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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0002779-58.2010.8.24.0025 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Jorge Luis Costa Beber
Origem: Gaspar
Orgão Julgador: Segunda Câmara de Direito Civil
Julgado em: Thu May 05 00:00:00 GMT-03:00 2016
Juiz Prolator: João Baptista Vieira Sell
Classe: Apelação

 

Apelação Cível n. 2014.057543-8, de Gaspar

Relator: Des. Jorge Luis Costa Beber

   APELAÇÃO CÍVEL. CONFIRMAÇÃO, REGISTRO E CUMPRIMENTO DE TESTAMENTO PARTICULAR. INSURGÊNCIA DOS HERDEIROS.

   CERCEAMENTO DE DEFESA. DESCUMPRIMENTO DO PRAZO A QUE ALUDE O ART. 1.132 DO CPC/73. DESACOLHIMENTO. POSSIBILIDADE DE IMPUGNAR O TESTAMENTO, NO PRAZO DE CINCO DIAS, CONTADOS DA AUDIÊNCIA, EXPRESSAMENTE CONSIGNADA NA CARTA DE INTIMAÇÃO REGULARMENTE RECEBIDA.

   APELANTES QUE, ACOMPANHADOS DE ADVOGADO, PRESENTES NA AUDIÊNCIA PARA INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS TESTAMENTÁRIAS, NADA QUESTIONARAM, TAMPOUCO SE INSURGIRAM COM A REMESSA DOS AUTOS AO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA O DERRADEIRO PARECER. JUNTADA DE PETIÇÃO POSTERIOR, COM APRESENTAÇÃO DOS INSTRUMENTOS DE MANDATO, NOVAMENTE SEM QUALQUER IRRESIGNAÇÃO CONTRA OS ATOS PROCESSUAIS PRATICADOS. PRECLUSÃO.

   Se a matéria decidida no curso do processo não abarca direito indisponível, a ausência de regular impugnação traduz inegável aceitação com o teor do que deliberado, obstando ulterior discussão em torno da mesma temática, já fulminada pela preclusão.

   RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2014.057543-8, da comarca de Gaspar (2ª Vara Cível), em que são apelantes Rosana de Oliveira Heinig e outros, e apelada Marly de Oliveira Piazza:

           A Segunda Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

           O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Des. Newton Trisotto, com voto, e dele participou o Exmo. Des. Sebastião César Evangelista. Funcionou como Representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Mário Luiz de Melo.

           Florianópolis, 5 de maio de 2016.

Jorge Luis Costa Beber

Relator

 

RELATÓRIO

           Rosana de Oliveira Heinig e outros interpuseram recurso de apelação cível contra sentença que, nos autos do procedimento especial de jurisdição voluntária ajuizado por Marly de Oliveira Piazza, confirmou, determinou o registro, o arquivamento e o cumprimento do testamento particular deixado por Maurina de Oliveira.

           Alegam que houve cerceamento de defesa, pois não tiveram a oportunidade de se manifestar a respeito do testamento, nos termos do art. 1.132 do CPC/73.

           Destacam que, ao contrário do que anunciou o magistrado singular, não manifestaram concordância em audiência e não lhes foi concedido prazo para a devida impugnação.

           Afirmam que os depoimentos das testemunhas não coincidem com o testamento, pois o legado instituído não foi de 50% do patrimônio da testadora, mas de dois bens específicos - um apartamento e uma vaga de garagem - conforme documentos encartados aos autos.

           Questionam, por isso, a presença dos testigos no ato de disposição de última vontade, salientando, ainda, que suas assinaturas foram reconhecidas por autenticidade 3 (três) dias depois da lavratura do testamento e do reconhecimento da firma da testadora, que ocorreu em 29.07.2003.

           Por fim, postulam o provimento do recurso.

           Contrarrazões às fls. 86/94.

           O representante do Ministério Público não apresentou manifestação (fls. 107/108).

           Em seguida, vieram-me conclusos. 

VOTO

           Presentes os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, o recurso deve ser conhecido.

           O apelo envereda contra a sentença que confirmou o testamento particular deixado por Maurina de Oliveira em favor da filha Marly de Oliveira Piazza.

           O ponto fulcral da insurgência dos apelantes dimana do fato de não ter sido oportunizada a manifestação a que alude o art. 1.132 do CPC.

           Razão não lhes assiste.

           Com efeito, a aludida norma adjetiva, vigente à época dos fatos, continha a seguinte redação:

    "Art. 1.132 - "Inquiridas as testemunhas, poderão os interessados, no prazo comum de 5 (cinco) dias, manifestar-se sobre o testamento".

           O culto e operoso magistrado Cássio José Lebarbenchon Angulski, atento ao procedimento regrado pelos arts. 1.130 a 1.133 do CPC/73, ao lançar o despacho que se encontra às fls. 26/28, ordenando as intimações necessárias, deixou expressamente consignado:

     "Após as inquirições, poderão os interessados manifestarem-se no prazo comum de 5 (cinco) dias, isso se não fizerem a manifestação de concordância na própria audiência" (Grifei).

           Desse ato, os interessados, ora apelantes, tomaram plena ciência, tal como se infere dos escritos que se encontram às fls. 32/34 (cartas de intimação) e fls. 39, 43 e 45 (avisos de recebimento e mandado de intimação).

           Não bastasse isso, os recorrentes compareceram na solenidade de oitiva das testemunhas testamentárias, acompanhados de advogado, na qual lhes foi oportunizado os questionamento que entendessem pertinentes, conforme timbrado às fls. 49/54, nada sendo indagado.

            Ainda, no termo de audiência foi concedido prazo para juntada dos instrumentos de mandato e expressamente consignado que "os autos fossem com vista ao Representante Ministerial, e na sequência conclusos para a prestação jurisdicional" (fl. 54).

           Dessume-se, portanto, que desde o despacho que repousa às fls. 26/28 os apelantes estavam cientes de que poderiam apresentar qualquer impugnação no prazo de 5 (cinco) dias após a inquirição das testemunhas; além disso, diante da ausência de qualquer questionamento na audiência, lhes foi expressamente informado que os autos seguiriam com vistas ao Ministério Público e posteriormente conclusos para sentença, ponto sobre o qual não se insurgiram.

           Ora, havendo regular intimação de todos aqueles a que alude o art. 1.131 do CPC/73, estando eles presentes na audiência e acompanhados de advogado, deixando de oferecer qualquer manifestação, seja na própria solenidade ou nos cinco dias subsequentes, embora previamente alertados desta faculdade, não há como não reconhecer a respectiva preclusão, como, aliás, defende JOÃO PAULO LUCENA, na obra Comentários ao Código de Processo Civil, Revista dos Tribunais, vol. 15., pg. 178).

           Mas não é só. Após a audiência, no prazo que lhe foi conferido, o patrono dos apelantes peticionou pleiteando a juntada dos instrumentos de mandato, deixando, também nessa de ocasião, de anunciar qualquer vício na tramitação do procedimento.

           As nulidades, sabe-se, devem ser sempre deduzidas na primeira oportunidade em que couber à parte manifestar-se no autos, sob pena de preclusão consumativa (art. 245 CPC/73), que incide sobre todas as questões decididas no curso da ação. O processo, rememoro, deve ser compreendido como um conjunto de atos contínuos à frente, sendo essa, aliás, a mens legis da aludida norma, vedando retrocessos indesejáveis na marcha processual.   
  Em resumo: se os apelantes foram pessoalmente intimados acerca do prazo de cinco dias para eventual impugnação após a audiência, deixando fluir o aludido interregno sem qualquer manifestação, não vejo como acolher as insurgências anunciadas no presente apelo.

           Oportuno enfatizar, de outra parte, qual a exata finalidade da natureza processual sob análise, citando-se, para tanto, a lição de ALEXANDRE DE FREITAS CÂMARA:

    "Pode se definir o procedimento regulado pelos arts. 1.125 a 1.141 do CPC como aquele destinado "a conhecer a declaração de última vontade do morto, verificar a regularidade formal do testamento (ou codicilo) e ordenar seu cumprimento". Neste procedimento, o juiz não examina nem profere decisão sobre os requisitos intrínsecos do ato de última vontade, apenas lhe examina os requisitos formais. Assim sendo, a aprovação do testamento (ou codicilo) não impede seja ele, posteriormente, impugnado em processo de jurisdição contenciosa, ainda que por vício formal, já que, como se sabe, a decisão proferida em processo de jurisdição voluntária não alcança a autoridade de coisa julgada material."  (Lições de Direito Processual Civil, Vol. III, 6ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p.582/583).

           Nesse exato sentido a orientação do Tribunal de Justiça de São Paulo no julgamento do Agravo de Instrumento n. 204.194-4/6-00, da Comarca de Monte Alto, Relator o Des. Quaglia Barbosa:

    "o processamento é apenas de confirmação deste testamento, para seu ulterior registro, arquivo e cumprimento (arts. 1.133, c.c. 1.126, CPC), mais nada; o que não impedirá, se for o caso, se discuta sobre sua validade ou não pelas vias ordinárias, já que no juízo de confirmação do ato realiza este valoração perfunctória apenas de seus requisitos de validade, determinando aquelas providências 'se lhe não achar vício externo, que o torne suspeito de nulidade ou falsidade' (1.126, CPC)" (fls. 76).

    Em suma: "o juiz somente negará registro ao testamento se ele padecer de vício externo; eventuais defeitos quanto à formação e manifestação de vontade do testador deverão ser apreciados ou no inventário ou em ação de anulação (J.T.J. 157/197)" (apud THEOTÔNIO NEGRÃO, "Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor", ed. Saraiva, São Paulo, 1999, nota 1 ao art. 1.126, p. 888).

           O Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul também já decidiu nessa mesma linha, realçando que as questões intrínsecas ao testamento, quando o caso, devem ser suscitadas por meio da competente ação ordinária:

    "APELAÇÃO CÍVEL - ABERTURA, REGISTRO E CUMPRIMENTO DE TESTAMENTO - NÃO HÁ QUALQUER NULIDADE DE REPRESENTAÇÃO OU CITAÇÃO POSTO QUE TODOS OS HERDEIROS SE MANIFESTARAM NOS AUTOS COM PROCURADORES REGULARMENTE HABILITADOS - PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA - ALEGAÇÃO DE DESÍDIA DOS ADVOGADOS - AFASTADA - MÉRITO - CONFIRMAÇÃO DO TESTAMENTO POR 3 TESTEMUNHAS EM AUDIÊNCIA - INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 1.876 E 1.878 AMBOS DO CÓDIGO CIVIL - TESTEMUNHAS CONTESTES E HARMÔNICAS NAS DECLARAÇÕES - VERACIDADE DO ATO - EXIGÊNCIAS LEGAIS DO ARTIGO 1.133 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL CUMPRIDAS - QUALQUER QUESTÃO INTRÍNSECA DO TESTAMENTO DEVE SER ANALISADA EM PROCEDIMENTO PRÓPRIO, QUAL SEJA, AÇÃO DE ANULAÇÃO - PREQUESTIONAMENTO - NÃO PROVIDO.

    Não há qualquer nulidade de representação, posto que as partes estão regularmente representadas por procuradores habilitados. Citação por edital não comprometeu a resposta, visto que todos os herdeiros necessários manifestaram-se nos autos. Preliminar de cerceamento de defesa afastada porquanto a irresignação com os advogados devem ser discutidas em ação própria. Ademais, verifica-se que a apelante foi por eles acompanhada em audiência, sem impugnar qualquer ato, operando-se a preclusão. O Testamento Particular segue as regras dos artigos 1.876 e 1.878 do Código Civil, sendo que sua confirmação ocorre quando as testemunhas forem contestes sobre o fato da disposição e reconhecerem suas assinaturas, bem como a do testador. In casu, foram cumpridas as exigências com a oitiva das testemunhas, de maneira que o disposto no artigo 1.133 do Código de Processo Civil estabelece que o magistrado reconhecerá autêntico, ouvido o Ministério Público que manifestou-se favorável. Questões intrínsecas relacionadas ao testamento, como reserva da parte legítima ou manifestação de vontade devem ser analisadas em procedimento próprio, ou seja, através de ação anulatória, sendo que a Abertura, Registro e Cumprimento de Testamento apenas discute a validade do referido ato de vontade. Não há necessidade de manifestação expressa sobre todos os dispositivos legais lançados por ocasião do recurso se o magistrado encontrou fundamento suficiente para motivar a decisão." (TJMS, Apelação Cível 2010.021650-1, de Campo Grande, rel. Des. Divoncir Schreiner Maran, j. 17.8.2010). (grifei).

           Na caso em liça, penso eu, agiu com acerto o magistrado singular, pois restaram efetivamente cumpridos os requisitos timbrados no art. 1.876 do Código Civil: a testadora era plenamente capaz, dispôs de parcela não abrangida pela legítima, o fez na presença de três testemunhas cujas assinaturas foram devidamente chanceladas por tabeliã, o que lhes confere incontestável veracidade e autenticidade, pouco importando a data em que foram reconhecidas.

           Ademais, ao contrário do que sugerem os apelantes, as testemunhas corroboraram em juízo a presença no ato da declaração de última vontade, sem deixar quaisquer dúvidas a respeito da sua realização. O fato de terem mencionado que a testadora dispôs de 50% do seu patrimônio em nada prejudica a confirmação do testamento, porquanto foram enfáticas e devidamente esclarecidas ao dizerem que o legado consistia em um apartamento e respectiva vaga de garagem situados no município de Balneário Camboriú (fls. 49, 51 e 53).

           Registro, ainda, que a ilustre representante do Parquet nada opôs à confirmação do testamento. Veja-se:

    "(...) Considerando que inexistem indícios que a última vontade da autora tenha sofrido qualquer tipo de influência ou coação, além de ter sido devidamente reconhecido por três (03) testemunhas como autêntico, pugna o Ministério Público pela confirmação, registro, arquivamento e cumprimento do testamento particular, com esteio nas disposições do artigo 1.133 do Código de Processo Civil." (fl. 65).

           Em caso análogo, pronunciei-me:

    "APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÕES CONEXAS. SENTENÇAS DE IMPROCEDÊNCIA. AÇÃO VISANDO A CONFIRMAÇÃO E CUMPRIMENTO DE TESTAMENTO PARTICULAR. PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. ANÁLISE DOS REQUISITOS FORMAIS. TESTAMENTO REDIGIDO DE PRÓPRIO PUNHO PELO TESTADOR, DEIXANDO TODOS OS SEUS BENS PARA A ESPOSA.

    (...) HIPÓTESE ENFOCADA EM QUE A EXISTÊNCIA DO TESTAMENTO E A MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DO TESTADOR, TAL COMO REGISTRADA NO MENCIONADO ESCRITO, FORAM CONFIRMADAS PELAS TESTEMUNHAS. 

    LEITURA DO TESTAMENTO PELO TESTADOR PARA UMA DELAS. RECONHECIMENTO DAS ASSINATURAS, COM A FIRMA DO AUTOR DO TESTAMENTO CHANCELADA POR TABELIÃ. AUTENTICIDADE E VERACIDADE DO TESTAMENTO INCONTESTES. POSSIBILIDADE DE CONFIRMAÇÃO. 

    "Não há falar em nulidade do ato de disposição de última vontade (testamento particular), apontando-se preterição de formalidade essencial (leitura do testamento perante as três testemunhas), quando as provas dos autos confirmam, de forma inequívoca, que o documento foi firmado pelo próprio testador, por livre e espontânea vontade, e por três testemunhas idôneas, não pairando qualquer dúvida quanto à capacidade mental do de cujus, no momento do ato. O rigor formal deve ceder ante a necessidade de se atender à finalidade do ato, regularmente praticado pelo testador." (REsp 828.616/MG, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/09/2006, DJ 23/10/2006, p. 313). (...)" (TJSC, Apelação Cível n. 2015.010651-1, de Mafra, deste relator, j. 30.04.2015). (grifei)

           Ante o exposto, voto pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

           É como voto.


Gabinete Des. Jorge Luis Costa Beber