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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0160100-95.2014.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Rodolfo Cezar Ribeiro Da Silva Tridapalli
Origem: Capital
Orgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Civil
Julgado em: Thu Nov 16 00:00:00 GMT-03:00 2017
Juiz Prolator: Rui César Lopes Peiter
Classe: Apelação Cível

 


Citações - Art. 927, CPC: Tema Repetitivo: 1404796

 


Apelação Cível n. 0160100-95.2014.8.24.0000, da Capital

Relator: Desembargador Rodolfo C. R. S. Tridapalli

   APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ERRO MÉDICO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.

   ERRO DE DIAGNÓSTICO. EFEITOS COLATERAIS IRREVERSÍVEIS DECORRENTES DO USO INDEVIDO DE MEDICAMENTOS (CORTICOIDE). SEM RAZÃO. QUADRO CLÍNICO SINDRÔMICO SEMELHANTE ENTRE AS PATOLOGIAS DE "POLIMIOSITE" E "DISTROFIA MUSCULAR". DIAGNÓSTICO COMPLEXO QUE DEMANDA ACOMPANHAMENTO MÉDICO POR LONGO PERÍODO. CONDUTA MÉDICA DEVIDAMENTE APLICADA PELOS REQUERIDOS. PERÍCIA MÉDICA ENFÁTICA AO CONCLUIR A INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CAUSA E EFEITO ENTRE A PATOLOGIA ADQUIRIDA POSTERIORMENTE PELA PACIENTE (ARTROSE DE QUADRIL) AO USO DE CORTICOIDE. NEXO DE CAUSALIDADE NÃO EVIDENCIADO. PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL AUSENTES. ERRO MÉDICO NÃO CARACTERIZADO. DANO MORAL INEXISTENTE. SENTENÇA MANTIDA.

   RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0160100-95.2014.8.24.0000, da comarca da Capital 4ª Vara Cível em que é Apelante Cristiane Ribeiro e Apelados Carlos Panagiotis Nicolaos Antonakopoulos e outros.

           A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, a unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

           Participaram do julgamento, realizado nesta data, a Exma. Sra. Desembargadora Rosane Portella Wolff e o Exmo. Sr. Desembargador Cesar Abreu, que o presidiu.

           Florianópolis, 16 de novembro de 2017.

Desembargador RODOLFO C. R. S. TRIDAPALLI

Relator

 

           RELATÓRIO

           Da Ação

           CRISTIANE RIBEIRO ajuizou "Ação de Indenização por Danos Morais por Erro Médico" em desfavor de CARLOS P. NICOLAOS ANTONAKOPOULOS, CLÍNICA MÉDICA SANTA CLARA, IVÂNIO ALVES PEREIRA e CLÍNICA MOVIMENTO, objetivando a condenação dos Requeridos ao pagamento de indenização por danos morais no importe de 700 (setecentos) salários mínimos, ou em valor a ser arbitrado pelo Juízo, bem como pensão vitalícia no valor de 2 (dois) salários mínimos mensais, nos termos da petição inicial de fls. 01/20 e documentos coligidos às fls. 21/119.

           Relatou a Autora que em razão de esporádicos tombos/quedas, eis que não tratavam-se de desfalecimento ou desmaios, o médico Dr. CARLOS P. NICOLAOS ANTONAKOPOULOS, que atende na CLÍNICA MÉDICA SANTA CLARA, solicitou a realização de exame de sangue e na data de 20/08/2002, sem solicitar qualquer exame específico, diagnosticou que a mesma estava acometida de uma moléstia grave, degenerativa e progressiva, denominada "Polimiosite do Adulto", sendo-lhe prescrito o medicamento "Prednisona 80 mg/dia".

           Narrou que nos dias 27/09/2002 e 19/11/2002, realizou novos exames de sangue, eis que apresentava um quadro clínico totalmente distinto e incapacitante, ou seja, muito pior do que aquele apresentado no início do tratamento, ocasião em que foi encaminhada ao médico Dr. IVÂNIO ALVES PEREIRA, responsável pela CLÍNICA MOVIMENTO, cuja especialidade é Reumatologia, sugerindo que fosse investigada a possibilidade de tratar-se de "Polimialgia".

           Aduziu que ficou internada no período de 22/11/2002 à 23/12/2002, sendo-lhe prescrita a medicação "Meticorten (Prednisona) 60mg/dia", "Metotrexate 2,5mg", "Tylenol (Paracetamol) 750mg" e "Carbonato de cálcio 500mg + Vitamina D800 UI", e sem apresentar qualquer melhora, nova consulta médica foi realizada no dia 12/02/2003, mantendo-se os medicamentos prescritos e a confirmação do diagnóstico de "Polimiosite do Adulto".

           Alegou que seu quadro clínico se agravava progressivamente, fato este que culminou em nova internação no período de 14/02/2003 à 28/02/2003, com diagnóstico de "Polimiosite do Adulto" e "Pneumonia Intersticial Grave", e no dia 01/03/2003 apresentou fraturas múltiplas no pé esquerdo, permanecendo por 04 meses engessada e fazendo uso de cadeira de rodas por aproximadamente 11 meses.

           Discorreu que como o seu estado de saúde não apresentava nenhuma melhora, no dia 20/04/2003 a família mudou-se para Porto Alegre/RS e iniciou novo tratamento no Hospital São Lucas da PUC/RS, com o médico Dr. Carlos Marrone, que passou a investigar o caso, solicitando a realização de exames específicos e biópsia de músculo, ocasião em que a medicação anteriormente prescrita foi reduzida gradativamente, visto que estavam provocando inúmeros efeitos colaterais.

           Finalmente, na data de 26/10/2004, foi constatado que a Autora sofria de "Miopatia de Cintura/Distrofia Muscular sem qualquer indício de Miopatia Inflamatória/Polimiosite", conforme diagnosticado pelos Réus, sendo que para o tratamento daquela bastaria a realização de fisioterapia e simples analgésicos, e não de uma série de medicamentos que utilizou por anos e que causaram-lhe efeitos colaterais irreversíveis.

           Salientou que "Polimiosite" é uma doença grave e degenerativa que por vezes leva à morte e jamais poderia ser diagnosticada sem a realização dos exames específicos e essenciais ao correto e seguro diagnóstico.

           Sustentou que não mais fazendo o uso de medicamentos e submetendo-se a apenas 2 sessões de fisioterapia por semana, em razão de fortes dores no quadril foi constatada como sequela "Artrose no quadril" provocada pela elevada dose de corticoide a que foi submetida, fazendo com que secasse toda a cartilagem do lado direito do quadril, tudo em decorrência do erro de diagnóstico e o uso de medicação prescrita erroneamente.

           Narrou que seu atual médico, Dr. Richard Canella, não recomenda o uso de prótese no quadril por possuir distrofia muscular, sendo-lhe recomendada a colocação da referida prótese "em porcelana" como tentativa de abrandar temporariamente os danos sofridos.

           Por fim, discorreu que "devido ao enorme sofrimento e ao grave risco de vida a que fora injustamente submetida, e as evidentes lesões materiais, psicológicas, morais e físicas que atingiram a Autora, decorrente do erro de diagnóstico médico cometido pelos Réus, busca a tutela jurisdicional no sentido de ver reparado o erro através da indenização ora pleiteada".

           Em consequência, pugnou a procedência dos pedidos vertidos na inicial.

           Deferiu-se o benefício da justiça gratuita à parte Autora, bem como a inversão do ônus de prova (fl. 124).

           Citados, IVÂNIO ALVES PEREIRA e CLÍNICA MOVIMENTO apresentaram contestação (fls. 149/175), aduzindo, preliminarmente, a ilegitimidade passiva da CLÍNICA MOVIMENTO. No mérito, relatou, em resumo, que: a) acompanhou a paciente no período de 22/11/2002 até o final de março de 2003; b) quando encaminhada ao médico ora contestante, a paciente já diagnosticada com "Polimiosite" fazia o uso do medicamento "prednisona 80mg/dia" há 03 meses, dosagem esta que foi gradativamente reduzida; c) quando a Autora foi internada por complicações infecciosas pulmonares, na data de 14/02/2003, fora atendida por uma equipe de 10 (dez) médicos, cujo diagnóstico era uníssono quanto a "Polimiosite"; d) a Requerente, na data de 15/04/2003, procurou o Dr. IVÂNIO em busca de uma indicação médica em Porto Alegre/RS que pudesse dar continuidade ao tratamento, porquanto estaria de mudança com a família, demonstrando assim que depositava confiança no tratamento que lhe prescrevera; e) após a mudança da paciente o diagnóstico de "Polimiosite" permaneceu hígido por 09 (nove) meses, vez que continuou fazendo uso da medicação outrora prescrita; f) o erro de diagnóstico, por si só, não representa um ato de imperícia; g) a paciente não havia informado ao médico recorrente o histórico de fraqueza muscular familiar, informação esta somente prestada na segunda consulta que realizara em Porto Alegre, fato este que evidentemente repercutiria no diagnóstico bem como no tratamento; h) o uso de "prednisona (corticoide)" foi associado com imunossupressor, que tem efeito poupador de dose de corticoide, bem como carbonato de cálcio e vitamina D para evitar osteoporose, o que demonstra sua preocupação com relação aos eventos adversos; i) a paciente possuía dificuldade financeira para realizar exames de alto custo como biópsia muscular, eletromiografia e desitometria óssea; j) não há nexo de causalidade entre o atendimento médico desenvolvido e a moléstia sofrida pela Requerente; k) a responsabilidade civil médica relativamente ao serviço prestado por profissional liberal é, em princípio, subjetiva, uma obrigação de meio, não de resultado, inexistindo, assim, o dever de indenizar. Por fim, pugnou a improcedência da ação.

           Por sua vez, citados, CARLOS P. NICOLAOS ANTONAKOPOULOS e SANTA CLARA ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA. também apresentaram contestação (fls. 425/447), suscitando, em preliminar, a ilegitimidade passiva da SANTA CLARA ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA. No mérito, relataram, em resumo, que: a) fora constatada atrofia de musculatura nos membros inferiores da paciente que se queixava de fraqueza extrema na região; b) após a realização de exames e consultas médicas, houve a suspeita de que se tratava de "Polimiosite", eis que a Autora apresentava os sintomas da doença, de modo que não foi passado diagnóstico preciso da doença; c) fora recomendado à Requerente que procurasse um especialista reumatologista, sendo-lhe indicado também a realização de fisioterapia; d) em razão da dor e astenia, iniciou o tratamento da paciente com o medicamento "prednisona", programando redução gradativa, enquanto aguardava-se o atendimento da mesma pelo especialista; e) a paciente voltou a fazer outras consultas, relatando as mesmas queixas, porém não procurou um especialista; f) preocupado com o estado da paciente realizou o encaminhamento da mesma, em caráter de urgência, ao especialista em reumatologia, Dr. IVÂNIO ALVES PEREIRA; g) posteriormente, os poucos atendimentos com o Dr. Carlos eram apenas em caráter de suporte, sem modificar as indicações do especialista; h) após a mudança da Autora para Porto Alegre/RS, a mesma permaneceu, por quase um ano, com o mesmo tratamento outrora realizado; i) o diagnóstico preciso somente foi obtido após a realização de um exame (biópsia muscular), o qual não é realizado em nenhum hospital da grande Florianópolis e, somente após a paciente informar a existência de casos análogos na família; j) a sindicância instaurada perante o Conselho Regional de Medicina do Estado de Santa Catarina foi refutada e arquivada; h) não há se falar em imperícia ou negligência em relação ao atendimento prestado pelo ora contestante; i) a responsabilidade do médico é de ordem subjetiva, eis que se trata de obrigação de meio; j) inexiste fato constitutivo do direito da Autora em pleitear indenização por dano de qualquer natureza. Ao final, requereu a improcedência dos pedidos vertidos na inicial. 

           Houve réplica às fls. 339/354 e 458/469.

           Em decisão proferida à fl. 475, afastou-se a preliminar de ilegitimidade passiva ventilada pelas requeridas CLÍNICA MOVIMENTO e SANTA CLARA ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA.

           Houve juntada de documentos (fls. 513/525), com manifestação da Requerente às fls. 528/531.

           Em audiência de instrução, inexitosa a conciliação (fl. 543).

           Posteriormente, fora deferida a prova pericial requerida pelas partes (fl. 545). Quesitos apresentados pelas partes às fls. 550/553, 565/568 e 569/572.

           Laudo pericial acostado às fls. 610/613 e 614/622.

           Manifestação ao laudo pericial juntado às fls. 631/634, 635/639 e 640/643.

           Audiência de Instrução e Julgamento realizada com a oitiva das testemunhas arroladas pela parte autora (fls. 677/679).

           Com as alegações finais (fls. 682/689; 690/698 e 699/713), sobreveio a sentença, fls. 716/730.

           Da Sentença

           O Magistrado de Primeiro Grau, Dr. RUI CÉSAR LOPES PEITER, compôs a lide, nos seguintes termos:

    Ante o exposto, com base no art. 269, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por Cristiane Ribeiro contra Carlos Panagiotis Nicolaos Antonakopoulos, Clínica Médica Santa Clara, Ivânio Pereira e Clínica Movimento e, em consequência, condeno a autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais), a teor do art. 20, § 4º, do CPC. Fica suspensa, contudo, a exigibilidade de tais verbas, uma vez que a autora é beneficiária da justiça gratuita (art. 12 da Lei n. 1.060/1950). Quanto aos honorários dos peritos, proceda-se nos termos da orientação 15/2007 da CGJ, que assim estabelece: "Nos casos em que houver nomeação de perito judicial e a parte sucumbente for beneficiária da assistência judiciária, por ocasião da sentença o Juiz deverá determinar a expedição de ofício ao Procurador-Geral do Estado solicitando o pagamento dos valores dos honorários periciais". Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

           Do Recurso de Apelação

           Irresignada, CRISTIANE RIBEIRO interpôs Recurso de Apelação (fls. 734/741) pleiteando a reforma da sentença, alegando, em síntese, que é evidente o nexo de causalidade entre o uso indiscriminado de medicamentos (corticoide) ao atual estado de saúde da paciente, acometida com "artrose no quadril". Por fim, pugna a procedência do Apelo.

           Das Contrarrazões ao Recurso de Apelação

           CARLOS P. NICOLAOS ANTONAKOPOULOS e SANTA CLARA ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA, apresentaram contrarrazões ao recurso de Apelação da Requerente (fls. 750/759), pugnando o desprovimento do Apelo e a manutenção da decisão. Sustentaram, em suma, que os dois laudos periciais colacionados aos autos foram conclusivos ao afirmarem a ausência de nexo de causalidade entre as condutas médicas e os danos descritos na inicial.

           IVÂNIO ALVES PEREIRA e CLÍNICA MOVIMENTO contra-arrazoaram o Reclamo interposto pela Requerente (fls. 760/766), discorrendo, em resumo, que os peritos foram categóricos ao afirmar que "a distrofia é uma doença que demora para se revelar, sendo necessário um acompanhamento a médio e longo prazo para um diagnóstico preciso". Requerem, assim, o desprovimento do Apelo, com a manutenção da decisão vergastada.

           Após, os autos vieram conclusos.

           Este é o relatório.

            

           VOTO

           I - Do Direito Intertemporal

           Não obstante o Código de Processo Civil de 2015 tenha aplicabilidade imediata desde 18/03/2016, nos termos de seus artigos 1.045 e 1.046, registra-se, por oportuno, que a análise das espécies se dá sob a égide do Código Buzaid, seja por sua vigência à época em que proferida a decisão sob exame (24/06/2014 - fl. 730), seja por àquele diploma não compreender efeito retroativo (LINDB, artigo 6º, § 1º).

           A propósito, sobre o tema, aponta-se da jurisprudência:

    PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. ART. 8º DA LEI 12.514/2011. INAPLICABILIDADE ÀS AÇÕES EM TRÂMITE. NORMA PROCESSUAL. ART. 1.211 DO CPC. "TEORIA DOS ATOS PROCESSUAIS ISOLADOS". PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM.

    [...] 4. Ocorre que, por mais que a lei processual seja aplicada imediatamente aos processos pendentes, deve-se ter conhecimento que o processo é constituído por inúmeros atos. Tal entendimento nos leva à chamada "Teoria dos Atos Processuais Isolados", em que cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar qual a lei que o rege, recaindo sobre ele a preclusão consumativa, ou seja, a lei que rege o ato processual é aquela em vigor no momento em que ele é praticado. Seria a aplicação do Princípio tempus regit actum. Com base neste princípio, temos que a lei processual atinge o processo no estágio em que ele se encontra, onde a incidência da lei nova não gera prejuízo algum às parte, respeitando-se a eficácia do ato processual já praticado. Dessa forma, a publicação e entrada em vigor de nova lei só atingem os atos ainda por praticar, no caso, os processos futuros, não sendo possível falar em retroatividade da nova norma, visto que os atos anteriores de processos em curso não serão atingidos. [...] (REsp 1404796/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, j. 26/03/2014).

           II - Da Admissibilidade do Recurso

           Como linha de princípio, destaca-se a lição de FREDIE DIDIER JR., e LEONARDO CARNEIRO DA CUNHA:

    O objeto do juízo de admissibilidade dos recursos é composto dos chamados requisitos de admissibilidade, que se classificam em dois grupos, de acordo com a conhecida classificação de Barbosa Moreira: a) requisitos intrínsecos (concernentes à própria existência do direito de recorrer): cabimento, legitimação, interesse e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer; b) requisitos extrínsecos (relativos ao modo de exercício do direito de recorrer): preparo, tempestividade e regularidade formal. (Curso de direito processual civil: meios de impugnação às decisões judiciais e o processo civil nos tribunais. v.3. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016. p. 107).

           Em tal contexto, conhece-se do Recurso de Apelação interposto, uma vez que presentes os pressupostos legais de admissibilidade.

           III - Do julgamento do Mérito Recursal

           Irresignada com a prestação jurisdicional, pugna a Apelante a reforma integral da sentença, para que seja julgado procedente o pedido exordial, consistente na condenação dos Requeridos ao pagamento de indenização por danos morais, bem como pensão vitalícia, em razão do erro de diagnóstico que acarretou no uso indevido de medicamentos - corticoides -, e consequentemente sequelas irreversíveis.

           Narra a Apelante que foi diagnosticada com "osteonecrose da cabeça femural" atribuindo sua causa ao uso contínuo e prolongado de corticoide durante os anos de 2002 a 2004, vez que os Requeridos, ora Apelados, concluíram que a mesma estava acometida de uma moléstia grave, degenerativa e progressiva denominada "Polimiosite do Adulto", enquanto que na verdade era portadora de "Distrofia Muscular/Miopatia de Cinturas".

           Pois bem.

           O Direito regula a matéria em exame no art. 951 do Código Civil, in verbis:

    Art. 951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.

           Por sua vez, o Código de Defesa do Consumidor prescreve:

    Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

    [...]

    § 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

           E sobre o dano moral, dispõe a Constituição Federal:

    Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

    [...]

    V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;

    [...]

    X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

           Registre-se, ainda, que o art. 186 do Código Civil, define que aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

           Portanto, os médicos, no exercício da profissão, respondem civilmente pelo dano material e moral que causarem, diante da presença do elemento subjetivo culpa, na forma de imperícia, negligência ou imprudência.

           Ensina a doutrina:

    A responsabilidade civil do médico, na qualidade de profissional liberal, em face do disposto no art. 14, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8078/90), será apurada mediante a verificação de culpa, regra, aliás, aplicável a todos os demais profissionais liberais [...] (PEREIRA, Hélio do Valle. ENZWEILER, Romano José. Curso de Direito Médico. São Paulo: Conceito Editorial, 2011, p. 333).

           Nas palavras de MARIA HELENA DINIZ:

    O erro profissional poderá constituir ato ilícito. [...] O profissional de saúde tem responsabilidade civil subjetiva pelos danos causados a paciente, por ato comissivo ou omissivo que praticar no exercício de sua atividade, devendo pagar, conforme o caso, as indenizações previstas nos arts. 948, 949 e 950, por isso deverá atuar com zelo, esforçando-se para o bom êxito do tratamento, evitando empregar técnicas lesivas ou ultrapassadas ou ter conduta culposa que possa agravar o mal ou inabilitar o paciente para o trabalho. Deve agir com diligência e cuidado, empregando métodos de qualidade e seguindo as regras técnicas da profissão. (Código Civil Anotado. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 646/647).

           Nesse contexto, passa-se a análise das provas coligidas no feito.

           Inicialmente, observa-se que instaurada sindicância junto ao Conselho Regional de Medicina do Estado de Santa Catarina - CREMESC - os conselheiros decidiram pelo seu arquivamento face a ausência de indícios de infração ética cometida pelos médicos denunciados, da qual se extrai a parte conclusiva (fls. 326/327):

    [...] Após análise dos fatos acima expostos, posso concluir que o denunciado Dr. Carlos Panagiotis Nicolaos Antonakopaulos avaliou a paciente, elaborou hipótese diagnóstica plausível, encaminhou para avaliação especializada, indicou tratamento compatível com a hipótese formulada, fazendo tudo que estava ao seu alcance, como clínico não especialista, não sendo possível vislumbrar ilícito ético por não ter sido confirmada sua hipótese diagnóstica, nem pelo fato do tratamento indicado ter tido paraefeitos previsíveis.

    Com relação ao Dr. Ivânio Alves Pereira [...] ele recebeu a paciente já em tratamento, com quadro clínico sindrômico compatível com a hipótese formulada pelo médico que a estava tratando inicialmente, sem condição clínica para realizar procedimentos invasivos naquele momento, e exibindo limitação financeira, fatos que levaram o médico a adotar a conduta mais conservadora, de manter o tratamento em curso, deixando de realizar os procedimentos confirmatórios da suspeita diagnóstica, sendo que, mais tarde, em outro serviço demonstraram ser esta hipótese equivocada. O pequeno tempo de acompanhamento de uma doença crônica e evolutiva, por certo contribuíram para que o médico não percebesse a resposta insuficiente ao tratamento, o que, se ocorresse, provavelmente o levaria a indicar os citados procedimentos. [...] 

           Do mesmo modo manifestou o Conselho Federal de Medicina quando da apreciação do recurso interposto pela Autora contra o arquivamento da sindicância junto ao Conselho Regional de Medicina do Estado de Santa Catarina - CREMESC. Confira-se (fls. 496/497):

    [...] Da avaliação criteriosa das informações trazidas aos autos podemos concluir:

    1. O quadro clínico apresentado pela paciente confirmado pelos exames laboratoriais legitimam a suspeita diagnóstica de Polimiosite.

    2. O diagnóstico diferencial com a Distrofia Muscular somente é possível após período longo de acompanhamento do médico, com avaliação periódica da evolução.

    3. A biópsia muscular pesquisa de anticorpos anti JO-1, e eletromiografia não estavam disponível aos médicos em Florianópolis.

    4. O quadro de artrose do quadril não se pode atribuir ao tratamento com corticoide, tal como pretende a paciente.

    5. A Medicina é uma ciência inexata. O conhecimento científico da Medicina evolui com conhecimento de erros e acertos. Sem que isto implique em ferimento à ética médica. O erro inescusável do ponto de vista ético é aquele que ocorre quando de forma grosseira ferindo o conhecimento básico que se exige do médico no exercício profissional. O erro diagnóstico clínico de ocorrência rara e com alterações clínicas e laboratoriais convém a vários outros pode ser considerado como erro escusável.

    6. O diagnóstico final somente foi estabelecido após longo período de tratamento e investigação através de exames não disponíveis aos Drs. Carlos e Ivânio o que demonstra claramente a complexidade do caso, não se podendo atribuir aos médicos erro inescusável.

           Extrai-se do laudo pericial elaborado pelo Dr. Gustavo Carriço de Oliveira (CRM 9237), médico ortopedista (fls. 612/613):

    Pelo relato da paciente, diante do Raio X apresentado e do exame físico-ortopédico que foi realizado, denotou-se que a paciente apresentava necrose avascular na cabeça do fêmur direito, com dor à mobilização do quadril direito (dificuldade para caminhar), limitação da rotação interna e flexão dolorosa, necessitando de muletas para andar.

    O exame físico-ortopédico realizado, somado ao histórico de saúde da paciente, não permite identificar se a doença ou o uso dos referidos medicamentos causaram a necrose da cabeça do fêmur, no quadril direito.

    Além disso, Distrofia e Polimiosite são doenças muito semelhantes, já que as duas envolvem fraqueza muscular. Ademais, não existe um exame único que possa identificar qual das doenças acomete a paciente. A distrofia, em especial, é uma doença que demora muito tempo para se revelar.

           Concluiu o Expert (fls. 612/613):

    As informações obtidas nesta perícia foram baseadas em relato da paciente durante entrevista e exame de Rx simples. Conforme relata a paciente, a necrose ocorrida manifestou-se com dor no quadril após seu tratamento em Porto Alegre e teve sintomatologia depois de muitos anos do início do tratamento em Florianópolis.

    No entanto, apesar dos sintomas terem sido identificados na data relatada, não há possibilidade de se afirmar relação de causa e efeito entre a patologia adquirida e os medicamentos utilizados uma vez que existem diversas causas de necrose avascular da cabeça do fêmur como, por exemplo, trauma, alcoolismo, lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatóide, anemia falciforme, doença de Gaucher, coagulopatias e hemoglobinopatias, pancreatite, radioterapia, disbarismo, hiperurecemia, quimioterapia, uso de corticosteroide (não havendo na literatura comprovação de dosagem específica que cause necrose, existindo inclusive controvérsia sobre seu real papel como fator etiológico), idiopática (forma sem causa definida, relatada em literatura especializada por representar 25% dos casos), entre outras causas.

            Consoante o laudo pericial apresentado pela Dra. Maria Amazile Ferreira Toscano, médica com especialidade em reumatologia, a expert consignou em resposta aos quesitos formulados pelo Apelado, Dr. IVÂNIO ALVES PEREIRA (fl. 615):

    3. O senhor perito pode confirmar que a utilização de corticoide nas doenças reumáticas e nas doenças inflamatórias musculares deve ser evitada, pelo risco raro e imprevisível de aparecimento de osteonecrose de quadril? Ainda em relação a osteonecrose, existem muitas causas de osteonecrose? É verdade que muitos casos são idiopáticos, ou seja, sem causa definida? O aparecimento de osteonecrose pode variar de meses a anos após a utilização de corticoide, assim não se pode relacionar a prescrição isolada de qualquer dos médicos que atendeu a paciente (número maior que 15 médicos) com o aparecimento de osteonecrose, concorda?

    R: Não concordo com a primeira afirmação, pois o corticoide nessas doenças, apesar do aparecimento eventual de algum paraefeito, é essencial no controle do processo inflamatório. Quanto à osteonecrose, esta é uma condição tardia, resultado de várias possíveis causas como, entre outros, abuso de álcool, gota, estados de hipercoagulabilidade, trauma e uso de corticosteroide sistêmicos. Em muitos casos de osteonecrose da cabeça do fêmur, uma causa não pode ser determinada, e estes são considerados como "idiopáticos".

           Em resposta aos quesitos apresentados pelo requerido Dr. CARLOS P. NICOLAOS ANTONAKOPOULOS, discorreu a médica perita (fls. 617/619):

    c. Os sintomas apresentados pela Sra. Cristiane e os resultados dos exames realizados eram compatíveis com suspeita de "polimiosite"? O que significa "polimiosite", quais seus sintomas e os problemas que causaram na paciente que possui essa patologia?

    R: As queixas de fraqueza muscular, atrofia muscular e alterações no exame da creatinoquinase (CPK) eram compatíveis com a suspeita clínica de polimiosite do adulto, doença autoimune de caráter inflamatório dos músculos que cursa com fraqueza muscular proximal, muitas vezes severa, com consequente atrofia muscular e que, muitas vezes, se não tratada adequadamente, poderá até evoluir para óbito.

    [...]

    i. A hipótese diagnóstica levantada inicialmente pelo Dr. Carlos foi mantida pelo Dr. Ivânio? Essa mesma hipótese diagnóstica foi mantida pelos outros profissionais que atenderam a paciente após o Dr. Ivânio? Após o último atendimento feito pelo Dr. Ivânio, quanto tempo demorou para se chegar ao diagnóstico definitivo da patologia que a Sra. Cristiane possuía? Porque levou tanto tempo. 

    R: Pelos dados obtidos dos autos, esta hipótese foi mantida tanto pelo Dr. Ivânio quanto pelos outros profissionais que a atenderam em Porto Alegre (RS). O último atendimento feito pelo Dr. Ivânio se deu em 20/04/2003 e o diagnóstico definitivo da doença após a biópsia muscular aconteceu em 26/10/2004. Entendo ser razoável supor que a demora em ser firmado o diagnóstico definitivo se deveu à complexidade do caso, e à necessidade de exames complementares de mais difícil obtenção.

    [...]

    k. O diagnóstico preciso da patologia que a paciente possuía foi obtido em que data? Pode-se afirmar que esse diagnóstico só foi obtido após a realização de exame de biópsia muscular? No que consiste esse exame? Algum dos hospitais da grande Florianópolis possui esse exame?

    R: O diagnóstico preciso se deu em 26/10/2004, após a realização de biópsia muscular no Hospital São Lucas em Porto Alegre. Este exame consiste na retirada de um fragmento de tecido que é analisado por uma patologista treinado. Pelas informações que possuo, esse exame não é realizado em nenhum hospital da grande Florianópolis (SC).

    [...]

    o. Em relação à patologia que foi primariamente diagnosticada, chamada "polimiosite", os sintomas são muito parecidos com os apresentados pela autora?

    R: Sim

           Em resposta aos quesitos apresentados pelo assistente técnico da parte Autora, observa-se (fls. 620/622):

    3. A periciada é portadora da enfermidade conhecida como polimiosite do adulto ou da doença denominada distrofia muscular/miopatia de cinturas?

    R: É portadora de distrofia muscular/miopatia de cinturas.

    4. Estas enfermidades são semelhantes, ou seja, são manifestações polimórficas de uma mesma doença? Insisto: são expressões fenotípicas de uma mesma patologia? Têm base genética ou familiar?

    R: Sim, são doenças com sintomas semelhantes. Numa fase inicial, ambas cursam com fraqueza muscular proximal e tem quadro clínico bastante similar. No entanto, não são a mesma doença. São doenças distintas. A distrofia muscular tem incidência familiar.

    5. Podem ser confundidas, quando diagnosticadas por médico especialista na área, como um reumatologista, por exemplo?

    R: Sim.

    [...]

    12. A biópsia muscular não é condição essencial para diagnóstico de polimiosite do adulto?

    R: Não. Segundo os critérios diagnósticos de Bohan e Peter, o diagnóstico de polimiosite do adulto pode ser firmado pelo médico como "definido", "provável" ou "possível". Para firmar diagnóstico "definido", é necessário que o paciente apresente sintomas, alterações bioquímicas e eletromiográficas compatíveis e biopsia muscular que confirme a hipótese. O diagnóstico "provável" pode ser feito sem a realização da biópsia, apenas com a presença de outros critérios.

    [...]

    21. O uso de corticoide em alta dose, considerada terapêutica, e por longo período (acima de seis meses) pode deixar sequelas graves e irreparáveis?

    R: A ocorrência de efeitos colaterais é esperada com o uso por longo período de corticosteroide, mesmo em doses baixas, e pode ocorrer com uso por curto período quando em doses altas. Quando do tratamento de doenças ou condições graves (transplantes, doenças alérgicas, imunológicas e reumatológicas), os beneficios do tratamento são considerados largamente superiores aos potenciais malefícios dos efeitos colaterais. A ocorrência de efeitos colaterais graves é rara e penso que estes não podem ser considerados "irreparáveis".

    22. Nos dias de hoje, a periciada se encontra em acompanhamento com médico ortopedista, em face de artrose de quadril. A artrose de quadril, apresentada pela periciada, pode ter sido provocada pelo uso de corticoide em doses terapêuticas e por período prolongado, a qual lhe foi prescrita para tratamento de polimiosite do adulto?

    R: Não existe correlação fisiopatológica entre artrose de quadril e o uso de corticosteroide. A artrose de quadril apresentada pela periciada parece ser consequência da osteonecrose da cabeça do fêmur. Esta é uma condição tardia, resultado de vários possíveis caminhos patogênicos como, entre outros, abuso de álcool, gota, estados de hipercoagulabilidade, trauma e uso de corticosteroide sistêmicos. Em muitos casos de osteonecrose da cabeça do fêmur, uma causa não pode ser determinada, e estes são considerados como "idiopáticos".

           Constata-se que os pareceres médicos foram enfáticos ao concluirem a semelhança dos sintomas das doenças "polimiosite" e "distrofia muscular", sendo que para o diagnóstico desta, por ser uma doença que demora muito tempo para se revelar, é necessário o acompanhamento médico por longo período, o que demonstra a complexidade do caso.

           Observa-se que a Autora esteve em acompanhamento médico com Dr. CARLOS PANAGIOTIS NICOLAOS ANTONAKOPOULOS por aproximadamente 03 (três) meses (fls. 24/44), enquanto que pelo Dr. IVÂNIO ALVES PEREIRA fora acompanhada por aproximadamente 05 (cinco) meses, até que na data de 15/04/2003 este encaminhou a paciente, a pedido por motivos de mudança de endereço, ao serviço de reumatologia do Hospital São Lucas - PUC/RS (fls. 47/80 e 96/98).

           Dando continuidade ao tratamento em Porto Alegre/RS, foram realizados exames específicos, notadamente, eletroneuromiografia e biópsia de músculo, até que na data de 26/10/2004 chegou-se ao diagnóstico sindrômico de Miopatia de Cinturas (fls. 100/107).

           Nesse contexto, constata-se que a Autora esteve em tratamento com os médicos Apelados por 8 (oito) meses, e com a equipe médica de Porto Alegre/RS por aproximadamente 18 (dezoito) meses, período este em que a paciente continuou fazendo o uso do medicamento "prednisona", mesmo que em dose reduzida.

           Neste ponto, a médica perita, Dra. Maria Amazile Ferreira Toscano, concluiu que os efeitos colaterais em decorrência do uso de corticoide poderão ocorrer tanto pelo uso em doses baixas por longo período, como também pelo uso em doses altas por curto período, ao passo que não é possível afirmar que os efeitos colaterais que alega a Autora/Apelante ter sofrido são decorrentes do período em que o medicamento fora prescrito pelos médicos Apelados (fl. 622).

           Por outro lado, a perícia médica concluiu que não é possível afirmar extreme de dúvidas a relação de causa e efeito entre a patologia adquirida pela pela paciente (necrose de cabeça do fêmur) ao uso de corticoide, vez que referida moléstia pode ocorrer por diversas causas, notadamente, trauma, alcoolismo, lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatóide, anemia falciforme, doença de Gaucher, coagulopatias e hemoglobinopatias, pancreatite, radioterapia, disbarismo, hiperurecemia, quimioterapia, idiopática (sem causa definida), dentre outras (fl. 6012).

           Ademais, a Expert descreveu que os benefícios nos tratamentos de doenças com o uso de corticosteroide são superiores aos possíveis malefícios dos efeitos colaterais, os quais, são raros e não podem ser considerados irreversíveis (fl.622).

           Por fim, consignou a prova pericial que a conduta do apelado Dr. CARLOS PANAGIOTIS NICOLAOS ANTONAKOPOULOS foi adequada, de modo que a partir do exame laboratorial realizado pela paciente, iniciou-se o tratamento medicamentoso, indicando a paciente ao tratamento com fisioterapia, assim como o acompanhamento de um médico especialista em reumatologia. Ademais, a hipótese por ele diagnosticada foi mantida pelo apelado Dr. IVÂNIO ALVES PEREIRA, assim como pela equipe médica que deu continuidade ao tratamento da Autora em Porto Alegre/RS, até que foram realizados exames específicos, notadamente, biópsia muscular, o qual não é realizado em nenhum hospital da grande Florianópolis, chegando-se ao diagnóstico final.

           Exsurge da prova produzida nos autos que a melhor técnica foi devidamente empregada pelos Requeridos, o que afasta a configuração de erro médico e, por conseguinte, o dever de indenizar civilmente por dano moral.

           Destarte, na hipótese, não verificada a ocorrência do ato ilícito consistente na prática de erro médico, ausentes os pressupostos da responsabilidade civil, razão pela qual não faz jus a Autora à reparação por dano moral, tampouco a pensão vitalícia perquirida.

           Diante da ausência de nexo de causalidade entre a conduta médica ao prescrever o uso de corticoide diante do quadro clínico sindrômico apresentado pela paciente e a patologia posteriormente apresentada pela mesma (artrose de quadril), não se denota a presença dos pressupostos de responsabilidade civil, em especial o elemento subjetivo "culpa" nas modalidades de imperícia e de negligência dos profissionais médicos Demandados.

           Corroborando com o caso, a jurisprudência desta Corte de Justiça:

    [...] Não havendo prova segura do nexo de causalidade entre o dano e a ação do médico, tampouco que tenha sido ele imperito, negligente ou imprudente, não respondem ele e/ou o hospital pela reparação dos danos (material e moral) resultantes de eventual insucesso nos serviços prestados [...] (Apelação Cível n. 0002273-37.2010.8.24.0040, de Laguna, rel. Des. NEWTON TRISOTTO, j. 27/06/2017).

    [...] "A prestação de serviço médico, salvo exceções (v.g., cirurgia estética, tratamentos odontológicos etc.), é obrigação de meio e não de resultado, uma vez que a asseguração da cura ou da melhora do paciente está limitada ao conhecimento científico humano e aos recursos que para tanto podem ser disponibilizados. É, pois, necessária a demonstração da culpa do médico para responsabilizá-lo (assim como, em determinadas circunstâncias, do estabelecimento hospitalar) pelo resultado terapêutico indesejado, ou ao menos o nexo de causalidade entre as sequelas verificadas no indivíduo tratado e os procedimentos realizados" (TJSC, Apelação Cível n. 2013.034085-6, de Joinville, rel. Des. Marcus Tulio Sartorato, j. em 9-7-2013). (TJSC, Apelação n. 0010689-95.2007.8.24.0008, de Blumenau, rel. Des. FERNANDO CARIONI, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 07/06/2016).

    [...] O erro de diagnóstico é tema dos mais delicados no âmbito das chamadas falhas técnicas médicas, daí por que, segundo pacífico entendimento doutrinário e jurisprudencial, somente se pode reconhecer a hipótese de culpa punível quando o erro for crasso, grosseiro, demonstrando absoluto descuido das normas de semiologia ou falta de conhecimentos elementares de patologia clínica. Em tema de responsabilidade civil médica, é imprescindível a prova do nexo causal entre a conduta adotada e o resultado lesivo não querido ou esperado, não se podendo olvidar, de todo modo, que nem sempre a causa que deu origem ao dano é evidente ou clara, sobretudo quando implementados procedimentos padrões que descartam a hipótese de falta de zelo e precauções". (TJSC, Apelação Cível n. 2009.015826-7, de Blumenau, rel. Des. JORGE LUIS COSTA BEBER, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 13/12/2012).

    [...] O erro de diagnóstico dá ensejo à responsabilidade civil somente se efetuado com imperícia, imprudência ou negligência, em desatenção às técnicas, recursos e equipamentos disponíveis no momento, o que não se verifica no caso em tela. (TJSC, Apelação Cível n. 2005.010816-7, de Videira, rel. Des. JOEL FIGUEIRA JÚNIOR, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 17/08/2009).

           Por todo o exposto, voto para conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

           Este é o voto.


Gabinete Desembargador Rodolfo C. R. S. Tridapalli