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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0003503-24.2017.8.24.0023 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Leopoldo Augusto Brüggemann
Origem: Capital
Orgão Julgador: Terceira Câmara Criminal
Julgado em: Tue Feb 20 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Marcelo Volpato de Souza
Classe: Recurso em Sentido Estrito

 

Recurso Em Sentido Estrito n. 0003503-24.2017.8.24.0023, da Capital

Relator: Desembargador Leopoldo Augusto Brüggemann

   RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME CONTRA A VIDA. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, I E IV, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA DE PRONÚNCIA.

   IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA PELA IMPRONÚNCIA EM RAZÃO DA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS QUANTO À AUTORIA. CABIMENTO. AUTORIA EMBASADA EM DENÚNCIA ANÔNIMA E RECONHECIMENTO INFORMAL, SEQUER DOCUMENTADO NOS AUTOS. POLICIAIS QUE, OUVIDOS EM JUÍZO, LIMITARAM-SE A REPRODUZIR DECLARAÇÕES DITAS PRESTADAS INFORMALMENTE PELA GENITORA DA VÍTIMA DURANTE AS INVESTIGAÇÕES. INFORMANTE, CONTUDO, OUVIDA APENAS NA FASE EMBRIONÁRIA, OPORTUNIDADE EM QUE DISSE DESCONHECER A AUTORIA DELITIVA, ESVAZIANDO, ASSIM, OS INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. AUSÊNCIA DE OUTRAS PROVAS. IMPRONÚNCIA QUE SE IMPÕE.

   RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Em Sentido Estrito n. 0003503-24.2017.8.24.0023, da comarca da Capital (Vara do Tribunal do Júri) em que é Recorrente Leandro da Cunha Rosa e Recorrido o Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

           A Terceira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, para impronunciar o acusado Leandro da Cunha Rosa, com a expedição de alvará de soltura, se por al não estiver preso. Custas legais.

           O julgamento, realizado no dia 20 de fevereiro de 2017, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Rui Fortes, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Ernani Guetten de Almeida. Funcionou pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Fábio Strecker Schmitt.

                 Florianópolis, 20 de fevereiro de 2018.

Desembargador Leopoldo Augusto Brüggemann

Relator

 

RELATÓRIO

           Na comarca Capital, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofereceu denúncia contra Leandro da Cunha Rosa, dando-o como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal, pela prática da conduta assim descrita na inicial acusatória:

    No dia 05 de outubro de 2016, por volta das 22h30min, na Rua da Fonte, Coqueiros, nesta Capital, mediante prévio acordo de vontades, juntamente com outra pessoa não identificada, com vontade de matar, o denunciado desferiu disparos de arma de fogo contra a vítima Gabriel Márcio dos Santos, provocando-lhe os ferimentos descritos no laudo cadavérico incluso, os quais foram a causa eficiente da sua morte. O crime foi praticado por motivo torpe, vez que o denunciado restou movido pelo sentimento de vingança privada, matando a vítima por acreditar que ela tinha molestado uma criança. Por fim, o crime também foi praticado com o uso de recurso que dificultou a defesa da vítima, já que foi dominada e arrastada, por duas pessoas, de dentro de sua casa para a rua, onde foi sumariamente executada (p. 01).

           Concluída a instrução do feito, na forma do art. 413 do Código de Processo Penal, a denúncia foi acolhida para pronunciar o acusado como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, incisos I e V, do Código Penal, bem como para determinar, ipso facto, o seu julgamento perante o Tribunal do Júri. Foi-lhe negado o direito de apelar em liberdade (p. 181-187).

           Irresignada, a defesa interpôs recurso em sentido estrito, no qual pugnou pela despronúncia do recorrente, ante à ausência de indícios suficientes de autoria, com fulcro no art. 414 do Código de Processo Penal (p. 202-211).

           Juntadas as contrarrazões (p. 214-219) e mantida a decisão pelo togado a quo (p. 221), ascenderam os autos a esta instância, e a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Exmo. Sr. Dr. Humberto Francisco Scharf Vieira, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto (p. 227-234).

           Este é o relatório.

 

VOTO

           Trata-se de recurso em sentido estrito contra decisão que admitiu a denúncia e pronunciou Leandro da Cunha Rosa pela possível prática do delito de homicídio duplamente qualificado contra a vítima Gabriel Márcio dos Santos (art. 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal).

           O recurso é de ser conhecido, porquanto presentes os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade.

           A defesa pugnou pela despronúncia do recorrente, em razão de não haver indícios suficientes acerca da autoria delitiva a ele atribuída.

           Com razão o pleito.

           Na hipótese que se apresenta, a impronúncia se impõe.

           Inicialmente, cumpre esclarecer que o processo para julgar os crimes dolosos contra a vida sofreu profunda reforma com o advento da Lei 11.689, de 9 de junho de 2008, que passou a vigorar a partir de 9 de agosto do mesmo ano, dando nova redação a vários dispositivos (art. 406 ao art. 497).

           Neste passo, o texto do antigo art. 408 do Código de Processo Penal sofreu severa modificação, o qual se contentava somente com indícios da autoria para a pronúncia do acusado.

           O novo texto, disposto no art. 413 do Código Processual Penal, exige, agora, a existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, in verbis:

    Art. 413 O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.

    § 1º A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena (grifou-se).

           Logo, caso o juiz não se convença da presença de tais indícios deve impronunciar o acusado (art. 414), o que antes também era estabelecido no art. 409 do CPP. Assim, para tanto, os indícios devem ser suficientes quanto à autoria, caindo por terra os indícios leves, conforme preceituava o revogado art. 408 do CPP.

           Destarte, a pronúncia exige uma probabilidade de autoria através de indícios veementes e não uma simples possibilidade com base em indícios leves, vagos, imprecisos que podem fundamentar uma denúncia ao júri.

           De outro turno, não pode ser deixado de lado, ainda, o atual texto do art. 155 do CPP, com a redação que lhe deu a novel Lei 11.690, de 09 de junho de 2008, que textua:

    O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas (grifou-se).

           Pois bem. No caso em apreço, a materialidade delitiva é incontroversa, porque vem assente pelo boletim de ocorrência de p. 3-4 e, principalmente, no Laudo Pericial Cadavérico de p. 16-30, o qual atestou a ocorrência de morte da vítima Gabriel Márcio dos Santos por traumatismo cranioencefálico, causado por projétil/disparo de arma de fogo.

           Todavia, não há indícios suficientes de autoria a permitir seja o recorrente levado a julgamento perante o Tribunal do Júri.

           Confira-se das provas:

           O acusado, em ambas as oportunidades em que fora interrogado (p. 48 e 158), negou enfaticamente a autoria do ilícito.

           Em juízo, disse não se recordar onde estava no dia dos fatos, mas que não foi ele o autor do crime. Mencionou que residia próximo à vítima e com ela mantinha amizade, não existindo razões que o levassem a ceifar a sua vida. Aduziu não saber quem foi o responsável pelo delito. Relatou acreditar estar sendo acusado por tal fato em razão de a mãe do ofendido não gostar dele tampouco de sua família. Afirmou não ter conhecimento de que a vítima teria molestado uma criança. Por fim, disse que não possui apelido e que, na localidade em que mora, existem outras pessoas chamadas pela alcunha de "Lê" (p. 158).

           A testemunha Enio de Oliveira, Delegado de Polícia, ouvida em juízo (p. 158), apontou a autoria do crime ao acusado, conhecido na localidade pelo apelido de "Lê", em razão do reconhecimento realizado informalmente pela genitora da vítima, tão logo ocorrera o crime, e também em decorrência de delação realizada por meio de denúncia anônima. Relatou que Egidia Maria Reis contou que estava em sua residência quando dois rapazes invadiram sua casa e retiraram o filho Gabriel da cama, conduzindo-o até a rua. Egidia mencionou que permaneceu dentro da residência e apenas escutou os tiros. Ainda, contou Enio que ela disse que embora os agentes estivessem encapuzados, pôde reconhecer um deles como sendo o "Lê", sujeito por ela já conhecido das redondezas. Por derradeiro, declarou que em diligências realizadas apuraram que o crime teria sido motivado por vingança, tendo em vista que a vítima teria supostamente molestado uma criança.

           No mesmo caminho foram os depoimentos judiciais prestados pelos Policiais Márcio João de Souza e Felipe Cavalheiro Rodrigues (p. 158).

           Márcio declarou que, ainda na noite dos fatos, a mãe da vítima confirmou ter sido o "Leonardo" um dos responsáveis pelo homicídio de seu filho, todavia disse que ela não quis formalizar as declarações por temer por sua vida, em razão de já conhecer os agressores da localidade. Contou que Egidia relatou que os agentes invadiram sua residência, com o rosto coberto por um moletom de capuz. Ainda, disse que apuraram que o delito teria ocorrido porque a vítima teria molestado uma criança a qual possuía parentesco com os agressores. Por fim, aduziu que também foram recebidas denúncias anônimas dando conta da autoria do crime. 

           Felipe, por sua vez, também relatou que a genitora do ofendido mencionara que um dos autores do crime teria sido Leandro (pessoa por ela já conhecida), todavia não quis ela formalizar tal declaração por medo. Ainda, disse que Egidia reconheceu o acusado por fotografias, procedimento que fora realizado informalmente, e também pela voz. Afirmou que o crime teria ocorrido por represália em razão de a vítima ter molestado uma criança.

           Com efeito, como se vê, a autoria apontada ao acusado pelos agentes públicos está consubstanciada essencialmente na fala da genitora da vítima, Egidia Maria Reis. No entanto, Egidia, ouvida apenas perante à Autoridade Policial, assim declarou:

    QUE, a depoente é mãe da vítima Gabriel Márcio dos Santos; Que, Gabriel residia na companhia da depoente no endereço acima mencionado; QUE no dia 05 de Outubro de 2016, por volta das 22:15hs, Gabriel estava em casa, deitado no quarto que fica na parte superior de sua casa; QUE, em certo momento, quando a depoente estava nos fundos da casa lavando o quintal, chamaram Gabriel na frente do portão da casa; Que, eram dois indivíduos, com balaclava e com moleton de capuz na cabeça, um se recorda que estava trajando moleton preto e outro não se recorda; Que, um deles era alto e outro de estatura baixa; Que, os dois estavam de calça jeans; QUE, a depoente perguntou aqueles dois indivíduos quem eles eram, e eles falaram que queriam falar com Gabriel; Que, imediatamente, a depoente subiu e foi avisar Gabriel da chegada daqueles dois indivíduos; QUE, Gabriel assustado só falava, "eu não fiz nada para eles, eu não vou fugir"; Que, o portão da casa estava cadeado e não sabe a depoente como eles abriram e entraram lá; Que, um daqueles dois indivíduos ainda falaram para Gabriel "ah, tu gosta de molestar criancinhas"; Que, Gabriel ainda disse que não tinha feito nada, que era da igreja; Que, ainda, mandaram a depoente calar a boca, senão iriam fazer alguma coisa com ela; Que, empurraram ele até lá embaixo e a depoente ficou na parte de cima, gritando e pedindo ajuda/socorro; Que, depois disso, só escutou vários disparos de arma de fogo vindo da rua e não saiu mais de casa; Que, depois ainda chegou uma pessoa da vizinhança, avisando que tinham matado Gabriel; Que, depois ainda chegou uma pessoa da vizinhança, avisando que tinham matado Gabriel; Que, chegaram vizinhos e não deixaram mais a depoente sair de casa; Que, ainda soube, que uma vizinha foi procurar Gabriel e não acharam ele por ali; Que, soube por um policial, que Gabriel estava morto "lá atrás", no pátio Kovanca; Que, não chegou a ver seu filho Gabriel alvejado; Que, a depoente afirma que Gabriel não era usuário de drogas e nunca teve nenhum rolo com as pessoas ali do bairro; Que, não sabe quem possa ser aqueles dois indivíduos que mataram seu filho e não sabe a motivação do delito; [...] Que, a depoente afirma conhecer a pessoa de Jordan, filho da Jaque, ali do bairro, como também a pessoa de apelido "Lê"; Que, ambos não eram amigos de Gabriel, mas Gabriel cumprimentava Jordan de vez em quando; Que, Gabriel nunca andou junto com esses dois (p. 45-46 - grifou-se).

           Ora, embora tenha Egidia relatado com detalhes o crime ocorrido, disse ela desconhecer os seus autores, tal como a motivação do delito.

           Ainda, é de se reforçar que apenas fora ela ouvida na fase investigativa.

           No mais, quanto à suposta autoria, apenas há o registro de denúncia anônima, realizada por meio do "disque denúncia - 181" (p. 35 e 36).

           Com efeito, embora não se duvide da veracidade da fala dos agentes públicos, o fato é que os seus depoimentos, imputando a autoria do ilícito ao acusado, estão embasados exclusivamente nas declarações informalmente prestadas pela genitora da vítima, esta que, no entanto, nada declarou a respeito.

           Como visto, referida testemunha ocular do crime, ouvida apenas na fase investigativa, disse que "não sabe quem possa ser aqueles dois indivíduos que mataram o seu filho e não sabe a motivação do delito" (p. 46).

           Logo, a citada autoria delitiva apontada pelos policiais por reprodução à fala informal de testemunha, não foi por esta confirmada na fase judicial, tampouco durante as investigações policiais ratificou a fala destes. Muito pelo contrário, ouvida na fase policial disse desconhecer a autoria delitiva, já em juízo sequer compareceu para prestar esclarecimentos.

           Ainda, sabe-se que a denúncia anônima, quando isolada, sequer é apta a deflagrar a ação penal. Por consequência, não pode servir ela para fundamentar a existência de indícios suficientes de autoria, a fim de remeter o acusado a julgamento perante o Tribunal do Júri.

           Sobre o tema, colhe-se do Superior Tribunal de Justiça:

    RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. QUADRILHA. DENÚNCIAS ANÔNIMAS IMPUTANDO A PRÁTICA DE ILÍCITOS. REALIZAÇÃO DE DILIGÊNCIAS PRELIMINARES PARA A APURAÇÃO DA VERACIDADE DAS INFORMAÇÕES. CONSTRANGIMENTO INEXISTENTE.

    Esta Corte Superior de Justiça e o Supremo Tribunal Federal firmaram o entendimento de que a notícia anônima sobre eventual prática criminosa, por si só, não é idônea para a instauração de inquérito policial ou deflagração da ação penal, prestando-se, contudo, a embasar procedimentos investigativos preliminares em busca de indícios que corroborem as informações, os quais tornam legítima a persecução criminal estatal. Precedentes [...] (RHC 53.541/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 12/09/2017 - grifou-se).

           E desta Corte, mutatis mutandis:

    APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33 c/c ART. 40, INCISO VI, AMBOS DA LEI 11343/06] . SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PLEITO DE CONDENAÇÃO SOB O FUNDAMENTO DE SUFICIÊNCIA DE PROVAS. NÃO ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO SUFICIENTE DA AUTORIA DO DELITO. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO COM BASE APENAS EM DENÚNCIA ANÔNIMA. ELEMENTOS DE INFORMAÇÃO. PROVA QUE NÃO FOI DEVIDAMENTE CORROBORADA EM JUÍZO. EXEGESE DO ART. 155, DO CPP. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (Apelação Criminal n. 0034480-67.2015.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, j. 16/11/2017 - grifou-se).

           Ainda:

    [...] 1. A denúncia anônima não viola o preceito instituído no art. 5º, inc. LXIV, da Carta Magna se constitui apenas o fio condutor da descoberta dos crimes, necessitando, por óbvio, de empenho policial para verificar a credibilidade dos informes a fim de constatar se a particularidade noticiada, de fato, procede, situação configurada na hipótese dos autos. [...] (Apelação Criminal n. 0000571-82.2015.8.24.0007, de Biguaçu, rel. Des. Sérgio Rizelo, j. 18/07/2017).

           Convém anotar que "O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas" (art. 155, caput, do CPP) (grifou-se).

           A prova produzida na fase investigativa somente poderá fundamentar a pronúncia quando corroborada por outra produzida na fase judicial, sob o crivo do contraditório, o que efetivamente não ocorreu.

           Como referido, a pronúncia exige probabilidade da autoria através de indícios veementes e não uma simples possibilidade com base em indícios leves, vagos, imprecisos que podem fundamentar uma denúncia ao júri.

           Desta feita, ante a ausência do mínimo lastro probatório quanto à autoria do delito, não é a resposta estatal adequada remeter a matéria ao Conselho de Sentença, concessa venia, já que, para a sentença de pronúncia deve haver "existência de indícios suficientes de autoria ou de participação" (art. 413 do CPP).

           Não havendo indícios suficientes quanto à autoria do crime, a sentença de pronúncia representa verdadeira coação ilegal, porquanto ausente justa causa para a ação penal, devendo, portanto, ser cassada, a fim de que o recorrente seja impronunciado. Ora, se apenas informes colhidos na fase administrativa não têm o condão de calçar a pronúncia, pior quando sequer existem, já que o "ouvi dizer" dos policias não é suficiente para tanto. 

           Mutatis mutandis, já decidiu esta Corte:

    RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TRIBUNAL DO JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, §2º, IV, DO CÓDIGO PENAL). DECISÃO DE PRONÚNCIA. RECURSO DE UM DOS RÉUS. [...] MÉRITO. PEDIDO DE IMPRONÚNCIA, DIANTE DA AUSÊNCIA DE PROVA DA AUTORIA. VIABILIDADE. ELEMENTO INFORMATIVO COLHIDO NA FASE INDICIÁRIA QUE, POR SI SÓ, É INSUFICIENTE PARA DETERMINAR A RESPONSABILIDADE PENAL DO RECORRENTE PELO CRIME DESCRITO NA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE PROVAS PRODUZIDAS SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO. OBSERVÂNCIA AO DISPOSTO NO ART. 155 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ADEMAIS, NEGATIVA DE AUTORIA CORROBORADA PELOS DEPOIMENTOS, UNÍSSONOS E COERENTES, DE TESTEMUNHA, DE TRÊS INFORMANTES E DO CORRÉU. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DA AUTORIA OU DA PARTICIPAÇÃO DO RECORRENTE NA PRATICA DELITIVA. EXEGESE DO ART. 414 DO CPP. IMPRONÚNCIA QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO (Recurso em Sentido Estrito n. 0002629-32.2016.8.24.0069, de Sombrio, rel. Des. Volnei Celso Tomazini, Segunda Câmara Criminal, j. 30/05/2017 - grifou-se).

    RECURSO CRIMINAL. TRIBUNAL DO JÚRI. CRIME CONTRA A VIDA. AGENTE PRONUNCIADO PELA SUPOSTA PRÁTICA DO CRIME DE TENTATIVA DE HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO POR MOTIVO TORPE E MEDIANTE RECURSO QUE IMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA (ART. 121, § 2º, I E IV, C/C O ART. 14, II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). RECURSO DEFENSIVO. IMPRONÚNCIA. ACOLHIMENTO. MATERIALIDADE DO DELITO DEVIDAMENTE DEMONSTRADA. AUSÊNCIA, TODAVIA, DE INDÍCIOS SUFICIENTES DA AUTORIA DELITIVA OU, AO MENOS, DA PARTICIPAÇÃO DO RECORRENTE NA TENTATIVA DE HOMICÍDIO PRATICADA. BRIGA GENERALIZADA QUE RESULTOU EM UM DISPARO DE ARMA DE FOGO CONTRA A VÍTIMA. DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS QUE NÃO DEMONSTRAM O NECESSÁRIO LIAME ENTRE O ACUSADO E O CRIME QUE LHE FOI IMPUTADO. ETAPA PROCESSUAL QUE, EMBORA DISPENSE A ANÁLISE APROFUNDADA DE PROVAS, EXIGE A EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA PARA QUE O AGENTE SEJA SUBMETIDO A JULGAMENTO PERANTE O TRIBUNAL DO JÚRI. MANUTENÇÃO DA DECISÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO (Recurso Criminal n. 2014.057545-2, de Joinville, rel. Des. Marli Mosimann Vargas, Primeira Câmara Criminal, j. 25/08/2015 - grifou-se).

    RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - HOMICÍDIO QUALIFICADO (CP, ART. 121, § 2º, IV) - PRONÚNCIA - MATERIALIDADE INCONTESTE - AUSÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA - VÍTIMA ENCONTRADA AINDA VIVA DIZENDO QUE NÃO RECONHECEU O ATIRADOR - POSTERIOR RETRATAÇÃO APONTANDO O ACUSADO COMO SEU ALGOZ - OFENDIDO COM DIVERSOS DESAFETOS - ÁLIBI COMPROVADO - CIRCUNSTÂNCIAS QUE ENFRAQUECEM A TESE ACUSATÓRIA - INDÍCIOS INSUFICIENTES PARA MANUTENÇÃO DA DECISÃO - IMPRONÚNCIA DECRETADA - RECURSO PROVIDO. Muito embora seja a sentença de pronúncia de índole precária e provisória, é indispensável a demonstração de indícios suficientes de autoria, não bastanto meras suposições para que o acusado seja submetido a julgamento pelo Conselho de Sentença (Recurso Criminal n. 2014.070561-5, de Ipumirim, rel. Des. Salete Silva Sommariva, Segunda Câmara Criminal, j. 02/12/2014 - grifou-se).

           Convindo citar precedente desta relatoria:

    RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME CONTRA A VIDA. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, I E IV, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA DE PRONÚNCIA. IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA PELA IMPRONÚNCIA EM RAZÃO DA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS QUANTO À AUTORIA. FALA EXTRAJUDICIAL DO CODENUNCIADO NÃO CONFIRMADA EM JUÍZO E QUE NÃO ENCONTRA QUALQUER RESPALDO EM PROVA JUDICIALIZADA. ÚNICA TESTEMUNHA PRESENCIAL QUE REFLUI EM JUÍZO. INEXISTÊNCIA DE PROVA PRODUZIDA SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. IMPRONÚNCIA QUE SE IMPÕE. PEDIDOS SUCESSIVOS PREJUDICADOS. QUANTO AO CORRÉU NÃO RECORRENTE, PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL QUE SE SOBREPÕE, IN CASU, À SOBERANIA DOS VEREDICTOS. FLAGRANTE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO PARA CASSAR A SENTENÇA DE PRONÚNCIA, COM A IMPRONÚNCIA DO ACUSADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO (Recurso Criminal n. 2014.044870-8, da Capital, j. 16/09/2014 - grifou-se).

           Ressalte-se que se está a julgar improcedente a denúncia, e não a pretensão punitiva do Estado. Sobrevindo novas provas, outra denúncia pode ser formulada, ex vi do art. 414, em seu parágrafo único, do CPP.

           Em decorrência, vota-se pelo conhecimento e provimento do recurso interposto por Leandro da Cunha Rosa, para impronunciá-lo, com a concessão de alvará de soltura, se por al não estiver preso.

           A comarca de origem deverá promover a comunicação à família da vítima, em observância ao art. 201, § 2º, do Código de Processo Penal.

           É o voto.


Gabinete Desembargador Leopoldo Augusto Brüggemann