prejuízo ao contraditório ou à ampla defesa.

           Em demandas análogas, convém salientar que este Tribunal já pacificou o entendimento de que, à luz da impugnação genérica apresentada pela concessionária de energia elétrica, merece subsistir o laudo técnico trazido à exordial, enquanto prova mais robusta à comprovação do prejuízo material controvertido, mesmo que confeccionado unilateralmente.

           Deste mesmo Colegiado, destaca-se:

    APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. SECAGEM DE FUMO EM ESTUFA. SUPOSTOS DANOS À PRODUÇÃO OCORRIDOS EM VIRTUDE DE INTERRUPÇÕES INJUSTIFICADAS NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. DEMANDA PROPOSTA PELO FUMICULTOR CONTRA CELESC DISTRIBUIÇÃO S.A. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA RÉ. AUTOR QUE ENCONTRA-SE EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AO CASO CONCRETO. SERVIÇO PRESTADO NA MODALIDADE DE CONCESSÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA POR EVENTUAIS DANOS CAUSADOS EM DECORRÊNCIA DA PRESTAÇÃO DE SEUS SERVIÇOS. EXEGESE DO ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. NEXO CAUSAL ENTRE AS INTERRUPÇÕES NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA E OS DANOS EXPERIMENTADOS PELO AGRICULTOR, DEVIDAMENTE COMPROVADOS. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE NÃO DEMONSTRADOS. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. VALIDADE DOS LAUDOS PERICIAIS ACOSTADOS À EXORDIAL. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DE FORMA ESPECÍFICA E DETALHADA PELA RÉ. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO ÂMBITO DESTE TRIBUNAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0000471-41.2014.8.24.0047, de Papanduva, rel. Des. Saul Steil, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 16-02-2017 - grifou-se).

           E do corpo do aresto paradigma, transcrevo, por sua completude e precisão, o seguinte excerto que a passa a compor o substrato do meu convencimento:

    Pondere-se que embora a apelante tenha contestado o laudo técnico acostado à inicial, impugnando a capacidade técnica do profissional que o elaborou, o fez de forma genérica e sem elementos capazes de derruir os argumentos lançados na exordial, ônus este que lhe incumbia, nos termos do art. 333, inc. II, do Código de Processo Civil de 1973 (redação atualmente prevista no art. 373, inc. II, do NCPC).

    Vale ressaltar que a questão pertinente à validade dos laudos técnicos trazidos pelo autor a fim de comprovar os danos materiais decorrentes da interrupção no fornecimento de energia, bem como a forma de apuração de tais danos, já foi objeto de apreciação nesta Corte, quando a matéria em questão ainda encontrava-se submetida à competência das Câmaras de Direito Público.

    Senão vejamos:

    INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. DIVERGÊNCIA, ENTRE AS CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS DECORRENTES DA INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA, OCASIONANDO O PERECIMENTO DO PRODUTO (FUMO), QUE SE ENCONTRAVA EM FASE DE SECAGEM EM ESTUFA, SUBMETIDA À VENTILAÇÃO MOVIDA POR ENERGIA ELÉTRICA. NECESSIDADE, SALVO HIPÓTESES EXCEPCIONAIS, DE OPORTUNIZAR O CONTRADITÓRIO QUANDO DEMONSTRADA, OBJETIVA E FUNDAMENTADAMENTE, O INTERESSE EM OUTRAS PROVAS. POSSIBILIDADE, TODAVIA, DE UTILIZAÇÃO DA PERÍCIA UNILATERAL, QUANDO AUSENTE CONTESTAÇÃO PONTUAL E CONCRETA. (TJSC, Pedido de Uniformização de Jurisprudência em Apelação Cível n. 2014.044805-2, de Itaiópolis, rel. Des. Ricardo Roesler, j. 09-09-2015).

    Colhe-se do referido julgado:

    [...] depois de ponderar as hipóteses mais comuns, creio que as seguintes premissas podem ser estabelecidas para os casos de indenização em questão:

    a) não é viável o julgamento antecipado sem implementação da instrução processual, ressalvadas as hipóteses em que: 1) não houver apresentação de defesa ou não for pontual e concretamente contestado o laudo técnico, e: 2) em qualquer hipótese, quando não se deduzir expressamente as provas e sua finalidade;

    b) o fato de a Celesc não ter participado da confecção do laudo técnico, mostrando-se inviável o exercício do direito ao contraditório naquela oportunidade, não autoriza que, na ausência de indicação e produção de provas no curso da instrução, seja prolatada sentença ilíquida, remetendo-se à liquidação a apuração. Nestes casos, fica autorizada a fixação do dano com base na prova feita pelo autor da ação;

    c) havendo laudo preliminar, com ou sem a participação da concessionária, a eventual necessidade de liquidação se dará às expensas da Celesc, ressalvada a hipótese em que impossibilidade de produzir-se as provas for tributável ao autor da ação.

    Ademais, consigna-se também que não houve impugnação específica por parte da apelante quanto ao valor apurado pelo magistrado a quo com base nas notais fiscais trazidas aos autos pela Empresa Fumageira Alliance One Exportadora de Tabacos Ltda (fls. 85/86) - grifou-se.

           Até porque, consoante dito alhures, em face da inversão do ônus da prova determinada pelo art. 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor (fl. 213), observa-se que a empresa ré não se desincumbiu do ônus processual que lhe cabia, ex vi do art. 373, inciso II, do Código de Processo Civil de 2015, acarretando a procedência da pretensão autoral.

           E se assim o é, há que se desprover o reclamo no ponto.

           Alega a Recorrente, ainda, que há culpa exclusiva do consumidor em relaçãos aos danos em escopo, porquanto omisso na obrigação de instalar dispositivos de proteção às oscilações da malha distributiva, bem como na adequação da unidade consumidora aos padrões normativos, não se afigurando razoável imputar à ré quaisquer falhas correlatas ao circuito interno das residências, eis que, supostamente, a responsabilidade da concessionária de energia elétrica cinge-se ao "ponto de entrega".

           Ab initio, quanto ao argumento de que as instalações elétricas internas da residência do segurado, supostamente inadequadas, seriam a causa dos prejuízos em questão, conveniente gizar que a concessionária de energia elétrica não produziu qualquer prova nesse sentido, limitando-se a arguir, genericamente, que o caso em comento albergaria culpa exclusiva do segurado.

           Consoante o detalhamento do acervo probatório efetuado alhures, e, considerando a inversão do ônus da prova incidente ao caso (fl. 213), ressoa inconteste que a empresa ré não se desincumbiu do ônus processual que lhe cabia (art. 373, inciso II, do CPC/2015), limitando-se a ilações despropositadas, que não ostentam idoneidade bastante à reversão do julgamento havido na origem - tese que dispensa a tessitura de maiores considerações.

           Por seu turno, em relação à aventada omissão do consumidor quanto à instalação de dispositivos de proteção às oscilações na rede elétrica, mister destacar que, em pretensões semelhantes, esta Corte firmou posição no sentido de inexistir qualquer razoabilidade na argumentação da concessionária, que pretende atribuir aos consumidores o ônus de eventuais falhas no fornecimento de energia elétrica, imputando aos usuários o custo de sua desídia na prestação dos serviços.

           Isto é, se à concessionária incumbe o fornecimento de energia elétrica, mostra-se de todo irrelevante a potestade de aquisição, por parte do consumidor, de equipamento de proteção quanto às eventuais anomalias da rede, pois pertence à própria Apelante a obrigação de minimizar essa problemática que lhe é de conhecimento longevo, criando mecanismos que impeçam as constantes falhas na prestação dos serviços, sendo "dever da concessionária fornecer com adequada qualidade o serviço essencial por ela prestado" (TJSC, Apelação Cível n. 0301893-83.2016.8.24.0054, de Rio do Sul, rel. Des. Saul Steil, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 23-02-2017).

           No mesmo norte, mutatis mutandis, veja-se:

    ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL - INDENIZATÓRIA - DANOS MATERIAIS - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO - CELESC - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - INTERRUPÇÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA - CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR - NÃO COMPROVAÇÃO - RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DA VÍTIMA DE GARANTIR A CONTINUIDADE DOS SERVIÇOS POR MEIO DE GERADOR - ALEGAÇÃO DESCABIDA - EVENTO FESTIVO CANCELADO EM RAZÃO DA INTERRUPÇÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA - DESPESAS COMPROVADAS - DEVER DE INDENIZAR DA CONCESSIONÁRIA - "QUANTUM DEBEATUR" - VALOR ADEQUADO - RECURSO DESPROVIDO.

    Por força da responsabilidade civil objetiva consagrada pelo art. 37, § 6º, da CF/88, a fazenda pública e os concessionários de serviços públicos estão obrigados a indenizar os danos causados em virtude de seus atos, e somente se desoneram se provarem que o ato ilícito se deu por culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior. Comprovado que a parte autora sofreu prejuízos ante o cancelamento do evento festivo que já estava organizado, inclusive com atração musical contratada e paga e venda antecipada de ingressos, por conta da queda de energia não solucionada no tempo devido, faz jus à indenização dos danos materiais a ser paga pela concessionária de energia elétrica. (TJSC, Apelação Cível n. 2015.041599-1, de Ibirama, rel. Des. Jaime Ramos, j. 06-08-2015 - grifou-se).

           Nesses termos, não merecem prosperar as alegações da concessionária quanto à necessidade de instalação de equipamentos protetivos às oscilações da rede de energia elétrica, cujo ônus não se pode imputar, em absoluto, aos usuários do serviço sob contenda.

           Ad argumentandum tantum, registre-se que o risco administrativo impõe a responsabilidade do Poder Público mesmo diante de atos lícitos, em conformidade ao direito posto.

           É o que nos ensina Edmir Netto de Araújo, professor de Direito Administrativo da Universidade de São Paulo:

    A responsabilidade do Estado por ato lícito é tema que vem sendo cada vez mais versado na doutrina brasileira, sempre no sentido de que independe a responsabilidade da ilicitude dos atos, porque decorre fundamentalmente do dano e do consenso que o respectivo prejuízo deve ser repartido entre a coletividade (justiça social e equidade), elementos que lastreiam a teoria objetiva sem culpa da responsabilidade do Estado. (ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo. 4 Ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 763 - grifou-se).

           No mesmo diapasão, é a doutrina de Cristiano Chaves de Farias, Felipe Braga Netto e Nelson Rosenvald:

    O STF, em múltiplas ocasiões, sublinhou que para a responsabilidade civil do estado é irrelevante a ilicitude ou ilicitude do ato estatal. A ilicitude ou na~o do ato, por si só, na~o diz nada acerca da exclusão da obrigação de reparar. Tanto os lícitos, como os ilícitos, na ordem jurídica brasileira, podem dar ensejo a` indenização. (FARIAS, Cristiano Chaves de; NETTO, Felipe Braga; ROSENVALD, Nelson. Novo tratado de responsabilidade civil. 2 Ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 1004 - grifou-se).

           Logo, a suposta regularidade administrativa quanto à prestação dos serviços não é suficiente, por si só, para ilidir a obrigação de indenizar, porque as esferas de responsabilidade - civil e administrativa - são absolutamente independentes, cumprindo-me afastar os argumentos aventados pela Apelante.

           Enfim, tratando-se de recurso manejado à luz do Código de Processo Civil de 2015, há que se fixar os honorários recursais em face do art. 85, §§ 1º e 11, da novel codificação, além do disposto no Enunciado Administrativo n. 7 do Superior Tribunal de Justiça.

           Considerando que na instância a quo a verba honorária restou fixada em R$ 1.000,00 (mil reais), com fulcro nos parâmetros do art. 85, §§ 2º e 8º, do Código de Processo Civil de 2015, assim como no trabalho zeloso desenvolvido pelo causídico da parte autora, oportuno majorar os honorários advocatícios em R$ 200,00 (duzentos reais), totalizando, à hipótese, o montante de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais) - nos estritos termos do que restou decidido nos Embargos de Declaração no Agravo Interno em Recurso Especial n. 1.573.573/RJ, julgado em 04/04/2017, sob relatoria do eminente Ministro Marco Aurélio Bellizze, em que o Superior Tribunal de Justiça delineou as balizas interpretativas do art. 85 da nova lei adjetiva, dentre as quais se inclui: "o não conhecimento integral ou o improvimento do recurso pelo Relator, monocraticamente, ou pelo órgão colegiado competente".

           Ante o exposto, vota-se no sentido de conhecer do recurso de apelação e negar-lhe provimento, majorando-se a verba advocatícia em R$ 200,00 (duzentos reais) para o patrono da parte autora, à guisa de honorários recursais.

           Este é o voto.


Gabinete Desembargador André Carvalho