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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0004649-87.2010.8.24.0139 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Júlio César Knoll
Origem: Porto Belo
Orgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Público
Julgado em: Tue Mar 20 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Janiara Maldaner Corbetta
Classe: Apelação Cível

 


 


Apelação Cível n. 0004649-87.2010.8.24.0139, de Porto Belo

Relator: Desembargador Júlio César Knoll

   APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA CONSTITUTIVA DE DIREITO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. PENSÃO POR MORTE. COMPANHEIRA DE EX-SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. IMPOSSIBILIDADE DE RATEIO ENTRE A ESPOSA E A CONCUBINA. DE CUJUS CASADO À ÉPOCA DO ÓBITO. INEXISTÊNCIA DA PROVA DE SEPARAÇÃO DE FATO. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

   "A titularidade da pensão decorrente do falecimento de servidor público pressupõe vínculo agasalhado pelo ordenamento jurídico, mostrando-se impróprio o implemento de divisão a beneficiar, em detrimento da família, a concubina. (STF, RE nº 590.779, rel. Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, julgado em 10.02.2009)" (TJSC, Apelação Cível n. 0303141-88.2015.8.24.0064, de São José, rel. Des. Ronei Danielli, Terceira Câmara de Direito Público, j. 31-10-2017).

   "Não é devida pensão por morte à concubina em concorrência com a viúva na hipótese em que o falecido, ao tempo do óbito, permanecia casado, pois, ainda que os requisitos configuradores da união estável se apliquem para fins previdenciários, conforme o artigo 16, § 3º, da Lei 8.213/1991, a existência de impedimento para o matrimônio, por parte de um dos companheiros, embaraça a constituição da união estável, o que impede que os efeitos jurídicos que dela irradiam alcancem a concubina." (AgRg no REsp 1267832/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, j. em 13-12-2011, DJe 19-12-2011).

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0004649-87.2010.8.24.0139, da comarca de Porto Belo 2ª Vara em que é Apelante Arazemi da Silva e Apelado IPREV Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina.

           A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, conhecer e desprover o apelo, mantendo-se incólume a sentença de primeiro grau, por seus próprios fundamentos. Custas na forma da lei.

           O julgamento, realizado no dia 20 de março de 2018, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Jaime Ramos, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Ronei Danielli.

           Funcionou como representante do Ministério Público o Dr. Murilo Casemiro Mattos.

           Florianópolis, 20 de março de 2018.

Desembargador Júlio César Knoll

Relator

 

RELATÓRIO

           Perante a 2ª Vara da comarca de Porto Belo, Arazemi da Silva, devidamente qualificada, promoveu, com fundamento nos permissivos legais, através de procurador habilitado, ação declaratória e constitutiva de direito, em desfavor do Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina - IPREV.

           Relatou, em apertada síntese, que conviveu maritalmente com Amandus Muller, desde 1997 até 28-4-2004, quando o mesmo veio a falecer.

           Aduziu, em tese, que seu companheiro era separado "de fato" da esposa, e que sua convivência com o de cujus era conhecida por todos.

           Mencionou que, quando Amandus foi internado no hospital para tratamento de saúde, permaneceu com ele, conforme documentos acostados aos autos.

           Diante disto, ajuizou a presente ação, a fim de que seja reconhecida a sua qualidade de dependente e consequentemente, concedido o benefício de pensão por morte na proporção de 50% (cinquenta por cento), desde a data do óbito, qual seja, 28-4-2004.

           Recebida, registrada e autuada a inicial, o IPREV foi citado.

           No prazo legal, veio aos autos e ofereceu resposta, via contestação, oportunidade em que rebateram os pontos da exordial.

           Foi designada audiência de instrução e julgamento, momento em foram ouvidas as testemunhas arroladas pelas partes (fl. 167).

           Ato contínuo, a MMa. Juíza de Direito, Dra. Janiara Maldaner Corbetta, proferiu sentença, a saber (fls. 190-193):

    Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por Arazemi da Silva em face do Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina - IPREV. Condeno a requerida ao pagamento das custas e honorários, estes fixados em R$ 800,00 (oitocentos reais), os quais ficam sobrestados de exigibilidade caso beneficiada com a Justiça Gratuita. P.R.I. Transitada em julgado, arquive-se.

           Inconformada, a tempo e modo, a autora interpôs recurso de apelação.

           Nas suas razões, reiterou os argumentos apresentados na peça exordial e pediu pela reforma da sentença, com a procedência dos pedidos.

           Apresentadas as contrarrazões, os autos foram encaminhados à douta Procuradoria-Geral de Justiça, sendo que lavrou parecer o Dr. Newton Henrique Trennepohl, que entendeu pela desnecessidade de sua intervenção feito.

           Vieram conclusos.

           Este é o relatório.

 

VOTO

           De início, mister enfatizar que como a decisão vergastada foi prolatada na vigência do Código de Processo Civil de 1973, as disposições do novo regramento processualista não se aplicam ao presente recurso.

           Assim sendo, satisfeitos os requisitos legais, conhece-se do apelo.

           Acerca da preliminar de nulidade da sentença, em razão do princípio da identidade física do juiz, a orientação do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o juiz não tem caráter absoluto, podendo ser flexibilizados em nome da celeridade processual.

           Colaciona-se:

    RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ERRO MÉDICO. CIRURGIA ORTOPÉDICA. PACIENTE QUE FICOU TETRAPLÉGICA. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE POR ESTA CORTE. SENTENÇA PROLATADA POR JUIZ DISTINTO DAQUELE QUE ACOMPANHOU OS ATOS INSTRUTÓRIOS. FLEXIBILIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ (ART. 132 DO CPC). REGIME DE EXCEÇÃO/MUTIRÃO. POSSIBILIDADE. PREJUÍZO NÃO EVIDENCIADO. NULIDADE DA SENTENÇA NÃO CONFIGURADA.

    Hipótese em que se alega, além de divergência jurisprudencial, violação aos princípio do devido processo legal (artigo 5º, inciso LVI, da Constituição Federal) e da identidade física do juiz (artigo 132 do Código de Processo Civil), ao argumento de que a sentença foi prolatada por magistrado distinto daquele que colheu as provas periciais e testemunhais, o que teria gerado enormes prejuízos ao recorrente. Pretende-se a determinação de retorno dos autos à primeira instância a fim de ser proferida outra sentença, desta vez, pelo juiz titular da vara que acompanhou a instrução do processo.

    2. A insurgência referente à suposta violação do princípio do devido processo legal, constante do artigo 5º, inciso LVI, da Constituição Federal, envolve matéria estranha ao âmbito de cabimento do recurso especial, disposto no artigo 105, inciso III, da Carta da República. Tal irresignação tem como via adequada de revisão, em matéria constitucional, o recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, de forma, que, nesse particular, não merece ser conhecido o apelo especial.

    3. Na forma do art. 132 do Código de Processo Civil, o magistrado que concluir a audiência só não julgará a lide se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, caso em que a passará ao seu sucessor.

    4. Sob esse enfoque, a Corte Especial deste Tribunal, por ocasião do julgamento do AgRg no Ag 624.779/RS, de relatoria do Min. Castro Filho, firmou entendimento no sentido de que o princípio da identidade física do juiz não tem caráter absoluto, podendo o juiz titular ser substituído por seu sucessor nas hipóteses previstas no artigo 132 do Código de Processo Civil, entre as quais está incluída a expressão "afastado por qualquer outro motivo", a partir da qual pode-se considerar o afastamento do magistrado em decorrência do regime de exceção/mutirão, que visa a agilização da prestação jurisdicional. Precedentes.

    5. Além disso, a jurisprudência entende que a simples alegação de afronta ao referido dispositivo legal não tem o condão de acarretar a nulidade da sentença, porquanto imperioso ventilar qual o prejuízo efetivamente sofrido.

    6. No caso em foco, verifica-se da leitura dos fundamentos do acórdão recorrido que, indubitavelmente, foram levados em consideração os elementos probatórios produzidos nos autos, dentre eles, documentos, prova testemunhal e pericial, de modo que, em assim sendo, não há como vislumbrar qualquer prejuízo ao recorrente. E, sem prejuízo, não há nulidade.

    7. Com efeito, desde que não haja prejuízo para nenhuma das partes, consoante ocorre na espécie, o princípio do juiz natural pode ser flexibilizado, a fim de conferir efetividade ao Judiciário, como nas hipóteses de mutirões. 8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta extensão, não provido (STJ, REsp 380466/PR, rel. Min. Benedito Gonçalves, j. em 13-10-2009).

           Nessa senda, extrai-se da jurisprudência deste Tribunal de Justiça:

    APELAÇÕES CÍVEIS E REEXAME NECESSÁRIO. TARIFAS DE LIMPEZA URBANA E COLETA DE LIXO. AÇÃO DE COBRANÇA AJUIZADA POR EMPRESA CONCESSIONÁRIA DO SERVIÇO PÚBLICO EM FACE DO MUNICÍPIO DE ITAJAÍ. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. DECISÃO QUE REJEITOU OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS EM PRIMEIRO GRAU PROFERIDA POR MAGISTRADO DISTINTO DAQUELE QUE PROLATOU A SENTENÇA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. PREFACIAL RECHAÇADA. Os tribunais têm atenuado o princípio da identidade física do juiz em prol da efetividade e celeridade processuais, notadamente se evidenciada a inexistência de prejuízo processual às partes (STJ, AgRg no Ag 1144374/RS, rel. Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma DJe 03/05/2011), nos casos de programas de enfrentamento de demandas, mutirões e também nas situações em que o magistrado afasta-se da respectiva unidade jurisdicional por algum motivo qualquer, nos termos do art. 132 do Código de Processo Civil. Além do que, a simples alegação de afronta ao princípio do juízo natural, desacompanhada de qualquer ilação acerca do prejuízo efetivamente suportado, não tem o condão de acarretar a nulidade da sentença "(...) com substrato no princípio da instrumentalidade, consagrado na expressão francesa 'pas de nullité sans grief'" (Apelação Cível n. 2011.063847-0, de São Bento do Sul, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. em 04/10/2011). [...] (TJSC, Apelação Cível n. 2012.002991-1, rel. Des. Carlos Adilson Silva, j. 11-8-2015) (Grifei).

           Logo, é medida que se impõe desprover o apelo no ponto.

           No mérito, a causa de pedir veio essencialmente embasada no direito de Arazemi da Silva receber o benefício de pensão por morte, porquanto alegou ter vivido maritalmente com Amandus Muller, por aproximadamente 7 (sete) anos.

           A benesse pretendida é devida aos dependentes do segurado, no caso de falecimento deste.

           A sua finalidade precípua é a manutenção econômica da família que teve sua subsistência prejudicada pela perda do segurado, o qual auxiliava no sustento familiar.

           Este direito encontra-se expressamente previsto no artigo art. 74 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97:

    Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:

    I - do óbito, quando requerida até 30 (trinta) dias depois deste;

    II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;

    III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.

    E ainda:

    Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:

    I - pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família e auxílio-acidente; 

    Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

    I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

    II - os pais;

    [...]

    § 4º. A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

           No presente caso, vislumbra-se que a autora visa o reconhecimento como dependente do de cujus, na qualidade de união estável, e consequentemente o recebimento do benefício de pensão por morte.

           Neste diapasão, a e. Corte de Justiça Catarinense já manifestou-se. Veja-se:

    ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL - PENSÃO POR MORTE DE SERVIDOR PÚBLICO CASADO - PRETENSÃO DE RATEIO ENTRE CONCUBINA E ESPOSA - IMPOSSIBILIDADE - AUSÊNCIA DE SEPARAÇÃO DE DIREITO OU DE FATO - CONCOMITÂNCIA E PERMANÊNCIA DO RELACIONAMENTO COM AS DUAS ATÉ O FALECIMENTO - CONCUBINATO IMPURO QUE IMPEDE A FORMAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL - PEDIDO IMPROCEDENTE - RECURSO ADESIVO - PLEITO DE CONDENAÇÃO DA AUTORA À RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DA TUTELA ANTECIPADA - DESNECESSIDADE - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA EXECUTÁVEL NESSE SENTIDO - NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. A Constituição outorga aos dependentes o direito à pensão por morte do servidor público. No Estado de Santa Catarina a Lei Complementar n. 129/1994 estabelece quais são os dependentes beneficiários, dentre os quais o cônjuge supérstite ou "o companheiro ou companheira designado que comprove união estável como entidade familiar" (art. 5º). Pode haver rateio da pensão por morte entre a ex-mulher separada de direito, mas dependente, que necessitava de pensão alimentícia, e a companheira com quem o servidor mantinha união estável até o falecimento. Também é possível o rateio da pensão por morte entre a ex-mulher e a concubina, na hipótese de união extraconjugal após separação de fato dos cônjuges unidos pelo matrimônio. Mas não é possível o rateio da pensão por morte entre a concubina e a mulher do servidor se a união conjugal foi mantida concomitantemente, por nunca ter sido desfeita pela separação de direito (judicialmente ou por escritura pública) ou de fato. Efetivamente, de acordo com o Código Civil de 2002, a pessoa casada está impedida de casar-se novamente, sob pena de incorrer em bigamia, e, em face do impedimento, não é possível a formação da união estável, de modo que "as relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato". É considerado "impuro" o concubinato quando ele concorre com o relacionamento conjugal não desfeito nem mesmo de fato, não sendo possível, nesse caso, a constituição de direitos em favor da concubina. Precedentes: STF, RE 590.779/ES, Rel. Min. Marco Aurélio, em 10.02.2009; STJ, REsp 674.176/PE, Rel. Designado Min. Hamilton Carvalhido, em 17.03.2009; REsp 1.104.316/RS, Relª Minª Maria Thereza de Assis Moura, em 28.04.2009; REsp 1.114.490/RS, Rel. Min. Jorge Mussi, em 19.11.2009; TJSC, Embargos Infringentes 2010.005398-5, Rel. Des. Newton Janke, em 09.06.2010; AC n. 2011.077839-6, Rel. Des. Rodrigo Collaço, em 27.09.2012. (TJSC, Apelação Cível n. 2012.081889-9, de Ponte Serrada, rel. Des. Jaime Ramos, j. 10-10-2013).

    BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PRETENSÃO DA CONCUBINA DE RATEIO DA PENSÃO POR MORTE, EM IGUALDADE DE CONDIÇÕES COM A ESPOSA DO FALECIDO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RELAÇÃO PARALELA AO CASAMENTO RECONHECIDA PELA APELANTE. SIMULTANEIDADE DE CONJUGALIDADES. UNIÃO ESTÁVEL NÃO CARACTERIZADA, SEQUER NA FORMA PUTATIVA POR AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. INEXISTÊNCIA DE DIREITO AO BENEFÍCIO SOB PENA DE MALFERIMENTO DO PRIMADO DA FAMÍLIA MONOGÂMICA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 1.723 DO CC. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. A titularidade da pensão decorrente do falecimento de servidor público pressupõe vínculo agasalhado pelo ordenamento jurídico, mostrando-se impróprio o implemento de divisão a beneficiar, em detrimento da família, a concubina. (STF, RE nº 590.779, rel. Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, julgado em 10.02.2009) (TJSC, Apelação Cível n. 0303141-88.2015.8.24.0064, de São José, rel. Des. Ronei Danielli, Terceira Câmara de Direito Público, j. 31-10-2017).

    AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA ANTECIPADA. PEDIDO DE PAGAMENTO DE PENSÃO POR MORTE. MEDIDA DE URGÊNCIA INDEFERIDA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA PLAUSIBILIDADE DO DIREITO INVOCADO. UNIÃO ESTÁVEL ENTRE A POSTULANTE E O FINADO NÃO EVIDENCIADA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 1001071-21.2016.8.24.0000, de Araranguá, rel. Des. Ricardo Roesler, Terceira Câmara de Direito Público, j. 06-06-2017).

    Apelação cível. Previdenciário. Pensão por morte. União estável não comprovada ao tempo do falecimento do servidor, assim como a dependência econômica. Benefício indevido. Recurso desprovido. Ausente a prova da existência de uma união estável e da dependência econômica, apresenta-se inviável a pretensão de percepção de pensão previdenciária por morte. (TJSC, Ap. Cív. n. 2008.016551-3, Rel. Des. Jânio Machado). (TJSC, Apelação Cível n. 2012.041687-7, de Brusque, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, Terceira Câmara de Direito Público, j. 17-09-2013).

           Ressalta-se, ainda, que:

    "No caso concreto, a documentação anexada à petição inicial não é suficiente para demonstrar, de plano, a probabilidade do direito alegado pela parte autora. Isso porque, não obstante a parte autora ter apresentado diversos documentos que denotam a sua convivência com o instituidor # tais como, a escritura pública de união estável, a certidão de óbito em que a autora figura como declarante, a certidão de nascimento de uma filha, dentre outros # a circunstância mais importante neste momento é que o laudo social realizado pelo IPREV # que serviu de base para o indeferimento do pedido na esfera administrativa # demonstra exatamente o contrário. Aliás, basta verificar o parecer da procuradoria do IPREV, que, ao analisar as informações apresentadas pela assistente social # a qual esteve pessoalmente no local e entrevistou diversas pessoas que conheciam a rotina da casa onde viviam a autora e o de cujus - concluiu que "depreende-se sem qualquer dúvida, pelas informações obtidas nas visitas domiciliares e os depoimentos colhidos, a inexistência de união estável entre a requerente e o ex-segurado na data do evento morte, situação que inviabiliza o pagamento da pensão previdenciária, razão pela qual o pedido deve ser indeferido." (ver p. 185). Daí por que não se justifica o excepcional afastamento do contraditório contra a Fazenda Pública (CPC, art. 1.059) (Grifei).

           Volvendo ao caso em concreto, observa-se da análise do Estado Social, realizado pelo IPREV, às fls. 80-87, as seguintes informações:

    Em visita à casa da filha do ex-associado (Mariane): [...] Quando o ex-associado veio residir no litoral vieram morar com ele Mariane e "Armandinho". A Sra. Wally continuou residindo em Rio do Sul - não quis vir morar na praia. Continuou casaca com o ex-associado.

    [...] Questionada sobre a relação de seu pai com a Sra. Arazemi, respondeu que ela sempre o acompanhava, mas não como esposa. [...]

    Reafirmou que seu pai (ex-associado) não morava com sua mãe, mas ia visitá-la e sempre preservou a família. Questionado se nessas visitar o ex-associado dividia o mesmo quarto com a Sra. Wally, disse que não, que ficava no quarto de hóspedes; que ela era doente e ele inclusive mantinha contato com seu médico.

    Questionada se a Sra. Arazemi tinha contato com seus irmãos, se frequentava a casa dela (de Mariane). Disse que em festinhas convidava a referida, mas o ex-associado sempre vinha sozinho. [...]

    Contato com a Sra. Evelin: [...] conhece a Sra. Arazemi, pois esta residia nos fundos da casa de seu pai. Disse ser uma pessoa boa. Seu pai a conheceu e parece que a trouxe de Joinville. Parece-lhe que passa dificuldades - "até fome" (sic). Quando seu pai ficou doente, ela o cuidou, mas não como sua mulher. Só olhava por ele enquanto as filhas Rosa e Mariane não o atendiam. Que lhe dava os remédios, auxiliando-o em seus cuidados.

    [...] Questionada se a Sra. Arazemi acompanhava seu pai em outros locais, mencionou que o acompanhava à igreja. Questionada se frequentava a sua casa (de Evelin), disse que sim, mas não como esposa, e sim como colega do pai. Disse que sua mãe (de Evelin) é ainda esposa dele.

    Questionada sobre a residência de sua mãe (de Evelin), disse que reside em Rio do Sul, com sua irmã Marli. Que no período de férias desta, a mãe vem para o litoral. Disse que seu pai nunca a abandonou. Que sempre "olhada por ela" (sic). Que a mesma teve uma "ebolia" (sic) e ele sempre ia visitá-la em Rio do Sul. Questionada se seu pai mantinha convívio carnal com a mãe, disse que esta é pessoa doente. Acredita que não mais tinham um convívio como casal, mas ele sempre a visitava, inclusive manteve a carteira do IPESC para a mesma. Informou-nos ainda que a Sra. Arazemi acompanhou seu pai nas internações que teve no Hospital Marieta Konder, em Itajaí, e no Hospital da UNIMED, em Joinville, afirmando querer ajudar.

    [...] contato com a Sra. Marli [...] informou que conhece a Sra. Arazemi, pois seu pai (o ex-associado) a ajudava. Que ela morava no terreno dele e por vezes ele a mandou embora. Questionada sobre as razões disso, não foi clara, afirmando, entretanto, que isso ocorreu mais de uma vez. Quando a Sra. Arazemi era mandada embora, ia pra Joinville. Que a mesma tinha uma filha com idade de 12 ou 13 anos, a quem a Sra. Marli viu muito pouco. Informou que a Sra. Arazemi era costureira e vivia dessa atividade. Que enfrentava dificuldades, por isso o ex-associado a ajudava. Informou que ela (a Sra. Marli) gostava dela (da Sra. Arazemi) e solicitou-lhe que cuidasse de seu pai. Afirmou que ela e seu pai não tiveram convivência sobre o mesmo teto como marido e mulher. Aifmrou que sua mãe (a Sra. Wally) "era a mulher dele" (sic). Que estes davam-se bem, apesar de seu pai ser uma pessoa "que gostava da vida" (sic); "era mulherengo" (sic). Que, inclusive, teve um relacionamento com a mãe de "Armandinho", o qual, posteriormente morou com a Sra. Wally, e foi tratado como filho. Informou, ainda, que seu pai (ex-associado) morava em Perequê desde que perdera um de seus filhos (Amandus Jr.) e sua mãe (Sra. Wally) permaneceu em Rio do Sul, morando consigo (Marli). Mas que o ex-associado ia visitá-la sempre. Informou, finalmente, que acompanhou (Aa Sra Marli) seu pai quando da sua última internação, ocorrida em Joinville, no hospital da UNIMED. Que a Sra. Arazemi visitou-o, mas não permaneceu em sua companhia. [...]

           Destarte, entendo que a Magistrada a quo julgou corretamente a presente demanda, tendo em vista a impossibilidade de conceder o benefício de pensão por morte à autora, uma vez que o falecido não encontrava-se separado de fato de sua esposa.

           O Superior Tribunal de Justiça "já pacificou o entendimento de que a existência de impedimento para o casamento disposto no art. 1.521 do Código Civil impede a constituição de união estável e, por consequência, afasta o direito ao recebimento de pensão por morte, salvo quando comprovada a separação de fato dos casados, o que, contudo, não configura a hipótese dos autos (AgRg no REsp 1418167/CE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 24-3-2015, DJe 17-4-2015).

           Dos depoimentos prestados no laudo social, depreende-se que não há comprovação de que o de cujus havia, de fato, se dissociado de Wally Muller.

           O que se nota, é que Amandus Muller mudou-se de cidade, todavia, sua cônjuge não quis o acompanhar e permaneceu em sua residência durante todo o período, sem o término do relacionamento e/ou desarrimo da família.

           Conforme noticiado pela filha, Mariane, durante o depoimento em audiência (fl. 167), a Sra. Wally apenas pediu alimentos, para descomplicar a forma de transferência de valores, sem que houvesse preocupação por parte do então servidor, que sempre a ajudava financeiramente. Transcreve-se, tal como foi citado no texto da sentença:

    Que seu pai nunca se separou de sua mãe, sequer de fato; Que seu pai Amandus ficou com sua mãe até o último dia de vida; Que sua mãe ficou morando em Rio do Sul pois estava cansada de mudanças e seu pai residia em Porto Belo; Que seu pai ficava mais em Rio do Sul do que em Porto Belo; Que soube que uma senhora passou a morar com seu pai e ao indagá-lo ele afirmou que não era nada daquilo que ela pensava; Que não sabe quanto tempo seu pai ficou com Arazemi; Que Arazemi sempre acompanhava seu pai, mas nunca a viu como esposa; Que seu pai pagava todas as despesas de sua mãe, que ele repassava parte de seu salário para ela pelo banco, pois nunca houve separação; Que não sabe dizer se houve acordo judicial ou se foi espontâneo; Que no local onde seu pai residia havia duas casas edificadas, era tudo uma casa só e não sabe se cada um morava em uma casa; Que não sabe se Arazemi trabalhava ou se era sustentada pelo seu pai; Que cuidava de sua mãe até mais que o necessário; Que Arazemi nunca visitou sua mãe, e sua mãe nunca teve conhecimento dela; Que ia muito pouco à casa do pai, então não pode falar sobre a convivência deles; Que falou para o seu pai, se tivesse algo sério com Arazemi, para inscrevê-la no IPESC mas ele não quis.

           Ressalta-se, que "À configuração da união estável como entidade familiar devem estar presentes a vida comum entre os companheiros, a notoriedade e estabilidade da relação, o objetivo de constituição familiar e a ausência de impedimentos para o casamento" (TJSC. Apelação Cível n. 2013.013052-3, rel. Des. Monteiro Rocha, j. 25-9-2014).

           Cumpre, também, destacar que o concubinato difere da união estável, uma vez que o primeiro, de acordo com o artigo 1727 do Código Civil, se configura por meio de "relações não eventuais entre homem e mulher, impedidos de casar [...]".

           Destarte, ainda que a autora estivesse pleiteando o reconhecimento de união estável com o de cujus, não teria direito a benesse postulada.

           Isto porque, o artigo 1.521 do Código Civil elencou em sua redação, como um dos impedimentos à celebração do casamento, o fato de uma das partes ser casada.

           No presente caso, denota-se que o segurado, Amandus, sempre fora casado com a Sra. Wally, e que nunca encontrou-se separado de fato ou judicialmente dela.

           Corroborando com o exposto, o Superior Tribunal de Justiça de Santa Catarina pacificou o entendimento de que "a existência de impedimento para o casamento disposto no art. 1.521 do Código Civil impede a constituição de união estável e, por consequência, afasta o direito ao recebimento de pensão por morte, salvo quando comprovada a separação de fato dos casado [...]" (AgRg no REsp 1418167/CE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 24-3-2015, DJe 17-4-2015).

           Neste contexto, importante trazer à baila importante anotação do doutrinador Fábio Ulhoa Coelho:

    [...] assim como ninguém pode ser casado duas vezes (bígamo), também não pode manter simultaneamente um casamento e uma união estável, nem duas uniões estáveis. [...] a pessoa casada só pode envolver-se numa união estável depois de sua separação de fato ou judicial (art. 1723 §1 CC). Aquele que já se encontra vinculado a uma união estável, igualmente não pode ligar-se a outro convivente enquanto não desfizer a primeira. [...] quando do desrespeitada a regra da monogamia, o relacionamento [...] em paralelo [?] denomina-se união livre (se há intuito de formar familia) ou é mero concubinato (se não há essa intenção) (Curso de Direito Civil: Família e Sucessões. 3. ed. São Paulo: Editora Saraiva. 2010, p. 140).

           Colhe-se excerto da jurisprudência do STJ, que se coaduna com este entendimento:

    Não é devida pensão por morte à concubina em concorrência com a viúva na hipótese em que o falecido, ao tempo do óbito, permanecia casado, pois, ainda que os requisitos configuradores da união estável se apliquem para fins previdenciários, conforme o artigo 16, § 3º, da Lei 8.213/1991, a existência de impedimento para o matrimônio, por parte de um dos companheiros, embaraça a constituição da união estável, o que impede que os efeitos jurídicos que dela irradiam alcancem a concubina. (AgRg no REsp 1267832/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, j. em 13-12-2011, DJe 19-12-2011).

    As situações de concomitância, isto é, em que há simultânea relação matrimonial e de concubinato, por não se amoldarem ao modelo estabelecido pela legislação previdenciária, não são capazes de ensejar união estável, razão pela qual apenas a viúva tem direito à pensão por morte. (REsp 1104316/RS, Rel. Ministra Maria Thereza De Assis Moura, , j. em 28-4-2009, DJe 18-5-2009).

           Diante do exposto, voto no sentido de conhecer e desprover o apelo, mantendo-se incólume a sentença de primeiro grau, por seus próprios fundamentos.

           Este é o voto.


Gabinete Desembargador Júlio César Knoll