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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 4001125-33.2016.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Marcus Tulio Sartorato
Origem: Laguna
Orgão Julgador: Órgão Especial
Julgado em: Mon Nov 20 00:00:00 GMT-03:00 2017
Juiz Prolator: Não informado
Classe: Direta de Inconstitucionalidade

 


 


Direta de Inconstitucionalidade n. 4001125-33.2016.8.24.0000

Relator: Desembargador Marcus Tulio Sartorato

   AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. EMENDA À LEI ORGÂNICA MUNICIPAL. REAJUSTE DE TARIFA DE TRANSPORTE COLETIVO CONDICIONADO À PRÉVIA REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA PÚBLICA. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA INDEPENDÊNCIA E HARMONIA DOS PODERES. ARTIGOS 32 E 50, § 2°, INCISO III, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

   1. Compete privativamente ao Chefe do Poder Executivo a edição de norma que implique em alteração na política tarifária.

   2. Condicionar o reajuste de tarifa de transporte coletivo à prévia realização de audiência pública viola o princípio da independência e harmonia dos Poderes, consagrado no artigo 32 da Constituição Estadual.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Direta de Inconstitucionalidade n. 4001125-33.2016.8.24.0000, da comarca de Laguna 1ª Vara em que é Requerente Prefeito do Município de Laguna e Requerido Câmara de Vereadores do Município de Laguna.

           O Órgão Especial decidiu, por unanimidade, julgar procedente o pedido. Custas legais.

                 Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Des. Cesar Abreu, Des. Ricardo Fontes, Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, Des. Jaime Ramos, Des. Alexandre d´Ivanenko, Des. Jorge Schaefer Martins, Des. Sérgio Izidoro Heil, Des. Jânio Machado, Des. Raulino Jacó Brüning, Des. Ronei Danielli, Des. Ricardo Roesler, Des. Rodrigo Collaço, Des. Pedro Manoel Abreu, Des. Newton Trisotto, Des. Luiz Cézar Medeiros, Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, Des. Fernando Carioni, Des. Torres Marques e Des. Rui Fortes.

           Presidiu a sessão o Exmo. Sr. Des. Torres Marques.

           Florianópolis, 20 de novembro de 2017.

Desembargador Marcus Tulio Sartorato

Relator

 

RELATÓRIO

           O Prefeito do Município de Laguna, com base no artigo 85, inciso VII, da Constituição Estadual, ajuizou ação direta de inconstitucionalidade em face dos §§ 1º, 2º e 3º do art. 125 da Lei Orgânica Municipal, introduzidos pela Emenda n.º 18/2013, promulgada pela Câmara Legislativa e que determina a realização de audiências públicas antes do ato administrativo que estabeleça reajuste de tarifa de transporte público coletivo urbano.

           Salientou o requerente que a norma impugnada reveste-se de inconstitucionalidade, uma vez que trata de matéria cuja iniciativa legislativa é privativa do Poder Executivo.

           Por conta disso, requereu a concessão de medida cautelar a fim de suspender os efeitos da legislação atacada e, ao final, a declaração de inconstitucionalidade das normas invocadas.

           Adotado o rito previsto no art. 12 da Lei Estadual nº 12.069/01 (fl. 65), o Presidente da Casa Legislativa Municipal manifestou-se pela improcedência do pedido inicial (fls. 68/75).

           Conquanto intimado, o Procurador-Geral do Município deixou transcorrer in albis o prazo concedido (certidão de fl. 103).

           A Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Ilustre Procurador Durval da Silva Amorim, manifestou-se pela procedência do pedido (fls. 107/115).

 

VOTO

           1. Insta assinalar, de início, que "não é necessária a nomeação de curador especial para a defesa do texto combatido na ação direta quando a autoridade que detém a atribuição constitucional deixa de fazê-lo" (STF, voto do Exmo. Sr. Ministro Cezar Peluso sobre questão de ordem no julgamento da ADI n. 3.916/DF, Rel. Min. Eros Grau, DJe de 13-5-2010).

           Assim, a ausência de manifestação por parte do Procurador-Geral do Município, não impede o julgamento do feito, porquanto "em sede de ação direta de inconstitucionalidade, de cunho eminentemente objetivo, nulidade não emerge em virtude da ausência de defesa da lei acoimada de vício" (TJSC, Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2014.088252-2, da Capital, rel. Des. Ricardo Fontes, j. 02-09-2015).

           2. A tese exordial firma-se na violação ao princípio constitucional da independência dos poderes, haja vista que o ato de legislar sobre projetos que impliquem em alteração na política tarifária compete, exclusivamente, ao Poder Executivo.

           Com efeito, o artigo 111 da Constituição Estadual dispõe que os Municípios regem-se por Leis Orgânicas, aprovadas por sua Câmara de Vereadores, atendidos os princípios estabelecidos nas Constituições Federal e Estadual.

           Por sua vez, prescreve o artigo 61, § 1º, inciso II , alinea "b", da Carta Magna:

    Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

    § 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República, as lei que:

    (...)

    II - disponham sobre:

    [...]

    b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração e seus territórios."

           Já a Carta Estadual, em seu art. 50, § 2º, incisos III e VI, repete a norma acima transcrita:

    Art. 50. São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que disponham sobre:

    [...]

    III - plano plurianual, diretrizes orçamentárias e orçamento anual;

    [...].

           O artigo 68, inciso VIII, da Lei Orgânica do Município de Laguna estabelece:

    Art. 68. Compete privativamente ao Prefeito, além de outras atribuições previstas nesta Lei Orgânica:

    [...]

    VIII - propor à Câmara Municipal projetos de lei relativos ao plano plurianual, diretrizes orçamentárias, orçamento anual, dívida pública e operações de crédito;

    [...]

     

           Conforme se depreende dos mencionados dispositivos, a edição de atos normativos relacionados com matéria orçamentária são de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo.

           O art. 125 da Lei Orgânica Municipal, com a redação dada pela emenda nº 11/2009 determina que "as tarifas dos serviços públicos de transporte são de competência exclusiva do Poder Executivo Municipal".

           Não obstante o estabelecido no caput do artigo, a emenda à Lei Orgânica nº 18/2013 acrescentou ao dispositivo os seguintes parágrafos:

    §1º - Fica obrigada a realização de audiência pública antes do ato administrativo que estabeleça reajuste de tarifa de transporte público coletivo urbano no município de Laguna.

    § 2° - O Poder Executivo deverá, com antecedência de 30 dias, solicitar ao Poder Legislativo Municipal para que convoque Audiência Pública para apresentar a planilha de cálculo tarifário adotada para reajuste de tarifa de transporte público no âmbito do Município, sob pena de caracterização de vício formal do ato administrativo.

    § 3° - Para a realização da audiência pública deverão ser convidados a participar.

    I - O Poder Executivo através da Secretaria de Finanças e Procuradoria Geral do Município;

    II - Representantes das Associações de moradores dos respectivos bairros, e representantes dos grupos organizados do município de Laguna;

    III As empresas de transportes públicos coletivos que prestam serviços no município;

    IV - representantes dos Estudantes (secundaristas e universitários);

    V - representantes da classe Trabalhadora através de suas entidades; e

    VI - O Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

           Condicionou-se, portanto, o reajuste de tarifas à prévia realização de audiência pública, "sob pena de caracterização de vício formal do ato administrativo".

           Como bem leciona o mestre Hely Lopes Meirelles:

    Leis de iniciativa exclusiva do prefeito são aquelas em que só a ele cabe o envio do projeto à Câmara. Nesta categoria estão as que disponham sobre matéria financeira; criem cargos, funções ou empregos; fixem ou aumentem vencimentos ou vantagens dos servidores, ou disponham sobre o regime funcional; criem ou aumentem despesas, ou reduzam a receita municipal (in Direito Municipal Brasileiro, 6ª ed., Malheiros, págs. 541/2).

           Está-se, in casu, diante de inconstitucionalidade formal, que se traduz como "defeito na formação do ato normativo, pela inobservância de princípio de ordem técnica ou procedimental ou pela violação de regras de competência. Nesses casos, viciado é o ato nos seus pressupostos, no seu procedimento de formação, na sua forma final" (Gilmar Ferreira Mendes, "Controle de Constitucionalidade, Aspectos Jurídicos e Políticos", Saraiva, p. 32).

           Nesse sentido, conforme bem lançou em seu parecer o ilustre Procurador de Justiça Durval da Silva Amorim, "conceder a outro Poder tal atribuição ou, ainda, ter limitação por parte de outro Poder, como fazem os parágrafos do artigo 125 da Lei Orgânica de Laguna é violar o princípio da separação de poderes. Referido princípio promove uma justa e adequada ordenação de funções do Estado e, consequentemente, intervém como esquema relacional de competências, tarefas, funções e responsabilidades dos órgãos estatais" (fl. 113).

           Observa-se, portanto, que a norma impugnada incorreu em violação ao princípio da independência e harmonia dos Poderes, consagrado no artigo 32 da Constituição Estadual, uma vez que, ao condicionar o reajuste de tarifa do serviço de transporte à prévia realização de audiência pública, invadiu a esfera de competência exclusiva do Chefe do Executivo, ferindo, também, o artigo 50, § 2º, inciso III, da mesma Carta, razão pela qual os dispositivos impugnados padecem de constitucionalidade.

           3. Por todo o exposto, vota-se pela procedência do pedido, para declarar inconstitucionais os parágrafos 1º a 3º do art. 125 da Lei Orgânica do Município de Laguna.


Gabinete Desembargador Marcus Tulio Sartorato