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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 4000775-74.2018.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Júlio César M. Ferreira de Melo
Origem: Itajaí
Orgão Julgador: Primeira Câmara Criminal
Julgado em: Thu Feb 22 00:00:00 GMT-03:00 2018
Juiz Prolator: Não informado
Classe: Habeas Corpus (Criminal)

 


 


Habeas Corpus (criminal) n. 4000775-74.2018.8.24.0000, de Itajaí

Relator: Desembargador Júlio César M. Ferreira de Melo

   HABEAS CORPUS. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. PACIENTE DENUNCIADO PELA PRÁTICA EM TESE DOS CRIMES DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES (ART. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/2006). CONCRETA GRAVIDADE DA CONDUTA. PREENCHIDOS OS PRESSUPOSTOS DO ARTIGO 312 DO CPP. PROVA DA MATERIALIDADE E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. NECESSIDADE DA SEGREGAÇÃO PARA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA E RISCO DE REITERAÇÃO DELITIVA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ORDEM DENEGADA.

   I - As decisões que decretaram a restrição de liberdade do paciente encontram-se amparadas em fundamentação jurídica legítima, lastreadas em elementos concretos depreendidos dos autos acerca das circunstâncias do caso, os quais revelaram a necessidade de se resguardar a ordem pública, haja vista a gravidade da conduta imputada e o elevado risco de reiteração delitiva.

   II - Na hipótese, o risco à sociedade é corretamente depreendido da gravidade concreta da conduta imputada, considerando a apreensão de elevada quantidade de entorpecentes, além das circunstâncias em que ocorreu a prisão em flagrante, contexto que revela a gravidade concreta da conduta imputada.

   III - Para fins de formação do juízo cautelar relativo aos pressupostos da decretação da preventiva, é evidente a desnecessidade de prova cabal da culpa, haja vista a previsão legal clara acerca da necessidade de se verificar a "prova da existência do crime e indício suficiente de autoria", devendo este último ser entendido como indicação, começo de prova ou prova incompleta. Evidente, portanto, a ausência de violação ao princípio da presunção de inocência quando o decreto de prisão cautelar se encontra bem fundamentado à luz do que estabelece o art. 312 do CPP.

   IV - A presença de circunstâncias pessoais favoráveis, tais como primariedade, ocupação lícita e residência fixa, não tem o condão de garantir a revogação da prisão se há nos autos elementos aptos a justificar a imposição da segregação cautelar, como no caso.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus (criminal) n. 4000775-74.2018.8.24.0000, da comarca de Itajaí 1ª Vara Criminal em que é Impetrante Raphael Ruggeri Artner e Paciente Lucas Medina Langner.

           A Primeira Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, denegar a ordem.

           Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Paulo Roberto Sartorato e Des. Carlos Alberto Civinski.

           Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Raul Schaefer Filho.

           Florianópolis, 22 de fevereiro de 2018.

Desembargador Júlio César M. Ferreira de Melo

Relator

 

           RELATÓRIO

           Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de Lucas Medina Langner, contra ato do MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Itajaí que, nos autos n. 0000167-45.2018.8.24.0033, converteu a prisão em flagrante do paciente em preventiva.

           Alega o impetrante, em síntese, que: a) o paciente sofre constrangimento ilegal à sua liberdade dada a ausência de fundamentação idônea a embasar a decretação da prisão cautelar; b) não estão presentes os pressupostos do art. 312 do Código de Processo Penal; c) o paciente ostenta condições pessoais favoráveis, que corroboram a conclusão no sentido da desnecessidade da custódia; d) é cabível a aplicação de outras medidas cautelares diversas da prisão.

           Requer, com base em tais alegações, o deferimento do pedido liminar e, no mérito, a concessão da ordem em definitivo para que seja revogada a prisão preventiva ou, subsidiariamente, sejam aplicadas medidas cautelares diversas da prisão.

           Indeferido o pedido liminar (fls. 18-20), foram apresentadas informações pela autoridade apontada como coatora (fl. 22).

           Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Lio Marcos Marin, que opinou pela denegação da ordem (fls. 25-29).

           Este é o relatório.

 

           VOTO

           O habeas corpus merece ser conhecido.

           Cumpre relembrar que o habeas corpus constitui ação autônoma de impugnação, de natureza constitucional, destinada ao especial fim de tutela da liberdade do indivíduo, quando este direito subjetivo esteja sofrendo violência ou coação decorrente de ilegalidade ou abuso de poder (art. 5º, LXVIII, CF e art. 647, CPP).

           Tendo em conta a natureza excepcional dessa ação constitucional, assim como suas inerentes características de simplicidade e sumariedade, o habeas corpus apresenta limites cognitivos estreitos, que inviabilizam a dilação probatória e tornam indispensável a demonstração de plano do alegado constrangimento ilegal à liberdade de locomoção do paciente.

           Como relatado, por meio do presente writ, busca-se a revogação da prisão cautelar do paciente Lucas Medina Langner. Passo ao exame da legalidade dos atos judiciais que determinaram a restrição ao ius libertatis deste.

           No caso concreto, depreende-se dos autos que o paciente foi preso em flagrante em 10-1-2018 pela suposta prática do crime previsto no art. 33 da Lei n. 11.343/2006.

           No dia seguinte, na audiência de custódia, o Juízo a quo homologou o flagrante e converteu a prisão em preventiva (fls. 34-35 dos autos originais):

    Ante o exposto, CONVERTO a prisão em flagrante de LUCAS MEDINA MANGNER em prisão preventiva, forte nos arts. 310, II, 312 e 313 do CPP. Em consonância com o disposto no parágrafo único do art. 285 do CPP, expeça-se mandado de prisão imediatamente, que deverá ser registrado no respectivo banco de dados do CNJ (art. 289-A, CPP). Já em relação ao conduzido Johnny Schiavinatto Mendes, entendo que não se fazem presentes os requisitos da prisão preventiva. Isso porque, em que pese as circunstâncias do seu flagrante sugerirem a participação na empreitada criminosa (foi pilhado na companhia do outro conduzido, o qual estava em posse de drogas), o conduzido Lucas assumiu a propriedade da droga apreendida. Além do mais, Jhonny afirmou que desconhecia que Lucas possuía drogas. Nessas condições, em que pese ser possível a sua participação do crime, não existe, por ora, inequivocidade sobre isso, e os fatos demandam aprofundamento cognitivo durante a instrução processual, notadamente quanto à demonstração de que Johnny praticava a traficância, o que, por ora, na fase investigativa, restou fragilizado. Como dito, há indícios da existência da prática delitiva, os quais, à primeira vista, autorizam a deflagração de possível Ação Penal, mas não são o bastante, neste momento, para a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva. Assim, sem maiores delongas, CONCEDO liberdade provisória ao conduzido Jhonny Schiavinatto Mendes mediante o cumprimento das seguintes medidas cautelares: I) Comparecimento trimestral em Juízo para justificar as suas atividades; II) Proibição de ausentar-se da Comarca por mais de 8 (oito) dias sem autorização judicial. Expeça-se o competente alvará de soltura, se por al não estiver preso. Certifiquem-se os antecedentes criminais dos conduzidos junto ao TJPR. Oportunamente, dê-se vista ao Ministério Público."

           Após o encerramento da fase inquisitorial, o paciente, juntamente com outro indivíduo, foi denunciado pela prática, em tese, do crime descrito no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06 c/c art. 29, caput, do Código Penal. Segundo constou na denúncia, em apertada síntese, na data de 10-1-2018, num posto de combustíveis da Comarca de Itajaí, o paciente, em união de esforços e desígnios com outro indivíduo, foi abordado pelos meliantes trazendo consigo 3 (três) porções individualmente embaladas da substância conhecida como haxixe, totalizando 255g, para fiz de comercialização, fornecimento e distribuição, além de 2 aparelhos de celular e 1 motocicleta que era conduzida pelo outro denunciado.

           Na sequência, o Juízo da origem examinou pedido de revogação da prisão cautelar, apresentado pela defesa técnica do paciente (fl. 132 dos autos originais):

  O pedido de revogação da prisão preventiva do denunciado Lucas Medina Langner não merece prosperar, uma vez que: a) ao menos nesta fase de cognição sumária não exauriente, não há indicativos de que a confissão foi obtida mediante coação; b) existem elementos suficientes de autoria, notadamente a narrativa dos policiais militares Rafael Vicente Marcondes e Marcelo Mussi de Lara, as quais somente são desconstituídas mediante prova robusta em sentido oposto, o que até então não se tem nos autos; e c) a existência de bons predicados não obsta a segregação cautelar quando satisfeitos os respectivos requisitos.

  Percebe-se que a prisão preventiva do denunciado foi regularmente decretada como garantia da ordem pública, em razão da quantidade e natureza do entorpecente apreendido (255 gramas de haxixe). Estes fundamentos já foram levados à apreciação do TJSC (habeas corpus n. 4000775-74.2018.8.24.0000), o qual, apesar de ainda não ter sido julgado, teve a liminar indeferida. Portanto, permanecem hígidos, até então, os fundamentos que ensejaram a prisão preventiva do réu.

           Da análise do caso, verifico que, ao contrário do alegado na peça de impetração deste writ, não há ilegalidade nas decisões supra mencionadas e tampouco constrangimento ilegal à liberdade do paciente.

           As decisões que determinaram a segregação cautelar do paciente apresentam fundamentação jurídica legítima, lastreada em elementos concretos depreendidos dos autos acerca das circunstâncias do caso, os quais revelaram a necessidade de se resguardar a ordem pública, haja vista a gravidade da conduta imputada e o risco de reiteração delitiva.

           Há prova da existência do crime, além de indícios suficientes de autoria por parte do paciente, tendo em conta os elementos informativos colhidos durante a fase inquisitorial, conforme se verifica no boletim de ocorrência (fls. 3-4 dos autos originais), termo de apreensão (fl. 8), do laudo pericial (fls. 136-138) e depoimentos dos Policiais Militares que fizeram o flagrante. Evidente, portanto, a presença do fumus comissi delicti com relação ao paciente.

           Como bem destacou o Ministro Teori Zavascki, "o art. 312 do Código de Processo Penal, ao mencionar o indício suficiente de autoria como requisito para decretação da prisão preventiva, não exige prova cabal da culpa, até porque isso seria incompatível com o juízo meramente cautelar" (RHC 117772, Segunda Turma, julgado em 26/11/2013).

           Sobre o tema, explanou brilhantemente o Ministro Sepúlveda Pertence:

  Prisão preventiva: "indício de autoria": inteligência. 

  O habeas corpus contra a prisão preventiva não comporta em linha de princípio, sopesamento do valor probante de elementos informativos contrapostos, mas a verificação da existência, contra o réu ou o indiciado, de "indício de autoria", locução na qual "indício" não tem o sentido específico de prova indireta - e eventualmente conclusivo - que lhe dá a lei (C.Pr.Pen., art. 239), mas, sim, apenas, o de indicação, começo de prova ou prova incompleta: existente um indício, só a contraprova inequívoca ou a própria e gritante inidoneidade dele podem elidir a legitimidade da prisão preventiva que nele se funda. [...] (RHC 83179, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 01/07/2003, DJ 22-08-2003 PP-00022 EMENT VOL-02120-35 PP-07299)

           Dito isso, torna-se evidente a ausência de violação ao princípio da presunção de inocência quando o decreto de prisão cautelar encontra-se bem fundamentado à luz do que estabelece o art. 312 do Código de Processo Penal.

           No que tange ao periculum libertatis, o risco à sociedade se depreende da gravidade concreta das condutas de tráfico de drogas, merecendo destaque a elevada quantidade de droga apreendida na ocasião (255g da substância vulgarmente conhecida como haxixe).

           O tráfico ilícito de entorpecentes é delito equiparado a hediondo, que gera relevante perturbação na sociedade ao disseminar infelicidade nos lares e fomentar a prática de outros delitos, o que caracteriza severo prejuízo à ordem pública.

           Ademais, corroboro o bem lançado parecer ministerial (fl. 26):

    [...] Portanto, diante das provas já produzidas, verifica-se a prática do crime de tráfico de drogas, que é conduta típica e antijurídica e que contou com o envolvimento do paciente, agente culpável, restando presentes os elementos que definem o conceito analítico da infração penal. Além disso, a quantidade da substância entorpecente apreendida é alta e com possibilidade de compartilhamento a um número expressivo de usuários, demonstrando, assim, a potencial lesividade da conduta perpetrada pelo agente.

    A corroborar com tal assertiva tem-se que as circunstâncias da prisão em flagrante também apontam no sentido de que a prisão cautelar é a medida mais acertada no caso em análise. Isso porque, conforme se infere dos documentos trazidos aos autos, especialmente da quantidade do entorpecente e das circunstâncias da prisão em flagrante, o paciente possuía no tráfico de drogas o seu meio de subsistência e, se posto em liberdade, poderá voltar a praticá-lo, colocando em risco, assim, a ordem pública.

    [...]

    Ademais, de se registrar que o paciente confessou à Autoridade Policial que a droga apreendida era a última porção que tinha, pois promoveu a venda do restante do entorpecente adquirido, o que, por si só, denota o risco concreto da reiteração delitiva.

    Aliás, importante destacar que a atuação da Polícia Militar decorreu de informações prestadas de forma anônima à Agência de Inteligência, no sentido de que naquele local haveria uma transação ilegal envolvendo entorpecentes, denotando que os munícipes de Itajaí não mais suportam conviver com o tráfico de drogas, o qual, sabe-se, é o maior causador dos males da sociedade contemporânea.

    Além disso, é sabido que a gravidade do crime e o clamor social são motivos capazes de ensejar a decretação da prisão preventiva, mormente quando aliados a outros fatores que indicam a necessidade da medida exatamente como ocorre no caso em apreço, onde as circunstâncias do caso em comento se mostram totalmente desfavoráveis ao paciente.

    Gize-se que o comércio de substâncias ilícitas é um dos males da atualidade, sendo o maior dos impulsores da criminalidade, motivo pelo qual deve ser combatido da forma mais enérgica possível. Assim, a liberação do paciente ou a aplicação de medida cautelar diversa da prisão não desencorajará o cometimento desse tipo de delito, criando na sociedade a sensação de insegurança e injustiça, não inibindo a criminalidade.

    Sabe-se que para a decretação e manutenção da prisão cautelar é suficiente um juízo de risco exatamente como no caso em análise e não de certeza; se fosse o caso de esperar que efetivamente ocorresse o dano social e jurídico que a lei permite obstar, não haveria razão para existência da medida preventiva [...].

           Por fim, oportuno salientar que o fato de o paciente ostentar predicados favoráveis não é suficiente para que possa responder em liberdade. Nesse ponto, importante recordar que é pacífica a jurisprudência das Cortes Superiores no sentido de que "a presença de circunstâncias pessoais favoráveis, tais como primariedade, ocupação lícita e residência fixa, não tem o condão de garantir a revogação da prisão se há nos autos elementos hábeis a justificar a imposição da segregação cautelar, como na hipótese" (HC 390.228/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 22/08/2017, DJe 29/08/2017).

           Ante todo o exposto, entendo que a restrição de liberdade do paciente é legítima.

           Diante disso, voto no sentido de denegar a ordem. Este é o voto.


Gabinete Desembargador Júlio César M. Ferreira de Melo