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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0310658-25.2015.8.24.0039 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Domingos Paludo
Origem: Lages
Orgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Civil
Julgado em: Thu Mar 16 00:00:00 GMT-03:00 2017
Juiz Prolator: Francisco Carlos Mambrini
Classe: Apelação Cível

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STJ: 7

 


Apelação Cível n. 0310658-25.2015.8.24.0039, de Lages

Relator: Desembargador Domingos Paludo

   APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. COBRANÇA INDEVIDA DE SERVIÇOS EM FATURA DE TELEFONIA. SENTENÇA QUE RECONHECEU A IRREGULARIDADE DA COBRANÇA E DETERMINOU A RESTITUIÇÃO EM DOBRO AO CONSUMIDOR, MAS DENEGOU A COMPENSAÇÃO PELOS DANOS MORAIS. ABALO ANÍMICO NÃO CARACTERIZADO. MERO ABORRECIMENTO. ALEGAÇÃO DA EMPRESA RÉ PELA REGULARIDADE DA COBRANÇA. INSUBSISTÊNCIA. ÔNUS DA PROVA QUE LHE COMPETIA. RECURSOS DESPROVIDOS.

   Inexistindo quaisquer atos restritivos ao crédito do consumidor, tem-se que a cobrança indevida de serviços somente implica dano moral em casos excepcionais, circunstância não verificada na hipótese.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0310658-25.2015.8.24.0039, da comarca de Lages (3ª Vara Cível) em que é Apte/RdoAd Osmar de Quadra e Apdo/RteAd OI S/A.

           A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer de ambos os recursos e negar-lhes provimento. Custas legais.

           Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Domingos Paludo - Relator e Presidente -, Des. André Carvalho e Des. Jorge Luis Costa Beber.

           Florianópolis, 16 de março de 2017.

Desembargador Domingos Paludo

Relator

 

RELATÓRIO

           Trata-se de apelação cível e de recurso adesivo interpostos, respectivamente, pela parte autora e pela empresa ré, contra a sentença de fls. 88/93, em que o togado singular julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na presente ação declaratória de inexistência de débito c/c reparação de danos materiais e morais, condenando a concessionária ré ao ressarcimento em dobro dos valores indevidamente cobrados do autor, acrescidos de correção monetária a partir dos desembolsos e juros de mora contados da citação, afastando, contudo, o pedido de danos morais.

           A parte autora, ora apelante, visa à reforma da sentença para reconhecer o dano moral experimentado, sob o argumento de que o "proceder abjeto empregado pela Recorrida ao efetuar a cobrança de serviços não contratados e durante largo período de tempo, perfaz o ato ilícito necessário à imposição dos danos morais que se objetiva reparar, porquanto a Recorrida desconsiderou qualquer respeito ao consumidor, fato que deve ser repudiado por este Egrégio Sodalício" (fls. 97/102).

           Por seu turno, em recurso adesivo, a empresa ré alega não haver quaisquer ilicitudes a embasar a eventual reparação, mas sim exercício regular do direito, na medida em que os serviços teriam sido efetivamente solicitados pelo consumidor (fls. 118/130).

           Contrarrazões da empresa ré às fls. 145/158.

           Sem contrarrazões do autor.

           Após, vieram os autos conclusos.

           Este é o relatório.

 

VOTO

           Presentes os pressupostos de admissibilidade previstos na legislação adjetiva, conheço de ambos os recursos.

           Insurge-se o apelante contra a sentença que não reconheceu o dano moral pleiteado, sob o argumento de que o "proceder abjeto empregado pela Recorrida ao efetuar a cobrança de serviços não contratados e durante largo período de tempo, perfaz o ato ilícito necessário à imposição dos danos morais que se objetiva reparar, porquanto a Recorrida desconsiderou qualquer respeito ao consumidor, fato que deve ser repudiado por este Egrégio Sodalício".

           Ademais, alegou o apelante que a "lesão moral que tem nascedouro nesse procedimento ilegal se aperfeiçoa pela renitência da mesma Recorrida em se negar a reconhecer o abuso praticado, cancelar a cobrança dos serviços e devolver o que se locupletou ilegalmente, obrigando o consumidor a suportar toda a sorte de obstáculos para alcançar um fim que somente adveio com a sentença" (fls. 97-102).

           Em que pese os valorosos fundamentos encartados na pretensão de reforma, adianto que razão não assiste ao apelante.

           Compulsando os autos, verifica-se incontroversa a cobrança indevida, eis que a concessionária de telefonia não comprovou a adesão aos serviços pelo apelante, ônus que lhe cabia, ante a inversão do ônus da prova estabelecida pelo Código de Defesa do Consumidor.

           No entanto, a despeito da cobrança por serviços não contratados, não se constatou que tal proceder tenha se dado de maneira vexatória, ou que por algum modo tenha causado abalo ao consumidor por prejuízos excepcionais.

           A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que a mera cobrança equivocada, por si só, não é capaz de caracterizar dano moral in re ipsa, devendo haver, para fundamentar o pleito indenizatório, a comprovação do dano sofrido.

           É o que se depreende do julgado abaixo ementado, in verbis:

    PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. COBRANÇA INDEVIDA POR SERVIÇO TELEFÔNICO. DANO MORAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. SÚMULA 7/STJ.

    1. A inscrição indevida do nome do usuário de serviço público em cadastro de inadimplentes gera o direito à indenização independentemente da comprovação do dano moral. Essa solução, porém, não é a mesma aplicável à situação dos autos, em que inexiste qualquer ato restritivo de crédito, mas apenas falha na prestação ou cobrança do serviço. Nesse caso, conforme a regra geral, o dano moral deve ser demonstrado, não presumido.

    2. Para se afirmar a caracterização da responsabilidade civil na espécie, seria necessário novo exame dos fatos e provas constantes dos autos, providência inadmissível a este Superior Tribunal em sede de recurso especial. Incidência da Súmula 7/STJ.

    3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no REsp 1.474.101/RS, rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, j. 12-02-2015 - grifos nossos).

           Os Tribunais Pátrios caminham no mesmo sentido:

    RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. TV A CABO. COBRANÇA APÓS O CANCELAMENTO DO SERVIÇO. DÉBITO AUTOMÁTICO EM CONTA CORRENTE. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. DANO MORAL AFASTADO.

    Caso em que da autora vinha sendo descontado, via débito automático em conta corrente, por serviço de TV a cabo cancelado em 27/11/2013. Considerando a alegação de cancelamento do serviço, corroborada pelos protocolos trazidos pela autora, cabia à ré comprovar nos autos a utilização do serviço após a referida data, o que não logrou fazer, no entanto. Sendo assim, indevida a cobrança dos valores após a solicitação de cancelamento, razão pela qual se impõe a repetição, em dobro, dos valores debitados a partir do mês de novembro. Trata-se de cobrança indevida, o que, conforme entendimento consolidado nas Turmas Recursais Cíveis, somente dá azo à indenização por danos morais em casos excepcionais, o que não se verifica no caso em tela. Dessa forma, inocorrente o dano moral, sendo afastada, portanto, a condenação à indenização a tal título. Sentença parcialmente mantida pelos seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46, da Lei 9.099/95. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME. (TJRS, Recurso Cível nº 71005435615, Primeira Turma Recursal Cível, rel. Des. Pedro Luiz Pozza, j. 23-04-2015 - grifos nossos) .

           E ainda, desta Corte Estadual de Justiça, colhe-se:

    RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DEMANDA AJUIZADA EM FACE DA CREDORA E DE EMPRESA ESPECIALIZADA EM ASSESSORIA DE COBRANÇA. SUSTENTADA A COBRANÇA INDEVIDA DE DÉBITO JÁ ADIMPLIDO JUNTAMENTE COM AMEAÇAS DE INSCRIÇÃO DO NOME DA AUTORA NO CADASTRO DE ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA AUTORA E SEGUNDA RÉ (BANDEIRA RECUPERAÇÃO DE CRÉDITO E ASSESSORIA DE COBRANÇA LTDA). AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO À SENTENÇA ARGÜIDA EM CONTRARRAZÕES. INSUBSISTÊNCIA. OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART. 514, II, DO CPC. AVENTADA A ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. ALEGAÇÃO DA SEGUNDA RÉ DE QUE SERIA MERA MANDATÁRIA, AGINDO NOS MOLDES DO QUE PREVIA O PACTO FIRMADO COM A CREDORA. CONTRATO NÃO JUNTADO AOS AUTOS. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS SUFICIENTES A VERIFICAR A CONDUTA DA EMPRESA. TESE RECHAÇADA. PRELIMINARES AFASTADAS. MÉRITO. COBRANÇA DE PRESTAÇÕES JÁ PAGAS E AVISO DE POSSÍVEL INSCRIÇÃO NOS CADASTROS DE MAUS PAGADORES EM CASO DE INADIMPLEMENTO. DANO MORAL NÃO VERIFICADO. MERO ABORRECIMENTO. INEXISTÊNCIA DE PROVAS, ADEMAIS, ACERCA DE EVENTUAL COBRANÇA NO LOCAL DE TRABALHO DA AUTORA, ACARRETANDO-LHE ALGUMA SITUAÇÃO VEXATÓRIA. ÔNUS QUE LHE COMPETIA, APESAR DE SE TRATAR DE RELAÇÃO DE CONSUMO. IMPOSSIBILIDADE DE IMPOR ÀS RÉS O DEVER DE CONSTITUIR PROVA NEGATIVA. DESCUMPRIMENTO DO EXIGIDO NO ART. 333, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. SENTENÇA REFORMADA. ANÁLISE DO RECURSO PRINCIPAL PREJUDICADA, POR VERSAR APENAS SOBRE O QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO A TÍTULO DE DANOS MORAIS E CONDENAÇÕES ACESSÓRIAS. RECURSO ADESIVO PARCIALMENTE PROVIDO. Não há que se cogitar em responsabilidade civil por ato ilícito e reparação de danos sem comprovação dos requisitos insculpidos no art. 186 do atual Código Civil. Ademais, é da dicção do art. 333, I, do Código de Processo Civil que incumbe à parte autora o ônus da prova acerca dos fatos constitutivos de seu direito. (AC 2013.009088-9, Des. Marcus Túlio Sartorato, j. 09-04-2013). (grifos)

           Dessarte, não prospera o pedido aventado no recurso de apelação, porquanto não se vislumbra o abalo psíquico capaz de embasar o dano moral: a cobrança indevida, sponte propria, embora renda ensejo à restituição em dobro do indébito, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC, não faz presumir o abalo anímico, cujos contornos devem ser demonstrados de maneira inconteste.

           Por sua vez, em seu recurso adesivo, a empresa ré alega, genericamente, não haver quaisquer ilicitudes a embasar a eventual reparação, mas sim exercício regular do direito, na medida em que os serviços teriam sido efetivamente solicitados pelo consumidor (fls. 118/130).

           Desvela-se que a empresa ré não se desincumbiu de seu ônus de provar os fatos modificativos, extintivos ou impeditivos do direito da apelada (art. 333, inciso II, CPC/1973), conforme acertadamente concluiu o Juízo (fls. 88/93):

    Com efeito, não resta dúvida de que o autor não solicitou os serviços do réu, pois competia à ré comprovar documentalmente a contratação dos serviços e sua utilização, mas não o fez.

    Assim, flagrante a responsabilidade civil da ré, pois providenciou a cobrança dos serviços impugnados, não apresentando justificativa plausível para a forma com que agiu.

    Observo que a relação constituída entre a concessionária de serviços de telecomunicações (fornecedor) e o usuário (destinatário final) é regida pelo Código de Defesa do Consumidor, ainda que prestação deste serviço não tenha se iniciado, a teor dos artigos 2º e 3º da Lei n. 8.078/90.

    É que o Código de Defesa do Consumidor tem como principal objetivo restabelecer o equilíbrio e a igualdade nas relações de consumo, a fim de suprimir a hipossuficiência do mais frágil, que é o consumidor, ora autor.

    Assim, tratando-se de relação de consumo, é de se aplicar o art. 6º, inciso VII do CDC, que impõe a inversão do ônus da prova, desde que verossímeis as alegações do autor e caracterizada sua hipossuficiência diante da parte contrária, que é o caso. Ora, não seria razoável impor ao autor a prova da negativa, pelo que competia à ré acostar aos autos contrato firmado para utilização dos serviços no valor de R$20,92 mensais.

    A propósito:

    "RESPONSABILIDADE CIVIL - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - COBRANÇA INDEVIDA DE VALORES RELATIVOS À INSTALAÇÃO E UTILIZAÇÃO DE LINHA TELEFÔNICA - NEGÓCIO JURÍDICO NÃO PERFECTIBILIZADO - INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO IMOTIVADA - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA ESTABELECIDO EM SENTENÇA - APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - ABALO MORAL PRESUMIDO - PARÂMETROS PARA FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO OBSERVADOS - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO 1. É cabível a inversão do ônus da prova em ação na qual se discute relação de consumo, a teor dos arts. 3º, § 2º, e 6º, VII, do Código de Defesa do Consumidor, inclusive no momento em que o julgador prolata a sentença, tendo em vista o princípio da eventualidade" (TJSC, AC n. 2004.022361-7, de Araranguá, Rel. Des. Marcus Túlio Sartorato).

    Desta forma, indiscutível que a ré agiu abusiva e ilegalmente ao efetuar cobrança de valores decorrentes dos serviços denominados "Comodidade - Pacote de Serviços Inteligentes 2" que o autor nunca utilizou no valor de R$20,92.

    Cabe observar, ainda, que a prova da relação contratual deveria ter sido realizada de forma documental, pelo que não se pode falar em cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado.

    O Superior Tribunal de Justiça já decidiu:

    "CONSUMIDOR - SERVIÇOS DE '90' - 'DISQUE PRAZER' - COBRANÇA - NECESSIDADE DE PRÉVIA SOLICITAÇÃO - CDC, ART. 39, II. A cobrança de serviço de '90' - 'disque-prazer' - sem a prévia solicitação do consumidor constitui prática abusiva (CDC, art. 39, II). Se prestado, sem o pedido anterior, tal serviço equipara-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento (CDC, art. 39, parágrafo único)" (REsp n. 318372/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU de 17.05.204).

    Portanto, a declaração de inexistência do débito é medida de rigor.

    Constatada a cobrança indevida, impõe-se a devolução em dobro do valor cobrado, a teor do art. 42, parágrafo único, do CDC, que estabelece que "o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais".

    Na espécie, restou demonstrada cobrança indevida, devendo a ré devolver, em dobro, o valor referente as faturas pagas pelo autor (fls. 09/45), sob pena de configurar enriquecimento sem causa, a teor do art 876 do Código Civil - grifo nosso.

           É fato incontroverso, portanto, que o autor não tinha quaisquer débitos pendentes para com a empresa de telefonia ré, sendo as cobranças em questão fruto de manifesta falha na prestação dos serviços, ao passo que o desprovimento do recurso adesivo é medida que se impõe.

           Ante o exposto, voto no sentido de conhecer de ambos os recursos e negar-lhes provimento.

           Este é o voto.


Gabinete Desembargador Domingos Paludo