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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0000901-47.2009.8.24.0021 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Luiz Fernando Boller
Origem: Cunha Porã
Orgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Público
Julgado em: Tue May 03 00:00:00 GMT-03:00 2016
Juiz Prolator: Samuel Andreis
Classe: Apelação

 


 


Apelação n. 0000901-47.2009.8.24.0021 e Apelação n. 0013458-41.2010.8.24.0018

Relator: Desembargador Luiz Fernando Boller

   APELAÇÕES CÍVEIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. INTERNAÇÃO DA VÍTIMA EM HOSPITAL PRIVADO. CONTROVÉRSIA ACERCA DA RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DOS SERVIÇOS HOSPITALARES.

   INSURGÊNCIA DOS AUTORES NA AÇÃO ORDINÁRIA.

   ALEGAÇÃO DE QUE O ESTADO DEVE ARCAR COM A SATISFAÇÃO DAS DESPESAS MÉDICO-HOSPITALARES EFETUADAS NO TRATAMENTO DO SEU FILHO JUNTO À UNIMED. TESE SUBSISTENTE. INTERNAÇÃO EM NOSOCÔMIO PARTICULAR QUE SE DEU TÃO SOMENTE EM RAZÃO DA INEXISTÊNCIA DE LEITO DISPONÍVEL NA UTI DA REDE PÚBLICA DE SAÚDE. ENCAMINHAMENTO EFETUADO PELA SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE. DEVER DO ESTADO EM PROPICIAR OS MEIOS ESSENCIAIS AO GOZO DO DIREITO À SAÚDE. ART. 24 DA LEI Nº 8.080/90.

   "Não viola legislação federal a decisão judicial que impõe ao Estado o dever de garantir a internação em UTI conforme orientação médica e, inexistindo vaga na rede pública, arcar com os custos da internação em hospital privado" (STJ - AgRg no AREsp nº 807.820, do Paraná. Relator Ministro Humberto Martins, julgado em 17/12/2015).

   RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

   APELO DA EMBARGANTE NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO.

   EXECUÇÃO ENCETADA POR UNIMED. TERMO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA FIRMADO PELA GENITORA DO PACIENTE, SOB SUBJUGADA COAÇÃO. EMBARGOS OPOSTOS COM O OBJETIVO DE AFASTAR A SATISFAÇÃO DO DÉBITO.

   RECONHECIMENTO, NA AÇÃO ORDINÁRIA, DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELO PAGAMENTO DO CUSTO TOTAL DO INTERNAMENTO. CONSTITUIÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL EM DESFAVOR DO ENTE PÚBLICO. EXECUÇÃO E EMBARGOS QUE, POR QUESTÃO LÓGICA E SUPERVENIENTE, FICAM SEM OBJETO, ANTE O CONCERTO DA PENDÊNCIA DE DÉBITO E CRÉDITO ENTRE TODOS OS LITIGANTES.

   INSURGÊNCIA PREJUDICADA.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n. 0000901-47.2009.8.24.0021, da comarca de Cunha Porã Vara Única em que é/são Apelante(s) Francisco Novak Cavalheiro e outro e Apelado(s) Unimed de Chapecó Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda. e outro.

           A Primeira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, conhecer do apelo dos autores na ação Ordinária, dando-lhe provimento. De outra banda, julgar extinta a execução e os embargos, por fato superveniente, restando prejudicado o recurso interposto. Custas legais.

           O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Carlos Adilson Silva, e dele participaram o Excelentíssimo Senhor Desembargador Jorge Luiz de Borba e o Excelentíssimo Senhor Desembargador Substituto Paulo Henrique Moritz Martins da Silva. Funcionou como representante do Ministério Público a Procuradora de Justiça Hercília Regina Lemke.

           Florianópolis, 3 de maio de 2016.

Desembargador LUIZ FERNANDO BOLLER

Relator

 

RELATÓRIO

           Cuida-se de apelação cível interposta por Francisco Novak Cavalheiro e Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro, contra sentença prolatada pelo juízo da Vara Única da comarca de Cunha Porã, que nos autos da (1) ação Ordinária nº 021.09.000901-1 (disponível em <http://esaj.tjsc.jus.br/cpopg/show.do?Pro cesso.codigo=0L0000CM60000&processo.foro=21> acesso nesta data), ajuizada contra o Estado de Santa Catarina e Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda., julgou improcedente o pedido, impondo aos autores o pagamento das custas e dos honorários, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade restou sobrestada em razão da concessão do benefício da Justiça Gratuita (fls. 224/227 da ação Ordinária), bem como de apelação interposta por Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro, contra o veredito prolatado pelo juízo da 4ª Vara Cível da comarca de Chapecó, que nos (2) Embargos à Execução nº 0013458-41.2010.8.24.0018 (disponível em <http://esaj.tjsc.jus.br/cpopg/show.do?processo. Código=0I0005RLD0000&processo.Foro=18> acesso nesta data), opostos contra Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda., rejeitou o pedido, impondo à embargante o pagamento dos honorários de sucumbência, "cuja execução, entretanto, fica subordinada ao disposto no art. 12 da Lei nº 1.060/50, porquanto [...] litiga sob o amparo da gratuidade da justiça. Sem custas" (fls. 270/275 dos Embargos à Execução).

           Malcontentes, Francisco Novak Cavalheiro e Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro interpuseram apelação nos autos da ação Ordinária nº 021.09.000901-1, alegando que o seu filho André Simonetto Cavalheiro sofreu acidente de trânsito em 29/08/2009, tendo sido imediatamente encaminhado à Fundação Hospitalar e Assistencial de Cunha Porã, onde foi atendido através do SUS-Sistema Único de Saúde. Contudo, em razão da gravidade do seu estado de saúde, os médicos constataram a urgência da sua internação em UTI-Unidade de Terapia Intensiva.

           Mas "como não havia leito de UTI disponível pela rede pública, a única alternativa que restou para os autores foi a internação em hospital particular para resguardar a vida de seu filho", garantindo, a propósito, que "os procedimentos e encaminhamentos administrativos apontados pelo Estado requerido em sede de contestação, não são de obrigação dos autores [...], visto que descrevem as condutas de médicos assistentes" (fl. 232 da ação Ordinária).

           Quanto ao SAMU-Serviço de Atendimento Móvel de Urgência de Santa Catarina, destacaram que este "foi contatado, mas como não havia leito de UTI pela rede pública, nem se deslocou até a cidade de Cunha Porã para realizar o transporte do filho dos autores até a cidade de Chapecó" (fl. 232 da ação Ordinária).

           Por conseguinte - argumentando que constitui obrigação do Estado o pagamento do tratamento de saúde do seu filho junto à Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda. -, lançaram prequestionamento dos dispositivos legais ventilados nas razões recursais, pugnando pelo conhecimento e provimento do apelo (fls. 230/241 da ação Ordinária).

           Recebido o recurso nos efeitos suspensivo e devolutivo (fl. 251 dos autos da ação Ordinária), sobrevieram as contrarrazões, onde Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda. aduziu que os apelantes deixaram de consignar as razões pelas quais a sentença deve ser reformada, em flagrante ofensa ao princípio da dialeticidade, refutando, de outra banda, as teses por eles manejadas, clamando pelo desprovimento da insurgência (fls. 253/262 da ação Ordinária).

           Já o Estado de Santa Catarina, a seu turno, rechaçou as alegações de Francisco Novak Cavalheiro e Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro, exorando que a sentença deve ser mantida (fls. 265/279 da ação Ordinária).

           Ascendendo a esta Corte, foram os autos distribuídos por vinculação ao Desembargador Newton Trisotto, em razão do Agravo de Instrumento nº 2009.069957-4 (disponível em <http://app6.tjsc.jus.br/cposg/pcpoSelecao Processo2Grau.jsp?cbPesquisa=NUMPROC&dePesquisa=20090699574> acesso nesta data - fls. 182/183 da ação Ordinária), vindo-me conclusos em razão do superveniente assento nesta Câmara.

           Em Parecer do Procurador de Justiça André Carvalho, o Ministério Público opinou pelo conhecimento e provimento da insurgência (fls. 191/199 da ação Ordinária).

           De outro vértice, Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro também interpôs recurso de apelação nos autos dos Embargos à Execução nº 0013458-41.2010.8.24.0018, exaltando que a internação do seu filho em hospital particular não se deu por sua vontade, mas tão somente pela urgência que o caso exigia, já que ausente, naquele momento, leito em UTI-Unidade de Terapia Intensiva na rede pública, sobressaindo, inclusive, que o Termo de Confissão de Dívida foi firmado sob coação da apelada, na medida em que foi imposto como condição para a liberação do paciente, razão pela qual - lançando prequestionamento dos dispositivos legais ventilados nas razões recursais -, bradou pelo conhecimento e provimento da insurgência (fls. 278/290 dos Embargos à Execução).

           Recebido o apelo apenas no efeito devolutivo (fl. 292 dos Embargos à Execução), sobrevieram as contrarrazões, onde Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda. rechaçou a tese manejada pela apelante, clamando pela manutenção do veredito (fls. 295/303 dos Embargos à Execução).

           Vindo a este Pretório, foram os autos distribuídos por vinculação ao Desembargador Substituto Paulo Ricardo Bruschi, em razão da Apelação Cível nº 2013.018176-4 (fl. 313 dos Embargos à Execução), vindo-me então conclusos.

           É, no essencial, o relatório.

 

VOTO

           Conheço de ambos os recursos porque, além de tempestivos, atendem aos demais pressupostos de admissibilidade.

           Conquanto Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda. tenha pugnado pelo não conhecimento das razões recursais de Francisco Novak Cavalheiro e Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro nos autos da ação Ordinária, argumentando que não atacam, especificamente, os fundamentos da sentença, não denoto qualquer ofensa ao art. 1.010, inc. III, da Lei nº 13.105/15 - equivalente ao art. 514, inc. II, do antigo Código de Processo Civil -, prestando-se a argumentação manejada a questionar, sim, o entendimento externado pelo juiz de piso.

           No caso em liça, Francisco Novak Cavalheiro e Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro ajuizaram a ação Ordinária nº 021.09.000901-1, objetivando que o Estado de Santa Catarina arque com as despesas relativas ao atendimento médico do seu filho André Simonetto Cavalheiro junto ao hospital particular da Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda., na medida em que tal internação somente se deu em razão da ausência de leito disponível na rede pública.

           Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda., a seu turno, encetou a Execução por Quantia Certa Contra Devedor Solvente nº 018.09.025789-5 (disponível em <http://esaj.tjsc.Jus.br/ cpopg/show.do?processo.codigo=0I0005GF20000&processo.foro=18> acesso nesta data) contra Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro, requerendo o pagamento das suso referidas despesas. Em contrapartida, a executada opôs os Embargos à Execução nº 0013458-41.2010.8.24.0018, garantindo que teria firmado o Termo de Confissão de Dívida sob subjugada coação da embargada.

           Pois bem.

           De fato, em 29/08/2009, André Simonetto Cavalheiro - filho de Francisco Novak Cavalheiro e Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro -, sofreu acidente de trânsito, tendo sido socorrido pelo Corpo de Bombeiros e encaminhado à Fundação Hospitalar e Assistencial de Cunha Porã (fl. 34 da ação Ordinária e fl. 53 dos Embargos à Execução).

           Em razão da gravidade do seu estado de saúde, os médicos entenderam imprescindível a sua internação em UTI-Unidade de Terapia Intensiva.

           Contudo, foi constatado que não havia disponibilidade de leitos na rede pública de saúde da região, o que motivou a urgente condução do paciente ao hospital da Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda.

           Corroborando tal afirmativa, a Secretária Municipal de Saúde de Cunha Porã, Izonha Salete Sachser, declarou que:

    [...] no dia 29 de agosto do corrente ano, em horário logo após ao meio dia, compareci ao Hospital da cidade de Cunha Porã, onde estava sendo atendido em caráter de emergência o senhor André Simonetto Cavalheiro, vítima de acidente de trânsito. Devido a gravidade dos ferimentos, o corpo médico do plantão informou que não dispunham de recursos para tratamento do paciente, que deveria ser encaminhado à corpo médico especializado e para leito de UTI. Após requerimento verbal dos familiares, e diligência desta secretária de saúde, foi constatado que na região não haviam leitos de UTI disponíveis, tendo então sido disponibilizado para o paciente André uma ambulância para remoção até o hospital particular da cidade de Chapecó/SC, onde havia leito (fl. 35 da ação Ordinária e fl. 44 dos Embargos à Execução - grifei).

           Neste sentido, a Direção da Fundação Hospitalar e Assistencial de Cunha Porã garantiu que "o encaminhamento sempre é para hospitais públicos, porém, devido à inexistência de leitos e pela gravidade da situação", o paciente "foi encaminhado para o Uniclínicas" (fl. 120 - grifei).

           Ao ser inquirida na audiência de instrução e julgamento realizada nos autos dos Embargos à Execução, a testemunha Francini Werka Friedrich - enfermeira que, juntamente com o médico Sérgio Israel Hernandez Abreu (CRM/SC nº 14.932), atendeu André Simonetto Cavalheiro -, relatou que o paciente chegou no hospital em estado extremamente grave, de modo que necessitava ser imediatamente internado em UTI-Unidade de Terapia Intensiva.

           Disse, ainda, que após muitas tentativas, não conseguiram vaga em hospitais públicos, situação que motivou, inclusive, a recusa do SAMU-Serviço de Atendimento Móvel de Urgência em realizar o transporte da vítima, que foi então encaminhada a um hospital particular (mídia digital acostada à fl. 213 dos Embargos à Execução).

           Por sua vez, a testemunha Sérgio Israel Hernandez Abreu - médico responsável pelo primeiro atendimento de André Simonetto Cavalheiro -, garantiu que, diante da gravidade do caso apresentado, efetuou com urgência ligações tanto para os hospitais da região, quanto para o SAMU, tendo, todavia, sido informado acerca da inexistência de leitos disponíveis. Por esse motivo, o paciente foi internado via Unimed.

           O profissional enfatizou, ainda, que caso o paciente não tivesse sido encaminhado ao hospital particular, certamente teria ido a óbito (mídia digital acostada à fl. 213 dos Embargos à Execução).

           Disto infere-se que - ao revés do que tenta convencer o Estado de Santa Catarina através da Comunicação Interna de fl. 119 -, houve, sim, tentativa de contratação de leito junto ao SAMU, o que também foi confirmado através do depoimento de Izonha Salete Sachser (mídia digital acostada à fl. 213 dos Embargos à Execução), merecendo destaque que, conquanto Francisco Novak Cavalheiro e Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro não dispusessem, naquele momento, de condições financeiras para tanto - dada a gravidade do estado de saúde do seu filho -, a internação em hospital particular era a única opção disponível.

           Nesse tocante, o Procurador de Justiça André Carvalho, bem pontuou que:

    [...] o juiz sentenciante entendeu que o procedimento administrativo adequado para busca de leito de UTI na rede pública de saúde não foi respeitado, visto que a central de regulação do SAMU não foi acionada para buscar um leito disponível, inclusive em outras regiões, de modo que deveriam os autores arcar com a internação particular.

    Não obstante, percebe-se que as declarações da Secretaria de Saúde do Município de Cunha Porã (fl. 35) e do Hospital da Cidade de Cunha Porã (fl. 120) de que não havia leito de UTI disponível na rede pública da região, bem como o fato de que o estado de saúde do paciente era extremamente grave e demandava urgentemente tal internação, são mais do que suficientes para demonstrar a imperativa necessidade de o paciente ser internado na rede particular para ter acesso integral ao direito à saúde.

    De fato, o que se vê é que não havia opção para os familiares do paciente senão a internação particular, visto que os médicos que o atenderam e a própria Secretária de Saúde Municipal não lograram encontrar um leito de UTI vago na rede pública da região. Outrossim, a condição extremamente grave do paciente não tolerava qualquer demora, tanto é que no próprio dia em que ocorreu o acidente teve que ser transferido. A propósito, veja o que informou o Hospital da Cidade de Cunha Porã no Ofício de nº 032/2011 (fl. 120): "o encaminhamento sempre é para hospitais públicos, porém, devido à inexistência de leito e pela gravidade da situação foi encaminhado para o Uniclínicas".

    A sua vez, a não adoção do procedimento administrativo supostamente adequado para averiguar a existência de outros leitos de UTI na rede pública de saúde estadual não solapa o fato de que na região em que o paciente estava não haviam leitos de UTI disponíveis. Além disso, o estado de saúde do paciente era gravíssimo (consoante o documento de fl. 36, o paciente possuía traumatismo craniano contuso e trauma torácico fechado, além de escoriações superficiais, bem como pneumotórax), não admitindo postergações.

    Ressalte-se, além disso, que tal fato não pode ser oposto ao paciente, dado que cabe ao Poder Público, por intermédio do SUS, administrar os procedimentos para disponibilização adequada de leitos de UTI aos pacientes graves. É evidente que não podem os apelantes ser responsabilizados pela ausência de comunicação correta entre os entes da federação que administram o SUS, sendo essa uma questão de distribuição interna de competência. Quer dizer, não podem os apelantes sofrerem as consequências da não tomada de procedimentos que não lhes competiam.

    De qualquer modo, a suposta adoção do procedimento adequado tampouco garante que seria encontrado leito de UTI para o autor em alguma outra região do Estado, que tornasse a transferência do paciente compatível com seu grave estado de saúde.

    O que se deve ressaltar, nesse caso, é que o paciente de fato não conseguiu ser atendido em leito de UTI pelo SUS, sendo necessária a internação particular para garantir seu direito à vida, muito embora, conforme comprovam os documentos de fls. 25/32, os pais do paciente não tivessem condições financeiras para tanto.

    Ora, em tal situação é evidente que os apelantes preferiram o encaminhamento para a rede pública de saúde, inclusive, porque não tinham como arcar com as despesas de atendimento particular, de modo que fica evidente que o ato em questão foi tomado em um momento de desespero, com vistas a resguardar a vida do filho.

    Assim, visto que a internação do paciente na rede particular se deu apenas porque a rede pública foi omissa em fornecer o tratamento de saúde adequado à gravidade de seu estado de saúde, é imperativo que o Estado de Santa Catarina arque com o pagamento dos custos da internação do filho dos apelantes [...] (fls. 191/199 da ação Ordinária).

           Ora, o direito à saúde está previsto no art. 6º da Constituição Federal, sendo dever do Estado garanti-lo mediante políticas sociais e econômicas que promovam a redução do risco de doenças e de outras complicações, e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (art. 196).

           No mesmo rumo, a Lei Orgânica do SUS-Sistema Único de Saúde, estabelece que a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo os entes federados proverem as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, bem como prestarem aos enfermos assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica e médico-hospitalar.

           A Lei nº 8.080/90 faz referência, ainda, à prestação suplementar na rede particular, em caso de carência de serviço na rede pública de saúde, preconizando no respectivo art. 24 que, "quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde (SUS) poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada" (grifei).

           Conclui-se então que, comprovada a necessidade de tratamento específico, este deve ser fornecido de modo gratuito.

           Deste modo, não tendo o Estado de Santa Catarina disponibilizado leito em UTI-Unidade de Terapia Intensiva na rede pública, deve arcar com as despesas resultantes do tratamento médico que foi dispensado a André Simonetto Cavalheiro, pela Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda.

           A propósito:

    ADMINISTRATIVO. TRATAMENTO MÉDICO. INTERNAÇÃO HOSPITALAR POR ORIENTAÇÃO MÉDICA. DEVER DO ESTADO.

    "Não viola legislação federal a decisão judicial que impõe ao Estado o dever de garantir a internação em UTI conforme orientação médica e, inexistindo vaga na rede pública, arcar com os custos da internação em hospital privado" (AgRg no AREsp nº 36.394/RJ. Relator Ministro Herman BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/2/2012, Dje 12/4/2012.) Agravo regimental impróvido (STJ - AgRg no AREsp nº 807.820, do PR. Rel. Ministro Humberto Martins, julgado em 17/12/2015 - grifei).

           Em vista disso, considerando que a responsabilidade pelo serviço médico-hospitalar em questão recai sobre o Estado de Santa Catarina, tanto a Execução por Quantia Certa Contra Devedor Solvente nº 018.09.025789-5, quanto os Embargos à Execução nº 018.10.013458-8 devem ser extintos, visto que, por questão lógica e superveniente, perderam seu objeto, restando prejudicado o exame do mérito recursal atinente a ambos.

           Nesta toada, por sua própria racionalidade e jurídicos fundamentos, adoto integralmente a intelecção professada pelo eminente Desembargador Substituto Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, que reproduzo, consignando em meu voto, nos seus precisos termos, como razões de decidir:

    Autos nº 0013458-41.2010.8.24.0018 - Execução

    O escopo da presente execução de título extrajudicial é a cobrança, pela Unimed de Chapecó, do crédito proveniente do termo de confissão de dívida firmado por Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro.

    O quantum decorre da internação de André Simonetto Cavalheiro, filho da executada/embargante, no hospital exequente/embargado, que presta atendimento exclusivamente particular.

    Neste feito, diante da alegação de que o encaminhamento do paciente ocorreu pelo Sistema Único de Saúde, a própria Unimed - na impugnação aos embargos -, requereu a denunciação da lide ao Estado de Santa Catarina (fls. 96/96 vº). Todavia, o pedido não foi apreciado.

    Na ação de conhecimento (Autos nº 0000901-47.2009.8.24.0021), ajuizada por Francisco Novak Cavalheiro e Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro em face do Estado de Santa Catarina antes da mencionada execução, os postulantes requereram fosse declarada a obrigação do réu em adimplir com os encargos de internação de seu filho (André Simonetto Cavalheiro) junto ao Hospital Unimed de Chapecó (fl. 13).

    A Unimed foi incluída no polo passivo deste feito (fl. 140) e, inclusive, apresentou contestação (fls. 152/161).

    Assim, são partes na ação de conhecimento: os autores, o Estado e a Unimed.

    O art. 515 do CPC atual dispõe:

    São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: 
 I - as decisões proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de fazer, de não fazer ou de entregar coisa;

    Tal comando praticamente reproduz o art. 475-N do CPC/1973, introduzido pela minirreforma decorrente da Lei nº 11.323 de 2005, que revogou o art. 584 e reposicionou o tema no art. 475-N.

    Para o revogado art. 584, título executivo judicial era a sentença condenatória proferida no processo civil.

    Como se constata, desde 2005 esse enfoque mudou radicalmente, de modo que decisões com outras cargas também passaram a ser enquadradas como títulos judiciais.

    Por exemplo: numa ação revisional de contrato bancário que é julgada parcialmente procedente para recalcular a dívida, que ainda subsiste, a casa bancária pode promover a sua liquidação e desde logo submetê-la a cumprimento, em desfavor do então autor da ação, porque mesmo não sendo condenatória, passou a ostentar o status de título executivo, pela redação dada ao art. 475-N, atual art. 515, inc. I do novo CPC.

    Assim, no presente caso, como foi reconhecido que o devedor é o Estado e não os particulares, a Unimed tem em mãos título executivo judicial em desfavor do ente público e, por questão lógica e superveniente, a execução extrajudicial promovida por ela em desfavor do particular ficou sem objeto, porque a Justiça fez verdadeiro acertamento da pendência de débito e crédito entre todos os envolvidos, de modo que a decisão precisa gerar efeitos concretos para todos.

    Como visto, por questão superveniente, a execução de título extrajudicial promovida pela Unimed em face do particular perdeu objeto, razão pela qual deve ser extinta, juntamente com os embargos (Autos n. 0013458-41.2010.8.24.0018).

    No que tange às despesas e aos honorários, é preciso tecer considerações:

    A Unimed ostentava, em tese, título executivo extrajudicial em desfavor de Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro.

    Em novembro de 2009 promoveu a respectiva execução.

    No mês de setembro de 2009, o marido de Tânia, Francisco Novak Cavalheiro, ingressou com a ação de conhecimento em desfavor do Estado e a Unimed foi citada para integrar o polo passivo daquele processo somente em abril de 2012.

    Em junho de 2010 foram opostos embargos à execução, nos quais se fez referência à ação contra o Estado.

    Na impugnação aos embargos, em outubro de 2010, a Unimed requereu a denunciação da lide ao Estado, pretensão que nem chegou a ser analisada.

    A linha de defesa dos embargos era que a devedora fora coagida a assinar a confissão de dívida.

    Assim, no plano da execução e dos embargos, a Unimed não pode ser atingida pela causalidade na aferição da sucumbência, porque ao promover a execução e impugnar os embargos, estava agindo em sustentação do seu direito de crédito pelo título executivo que ostentava.

    Somente a executada pode ser atingida pelo pagamento das despesas e da verba honorária.

    Aplica-se à hipótese o art. 85, § 2º do CPC/2015. Os honorários devem ser fixados no patamar mínimo, 10% sobre o valor da execução (englobando execução e embargos), porque não há nenhum elemento diferenciador, para maior, nos parâmetros dos incisos I a IV do referido dispositivo. Incide, também, a regra do art. 98, § 3º, do CPC/2015, porque a executada é beneficiária da gratuidade de justiça.

           Dessarte, manifesto-me no sentido de conhecer e dar provimento à Apelação Cível nº 0000901-47.2009.8.24.0021, julgando procedente a pretensão de Francisco Novak Cavalheiro e Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro nos autos da ação Ordinária nº 021.09.000901-1, determinando que o Estado de Santa Catarina arque com as despesas médico-hospitalares efetuadas com o tratamento de André Simonetto Cavalheiro junto à Unimed de Chapecó-Cooperativa de Trabalho Médico da Região Oeste Catarinense Ltda., impondo ao ente federado o dever de honrar o pagamento dos honorários sucumbenciais em favor dos advogados dos autores, estes fixados em R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos reais), o que faço com fulcro no art. 85, §§ 4º, inc. III, e 8º, do novo Código de Processo Civil, restando o Estado de Santa Catarina, todavia, isento das custas (art. 35, 'i', da Lei Complementar nº 156/97, com redação dada pela Lei Complementar nº 524/2010).

           De outro vértice, pronuncio-me no sentido de julgar prejudicado o exame do mérito recursal da Apelação Cível nº 0013458-41.2010.8.24.0018 ante a perda do objeto, porquanto extintas tanto a Execução por Quantia Certa Contra Devedor Solvente nº 018.09.025789-5, quanto os Embargos à Execução nº 018.10.013458-8 por fato superveniente.

           Via de consequência, ante o princípio da causalidade, Tânia Teresinha Simonetto Cavalheiro arcará com os ônus da sucumbência, devendo honrar o pagamento integral das custas e dos honorários devidos aos patronos da embargada/exequente, que, a rigor do disposto no art. 85, § 2º, do novo Código de Processo Civil, vão fixados em 10% sobre o valor da execução (englobando execução e embargos), porque não há nenhum elemento diferenciador, para maior, nos parâmetros dos incs. I a IV do referido dispositivo, restando a exigibilidade, todavia, suspensa nos termos do art. 98, § 3º, da Lei nº 13.105/15, porque a executada é beneficiária da Justiça Gratuita, bem como impossibilitada a compensação (art. 85, § 14, do mesmo códice).

           É como penso. É como voto.


Gabinete Desembargador Luiz Fernando Boller