Apelação Cível n. 0003456-32.2013.8.24.0042, de Maravilha
Relator: Desembargador Hélio do Valle Pereira
ACIDENTE DO TRABALHO - INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE - SEGURADO ESPECIAL - AUXÍLIO-ACIDENTE DEVIDO.
O auxílio-acidente é instituto tradicional da infortunística. Mesmo que a incapacidade seja parcial; ainda que exista a possibilidade de inserção no mercado de trabalho; há a proteção, que bem por isso é contada na razão de apenas uma porção do salário-de-benefício.
Lesões insignificantes, que não tragam nenhum embaraço ao labor, não são indenizáveis. Mas outras, que tenham significado bastante para gerar um maior sacrifício, justificam o auxílio-acidente. Caso contrário, a hipótese seria ainda mais gravemente para o INSS - de deferimento de aposentadoria por invalidez. Posicionamento do STJ, firmado em grau de REsp Repetitivo, confirma a tese.
No caso, a perícia diagnosticou que o autor possui patologia lombar, lesão que tem relação com a atividade como agricultor e, ainda que não impeça puramente o trabalho, traz maior dificuldade.
Recurso conhecido e provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0003456-32.2013.8.24.0042, da Comarca de Maravilha - 2ª Vara em que é apelante José Wagner e apelado o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
A Quinta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas legais.
Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Gerson Cherem II e Denise de Souza Luiz Francoski.
Florianópolis, 15 de março de 2018.
Desembargador Hélio do Valle Pereira
Presidente e relator
RELATÓRIO
Sentença da Comarca de Maravilha julgou improcedente o pedido de proteção acidentária realizado por José Wagner.
Vem, por isso, recurso do autor.
Argumenta ser agricultor atuante em regime de economia familiar e que em decorrência do trabalho desenvolveu patologia que afeta a sua coluna lombar. Sustenta que a perícia identificou o nexo etiológico e a perda parcial da incapacidade, que atinge o grau de 25%. A esse respeito, defende que a inaptidão, ainda que mínima, dá ensejo ao deferimento do benefício infortunístico.Pede, ademais, o prequestionamento de toda tratada no recurso.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região declinou de sua competência e encaminhou os autos para esta Corte.
Após contrarrazões, a Procuradoria-Geral de Justiça negou interesse na causa.
Depois, o autor juntou documentação comunicando a prorrogação do auxílio-doença até setembro de 2015 (fls. 108), conferido administrativamente pelo INSS. Intimada, a autarquia nada disse.
VOTO
1. O autor relata padecimento lombar decorrente de sua atividade na agricultura. A autarquia, reconhecendo a condição de segurado especial, concedeu-lhe auxílio-doença infortunístico até setembro de 2013, razão porque veio a demanda pedindo o seu restabelecimento ou conversão em aposentadoria por invalidez.
Julgado improcedente o pleito, o autor trouxe aos autos comprovação de que benefício previdenciário havia sido prorrogado de fevereiro a setembro de 2015.
Postula, agora no apelo, o deferimento do auxílio-acidente.
2. A perícia descreveu diagnóstico de "doença degenerativa lombar" (fls. 63) e indicou como data provável do início da patologia o ano de 2009 e da incapacidade o ano de 2013. Referiu também que a lesão está consolidada (fls. 66) e guarda nexo causal com a atividade desempenhada na agricultura (fls. 67). Por conta disso, o expert aclarou que o quadro de saúde do segurado corresponde a uma perda de 25% da capacidade laborativa, configurando um padecimento parcial e permanente. O dano, nesses termos, seria residual (fls. 67). Apesar disso, afastou possível incapacidade para o trabalho (item c - fls. 68).
3. A partir daí, em que pese ao desfecho desfavorável ao demandante, tenho que o auxílio-acidente seja mesmo merecido.
A proteção do art. 86 da Lei 8.213/91 exige incapacidade parcial e permanente, o que, a meu ver, é bem a situação concreta. Trata-se de benefício de quem pode trabalhar, mas com mais sacrifício - notadamente em situações como a presente, em que o autor trabalha na agricultura, atividade eminentemente braçal e, ao que consta, a desempenha desde os oito anos de idade. Há de se considerar, além disso, que se trata de patologia crônica e degenerativa, mas cuja progressão possui atrelamento ao labor.
Em casos tais, a despeito da perícia em sentido oposto, não se pode ignorar o caráter social do benefício.
Atente-se, outrossim, que o art. 86 da Lei 8.213/91, a contar da Lei 9.032/95, se contenta com a incapacidade parcial e vitalícia. Não faz dosagem quanto à sua extensão (diferentemente do que constava na redação original do dispositivo ou mesmo perante a Lei 6.367/76, ambas prevendo três patamares distintos para a proteção nessas situações).
Apenas se devem afastar lesões que tragam consequências insignificantes, mas o que decididamente não é o caso.
Este Tribunal de Justiça tem corretamente se posicionado nessa linha tradicional:
"PREVIDENCIÁRIO. ACIDENTE DE TRABALHO. FRATURA INTRA-ARTICULAR DO SEGUNDO METACARPIANO DA MÃO DIREITA. PERDA PERMANENTE DA FORÇA E DOS MOVIMENTOS DO DEDO. REDUÇÃO DA CAPACIDADE PARA O LABOR ATESTADA PELO PERITO MÉDICO. NÍVEL DO DANO QUE NÃO INFLUENCIA NA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AUXÍLIO-ACIDENTE DEVIDO. MANUTENÇÃO.
'O nível do dano e, em consequência, o grau de maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão'. (REsp n. 1.109.591/SC, rel. Min. Celso Limongi, j. em 25/08/2010).
'Recentes decisões do STJ assentaram posicionamento no sentido de que o grau da lesão e da redução capacidade de trabalho não interferem na concessão do benefício, pois este será devido ainda que a lesão e a diminuição da aptidão sejam mínimas.' (ED em AC n. 2009.054212-7/0001.00, de Curitibanos, rel. Des. Pedro Manoel Abreu) [...].' (AC n. 2014.094764-6, de Rio do Oeste, rel. Des. Carlos Adilson Silva, j. 10-6-2015)."
(...) (AC 2015.039118-9, de Orleans, rel. Des. Jorge Luiz de Borba)
É importante destacar que o REsp 1.109.591, justamente proveniente deste Tribunal de Justiça, permitiu que o STJ firmasse a tese há pouco reproduzida em grau de recurso repetitivo.
Vale ainda ponderar que mesmo pedido o auxílio-doença e aposentadoria por invalidez na inicial, é o caso de auxílio-acidente, tal como agora postulado no recurso, especialmente porque se trata de sequela permanente e como já se disse, parcial.
4. O benefício será devido desde a cassação do primeiro auxílio-doença (à época o INSS já estava ciente do estado de saúde do autor), pagando-se as parcelas vencidas de acordo com a escala de reajustamentos administrativos. Naquele momento, inclusive, pelos dados agora expostos, a incapacidade do autor já poderia ser definida como parcial e definitiva.
É verdade que depois foi revigorado auxílio-doença, mas o autor não pode ser prejudicado. Fosse concedida a mercê de direito no momento próprio, o acionante estaria acumulando os ganhos do mencionado auxílio-acidente com salários.
Quanto aos encargos, lembro que recentemente o Supremo Tribunal Federal chamou as coisas à ordem, dando, por assim dizer, uma interpretação autêntica ao precedente julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, mais exatamente para definir a extensão da inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei 9.494/97 (na redação da Lei 11.960/2009). Tratou-se do RE 870.947-SE (rel. Min. Luiz Fux), que corresponde ao Tema 810 da Repercussão Geral.
Em síntese, ficou aclarado que:
a) É inconstitucional a aplicação dos juros incidentes nas caderneta de poupança às condenações judiciais de natureza tributária (que seguirão os mesmos critérios de aditamento impostos legalmente em prol Fazenda Pública quando for a credora).
b) É constitucional a aplicação daqueles mesmos juros às demais obrigações.
c) É inconstitucional a aplicação da TR (adotada para as cadernetas de poupança) quanto a quaisquer créditos.
d) O índice que deve ser convocado em substituição é o IPCA-E.
A partir daí, o entendimento que tem vingado é fazer valer esse pensamento: juros da Lei 11.960/2009, vencidos da citação (art. 405 do Código Civil); correção monetária, do vencimento de cada parcela, pelo IPCA-E a contar de 30 de junho de 2009, quando entrou em vigor a tal norma (p.ex., TJSC, AC 0300102-45.2015.8.24.0012, de Caçador, rel. Des. Pedro Manoel Abreu; TRF-4ª Região, AC 5062979-51.2016.4.04.7000/PR, rel. Des. Federal Amaury Chaves de Athayde).
Os honorários advocatícios serão de 10% (Súmulas 110 e 111 do STJ), mas alertando-se que o entendimento do STJ restringe o cálculo às parcelas vencidas até a sentença (no caso, o acórdão).
As custas serão arcadas pelo INSS (Súmula 178 do STJ), mas contadas pela metade (Lei Complementar Estadual 156/1997).
5. Assim, conheço e dou provimento ao recurso do autor para conceder o auxílio-acidente, nos termos postos no item 4.
É o voto.
Gabinete Desembargador Hélio do Valle Pereira