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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0005757-57.2009.8.24.0020 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Salete Silva Sommariva
Origem: Criciúma
Orgão Julgador: Segunda Câmara Criminal
Julgado em: Tue Jun 07 00:00:00 GMT-03:00 2016
Juiz Prolator: Karina Maliska Peiter
Classe: Apelação

 


 

ESTADO DE SANTA CATARINA

       TRIBUNAL DE JUSTIÇA


Apelação n. 0005757-57.2009.8.24.0020, de Criciúma

Relatora: Desa. Salete Silva Sommariva

   APELAÇÃO CRIMINAL - ESTUPRO DE VULNERÁVEL EM CONTINUIDADE DELITIVA CONTRA TRÊS VÍTIMAS (CP, ART. 217-A COM APLICAÇÃO DA PENA PREVISTA NO REVOGADO ART. 214, C/C ART. 71, P. ÚNICO). - DELITO PRATICADO ANTERIORMENTE À EDIÇÃO DA LEI N. 12.015/09 - DECISÃO COLEGIADA DESTE TRIBUNAL QUE AFASTOU A INCIDÊNCIA DO ART. 9º DA LEI N. 8.072/90 E APLICOU A PENA OBSERVANDO OS LIMITES PREVISTOS NO ART. 214 DO CP - IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL QUANTO AO PONTO EM RECURSO ESPECIAL - PROVIMENTO DO RECLAMO PELA CORTE SUPERIOR - DEVOLUÇÃO DOS AUTOS PARA ELABORAÇÃO DE NOVA DOSIMETRIA - REPRIMENDA RECALCULADA COM BASE NA SANÇÃO DO ART. 217-A DO CP.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n. 0005757-57.2009.8.24.0020, da comarca de Criciúma (1ª Vara Criminal) em que é Apelante/Apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina e Apelado/Apelante E. de M. L.:

           A Segunda Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, em cumprimento à decisão do Superior Tribunal de Justiça, fixar a pena de E. de M. L. em 21 (vinte e um) anos de reclusão, mantidas as demais determinações do acórdão de fls. 199/214. Custas legais.

           Participaram do julgamento, realizado em 07 de junho de 2016, os Exmos. Srs. Des. Sérgio Rizelo e Getúlio Corrêa.

           Florianópolis, 08 de junho de 2016.

Salete Silva Sommariva

PRESIDENTE E RELATORA

 

           RELATÓRIO

           A representante ministerial, oficiante na 1ª Vara Criminal da comarca de Criciúma (SC), ofereceu denúncia em face de E. de M. L., dando-o como incurso nas sanções dos arts. 136, § 3º e 214 c/c art. 226, inc. II (por várias vezes), e art. 71, todos do Código Penal, e art. 9º da Lei n. 8.072/90, quanto à vítima J. C. D. C., nas penas dos arts. 136, § 3º e 214 c/c arts. 224, letras "a" e "c", e 226, inc. II, todos do Estatuto Repressivo, quanto à vítima A. J. D. C., nas reprimendas dos arts. 136, § 3º, e 214 c/c arts. 226, inc. II (por duas vezes) e 71, todos do Código Penal e art. 9º da Lei dos Crimes Hediondos, quanto à vítima M. A. D., e nas penas dos arts. 214 c/c 224, letra "a", ambos do Estatuto Repressivo, quanto à vítima A. B. G., em virtude dos fatos assim narrados na exordial acusatória:

    Consta que em datas e número de vezes ignorados, sob sérias ameaças de agressão física e de morte, inclusive por envenenamento, o denunciado constrangeu seu enteado J. C. D. C. a praticar e permitir que com ele praticasse atos libidinosos diversos da conjunção carnal, ora consistentes em obrigar a criança a mexer e sugar no pênis do implicado, e ora a praticar com o infante sexo anal, até a satisfação de sua lascívia.

    Abusando da sua condição de padrasto bem como sob temor reverenciai, consta, ainda, que em data e circunstâncias a serem esclarecidas durante a instrução criminal, E. de M. L. constrangeu sua enteada A. J. D. C. a permitir que com ela praticasse ato libidinoso diverso da conjunção carnal, consistente em manipular a vagina da criança, também com a finalidade de satisfazer a sua concupiscência.

    Da mesma forma, em data incerta, abusando da qualidade de padrasto e mediante sérias ameaças de agressão física e de morte certa, E. de M. L. colocou seu pênis para fora das calças, compelindo seu enteado M. A. D. a sentar em seu colo e, concomitantemente, manipulou os órgãos genitais da criança até satisfazer a sua própria lascívia.

    Por fim, revela o inquérito policial que no dia 10 de março de 2009, mediante a costumeira violência moral, especialmente dirigidas contra seus enteados, o denunciado constrangeu M. A. D. e a criança A. B. G. a praticar ato libidinoso diverso da conjunção carnal, entre si, obrigando ambos a desnudarem-se. Em seguida, E. de M. L. compeliu M. A. D. a deitar-se de bruços sobre a cama e A. B. G. sobre o mesmo, impondo a este que esfregasse seu órgão genital nas nádegas daquele, enquanto que a tudo assistia, também com o fim de satisfazer sua libido.

    Não bastasse tudo isso, os autos revelam também que o denunciado, reincidente em crime contra os costumes (fls. 38/40), habitualmente submetia seus enteados J. C. D. C., M. A. D. e A. J. D. C. a maus tratos, na medida em que, abusando de meios de correção ou disciplina, os agredia fisicamente, expondo a perigo e ferindo a integridade física das crianças, tanto que, em uma oportunidade, desferiu um tapa no rosto da pequena A. J. D. C., causando-lhe a lesão corporal descrita no auto de exame de corpo de delito de fls. 22.

    A habitual personalidade violenta do denunciado, sem dúvidas, nos momentos que antecediam as práticas sexuais abusivas impingiam, especialmente aos enteados J. C. D. C. e M. A. D., a certeza quanto a inevitabilidade e gravidade do mal anunciado pelo mesmo, motivo pelo qual caracterizada violência real moral e não ficta quanto aos delitos a que submetidos os garotos nominados, permitindo, desta forma, a incidência da causa de aumento de pena do art. 9o da Lei n. 8.072 (Lei dos crimes hediondos), segundo moderna e dominante jurisprudência.

           Concluída a instrução criminal, a denúncia foi julgada parcialmente procedente, para absolver o acusado da prática do delito previsto no art. 136, § 3º, do Código Penal, e condená-lo como incurso no crime previsto no art. 217-A (por sete vezes), contra as vítimas J. C. D. C., M. A. D. e A. B. G., com as seguintes reprimendas, respectivamente: 21 (vinte e um) anos de reclusão; 21 (vinte e um) anos e 9 (nove) meses de reclusão; e 17 (dezessete) anos e 4 (quatro) meses de reclusão. Na sequência, a magistrada fez incidir a regra da continuidade delitiva específica entre os delitos, fixando a sanção aflitiva em 43 (quarenta e três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, a ser resgatada em regime fechado, negado o direito de recorrer em liberdade, porque permaneceu preso durante a instrução e por estarem presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal.

           Insatisfeitos com a prestação jurisdicional, tanto o representante do Ministério Público como o sentenciado apelaram.

           A acusação requereu a manutenção da continuidade delitiva em relação aos crimes perpetrados contra cada uma das vítimas, com a aplicação da regra do concurso material entre os delitos praticados contra ofendidos diversos, ao invés da continuidade delitiva.

           A defesa, por sua vez, postulou a absolvição por ausência de provas, aduzindo que "os crimes imputados ao acusado não passaram de ficção; uma história forjada para lhe prejudicar". Alternativamente, pleiteou a aplicação da pena mínima, a isenção do pagamento das custas e o arbitramento de verba honorária ao causídico, com a expedição da respectiva certidão de URH's.

           Após as contrarrazões e o parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça, esta Segunda Câmara Criminal, em sessão ocorrida em 19-8-2010, decidiu negar provimento ao recurso ministerial e dar parcial provimento ao recurso da defesa, minorando a sanção final para 16 (dezesseis) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

           Irresignado, o representante do Ministério Público interpôs Recurso Especial (fls. 230/237), ao qual, em decisão monocrática proferida em 27-8-2015, o Min. Feliz Fischer, com fulcro no art. 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil (1973), deu provimento para reconhecer a incidência do art. 9º da Lei n. 8.072/90 e, em razão disso, determinar que a pena do recorrido fosse recalculada com base na sanção prevista no art. 217-A do Código Penal.

           Contra referida decisão o acusado interpôs agravo regimental (fls. 310/314), o qual restou desprovido pela Corte Superior.

           Após, retornaram os autos a este Tribunal de Justiça.

           VOTO

           Trata-se de cumprimento de decisão exarada pelo Min. Feliz Fischer do Superior Tribunal de Justiça que, em decisão monocrática proferida em 4-4-2014, com fulcro no art. 557, §1º-A, do Código de Processo Civil (1973), deu provimento ao Recurso Especial interposto pelo Ministério Público para reconhecer a incidência, ao caso, do art. 9º da Lei n. 8.072/90 e, em razão disso, determinar que a pena do recorrido fosse recalculada com base na sanção prevista no art. 217-A do Código Penal.

           Em assim sendo, mantidos os direcionamento lá esposados, deve apenas ser retificada a dosimetria efetivada no acórdão de fls. 199/214, que partiu dos limites do revogado art. 214 do Código Penal para fixação da pena (6 a 10 anos de reclusão), a fim de que seja levado em consideração os limites de 8 (oito) a 15 (quinze) anos de reclusão estabelecidos no art. 217-A do Código Penal.

           1 Dos dois crimes cometidos contra J. C. D. C.

           Na primeira fase, mantém-se a fixação da pena no mínimo legal, o que leva a sanção privativa de liberdade a 8 (oito) anos.

           Na etapa seguinte, majora-se a reprimenda em 1 (um) ano, nos termos do acórdão, em razão da reincidência específica.

           Na terceira fase, incide a causa de aumento do art. 226, II, do Código Penal (1/2), resultando a pena em 13 (treze) anos e 6 (seis) meses de reclusão.

           Aplica-se, por fim, a continuidade delitiva, em 1/6 (um sexto), restando a pena final arbitrada em 15 (quinze) anos e 9 (nove) meses de reclusão.

           2 Dos dois crimes cometidos contra M. A. D.

           Na primeira fase, mantém-se a fixação da pena no mínimo legal, o que leva a sanção privativa de liberdade a 8 (oito) anos.

           Na etapa seguinte, majora-se a reprimenda em 1 (um) ano, nos termos do acórdão, em razão da reincidência específica.

           Na terceira fase, incide a causa de aumento do art. 226, II, do Código Penal (1/2), resultando a pena em 13 (treze) anos e 6 (seis) meses de reclusão.

           Aplica-se, igualmente, a continuidade delitiva, em 1/6 (um sexto), restando a pena final arbitrada em 15 (quinze) anos e 9 (nove) meses de reclusão.

           3 Do crime cometido contra A. B. G.

           Na primeira fase, mantém-se o aumento da pena basilar em 1 (um) ano em razão da negativação das circunstâncias do crime, o que leva a sanção privativa de liberdade a 9 (nove) anos.

           Na etapa seguinte, majora-se a reprimenda em 1 (um) ano, nos termos do acórdão, ante o reconhecimento da reincidência específica.

           Na terceira fase, não há causas especiais de aumento ou diminuição de pena, motivo pelo qual resulta a pena final em 10 (dez) anos de reclusão.

           4 Da continuidade específica

           Considerando o reconhecimento da continuidade delitiva específica entre os delitos perpetrados contra as três vítimas, exaspera-se, conforme fracionário fixado no acórdão anterior, a pena relativa ao delito mais grave no patamar de 1/3 (um terço), resultando a reprimenda definitiva fixada em 21 (vinte e um) anos de reclusão, mantidas as demais cominações do acórdão de fls. 199/214.

           À vista do exposto, o voto é no sentido de, em cumprimento à decisão do Superior Tribunal de Justiça, fixar a pena de E. de M. L. em 21 (vinte e um) anos de reclusão, mantidas as demais determinações do acórdão de fls. 199/214.


Gabinete Desa. Salete Silva Sommariva