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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0138356-10.2015.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: João Henrique Blasi
Origem: Brusque
Orgão Julgador: Segunda Câmara de Direito Público
Julgado em: Tue Nov 08 00:00:00 GMT-03:00 2016
Juiz Prolator: Cláudia Margarida Ribas Marinho
Classe: Agravo de Instrumento

 


 


Agravo de Instrumento n. 0138356-10.2015.8.24.0000, de Brusque

Relator: Desembargador João Henrique Blasi

   AGRAVO DE INSTRUMENTO. ENERGIA ELÉTRICA. SERVIÇO UTILIZADO COMO INSUMO DE PRODUÇÃO. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO CONSUMERISTA. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CLÁUSULA CONTRATUAL QUE FIXA MULTA PELA RESCISÃO UNILATERAL E ANTECIPADA DO CONTRATO. ABUSIVIDADE NÃO DEMONSTRADA. FALTA DE REQUISITO AUTORIZADOR DA CONCESSÃO DA MEDIDA ANTECIPATÓRIA REQUERIDA. DECISUM MANTIDO. RECURSO DESPROVIDO.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 0138356-10.2015.8.24.0000, da comarca de Brusque, Vara Cível, em que são agravantes RS Reciclagem Têxtil Ltda. (em recuperação judicial) e outro e é agravada Celesc Distribuição S/A.

           A Segunda Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso. Custas legais.

           Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Desembargadores Sérgio Roberto Baasch Luz e Cid Goulart.

           Florianópolis, 8 de novembro de 2016

Desembargador João Henrique Blasi

RELATOR E PRESIDENTE

           RELATÓRIO

           RS Reciclagem Têxtil Ltda. (em recuperação judicial) e Benefios Reciclagem Ltda., via Advogado Samuel Gaertner Eberhardt, interpuseram agravo de instrumento mercê de decisão proferida pela Juíza Cláudia Margarida Ribas Marinho, que, em ação ordinária por ela aforada contra Celesc Distribuição S/A, representada pela Advogada Luciley Maria Lauxen, indeferiu a tutela antecipada requerida (fl. 17).

           Os agravantes asserem a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e a inviabilidade da cobrança de multa, cujo valor consideram abusivo, por rescisão antecipada, requerendo, por isso, a reforma do decisum em ordem a impedir a inscrição da primeira agravante em órgãos de restrição creditícia e o corte no fornecimento de energia elétrica em desfavor da segunda agravante (fls. 2 a 15).

           O Desembargador Luiz Zanelato indeferiu o efeito suspensivo-ativo almejado (fls. 31 a 38).

           Não foram ofertadas contrarrazões (fl. 46).

           O Ministério Público manifestou-se de maneira formal (fls. 49 a 51).

           É o relatório.

           VOTO

           De pronto, do decisum agravado, calha transcrever o excerto que segue:

   Primeiramente, há que se ressaltar que não se trata de relação de consumo, vez que as autoras, pessoas jurídicas de direito privado, utilizam do serviço prestado pela ré como insumo. Além disso, não há que se falar em hipossuficiência das autoras, por serem empresas de grande porte.

  [...]

  Para a concessão da tutela antecipada há que se verificar, em cognição sumária, a existência de prova inequívoca que conduza a verossimilhança da alegação e dano irreparável ou de difícil reparação, havendo a necessidade da presença simultânea dos dois requisitos.

  A verossimilhança da alegação diz respeito a plausibilidade do direito invocado e a probabilidade de que seja reconhecida a procedência dos pedidos ao final da ação. O dano irreparável ou de difícil reparação se configura na possibilidade de causar-se grande prejuízo ao Autor com a demora na resolução do processo.

  Relembre-se, ademais, que a decisão antecipatória é realizada em cognição sumária e pode ser revista a qualquer tempo (art. 273, § 4º, do CPC).

  Dito isso, verifica-se, pelo menos em cognição sumária, que não há qualquer abusividade da cláusula que estipulou a multa pela rescisão unilateral e antecipada do contrato, pois estipulada com o fim de compensar o investimento realizado pela ré, a qual obteria vantagens financeiras se mantido o negócio até o final da sua vigência.

  Ademais, pretende a parte autora fazer crer que a multa é inexigível, visto que a rescisão antecipada do contrato foi motivada unicamente por motivo de força maior, qual seja, a crise financeira que atingiu todo o setor têxtil, inclusive as autoras, culminando na recuperação judicial destas.

  No entanto, não há qualquer razão que assista à parte autora, pois denomina de força maior o que, na realidade, se trata de risco do empreendimento.

  "Não se constitui caso fortuito ou de força maior, dentre outros, a crise econômica ou financeira e o insucesso devido a risco próprio da natureza de certos contratos" (Apelação Cível n. 1998.002413-7 do TJSC, j. 17-08-2000).

  Ressalta-se que a rescisão contratual antecipada e unilateral ocorreu exclusivamente por culpa da primeira requerente, que deixou de exercer suas atividades no local objeto do contrato, tendo, inclusive, afirmado que nada tinha a se opor quanto ao encerramento do contrato (fl. 04).

  Afirma a parte autora, também, que, diante da incorporação das empresas, a segunda requerente assumiu todos os débitos da primeira, inclusive a multa (fl. 02), o que daria legitimidade à ré para cobrança da multa da segunda requerente.

  Assim, ausente o requisito da verossimilhança das alegações, indefiro o pedido de tutela antecipada. (fls. 17 e 17 v.)

           Ademais, da decisão unipessoal que indeferiu o efeito suspensivo vindicado, faz-se oportuno escandir o seguinte fragmento:

  Segundo a interpretação que segue a teoria finalista do conceito de consumidor, necessário ponderar, em se tratando de pessoa jurídica, qual é a destinação do produto adquirido.

  Na causa vertente, a energia elétrica é utilizada como insumo de produção, vez que a parte agravante necessita da energia elétrica para produzir seus produtos, portanto, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, não devem ser consideradas consumidoras, pois o insumo energia elétrica é parte integrante do ciclo de produção. Destaca-se:

  PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. UTILIZAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA COMO INSUMO. AUSÊNCIA DE VULNERABILIDADE. NÃO INCIDÊNCIA DO CDC. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

  1. Esta Corte Superior adota a teoria finalista para a definição do conceito de consumidor, motivo pelo qual não se aplica a legislação consumerista quando o usuário do serviço utiliza a energia elétrica como insumo, como se verifica no caso dos autos.

  2. O que qualifica uma pessoa jurídica como consumidora é aquisição ou utilização de produtos ou serviços em benefício próprio; isto é, para satisfação de suas necessidades pessoais, sem ter o interesse de repassá-los a terceiros, nem empregá-los na geração de outros bens ou serviços. Desse modo, não sendo a empresa destinatária final dos bens adquiridos ou serviços prestados, não está caracterizada a relação de consumo (AgRg no REsp 916.939/MG, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJe 03.12.2008). (grifou-se).

  3. Agravo Regimental desprovido. (AgRg no REsp 1331112/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/08/2014, DJe 01/09/2014)

  [...]

  Vai daí que não se aplica a legislação consumerista à esta causa.

  Tecida tal premissa, passa-se à análise da multa contratual e suas consequências.

  Insurgem-se as agravantes de que a multa em razão da rescisão contratual é indevida, pois a interrupção das atividades no parque fabril da agravante RS Reciclagem foi motivada por força maior, consubstanciada na crise econômica que a assolou, resultando em plano de recuperação judicial, que culminou em sua incorporação pela agravante Benefios.

  Conforme fundamentado pelo juízo da origem, a crise econômica são se enquadra no conceito de força maior, vez que é risco que todo empreendimento é submetido.

  Ao tecer comentário acerca do art. 393 do Código Civil, que exonera o devedor do pagamento dos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, Maria Helena Diniz leciona:

  Requisito objetivo e subjetivo da força maior e do caso fortuito. O requisito objetivo da força maior ou do caso fortuito configura-se na inevitabilidade do acontecimento, e o subjetivo na ausência de culpa na produção do evento. (Código Civil Anotado. 14ª. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 342).

  À luz de tal consideração, é possível verificar que a crise econômica enfrentada pelas agravantes não se traduz em força maior, pois impossível dizer que era inevitável, bem com que ausente a culpa.

  [...]

  Logo, não há força maior a ser reconhecida.

  A multa, por sua vez, possui previsão no contrato (cláusula vigésima, p. 164-v, anexo 1 de 1), no seguintes termos:

  CLÁUSULA VIGÉSIMA - A rescisão do contrato durante a vigência implica, sem prejuízo de outras estabelecidas pelas normas e dmais CLÁUSULAS, ANEXOS e condições formadas neste Contrato, as seguintes cobranças pela Distribuidora:

  I. valor correspondente ao faturamento de todo MUSD contratado subsequente à data da rescisão, limitado a 6 (seis meses), para os Horários de Ponta e Fora de Ponta, quando aplicável; e

  II. valor correspondente ao faturamento dos montantes mínimos previstos na Resolução Normativa da ANEEL nº 414/2010, pelos meses remanescentes além do limite fixado no INCISO I desta CLÁUSULA, para o Horário Fora de Ponta.

  Considerando que a cláusula terceira do mesmo contrato (fl. 160-v), dispõe que, após o mês de abril de 2014, suas prorrogações seriam automáticas e sucessivas pelo período de 12 (doze) meses, salvo oposição do contratante, o que não ocorreu nesta causa, ausente a verossimilhança do direito alegado nesta fase da lide.

  Salienta-se, ainda, que a incidência da multa não está vinculada ao investimento prévio pela agravada, sendo irrelevantes, portanto, os argumentos das recorrentes neste sentido.

  Ademais, as agravantes não demonstraram com êxito a abusividade da cláusula supramencionada, haja vista que a mera alegação, sem ponderar acerca das razões que a tornam abusiva, não induz à verossimilhança do que alega.

  Nesse contexto fático e jurídico, não se visualiza plausibilidade na fundamentação recursal (fumus boni juris) e, por sua vez, o suposto dano proveniente do cumprimento da decisão recorrida, não obstante sua aparência de realidade, não se apresenta contra o direito, mas sim é consequência dele, deste modo não restando configurados, na espécie, os pressupostos exigidos no art. 558, caput, do CPC, sem que a decisão de primeiro grau não pode ser sustada. (fls. 34 a 38)

           Ao que se observa a decisão recorrida desnuda-se acertada, pois, in casu, a energia elétrica é utilizada como insumo de produção, não se caracterizando relação de consumo, daí porque não se faz aplicável a legislação consumerista, ademais do que não há, nos autos, prova convincente, ao menos nesta fase, da verossimilhança da alegada inexigibilidade da multa contratual por rescisão unilateral e antecipada do contrato. Por via consequencial não se mostra satisfeito o regrado pelo art. 273 do Código de Processo Civil de 1973 (norma processual vigente à época da prolação do decisum recorrido e correspondente ao art. 300 do NCPC). 

           É o quanto basta, a título de argumentação, endossando o assentado pela interlocutória agravada e pela decisão denegatória do efeito suspensivo, para desautorizar a pretensão recursal sob exame, ressalvando, ademais, e por fim, a natureza angusta da cognição em sede de agravo de instrumento.

           Frente ao expendido voto pelo desprovimento do recurso.


Gabinete Desembargador João Henrique Blasi