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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0003553-49.2014.8.24.0025 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Ernani Guetten de Almeida
Origem: Gaspar
Orgão Julgador: Terceira Câmara Criminal
Julgado em: Tue May 03 00:00:00 GMT-03:00 2016
Juiz Prolator: Graziela Shizuiho Alchini
Classe: Apelação

 


 


Apelação n. 0003553-49.2014.8.24.0025

Relator: Desembargador Ernani Guetten de Almeida

   APELAÇÃO CRIMINAL (RÉU PRESO). EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO (ART. 159, § 1º, DO CÓDIGO PENAL), FALSIDADE IDEOLÓGICA (ART. 299 DO CÓDIGO PENAL) E USO DE DOCUMENTO FALSO (ART. 304 DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA.

   RECURSOS DAS DEFESAS. PRELIMINARMENTE. SUSTENTADA A QUEBRA DA INCOMUNICABILIDADE DAS TESTEMUNHAS DE ACUSAÇÃO. POLICIAIS CIVIS. DESCABIMENTO. DEFESA QUE TERIA SOLICITADO A FAMILIAR DA APELANTE PARA FILMAR AS TESTEMUNHAS CONVERSANDO ENQUANTO AGUARDAVAM PARA PRESTAR DEPOIMENTO. FÓRUM EQUIPADO COM MONITORAMENTO ELETRÔNICO. PEDIDO REALIZADO APÓS A OITIVA DOS TESTIGOS E INDEFERIDO PELA MAGISTRADA A QUO. PLEITO EXTEMPORÂNEO. PRELIMINAR RECHAÇADA.

   ALEGADA A NULIDADE DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS AS QUAIS NÃO FORAM PREVIAMENTE DEFERIDAS PELO JUIZ DA UNIDADE JURISDICIONAL, DESRESPEITANDO A RESOLUÇÃO N. 71/2009, DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, AO ART. 7º DA RESOLUÇÃO 12/2010-CM DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA, E AO ART. 112 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INACOLHIMENTO. INTERCEPTAÇÃO DEFERIDA PREVIAMENTE PELO JUIZ PLANTONISTA. SOLICITAÇÃO REALIZADA POR CORREIO ELETRÔNICO APÓS O HORÁRIO DE EXPEDIENTE FORENSE. POSSIBILIDADE EVIDENCIADA NA LEI N. 9.296/96. PROCESSO DE INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA DISTRIBUÍDO AO MAGISTRADO TITULAR DA UNIDADE JURISDICIONAL RESPEITANDO AS DETERMINAÇÕES DE SUBSTITUIÇÃO PREVISTAS NA RESOLUÇÃO N. 12/2010 DO CONSELHO DA MAGISTRATURA. PRELIMINAR AFASTADA.

   MÉRITO. REQUERIDA A ABSOLVIÇÃO DOS APELANTES POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS EM RELAÇÃO AO CRIME DE EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO. DESCABIMENTO. APELANTE P. W. DA S. M. QUE CONFESSOU JUDICIALMENTE TER PARTICIPADO DO CRIME. CONFISSÃO CORROBORADA POR OUTROS ELEMENTOS DE PROVAS. APELANTES QUE PREVIAMENTE PLANEJARAM O ARREBATAMENTO DO MENOR, A LOCAÇÃO DE CATIVEIRO, O PRÉVIO AJUSTE COM OS DEMAIS COMPARSAS E MONITORARAM POR INTERMÉDIO DA REDE SOCIAL FACEBOOK, OS LOCAIS QUE A VÍTIMA FREQUENTAVA E AS CONDIÇÕES FINANCEIRAS E SOCIAIS DA FAMÍLIA DO OFENDIDO. APELANTE R.R. ALEGA QUE NA ÉPOCA DOS FATOS NÃO CONVIVIA COM P.W.DA S. M. E QUE APENAS ESTE TERIA PARTICIPADO DO SEQUESTRO, JUNTAMENTE COM OS COMPARSAS MORTOS DURANTE A ABORDAGEM POLICIAL NO CATIVEIRO. IMPOSSIBILIDADE. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS E DEPOIMENTOS DE TESTEMUNHAS QUE PRESENCIARAM AMBOS OS APELANTES JUNTOS NA ÉPOCA DOS FATOS. LIGAÇÕES TELEFÔNICAS REALIZADAS POR R.R. NO LOCAL DO CATIVEIRO DA VÍTIMA QUE DEMONSTRAM SUA PARTICIPAÇÃO NA AÇÃO CRIMINOSA. MATERIALIDADE E AUTORIA PROVADAS.

   APELANTES QUE PUGNAM PELO RECONHECIMENTO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DA PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA (ART. 29, § 1º, DO CÓDIGO PENAL). INACOLHIMENTO. PROVAS ROBUSTAS DE QUE AMBOS OS APELANTES PERMANECIAM PREVIAMENTE AJUSTADOS COM OS MESMOS DESÍGNIOS. APELANTE R.R. QUE EMBORA NÃO TENHA PARTICIPADO DO ARREBATAMENTO E NEM DA EXTORSÃO, FOI A MENTORA INTELECTUAL DA EMPREITADA CRIMINOSA. APELANTE P. W. DA S. M. QUE PARTICIPOU DE TODOS OS ATOS CRIMINOSOS INVIABILIZANDO A ACOLHIDA DA REDUTORA. COAUTORIA COMPROVADA. 

   PRETENSÃO DE REVISÃO DA DOSIMETRIA DA PENA REQUERIDA POR AMBOS OS APELANTES. IMPOSSIBILIDADE. REPRIMENDAS APLICADAS QUE GUARDAM PROPORCIONALIDADE AO DELITO PRATICADO E AS CONDIÇÕES PESSOAIS DOS AGENTES. AUMENTO EMPREGADO NA PRIMEIRA FASE DOSIMÉTRICA FUNDAMENTADO NO TRANSTORNO QUE O CRIME CAUSOU NA VIDA DA VÍTIMA E SEUS FAMILIARES. NECESSIDADE DE ACOMPANHAMENTO PSICOLÓGICO E TENTATIVA DE SUICÍDIO DA GENITORA DO MENOR. FATORES QUE EXCEDEM O TIPO PENAL E MERECEM INCREMENTO NA PENA-BASE. INVIABILIDADE DE REDUÇÃO.

   APELANTE P. W. DA S. M. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO AOS CRIMES DE FALSIDADE IDEOLÓGICA E USO DE DOCUMENTO FALSO. DESCABIMENTO. PROVAS ROBUSTAS DE QUE O APELANTE TENTOU SE FAZER PASSAR POR OUTRA PESSOA, A FIM DE OCULTAR OS ANTECEDENTES PENAIS. AGENTE COM HISTÓRICO EM CRIMES PATRIMONIAIS E QUE APRESENTAVA QUATRO MANDADOS DE PRISÃO EM ABERTO. APELANTE QUE SE APROVEITOU DOS DOCUMENTOS OFICIAIS, TAIS COMO RG, CPF, TÍTULO DE ELEITOR E CARTÕES DO SUS FALSOS PARA ABRIR CONTAS EM BANCOS E OUTROS ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS. EVIDENCIADA A LESÃO A FÉ PÚBLICA, BEM JURÍDICO TUTELADO. ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL.

   PLEITO DE REDUÇÃO DAS PENAS. DESCABIMENTO. REPRIMENDAS FIXADAS ACIMA DO MÍNIMO LEGAL CORRETAMENTE MOTIVADAS PELA MAGISTRADA A QUO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO ENTRE OS DELITOS. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA E USO DE DOCUMENTO FALSO PRATICADOS COM DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. DESCONFIGURADA A SUCESSÃO E NEXO DE DEPENDÊNCIA ENTRE AS FIGURAS DELITIVAS AS QUAIS DEVEM SER CONSIDERADAS SEPARADAMENTE.

   RECURSO DE P. W. DA S. M. PEDIDO DE AUMENTO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRETENDIDA FIXAÇÃO DE ACORDO COM A TABELA DA SECCIONAL DA OAB. INACOLHIMENTO. CONCESSÃO DE FORMA EQUITATIVA. ENTENDIMENTO DA SEÇÃO CRIMINAL DESTA CORTE DE JUSTIÇA. MANUTENÇÃO DA VERBA ARBITRADA PELO JUÍZO A QUO QUE SE IMPÕE.

   DE OFÍCIO, MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS EM RAZÃO DO REGRAMENTO TRAZIDO PELA LEI 13.105/15 (NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL), QUE ESTIPULA O PAGAMENTO DE HONORÁRIOS RECURSAIS.

   EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. POSSIBILIDADE. SENTENÇA CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR ESTA CORTE DE JUSTIÇA. PRECLUSÃO DA MATÉRIA FÁTICA. NOVA ORIENTAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (HC N. 126.292/SP) ADOTADA POR ESTA CÂMARA CRIMINAL (AUTOS N. 0000516-81.2010.8.24.0048). TRANSMUDAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA PRISÃO, QUE PASSA DE SEGREGAÇÃO CAUTELAR PARA A DE CUMPRIMENTO DE ACÓRDÃO PENAL CONDENATÓRIO.

   RECURSOS CONHECIDOS, AFASTADAS AS PRELIMINARES E DESPROVIDOS.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n. 0003553-49.2014.8.24.0025, da comarca de Gaspar 3ª Vara em que são apelantes Rosicleide Rodrigues e Peterson Willian da Silva Machado e apelado o Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

           A Terceira Câmara Criminal decidiu, por votação unânime, conhecer dos recursos, afastar as preliminares e negar-lhes provimento. Custas legais.

           Presidiu o julgamento, realizado na presente data, o Exmo. Sr. Des. Rui Fortes, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho. Funcionou como Representante do Ministério Público o Dr. Norival Acácio Engel.

           Florianópolis, 03 de maio de 2016.

Desembargador Ernani Guetten de Almeida

Relator

 

           RELATÓRIO

           O representante do Ministério Público da Comarca de Gaspar (3ª Vara), ofereceu denúncia contra Rosicleide Rodrigues, qualificada nos autos, dando-a como incursa no art. 159, § 1º, do Código Penal e Peterson Willian da Silva Machado, já qualificados nos autos em epígrafe, dando-o como incurso nas sanções dos arts. 159, § 1º; 299 (por quatro vezes) e 304 (por seis vezes), todos do Código Penal, em razão dos seguintes fatos delituosos, conforme consta na denúncia (fls. 01/05):

    [...] Fato 1

    Infere-se do presente caderno investigatório que, no curso do ano de 2014, os denunciados PETERSON WILLIAN DA SILVA MACHADO e ROSICLEIDE RODRIGUES, companheiros entre si, arquitetaram um plano para obter de forma imediata grande proveito financeiro: o sequestro do menino A.A.B.O., filho único de um casal de empresários da cidade de Ilhota-SC.

    Para concretizar seu intento, os denunciados uniram-se a Aldair Gonçalves de França, vulgo Gão, e Fernanda Marin Soares, dividindo com eles as tarefas necessárias à captura e vigilância do infante. Assim, primeiramente, os denunciados PETERSON WILLIAN DA SILVA MACHADO e ROSICLEIDE RODRIGUES locaram um sobrado sito na Rua Olindio Rodolfo de Souza n. 407, Bairro Armação, na cidade de Penha-SC, a fim de que o local servisse de cativeiro da criança. Ato contínuo, os sequestradores passaram a colher informações a respeito das finanças da família do menino e do cotidiano familiar, inclusive mediante acesso à rede social facebook. Por fim, o grupo ainda optou por monitorar a criança em seus afazeres habituais, de modo a identificar situações de vulnerabilidade aptas a facilitar a ação criminosa.

    Assim, no dia 29 de maio de 2014, por volta das 19h45min, o denunciado PETERSON WILLIAN DA SILVA MACHADO, na companhia de Aldair e Fernanda, deslocou-se ao centro de Ilhota/SC, a bordo do veículo FORD/KA, cor vermelha, placas MJG 8389, oportunidade em que observaram o menino a brincar nas imediações do campo de futebol Bola Cheia.

    Ao perceberem a aproximação da criança, Fernanda imediatamente a arrebatou, posicionando-a no banco traseiro do carro e determinando que permanecesse em silêncio. Durante o percurso, os sequestradores amarraram as mãos e os pés do menino, bem como colocaram sobre seus olhos uma venda, conduzindo-o, na sequência, ao cativeiro preparado na cidade de Penha/SC.

    Por volta das 20h17min daquele mesmo dia, o denunciado PETERSON WILIAN DA SILVA MACHADO efetuou contato telefônico com a família da vítima, momento em que exigiu a importância de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) como preço do resgate de A.A.B.O.

    As negociações com familiares do menino perduraram por quatro dias, sendo que, em todos os telefonemas, o denunciado PETERSON WILIAN DA SILVA MACHADO reclamou, em benefício próprio e de seus comparsas, valores de elevada monta e outros bens de alto custo aquisitivo, como joias e relógios, em troca da liberdade do infante.

    Apenas no dia 4 de junho de 2014, às 10h02min, policiais civis da Diretoria de Investigações Criminais Divisão de Roubos e Antissequestros -, após acompanhamento telefônico, lograram êxito em prender em flagrante delito os denunciados PETERSON WILIAN DA SILVA MACHADO e ROSICLEIDE RODRIGUES, identificar a real localização do cativeiro e resgatar o menino A.A.B.O., devolvendo-o a sua família.

    Logo, os denunciados PETERSON WILIAN DA SILVA MACHADO e ROSICLEIDE RODRIGUES, conjuntamente com Aldair Gonçalves de França, vulgo Gão, e Fernanda Marin Soares, sequestraram pessoa menor de dezoito anos, por mais de 24 (vinte e quatro) horas, com o fim de obter para si vantagem econômica como preço do resgate.

    Fato 2

    Durante a ação policial de libertação do menino A.A.B.O., agentes da força pública apreenderam em poder do denunciado PETERSON WILLIAN DA SILVA MACHADO a cédula de identidade nº 6069542, expedida em 04.07.2011, o título de eleitor nº 061511881090, o Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) nº 701.902.231-62 e Cartão Nacional de Saúde nº 898003734327077, todos em nome de Peterson Silva Machado, identidade falsa assumida pelo denunciado com o objetivo de ocultar seus antecedentes criminais e mandados de prisão contra si expedidos.

    Assim, PETERSON WILLIAN DA SILVA MACHADO, nos últimos quatro anos, fez inserir, por quatro vezes, em documento público, declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita com o fim de prejudicar direito e alterar verdade sobre fato juridicamente relevante.

    Fato 3

    Posteriormente, em datas e horários a serem esclarecidos no curso da instrução criminal, o denunciado PETERSON WILLIAN DA SILVA MACHADO, valendo-se dos papéis anteriormente falsificados, fez uso destes, por, pelo menos sete vezes para firmar contratos junto a instituições financeiras (Caixa Econômica e Banco do Brasil), a operadoras de cartões de crédito e estabelecimentos comerciais [...]

           Concluída a instrução criminal, a M.Ma. Juíza proferiu sentença (fls. 1.272/1.320), fazendo constar na parte dispositiva, in verbis:

    [...] JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a denúncia de fls. 1-5 para, em consequência:

    a) CONDENAR a ré ROSICLEIDE RODRIGUES, já qualificada, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 20 (vinte) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, por infração ao art. 159, § 1º, do Código Penal; e

    b) CONDENAR o réu PETERSON WILLIAM DA SILVA MACHADO, já qualificado, ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 34 (trinta e quatro) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, e ao pagamento de 108 (cento e oito) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, devidamente corrigido, por infração aos arts. 159, § 1º, 299 (por quatro vezes) e 304 (por seis vezes) do Código Penal [...]

    Condeno a ré Rosicleide Rodrigues, ainda, ao pagamento de metade das custas processuais e, em relação ao réu Peterson William da Silva Machado, isento-o de custas (Circular 16/2009 da CGJ).

    Mantenho as prisões dos réus porque remanescem íntegros os fundamentos lançados da decisão que lhes decretou a prisão preventiva, referência que, por si só, não configura nenhuma ilegalidade, haja vista que a expressa atribuição às razões que alicerçaram a ordem de prisão faz com que aquela motivação incorpore-se ao presente ato decisório (STF, MS 25.936-ED-DF, rel. min. Celso de Mello, j. 13-6-2007), notadamente quando não se evidencie alteração da situação fática desde a determinação da custódia, bem como a necessidade de se assegurar a ordem pública, diante do perigo concreto de reiteração delitiva (STF, HC 84658-PE, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 3-6-2005).

    Outrossim, DECRETO a perda, em favor da União, das armas de fogo e das munições apreendidas, com esteio no artigo 91, inciso II, a, do Código Penal, determinando sejam encaminhadas ao Comando do Exército [...]

           Inconformados com a sentença prolatada, os denunciados Rosicleide e Peterson apelaram (fls. 1.340/1.368 e 1.440/1.453, respectivamente). 

           A apelante Rosicleide, em suas razões recursais pleiteou, preliminarmente, pela nulidade do feito em razão da suposta quebra de incomunicabilidade das testemunhas durante a audiência de instrução e julgamento. No mérito, postula pela sua absolvição, alegando que não existem elementos suficientes que comprovem a participação da apelante na empreitada criminosa. Subsidiariamente, requer o reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no art. 29, § 1º, do Código Penal. Por fim, pugna pela redução da reprimenda fixada.

           O apelante Peterson, por sua vez, requer, preliminarmente, o reconhecimento da nulidade das interceptações telefônicas realizadas. No mérito, postula pela absolvição da prática do delito de extorsão mediante sequestro ou, alternativamente, o reconhecimento da causa de diminuição de pena da participação de menor importância. No que se refere aos crimes de falsidade ideológica e uso de documento falso, pugna pela absolvição por insuficiência de provas e, subsidiariamente, pela aplicação do princípio da consunção. Por fim, requer a revisão da dosimetria da pena em relação aos delitos a que foi condenado.

           Apresentadas as contrarrazões (fls. 1.480/1.487), os autos ascenderam a este Tribunal, oportunidade em que a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Dr. Paulo Roberto Speck, manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento de ambos os recurso (fls. 03/46 dos autos físicos).

           Este é o relatório.

           VOTO

           Os recursos como próprios e tempestivos devem ser conhecidos. Quanto ao mérito, devem ser desprovidos.

           Em suma, tratam os autos da prática de crime de extosão mediante sequestro que teve como vítima direta uma criança de 10 (dez) anos de idade, que ficou em poder dos seqüestradores por mais de 04 (quatro) dias, em cidade distinta da que foi arrebatada, sendo o sequestro arquitetado por quatro agentes, entre eles os dois ora apelantes mais dois indivíduos que restaram mortos quando da abordagem policial no cativeiro. 

           Além do crime contra o patrimônio, tem-se a prática de delitos contra a fé pública.

           Passe-se ao exame dos reclamos.

           Preliminarmente:

           1) Da quebra de incomunicabilidade das testemunhas:

           A defesa da apelante Rosicleide Rodrigues alega que ocorreu nulidade no feito, pois as testemunhas arroladas pela acusação não ficaram incomunicáveis durante a audiência de instrução e julgamento, ao passo que teriam, inclusive, conversado sobre o processo enquanto esperavam suas oitivas.

           Sem razão.

           Dispõe o art. 210 que "As testemunhas serão inquiridas cada uma de per si, de modo que umas não saibam nem ouçam os depoimentos das outras, devendo o juiz adverti-las das penas cominadas ao falso testemunho." Ainda, o parágrafo único estabelece que "Antes do início da audiência e durante a sua realização, serão reservados espaços separados para a garantia da incomunicabilidade das testemunhas."

           Sobre o referido artigo leciona Fernando Capez in Curso de Processo penal, 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 450:

    "As testemunhas devem ser ouvidas de modo que umas não saibam nem ouçam os depoimentos das outras. O parágrafo único do art. 210 passou a prever que, antes do início da audiência e durante a sua realização, serão reservados espaços separados para a garantia da incomunicabilidade das testemunhas. Trata-se de previsão legal bastante distante da realidade, pois, dificilmente, poderá haver um controle efetivo que impeça esse contato, além do que, qual a garantia de que tais testemunhas não se comunicaram antes de sua entrada no recinto do fórum ou mesmo nos seus corredores? Desse modo, é improvável que esse comando legal consiga ser cumprido, de forma que, constatado que as testemunhas não ficaram incomunicáveis, deverá haver mera irregularidade"

           Infere-se dos autos que o pleito já tinha sido realizado durante a audiência de instrução e julgamento depois da oitiva de todos os policiais civis envolvidos na investigação do caso, ao passo que a Magistrada a quo acertadamente rechaçou a nulidade alegando que:

    "Quanto ao pedido de nulidade da prova em razão da alegação de quebra da incomunicabilidade das testemunhas, indefiro. Primeiro porque a defesa só alegou tal situação após todos os Policiais serem ouvidos e a notícia a esta Magistrada de que um parente da ré Rosicleide estaria filmando as vítimas. De toda a forma, Fabrício de Souza afirmou que tentou fazer a gravação orientado pelo advogado de Rosicleide no sentido de comprovar que os Policiais estavam conversando entre si no curso das inquirições, contudo não soube informar sobre o que eles conversavam. Ressalto que este fórum é equipado com monitoramento eletrônico, logo, os fatos poderiam ter sido comprovados mediante simples requerimento a este juízo pelos patronos da ré, o que não ocorreu a tempo hábil. Além disso, não se verifica comprovado prejuízo para a defesa. Como bem lembrou a representante do Ministério Público, 'as testemunhas trabalham diariamente juntas, os testemunhos que ora pretende a defesa anular são justamente relativos aos Policiais que atuaram na investigação dos fatos, os quais trabalham diariamente lado a lado. Portanto, não é porque conversaram sobre qualquer tipo de assunto nos corredores públicos do Fórum que suas palavras serão tomadas como eivadas de nulidade, tampouco com ressalvas'" (fls. 763/764).

           Observa-se que a defesa, tentando coletar provas para anular a instrução processual, solicitou à familiar da apelante que registrasse cenas dos policiais civis conversando entre si enquanto aguardavam a audiência.

           Inicialmente, a prova que a defesa pretendia produzir para anular a instrução é totalmente inviável. A uma, porque o Fórum possui monitoramento eletrônico, o qual, facilmente, viabilizaria a colheita das informações que, clandestinamente, pretendia produzir. A duas, que a incomunicabilidade das testemunhas, justamente policiais civis que trabalham juntos e participaram de toda a investigação juntos, não tem propósito, pois realizado o requerimento de nulidade justamente após a oitiva de todos os agentes públicos, no qual se percebeu que não ocorreu combinação de falas, pois os policiais inquiridos participaram de momentos diferentes da operação. 

           Portanto, o fato de terem esperado o início da audiência de instrução e julgamento no mesmo recinto não altera a incomunicabilidade dos agentes públicos, pois, caso quisessem falar sobre os fatos narrados na denúncia, poderiam tê-lo feito em seu local de trabalho.

           Não bastasse, os policiais civis, assim como qualquer outra testemunha, sempre prestam compromisso de dizer apenas a verdade, sob pena de cometer crime.

           E, por fim, conforme se verá na análise do mérito, a decisão não foi baseada exclusivamente nos depoimentos prestados pelos policiais.

           Logo, não só pela atitude esdrúxula que levou a defesa a tentar viabilizar uma nulidade processual, como também por impropriedade dos meios utilizados e, especialmente, em face do requerimento extemporâneo realizado pela defesa acerca da quebra da incomunicabilidade das testemunhas, rechaça-se a nulidade, afastando-se a preliminar suscitada.

           2) Da nulidade das interceptações telefônicas realizadas:

           A defesa do apelante Peterson aduz que as interceptações telefônicas que originaram a presente ação penal são nulas, pois desatenderam ao art. 7º, § 2º, da Resolução n. 71/2009, do Conselho Nacional de Justiça; ao art. 7º da Resolução 12/2010-CM do Tribunal de Justiça de Santa Catarina; e ao art. 112 do Código de Processo Penal, diante da incompatibilidade.

           Imerece guarida o pleito.

           Inicialmente, o requerimento de nulidade já restou suscitado e analisado perante o juízo a quo, o qual assim decidiu:

    [...] no caso em análise, a Autoridade Policial, em observância ao sigilo necessário para o processamento do referido procedimento, enviou diretamente ao e-mail funcional do juiz plantonista, às 22h15min do dia 29/05/2014, pedido, por escrito, para interceptar os números de telefones de propriedade dos pais da vítima sequestrada, bem como um número de telefone utilizado para pedir o resgate. No dia seguinte (30/05/2014), o referido procedimento foi devidamente cadastrado e autuado (13h38min), quando então as decisões passaram a ser proferidas pelo magistrado responsável pela 3ª Vara da Comarca de Gaspar.

    Como se vê, não há qualquer afronta ao regramento disposto no § 2º do art. 7º da Resolução nº 71/2009 do CNJ, visto que o recebedor do requerimento foi o próprio juiz plantonista, que tomou o cuidado de acostar no despacho o horário em que proferiu a sua decisão (00h45min do dia 30/05/2014), suprindo assim a exigência do protocolo (data e hora de entrada do pedido).

    Além disso convém lembrar que a Lei que regulamenta a interceptação telefônica autoriza que o pedido seja formulado de forma verbal, desde que posteriormente seja ele reduzido a termo (Lei nº 9.296/1996, art. 4º). Ora, se o legislador, preocupado com a agilidade que referido procedimento requer, permitiu que o requerimento informal, não será uma suposta inobservância à resolução que dispõe sobre o regime de plantão judiciário que anulará a medida da interceptação telefônica deferida.

    Da mesma forma não vislumbro qualquer ofensa ao previsto no art. 7º da Resolução nº 12/2010 -CM do TJSC, pois assim que se iniciou o expediente foi registrado, autuado e encaminhado para o juiz responsável pela vara, Dra. Jussara Schittler dos Santos Wandscheer, já que no referido dia, a Dra. Cibele Mendes Beltrame, juíza substituta designada para esta unidade jurisdicional, se encontrava em curso junto ao Tribunal de Justiça [...] (fls. 668/669).

           Logo, não há que falar em nulidade das interceptações telefônicas, pois conforme bem narrado pela Togada o pedido foi previamente deferido, inicialmente, pelo Juiz Plantonista, uma vez que realizado fora do horário do expediente forense e, logo após, pelo Magistrado Titular da unidade.

           Assim, afasta-se a preliminar suscitada.

           2) Mérito:

           2.1) Do crime de extorsão mediante sequestro (recursos e Peterson e Rosicleide):

           Colhe-se dos autos que ambos os apelantes almejam a absolvição pela insuficiência de provas.

           Em suma, a defesa de Rosicleide alega que esta não participou do sequestro e que sequer sabia que seu ex-companheiro Peterson estava envolvido no crime. Aduz que na época dos fatos não estava se relacionando com Peterson e que este a isentou de qualquer participação no crime. Relata que a casa que serviu de cativeiro não foi alugada para este fim, mas sim para a família de Peterson e Rosicleide residirem. Por fim, alega que as interceptações telefônicas nada comprovaram acerca da participação da apelante na empreitada criminosa.

           Alternativamente, requer o reconhecimento de que teve participação de menor importância, uma vez que todos os contatos com a família da vítima, bem como toda a condução do sequestro foram realizadas pelo apelante Peterson, que esteve numa posição totalmente ativa no desenrolar do delito.

           No que tange à dosimetria da pena, pleiteia a aplicação da reprimenda no mínimo legal, bem como seja afastada a agravante reconhecida em primeiro grau prevista no art. 62, inciso I, do Código Penal.

           Por outro lado, o apelante Peterson alega, em suma, que confessou espontaneamente em juízo a sua participação na prática do delito. No entanto, sustenta que sua participação no crime se enquadra como aquelas de menor importância, secundárias ou dispensáveis. Sustenta que a captura da vítima foi realizada por Fernanda que teria aliciado o garoto, bem como a proteção do cativeiro era realizada tanto por Fernanda como por Adailton, ambos mortos quando do estouro de cativeiro. Aduz que todo o planejamento e coordenação das atividades eram realizados por Rosicleide, a qual conhecia a família da vítima, alugou a casa e preparou o cativeiro.

           No entanto, sorte não lhes socorre.

           A materialidade delitiva restou comprovada pelo boletim de ocorrência (fls. 73/75), termos de apreensão (fls. 28/29, 39 e 40/43), relatórios de interceptação telefônica (fls. 217/225) e de investigação (fls. 109/113), mídias de fls. 226, laudo pericial (fls. 542/559), bem como pela prova oral coligida.

           O apelante Peterson confessou a participação no delito, ao passo que, muito embora tenha apresentado versões diferentes tanto na etapa indiciária quanto em juízo, em ambas, isentou a responsabilidade de apelante Rosicleide, apesar de, nas razões de apelação, ter mencionado que esta era a mentora do crime:

    "[...] teve participação nos fatos narrado na denúncia. Disse que alugou o imóvel em Penha porque era muito quente em Indaial onde tinham uma loja, para passar os fins de semana na praia. Depois de problemas que teve, com uma determinação judicial para não se aproximar 50 metros de um bar, resolveram morar em Penha. Afirmou trabalhar como vendedor de carros e por isso conheceu Gão e Fernanda, os quais compraram um carro seu. Em maio, quiseram comprar outro carro, e vendeu esse Ford Ka vermelho para eles. Certo dia, estava passeando com um cachorro na frente do Beto Carrero e os encontrou, Gão e a moça, tendo eles feito uma proposta de sete mil reais para alugar a casa por quinze dias. Disseram que iam 'pegar um cara' que devia trinta mil para eles. Negou que a casa tivesse sido alugada para fins de cativeiro. Discutiu com seus pais e com Rosicleide para que eles saíssem da casa e não se envolvessem, pois decidiu participar. Quando eles foram pegar a pessoa, trouxeram a criança. Eles monitoraram por uns três ou quatro dias e o intuito era pegar o pai do menino. Perguntou que 'loucura era aquela, mas quando viu já estava envolvido' e 'não pode mais sair'. Seu trabalho era trocar o carro, porque aquele foi visto, para depois devolver a criança. Fez só duas ligações e Gão fez as outras. Trocou o carro em Criciúma e depois foi em Brusque para negociar um carro bom. Quando foi abordado, disseram que a ordem era matar os três e lhe 'encheram de porrada', nessa casa onde foi comprar um carro. Não estava armado e não reagiu. Chegou a desmaiar e depois, o policial pediu para pegar uma sacola onde tinha um revólver 38 e iam 'forjar, dizendo que eu tinha reagido e iam me matar', mas gritou e uma vizinha viu. Disse que o plano não foi seu, que não era o mentor. Disse que no depoimento da delegacia, mentiu; que foi bastante agredido e só fez o exame de corpo delito depois de quinze dias. Afirmou que emitiu os cheques encontrados em nome de Pretroson, assim como o bilhete que tinha eram escritos de Gão para que falasse no telefone. Aduziu que Rosicleide não teve nenhuma participação no fato e que discutiu com seus pais. Para tirar a atenção e ela não vir na casa, às vezes ia lá. Esteve na casa durante o sequestro, não podia sair muito do local, pois era conhecido ali e precisava afastar as pessoas que aparecessem. Rosicleide teria dito para vizinhos que iria numa feira, pois ela fazia isso. Não conversou com ela nada sobre o sequestro. Pode ter tido conversa sobre melhorar de vida, pois a intenção era vender a casa onde tiveram problemas, despejar o inquilino. Disse que o Delegado Anselmo levou a foto de uma mulher, afirmando que 'se falasse que era ela, liberaria a Rose, porque essa pessoa teria motivo para matar'. Iria comprar um outro carro para entregar a criança, o que seria feito em Navegantes. Disse que ia ganhar de Gão sete mil por quinze dias, pois ele disse que ganharia trinta mil reais. Mas ele apareceu com uma criança e até então ele estava 'nos enganando', só foi saber do valor quando viu no jornal e 'queria divisão igual'. Lembra de ter dado uma entrevista e que 'inventou uma história ali', disse que não falou o que disse hoje porque tinha medo de repreensão. Não estava no carro quando a criança foi pega. O plano foi organizado por Gão e Fernanda. Gão era traficante e Fernanda o ajudava, em Brusque e Indaial. Acredita que Rosicleide conhecia a família da vítima porque trabalhava como representante. Quando foi preso em Indaial, conheceu um senhor que lhe deu a ideia de pedir para a filha dele um dinheiro para pagar o advogado. Rosicleide foi junto. Não lembra o nome do preso. Não lembra de ter feito churrasco na residência. Usava o telefone de Rosicleide se tinha crédito e ela usava o seu. Mas no sequestro 'jamais ia fazer uma coisa dessas' e 'não pegou o telefone dela para fazer isso'. Conversaram na época do sequestro para não chamar a atenção. O objetivo era, assim que pegasse o dinheiro, deixar todo mundo para trás, não ia ficar com ninguém. O telefone nº 47 97625860 era seu e pegava telefones em negócios. Nunca almoçou com Rosicleide, Gão e Fernanda em Indaial. Ligou para Rosicleide ir junto em Criciúma para trocar o carro porque não tem habilitação. Isso foi num sábado ou domingo. Não chegou a passar no cativeiro. Nunca foi na boate Tio Pedro em Blumenau com Rosicleide, mas esteve lá com Gão e Fernanda, usando o veículo Ford Ka que já tinha vendido. Chamou a polícia, Rose chamou a polícia, a vizinha também, em relação ao vizinho em Indaial. Não existe dívida nenhuma de imóvel. Reconhece sua letra nas cartas escritas para Rosicleide. O mentor do sequestro seria Gão. O número 47 96224801 não conhece; o telefone (47) 96750709 era de Rosi e já utilizou algumas vezes. O número (47) 97625860 era o que usava; e o número (47) 96881111, não lembra. Todo chip que Gão comprava, ele usava e jogava fora, foi o que fez também nas duas ligações. Os 'dois' acharam o telefone do pai do Angelo no Facebook. Não estava no Ford Ka. Está arrependido. Fez duas ligações e não sabe quantas Gão fez. Falou com Jean, fez a primeira ligação. Não tinha planos de fugir com Rosiclede, as malas ela levou no dia da discussão e o dia que foi almoçar" (sic., excertos do depoimento prestado na audiência de fl. 762 e transcrito na sentença às fls. 1.277/1.279).

           Na etapa indiciária, Rosicleide Rodrigues utilizou-se do direito constitucional ao silêncio. No entanto, em juízo, negou a participação no crime alegando que na época dos fatos não estava mais convivendo com Peterson:

    Disse que teve um namoro moderno com Peterson durante mais ou menos seis meses, até abril; em 17 de março ele já tentava terminar. Disse que não estava com ele em maio, mas que estava tentando ficar com ele. A casa foi alugada porque ele foi impedido pela Dra. Leila de Indaial de se aproximar de um inquilino. Ele foi preso e antes de ele sair, a interroganda se antecipou e procurou uma casa em Penha para nós, em fevereiro/março. As brigas começaram em março e continuaram juntos porque a acusada não queria se separar, em abril ainda estavam juntos, mas início de maio saiu da casa e foi ficar na casa de praia de um amigo, em Barra Velha. Não participou do sequestro. Durante o sequestro, ligava muito para Peterson e nunca percebeu que ele estava planejando qualquer tipo de sequestro. Perguntada se esteve na casa durante o sequestro, disse que esteve no sábado à noite quando foram para Criciúma, mas afirmou que passou por perto da casa e não entrou na casa. Quanto às ligações telefônicas, disse que Peterson tinha moto e um dia ele perdeu o celular. Completou que tinha dois números em seu telefone e passou um dos chips com número registrado em seu nome, passou para ele. Disse que não conhecia familiares da vítima; que há uns quatro anos, com seu ex-marido, encontrou o casal pais da vítima numa festa, mas não conversaram e não tinham amizade. Não comentou com ninguém sobre a família. O Ford Ka vermelho era de Peterson, e ele ficou uns dois meses com o carro. Afirmou que em maio ele ainda tinha esse carro e que a acusada foi junto quando ele foi trocar no sul. Conheceu Aldair, tendo-o visto uma ou duas vezes lá no portão e não tinha nenhuma ligação com Fernanda. A troca do carro foi em Criciúma, e Peterson que foi dirigindo o Ford Ka. Ele trocou em duas motos, mas voltaram com uma moto, e ele pilotando. Nunca mais entrou na casa depois de ter saído, onde ele ficou. Não sabe dos cheques. Disse que o aluguel de Penha foi pago com uma moto. Achou muito contraditório o que disseram sobre sua prisão. Disse ter sido presa em Barra Velha três horas da tarde. Foi até o muro ver quem estava chegando quando ouviu barulhos de carro. Acrescentou que lhe bateram muito, seu ouvido sangrou; não foi ouvida em Gaspar e impedida de falar com seu advogado. Disse que estava muito fragilizada quando conheceu Peterson, porque uma filha havia morrido e tinha se separado em julho. Falou que está sendo acusada e ninguém a ouviu, que tomava banho no pátio da DEIC e lá ficou dez dias. Disse que nunca teve nenhum problema ou cometeu estelionato. Disse que está presa inocentemente e está sofrendo muito dentro do Presídio. Não tem dívida imobiliária nenhuma. Peterson comprou um imóvel em Indaial em setembro; o pai dele tinha uma casa, que foi vendida para comprar junto a casa de Indaial. Quando Peterson tirou os pais de casa e a interroganda, o pai dele ficou indignado e lhe ligou. Não era com um corretor de imóveis que falou ao telefone, era o pai de Peterson pedindo o dinheiro de volta, para que vendesse a casa de Indaial e devolvesse o dinheiro. Na Delegacia, foi levada para uma sala onde lhe mandaram abrir o facebook; deu a senha para o agente e não sabe se mexeram ou alteraram; o que está na certidão de fl. 321 dos autos não é verdade. Falou que na casa onde estava em Barra Velha tem um aterro e um pomar. Nunca almoçou em Indaial com Gão e Fernanda. O telefone (47) 9622-4801 não conhece; o telefone (47) 9675-0709 é seu; o número (47) 9762-5860 também é seu; e o número (47) 9688-1111, não conhece. Era comum a troca de telefones com Peterson. Nunca esteve na boate Tio Pedro. Chamou a polícia várias vezes em Indaial em relação ao inquilino e várias vezes teve que ir ao Fórum (sic., excertos do depoimento prestado na audiência de fl. 762 e transcrito na sentença às fls. 1.279/1.280).

           Ocorre que a versão dos apelantes de que na época dos fatos não estavam juntos carece de prova, pois o Delegado Anselmo Firmo de Oliveira Cruz, a testemunha Regina Marques Firmo Evaristo e o policial civil Fernando Barosa, afirmam que os apelantes estavam juntos na época dos fatos, pois além de alugarem a casa que serviu para o cativeiro do infante, trocavam constantes mensagens via celular com palavras de carinho um pelo outro. Vê-se:

    [...] que no dia 29 de maio, por volta das 20h30min, foi acionado pelo Delegado da Comarca de Gaspar, Egídio Manoel Ferrari, informando sobre o sequestro em andamento de um menino filho de um empresário de Ilhota; imediatamente se deslocou com alguns policiais para a Comarca, onde identificaram que o menino Angelo Antonio teria desaparecido no centro de Ilhota, próximo de sua casa e cerca de meia hora ou quarenta e cinco minutos depois, havia sido feito contato telefônico com o pai dele, Jean Carlos, fazendo a exigência de 500 mil reais para que o menino fosse libertado. Montaram base operacional num local fora de delegacia de polícia e o depoente passou a coordenar os trabalhos de investigação, reunindo policiais da DEIC e de Gaspar e Ilhota; na base de operações estavam em cinco policiais que recebiam e processavam todas as informações apuradas e relacionadas ao sequestro e, fora isso, sete equipes de campo faziam as diligências para buscar e certificar informações. Como de praxe, foram requeridas interceptações telefônicas e identificado o número serial do aparelho que fez o contato fazendo a extorsão para o pai da vítima. Começaram a trabalhar com o histórico de ligações desse telefone desde o início do ano ou inicio de abril, pelo menos, e entre os chips que foram utilizados, a maior quantidade de ligações, tanto recebidas quanto feitas, era para um telefone da Rosicleide. Assim, a partir daí já tinham um suspeito, uma pessoa relacionada com aquele que usou o aparelho utilizado na extorsão. No primeiro momento já, Rosicleide chamou atenção por ter envolvimento com estelionato e extorsão em Balneário Camboriú, um perfil incomum. Ela também tinha relações na região, um comércio na cidade de Brusque e amizade através de facebook com a família da vítima. Essa informação foi apurada e não conseguiram materializar porque alguém acessou e apagava as informações e contatos da rede social de Rosicleide. Então, era uma pessoa da região, com contatos na região e com um perfil criminoso que se adequa a essa situação de extorsão mediante sequestro. Ela tinha uma loja de venda de roupas em Brusque. A família da vítima é dona das duas maiores confecções de Ilhota, de roupas íntimas e de praia. Identificaram então Rosicleide como alvo da investigação e apuraram o histórico dela envolvendo um imóvel em Indaial, com o companheiro dela, o até então não identificado Peterson, com vários problemas com um inquilino, boletins de ocorrência, que levaram à prisão de Peterson por descumprimento de ordem judicial de afastamento, além das suspeitas acerca do desaparecimento desse inquilino, umas duas semanas antes do sequestro, seguido do desaparecimento de Rosicleide e Peterson de Indaial. Eram situações muito suspeitas, chamaram atenção e levaram às deduções no sentido de que tiveram problemas lá, sumiram e queriam resolver a vida cometendo um sequestro, um jeito de conseguir um valor alto. Com a identificação preliminar do nome falso de Peterson Silva Machado, só havia essa passagem em Indaial, o que também levantou suspeitas, pois essa pessoa não tinha nenhuma passagem, nem registro de carteira de identidade, nada, uma pessoa com vida civil muito recente. Graças a essa prisão em Indaial, puderam identificar tatuagens dele pelo corpo. Também verificaram que o mesmo aparelho, antes de fazer a ligação da extorsão, recebeu a ligação de um orelhão e esse orelhão foi localizado nas margens da 101 em um hotel em Barra Velha, e através da filmagem do hotel identificaram que a pessoa tinha o biotipo parecido com o Peterson, que já sabiam ser o companheiro da Rosicleide, e uma testemunha informou que ele tinha uma tatuagem no pescoço. Das testemunhas iniciais, uma teria visto um carro vermelho usado para arrebatamento do Anderson, o carro chegou a ficar parado num beco, e identificaram que em Indaial, antes de Peterson e Rosicleide desaparecem, usavam um Ford Ka vermelho, o que foi confirmado por um policial de Indaial, o que era mais um elemento que os vinculava ao sequestro. Trabalhando com a identificação ainda de Peterson, pois não fechava a vida civil dele, chegaram no nome verdadeiro, o que mostrava o histórico criminoso, foragido da região de Tubarão, quatro mandados de prisão em aberto por roubos naquela região, o que mostrava um perfil delinquente bem capaz de cometer um crime dessa natureza, isso reforçado pelo desaparecimento desse inquilino em Indaial. Pela movimentação das poucas ligações feitas, na realidade ele usava um aparelho para fazer os contatos das extorsões, uma ligação inicial, sábado umas duas ligações em que ele fez a troca de chip, mas usou o mesmo aparelho e no domingo nova ligação. Então, a partir do monitoramento de todos os contatos feito com esse mesmo telefone, perceberam movimentação dele na região de Penha. Acreditavam então que fosse ele o sequestrador e que o cativeiro fosse na cidade de Penha, mas por uma questão técnica de interceptação telefônica, não tinham endereço do cativeiro. Peterson fez um primeiro contato na quinta feira exigindo 500 mil reais e combinando pagamento no sábado em Balneário Camboriú. No sábado fez um novo contato e dizendo que seria feito outro contato segunda-feira para que conseguisse o valor de 500 mil reais. No domingo houve uma mudança de cenário, em que ele fez um contato não programado, bastante alterado e fez ameaças ao Angelo por conta da notícia veiculada no jornal Diarinho de que a polícia estaria atuando no caso sequestro, ele fala inclusive que viu a notícia e estava bastante irritado por isso, aumentando o valor para 600 mil reais e mencionou que o avô tinha dólares e joias que deveriam ser entregues também, o que deixou o pai muito abalado, tendo o avô continuado a ligação. No domingo a polícia tinha bastante convicção de que era o Peterson o sequestrador e perceberam uma movimentação, até de conversas, de que havia problemas com o imóvel em Indaial e aparentemente não queriam voltar pra lá e precisavam de dinheiro para resolver a vida. Tinha motivação pessoal de atritos com os pais de Peterson, que moravam juntos neste imóvel de Indaial e teriam ido para Penha. Ficou claro também que a movimentação deles tentava deixar Rosicleide de fora, como se não aparecesse nesse crime. Mas até na fala dele nas ligações telefônicas, se demonstrava um ar de falsidade, no sentido de ter sido orientado. Depois de esclarecido todo o fato e da prisão, perceberam que Peterson é burro, é a força bruta. E Rosicleide tem um perfil de estelionatária, de pessoa com habilidades de convencimento e com lábia, então 'a classificação que eu faço pessoalmente é que no sentido de que o próprio Peterson foi manipulado nessa situação ou bem orientado pela Rosicleide'. No domingo tinham bastante convicção de que era realmente ele quem fazia as ligações da extorsão e que tinha contato com a vítima, porque foi pedido uma prova de vida entre sábado e domingo, e ele providenciou uma gravação em que se identificou com dificuldade que era a voz do Angelo. No sábado teve um fato peculiar que foi uma ida deles a Criciúma, o que gerou apreensão porque poderia ter sido trocado o local do cativeiro, mas entre domingo e segunda-feira voltou a movimentação em Penha. Então determinou que as equipes de campo trabalhassem com janelas de oportunidade, ou seja, se houvesse a chance de abordar a pessoa suspeita sem risco para a vítima, autorizou a abordagem. De segunda para terça-feira, perceberam pelas ligações a tentativa da compra de um outro carro em Brusque, identificando-se um picareta de carros com quem Peterson fez alguns contatos. Havia dúvidas se Rosicleide iria junto. Na terça-feira uma equipe de campana localizou Peterson defronte a casa de um indivíduo que vende carros, onde fizeram a abordagem e a condução. Pelo que foi relatado, ele ficou perdido e desorientado sobre o que fazer. Ele indicou onde seria exatamente o local do cativeiro e foram reunidas equipes de campo no parque Beto Carrero. Peterson avisou que era um casal que estava responsável pelo cativeiro e que eles teriam armas. O menino estava na parte de cima da casa trancado e o casal na parte de baixo. Nas ligações ele dizia que o menino estava comendo pizza e lasanha e que estava pensando em ver o remédio que o menino tomava, mas perceberam a mentira porque um dos pratos os pais afirmaram que a criança não comia. Ele nem sabia dizer o nome das pessoas responsáveis pelo cativeiro, falou que a moça era 'Galega' e o rapaz seria 'Gão', ele de Penha e ela de fora, sem outros elementos para identificação. A proprietária da residência em Penha morava na casa ao lado do local usado como cativeiro. A casa foi alugada, acredita que em fevereiro, pelo casal Rosicleide e Peterson, também morando lá os pais de Peterson. Essa testemunha afirmou que alguns dias ou um mês antes os pais de Peterson saíram da casa e ela até perguntou se 'Dona Solange e Seu Geraldo não estão morando mais aí'. Neste ponto, ressalvou que o nome da mãe de Peterson é Adélia e não Solange, e que outras vezes viu esse expediente de pais de pessoas foragidas mentirem os próprios nomes para não identificarem que o filho usa nome falso. Na semana antes do sequestro, a própria Rosicleide mencionou para a proprietária da casa que iria ficar duas semanas fora, que iria para São Paulo participar de uma feira, o que demonstrou uma mentira por parte de Rosicleide, denotando exatamente que estava preparando para que o local fosse usado como cativeiro e tentando debelar qualquer participação dela. Mencionou que isso mostra a 'mente inteligente' dela, de não só elaborar o plano, mas também cercar de toda maneira para se proteger e ficar de fora de qualquer ação concreta. Ela mencionou ainda que na mesma semana ou 15 dias antes, Rosicleide perguntou para a vizinha se não queriam banners que ela tinha e eram bons para usar como blecautes nas janelas, e uma outra vizinha confirmou que os blecautes foram colocados nas janelas da casa na semana anterior ao sequestro. Para a proprietária da casa ela comentou também que um casal de primos dela viria do Paraná para ficar uns dias na casa, mais uma mentira, já que o casal não tinha parentesco com ela: ele era da região de Penha e a moça, Fernanda Marin, era prostituta em uma boate entre Blumenau e Indaial. Foi identificado depois que os quatro, Peterson, Rosicleide, Gão/Aldair e Fernanda várias vezes almoçavam antes juntos na região de Indaial, então os quatro se conheciam bem antes. No dia 20 de maio, se não se engana, Peterson e Rosicleide foram buscar a Fernanda nesse prostíbulo, o que foi documentado no inquérito por prova testemunhal, em contrapartida à versão dada para a vizinha de que seria um casal de primos, o que demonstrou as mentiras tentando acobertar a situação. Fernanda foi identificada como quem atraiu o inquilino da casa em Indaial para que ele fosse morto. Peterson acompanhou a polícia até o local do cativeiro, ficando na viatura. Logo na entrada da casa, foi identificado o homem com arma na mão, provavelmente escutaram barulho das viaturas. Caracterizada a ameaça contra os policiais e o próprio Angelo, já que Gão poderia correr para a parte de cima, os dois foram alvejados. Na parte de cima, a porta estava meio trancada, pesada, e lá dentro Angelo bastante assustado, abatido e nervoso. Ele estava desorientado e isso levou a suspeita de que pudesse ter sido dopado, o que não se confirmou. O menino, depois, disse que percebeu que era um sequestro, ele falou que a menina era agressiva e o xingava. Tinha ameaças, não abertamente de morte, mas diziam para ele não falar nada, não gritar, que seria pior pra ele. No início eles falavam que era uma brincadeira, um jogo, mas em um certo momento ele entendeu que estava sequestrado e que queriam dinheiro. Mesmo alguns dias depois, ele demonstrou estar desorientado, não tinha noção do tempo que ficou no quarto, fechado. A casa onde estava Rosicleide foi indicada por Peterson, e era em local próximo de onde foi feita a ligação do orelhão para o teste do telefone antes da primeira extorsão. Os policiais disseram que ela estava no muro, com aspecto de ansiedade, e no quarto sobre a cama tinha duas malas prontas. Outra situação que chamou a atenção é que nas conversas entre eles sempre faziam força para não mencionar o sequestro, mas ao mesmo tempo os dois tiveram conversas no sentido de que 'nossa vida vai se resolver agora'. Rosicleide chegou a ter uma conversa com um corretor de imóveis sobre uma negociação de 100 mil reais. Havia uma ansiedade com os pais dele por conta do imóvel, do negócio mal feito em Indaial; compraram uma casa lá e não conseguiram tirar o inquilino. A impressão que deu é que os pais de Peterson deram o dinheiro, foram morar junto, e o negócio deu errado, mas quem fez o negócio foi Peterson e Rosicleide. Peterson e Rosicleide se falaram algumas vezes durante o período do sequestro e uma situação que levou inclusive à convicção e foi um dos motivos da prisão em flagrante da Rosicleide, foi que numa ligação que ela fez para uma amiga de Itajaí marcando de ir numa festa, foi feita pela Rosicleide com a ERB do sinal da estação rádio base exatamente que batia com o do cativeiro, em Penha. Depois, foi identificado por uma outra vizinha, que na noite de sábado teve um churrasco na casa do cativeiro com dois casais presentes. Peterson foi visto lá durante o sequestro, Gão e Fernanda também foram vistos durante o sequestro, e Rosicleide tentava se manter afastada, mas ela cometeu essa falha de ter ido nessa noite até ali, não foi vista efetivamente, mas se ouviu a voz de dois casais. Uma ligação que ela fez, ela falando no telefone, bate a ERB do cativeiro, só não conseguiam precisar qual a casa, ERB bem distinta de onde ela foi presa, que era bem longe. Essa ligação ela fez em Penha, no mesmo azimute do cativeiro. Identificaram que Peterson fez uma vida falsa com o outro nome. Encontraram vários documentos e um volume grande de cheques com esse nome. Nas negociações com a família da vítima, todas as ligações foram feitas pela mesma voz masculina, aparentemente pelo Peterson, e em certos momentos parecia que estava lendo um texto de maneira robótica. Trabalharam com centenas de elementos de provas e o primeiro nome surgido como suspeito foi o da Rosicleide, e aí chegaram no Peterson. A partir do telefone usado para fazer a extorsão, foi feita a quebra de listagens e esse aparelho durante vários meses, com quem manteve mais contato, foi o telefone da Rosicleide. Não sabe dizer se a ocorrência de Balneário Camboriú resultou em processo criminal, pois era um boletim de ocorrência recente. Foi identificado que um ou dois facebooks de familiares da vítima tinham amizade com Rosicleide; e na Delegacia, quando ela acessou o facebook, havia outra pessoa deletando as informações. A conclusão do inquérito em Indaial é que os dois, junto com Fernanda Marin, cometeram o homicídio, tendo Peterson colaborado com a localização do corpo. Havia boletins de ocorrência das duas partes, tanto de Rosicleide como Luis. O azimute se trata de uma linha a partir da estação rádio base, a partir da ERB, e pode alcançar seis quilômetros, a distância da ERB para o local do cativeiro é de 300 metros. A relação de Peterson e Rosicleide iniciou no sul do Estado" (Delegado Anselmo Firmo de Oliveira Cruz, sic., trechos das declarações prestadas na audiência de fl. 762, transcrito na sentença às fls. 1.280/1.285).

           Corroboram as declarações do Delegado de Polícia os depoimentos dos policiais civis Eduardo Pacheco Schramm e Daniel Nilton dos Santos (fls. 691/692).

           Também extrai-se das informações que constam no relatório de fls. 109/113, em que se realizou um cronograma das interceptações telefônicas, que uma das ligações ocorreu de um terminal usado no sequestro para um ramal de telefônico público, localizado na frente de um hotel em Barra Velha/SC, cidade onde estava Rosicleide. Segundo os depoimentos dos policiais, o telefone público teria sido usado por um homem com características semelhantes a Peterson e com um carro vermelho.

           O número inicialmente utilizado pelo sequestrador (47) 9622-4801, conforme o mencionado relatório de investigação policial, tinha como interlocutores dois números vinculados à Rosicleide (47) 9675-0709 e (47) 9762-5860, de forma que esses telefones também foram interceptados e, então, ficou constatado que ambos os ramais efetuaram ligação telefônica às 11h03min do dia 29.05.2014 da mesma região em que fica o telefone público supracitado. Logo, tanto Peterson quanto Rosicleide estiveram na localidade em que o número utilizado para o pedido de resgate no dia em que o sequestro se concretizou.

           Ainda de acordo com o relatório, foi também constatado que o ramal (47) 9762-5860 realizou ligações da cidade de Ilhota/SC entre 16h49min e 17h14min, pouco tempo antes do efetivo sequestro do menino naquele município.

           Também há referência de que a primeira ligação do sequestrador foi realizada pelo número (47) 9675-0709, que era utilizado por Rosicleide, conforme as escutas telefônicas demonstram. Ficou comprovado, igualmente, por intermédio das escutas telefônicas que o número (47) 9762-5860 era utilizado por Peterson, o qual, segundo rastreio de chamadas, encontrava-se na cidade de Penha/SC, local do cativeiro de A. A. B. de O.

           Importante destacar, ainda, quanto às interceptações: No dia 30.05.2014, o telefone de Peterson registrou ligações na cidade de Penha/SC entre 12h e 12h34min. Já o telefone de Rosicleide realizou ligações em Barra Velha/SC às 12h, em Ilhota/SC às 12h25min e às 12h34min em Penha/SC, região do cativeiro.

           No dia 31.05.2014 às 10h10min, o mesmo seqüestrador, ou seja, Peterson, entra em contato com o telefone de Jean (pai do infante sequestrado) para continuar com as exigências de dinheiro para libertar A. A. B. de O., momento em que Jean pede ao sequestrador uma prova de vida de seu filho. Às 15h23min Rosicleide e Peterson se telefonam, sendo que ela está em Itajaí/SC e ele em Penha/SC, o mesmo se repete às 15h54min. O seqüestrador volta a fazer contato, agora da cidade de Piçarras/SC, com Jean às 17h35min, para mostrar ao pai do infante uma gravação de A. Pouco tempo depois desse contato, o telefone de Peterson foi utilizado em Piçarras/SC.

            Cabe ressaltar que nesse dia o sequestrador realizou as duas chamadas do ramal (48)9807-6601, porém utilizando o mesmo aparelho de IMEI: 359348035359890.

           Ainda no dia 31.05.2014 às 18h31min, Rosicleide enviou uma mensagem de texto de seu celular com o seguinte conteúdo: Ela ainda gosta de vc só tem medo então e um trabalho de reconquista to no banho já volto responder bj bj. Essa mensagem que Rosicleide diz que está no banho foi enviada do local do cativeiro de A. A. B. de O., conforme rastreio utilizado através da antena de celular na cidade de Penha/SC. Mais tarde, Rosicleide e Peterson foram à cidade de Criciúma/SC para se livrarem do Ford Ka vermelho utilizado no arrebatamento de A., pois a notícia de que esse carro teria sido usado pelos seqüestradores do menino A. foi divulgada pela imprensa da região.

           Depois deste fato, Peterson teria novamente feito contato com a família do infante para subir o preço do resgate para R$ 600 mil reais, além de dólares e jóias que estariam no cofre do avô de A., Erico de Oliveira.

           No mesmo sentido do relatório das interceptações telefônicas, colaciona-se o depoimento do policial civil Fernando Barosa, o qual participou das investigações sobre o sequestro e esclareceu que Rosicleide esteve no local do cativeiro, pois ao rastrear o telefone celular de sua propriedade foi detectado que estava na mesma região de Penha/SC na qual se localizava a casa que serviu de cativeiro para abrigar a vítima.

    [...] que participou das investigações do sequestro. Inicialmente, houve um contato da família pedindo 500 mil reais. Houve interceptações telefônicas e fizeram análise de quebra de dados e informações, aparecendo dois telefones vinculados a Rosicleide. Ela chamou a atenção pela quantidade de boletins de ocorrência, um deles mencionando uma extorsão que ela teria praticado junto com Peterson, o que levou às suspeitas sobre os dois. Interceptaram também os telefones dela. Descobriram que Peterson tinha quatro mandados de prisão e ele se passava como se fosse um irmão, então havia dois cadastros em sistemas com nomes diferentes. Teve uma ligação originada de um orelhão e nas imagens do local, conseguiram identificar um Ka e a testemunha do hotel indicou características que batiam com as de Peterson. Também havia a informação de que o arrebatamento da criança foi por um Ka. Pelas interceptações, sabiam que os dois estavam entre Penha e Barra Velha. Quem ficava mais no cativeiro era Peterson, mas houve um fato específico que Rosicleide estaria no mesmo azimute mesmo local da antena e em troca de mensagens com terceiro disse que ia tomar banho, o que deu a certeza de que ela estava também no cativeiro. A Rosicleide disse depois que não tinha nada a ver com Peterson, mas ficou claro que eles mantinham um relacionamento, tendo até dito por áudio ou mensagem que inventou pros sogros que estavam separados porque teve problemas com eles, além da forma que se chamavam. Localizaram Peterson, que indicou o local do cativeiro e informou que lá havia duas pessoas armadas. Depois a polícia encontrou Rosicleide com as malas prontas. Durante as ligações, Rosicleide disse que teria um dinheiro para entrar, alguma negociação que estava fazendo e que nos próximos dias tinha expectativa de receber. Nas interceptações, dava a entender que Rosicleide conhecia o cativeiro, já esteve lá e teria tomado um banho no cativeiro, mas não que permanecia o tempo todo lá. Peterson e Rosicleide estavam juntos há um tempo, mas naqueles dias durante o cativeiro eles passavam algumas noites juntos e outras Peterson passava no cativeiro. Durante o período houve bastante trocas de mensagens, conversas, localizações de ambos os telefones na mesma região, o que não deixa dúvidas de que estavam juntos durante o ocorrido. A criança relatou que havia três pessoas no veículo, que seriam Peterson, Fernanda e Gão. Fernanda e Gão o tempo todo cuidavam da criança no cativeiro. Depois que a imprensa divulgou o carro envolvido, houve ligação para a família com novas ameaças e aumento do valor do resgate, para 600 mil, joias e dólares. Peterson confessou o crime, logo que foi preso. No começo ele deixou dúvidas sobre o envolvimento de Rosicleide, mas passou a negar. No facebook, Rosicleide tinha amigos em comum com a mãe da criança. Quanto ao delito de falsidade, se recorda que ele se passava por um irmão, como se tivesse um irmão gêmeo. Não lembra dos documentos que foram encontrados [...] (fl. 1.182).

           De outro viés, ainda que os apelantes queiram sustentar que na época dos fatos não estavam mais juntos, e que Rosicleide nada teria a ver com o crime perpetrado, verifica-se que tais alegações são isoladas nos autos, pois a testemunha Regina Marques Firmo Evaristo, que locou a casa que serviu como cativeiro para o infante A., na oportunidade em que foi ouvida em juízo, destacou que o casal Peterson e Rosicleide, os quais chamava de Pedro e Rose, tinham um bom relacionamento. Relata que bem na época do sequestro, Rosicleide teria dito que viajaria para São Paulo a fim de participar de uma feira, inclusive, deixando avisado que um casal de primos ficaria em sua casa juntamente com Peterson, para não levantar suspeitas acerca da aparição repentina de Fernanda e Adailton na casa.

    [...] que alugou a casa para Pretroson, a quem chamava de Pedro, e a Rose, um casal, em fevereiro. Disseram que era rápido porque estavam vendendo um terreno em Indaial. Eram vizinhos bons, pagaram adiantado até agosto. Deram a entrada em dinheiro e ofereceram uma moto em pagamento dos demais meses. Eram vizinhos perfeitos: ela disse que tinha uma loja e que havia fechado a loja e ele que era revendedor de carros. Só soube dos fatos no dia que a polícia chegou, onde encontraram o menino. Não entende como o menino não a ouviu falar e nem ouvia seus cachorros latirem. Vieram em quatro morar, os pais de Peterson, ele e Rose. Foi viajar em abril e quando voltou de viagem, os pais dele tinham ido embora. Perguntou para Rose e ela disse que discutiram e acharam melhor arrumar uma quitinete para eles morarem sozinhos. Ela disse também que ia fazer uma viagem para São Paulo e ia ficar cerca de 15 a 20 dias, ia trabalhar para uma loja Fakini, fazer uma feira em São Paulo, para pagar o que deve para eles. O jeito que ela se lamentava já chorei com ela, vocês não têm noção, ela é fera. Ela disse que ia viajar e que Peterson ia ficar, também disse que vinha um casal de primos do Paraná que estavam em férias e iam ficar ali uns 10 ou 15 dias. Mas não viu esse casal. Dia 25 de maio fez um almoço em casa e quando foi na garagem, viu uma moça correndo, parecida com a Rose, mas quando ela levantou a cabeça, viu que não era a Rose. A moça se apresentou como a prima da Rose. Na contratação do aluguel, mostraram documentos de identidade. Rose falou um dia que uma época estava a ponto de separar por causa da mãe dele, mas ela dizia uma coisa, mas o que mostrava pra gente era um casal perfeito, se chamavam de amor e de cheiro. A movimentação da casa era tranquila. Depois que Rose viajou, não a viu mais. A depoente não estava em casa no dia que teria acontecido o churrasco. Na terça feira, viu Peterson lavar uma moto na frente de casa e não viu o carro deles na garagem, um Ford Ka vermelho [...] (1.292/1.293).

           Corroborando com as declarações acima citadas, verifica-se o depoimento de Rosangela Vargas Firmo, vizinha do imóvel que serviu como cativeiro: "[...] disse que na casa vivia um casal por uns quatro ou cinco meses. Sabe que tinha um carro vermelho. Escutou que no sábado teve um churrasco e pelo que ouviu, devia ser dois casais. Não sabe se era o Peterson e a mulher. Tinha duas vozes femininas e dois homens. Chamou a atenção a colocação de um banner na janela da frente da casa, uma foto de loja. Quase não viam Rosicleide e naquela semana parecia não ter ninguém em casa. O muro da casa é alto. Havia uma senhora morena na casa logo que chegaram, os pais de Peterson moraram ali e não viu sinais de mudança. No churrasco, referiu ter ouvido uma parte de conversa de uma pessoa perguntar para a outra: "amor, a farofa tá pronta? Porque a carne tá pronta.[...]" (fl. 1.054).

           De outra banda, constata-se que Peterson e Rosicleide já conheciam os criminosos que foram alvejados pela polícia no momento do "estouro" do cativeiro, Fernanda Marin e Adailton, vulgo Gão, da cidade de Indaial, conforme verificado pelas testemunhas Wilmar Giovanella e Jean Paulo Gai Ribicki.

    [...] que Peterson e Rosicleide frequentavam o restaurante Kanecos Bier, em Indaial, vieram algumas vezes almoçar. Confirmou que frequentavam o restaurante em abril e maio, não lembrando se em período anterior. Quando viu nos jornais a foto da prisão deles, os reconheceu como as pessoas que frequentavam o restaurante. Que um dia estava servindo buffet e eles estavam esperando um casal que vinha de Brusque ou Gaspar, comentaram que aguardariam essas duas pessoas. A única coisa que lembra que a moça que morreu veio no buffet e disse que gostava de comer muita carne. Reconheceu essa moça por foto: na sua opinião é a mesma pessoa que esteve lá, galega, estatura média, 1,60 m ou um pouco mais, jovem. Outras vezes Peterson veio almoçar com o padrasto e sua mãe, e outra ocasião um outro casal almoçou com eles. Sabe que eles tinham um problema com uma casa e pediram indicação de advogado. Na vez que eles esperaram esse outro casal, estavam o Peterson e a esposa que está presa. Reconheceu fotografias de Peterson e de Rosicleide. Reconheceu foto também da pessoa que esteve com eles e disse que gostava de carne. Anteriormente, vinha um casal de senhores de idade almoçar com eles (Wilmar Giovanella - fls. 1.293/1.294).

     [...] que reconhece sua assinatura no depoimento prestado. Disse que foi trabalhar no bar Tio Pedro para roçar e à tarde, entre uma e duas horas, chegou um casal e conversou com as meninas no ponto de cima, eram garotas de programa. O casal depois perguntou para o depoente se conhecia uma menina da casa para leva-los para conhecer a cidade. Chegaram em um Ka vermelho. A moça era loira, de óculos, mas não saiu do carro. Reconheceu por fotos. Recordou-se muito bem de Peterson, porque o viu, e Rosicleide aparentemente era ela, a roupa era a mesma. O depoente chamou uma menina da casa e ela não quis ir, mas depois conversou com eles lá fora. Cerca de 15 minutos depois ela disse que ia sair com eles, que teria sido paga, falou que voltaria de noite. Não falou o que ia fazer, mas pode ser que teriam ido fazer um programa. Pelas 19 horas, a irmã de Fernanda veio procura-la e, não a encontrando, ligou para ela, que teria dito que estava saindo do motel e iam sair para comer e depois voltar para o bar. Parecia que eles já tinham se encontrado mais de uma vez, porque ela deu um beijo e falou pra Fernanda quanto tempo; que Peterson também a abraçou. Então parecia que se conheciam (Jean Paulo Gai Ribicki - fls. 1.293/1.294).

           Logo, conclui-se que Rosicleide e Peterson alugaram uma casa, a qual foi cuidadosamente preparada para servir de cativeiro para a vítima, com a colocação de "banners" nas janelas, para evitar que alguém pudesse ver o que ocorria no local, bem como procuraram o auxílio de Fernanda Marin e Adailton, vulgo Gão, antigos conhecidos dos apelantes na cidade de Indaial e que estes permaneceram no local durante todo o tempo em que perdurou o sequestro, vigiando a vítima.

           Além disso, próximo a data do crime, Rosicleide procurou inventar uma versão sobre os fatos, a fim de se isentar da responsabilidade e não levantar qualquer suspeita sobre sua participação no crime, alegando que ficaria fora por 10 (dez) ou 15 (quinze) dias participando de uma feira em São Paulo, porém como registrado alhures, nos depoimento dos agentes públicos, Rosicleide esteve em Penha/SC por pelo menos duas vezes durante o sequestro. Em uma delas, inclusive, teria tomado banho no local e, na outra, teria participado de um churrasco juntamente com Peterson, Fernanda e Adailton.

           Nesse mesmo viés, como bem destacado pela Magistrada prolatora da sentença, a insistência em afastar Rosicleide da participação no evento criminoso, esbarra em inúmeros depoimentos e provas de que realmente não só participou do delito, como também foi a mentora intelectual da ação. Veja-se:

    [...] quanto à acusada Rosicleide, percebe-se a insistência dos réus de afastar a participação dela no evento criminoso, o que esbarra nas inúmeras contradições em suas falas e em circunstâncias fáticas, devidamente comprovadas, que impedem que se acredite na versão articulada pela defesa, senão vejamos.

    Primeiro, vã a tentativa de Rosicleide de qualificar sua relação com Peterson como um 'namoro moderno' (interrogatório judicial), pois ela mesma, quando informou os dados para o boletim individual de fl. 14, contou que 'vive com o cônjuge', informação também repassada por Peterson em documento semelhante (fl. 23). Peterson se refere a Rosicleide como sua esposa e não há dúvidas, pelo que se depreende dos autos, que eles eram um casal. Em 10-6-2014, em depoimento para a polícia de Indaial, Rosicleide afirmou que vivia com Peterson desde novembro de 2013 (fls. 124-125).

    Neste contexto, não é crível a alegação de que estavam separados justamente no período do sequestro, pois continuavam a se falar: conforme os policiais relataram, com base nas interceptações telefônicas, havia comunicação entre eles, inclusive se denominando de forma que dava a entender que não houve o rompimento.

    Assim, a circunstância de a todo tempo os réus tentarem afastar Rosicleide da cena do crime, a casa comum do casal que serviu de cativeiro demonstra, pelo contrário, que ela sabia do que ali ocorria e que buscava não denotar sua ligação com a extorsão, pois de todos os envolvidos era a única que teve relações com a família vítima, conforme relatado por Laurinha Bailer de Oliveira, mãe da criança sequestrada.

    A farsa da 'briga' e da 'separação' fica ainda mais evidente quando se constata que a própria Rosicleide inventou uma história diferente para a vizinha, a testemunha Regina Marques Firmo Evaristo, para quem Rosicleide disse que sairia da casa por alguns dias 15 ou 20 para participar de uma feira em São Paulo, o que não ocorreu, porque a todo tempo ela ficou em local próximo, em Barra Velha. E mais: foi Rosicleide quem justificou para a mesma vizinha a presença de duas pessoas na casa os comparsas Gão e Fernanda, encarregados do arrebatamento do menino com Peterson e da vigilância da criança durante o período de cativeiro como seus parentes do Estado do Paraná que, supostamente, passariam alguns dias na casa. Então, se Rosicleide realmente não soubesse do crime, por que ela justificaria a presença dos outros sequestradores para a vizinha? Não há outra resposta senão a de que ela, conforme as palavras do Delegado Anselmo Firmo de Oliveira Cruz, estava preparando para que o local fosse usado como cativeiro e tentando afastar sua participação. Aliás, conforme o Delegado, 'isso mostra a 'mente inteligente' de Rosicleide, de não só elaborar o plano, mas também cercar de toda maneira para se proteger e ficar de fora de qualquer ação concreta' [...]

           Vai ao encontro do relatado pela Magistrada, as declarações da genitora do ofendido, Laurinha de Oliveira Bailer, a qual conhecia Rosicleide, pois esta era amiga da sogra de sua sobrinha. Relatou que, na época do sequestro, Rosicleide chegou a passar na casa de familiares da genitora de A. para coletar informações sobre o crime:

    [...] que seu marido ligou avisando que haviam roubado seu filho. Quando chegou em casa, correu no rio e no mato e achou que haviam feito alguma coisa com seu filho. Seu marido então recebeu uma ligação pedindo 500 mil. Logo veio a polícia e um policial ficou em sua casa; que tomou vários remédios porque queria morrer. Foi feito um outro contato telefônico, o sequestrador falou que viu no jornal que a polícia estava no meio, aumentou o valor. Ouviram uma gravação do filho, que reconheceram não pela voz, mas pela frase que seu filho sempre fala. O sequestrador aumentou para 600 mil, querendo também o ouro e os dólares. Então pensaram que era alguém que era próximo e conhecia a sua vida. Conheceu Rosicleide numa festa em Itajaí, da sogra de sua sobrinha, na época ela era casada com outro homem, dono de uma churrascaria, que é uma boa pessoa. Ela conversou com a depoente nesta festa, falou que sua vida eram Angelo e Taline, seus filhos. Disse que passou tempo disso e na sexta-feira Rosicleide esteve nessa casa onde se conheceram, porque ela sabia que sua sobrinha estava lá e poderia falar o que estava acontecendo , tanto que a dona da casa se assustou e ficou surpresa porque fazia muito tempo, já que ela tinha se separado do bom marido; foram jogar boliche. Quando a polícia chegou com a foto de Rosicleide, na hora sua sobrinha reconheceu e falou o apelido dela. Nisso a sogra dela já ligou, e disse que teria mandado pelo celular uma mensagem dizendo que a sequestradora era a cara de sua amiga, falando de Rosicleide. Então, acredita que ela colheu alguma informação da depoente nessa festa. Não foram ao horário do encontro e ficaram esperando a ligação; tendo o seu marido falado para o sequestrador que não havia conseguido o dinheiro. Então seu sogro passou a negociar com o sequestrador e a polícia pediu para enrolar a ligação. Depois que a polícia recuperou seu filho, ele lhe contou que um cara e a criança apontou pelas fotos - chamou ele até o carro para dar um CD e ele, muito medroso, não desceu do patinete. Aí a pessoa disse que o CD era para seu amigo Josué que realmente era o melhor amigo do filho. Quando o menino se aproximou, Peterson pegou Angelo. Seu filho reconheceu Peterson e os dois que morreram por fotos. Angelo foi deitado no banco, tampado, e a moça foi atrás com ele, o segurando. Ela falou para Angelo que era um jogo e seu pai estava sabendo. Peterson também disse que sabia tudo sobre a vida dele, onde estuda, sua casa, e que ele tinha que colaborar com o jogo, tudo que perguntarem, Angelo tinha que responder e que não poderia mentir. Angelo achou que era um jogo até sexta à noite. Seu filho disse que botaram ele num cantinho, mas só naquele dia e algumas horas. Depois o tiraram dali e o amarraram pés e mãos com o cadarço do tênis. Falou também que vendaram seus olhos, palavra que não é de uso da família. Angelo contou também que os sequestradores Peterson e os dois que morreram - discutiram entre eles, algo como quer sair do jogo? e então Angelo percebeu que não era um jogo, já que estavam brigando porque o que morreu saiu para usar droga e Peterson reclamou de ter deixado a moça sozinha na casa com Angelo. Que Rosicleide apresentou a moça para os vizinhos como sobrinha que iria passar uns dias na casa, dizendo que iria para São Paulo. Angelo comia uma vez por dia, tomou dois banhos. A moça que morreu não lhe batia, chamava palavrão e mandava o menino calar a boca quando ele chorava ou dizia que tinha saudades. Angelo reconheceu os três envolvidos no sequestro, mas não teve contato com Rosicleide. Disse que ficaram sequelas. Angelo falou que eles perguntaram onde ficam as joias de sua mãe e os dólares e ele pediu desculpa por ter contado qual era o lugar. Não mencionou para Rosicleide, naquela festa, sobre joias e dólares, mas na cidade a família é muito conhecida, pois seu sogro comprava muito ouro em um garimpo. Eram três pessoas no carro, mas tem certeza, como mãe, que quem foi mentora de tudo foi a Rosicleide. Quando questionada sobre as sequelas, disse que seu filho tirou zero na escola por um mês e meio, dois meses, que Angelo ficava na escola pensando, quieto, e as professoras se apavoraram. Mas faz uns quinze dias que ele conseguiu contar pra os amigos. O menino vai na psicóloga em Blumenau duas vezes por semana, mas não tem um dia que ele não fala neles; ele diz que quer estudar e um dia dar um tiro no pé ; que Angelo pergunta muito se eles vão sair quando ele estiver adulto; tem medo de sair de casa dizendo: e se eles saíram?; tem muito medo e fala muito sobre o que aconteceu, já chegaram a fazer corrente de oração para que o filho pudesse esquecer isso. A família tem medo agora, vivem com bastante medo (fls. 1.290/1.291).

           Sobre situações semelhantes, colhe-se da jurisprudência deste Sodalício:

           1) Apelação Criminal n. 2011.016928-1, de Rio do Sul, rel. Des. Sérgio Izidoro Heil, j. 18-12-2012:

    APELAÇÃO CRIMINAL. EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS BEM DELINEADAS NO CONJUNTO PROBATÓRIO. DEMANDA COMPLEXA, COM INÚMEROS DENUNCIADOS. AGENTES ALTAMENTE ORGANIZADOS PARA A PRÁTICA DE DELITOS COM O MESMO MODUS OPERANDI, TENDO COMO ALVO AGÊNCIAS BANCÁRIAS. PRIVAÇÃO DA LIBERDADE DE GERENTES E SEUS FAMILIARES. PROVA EFETIVA DA PARTICIPAÇÃO DOS SEIS APELANTES NA EMPREITADA DELITUOSA. EXISTÊNCIA DE CONDENAÇÃO, ADEMAIS, DE TODOS OS RECORRENTES EM OUTRA AÇÃO PENAL EM FACE DE CRIMES ANÁLOGOS. ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM DIANTE DA CONDENAÇÃO PELA FORMAÇÃO DE QUADRILHA (ART. 288 DO CP) E SEQUESTRO MAJORADO PELO CONCURSO DE AGENTES (ART. 159, § 1º, DO CP). NÃO OCORRÊNCIA. DELITOS AUTÔNOMOS. DISTINÇÃO DOS BENS JURÍDICOS TUTELADOS PELAS NORMAS PENAIS INCRIMINADORAS. CONDENAÇÕES MANTIDAS. DOSIMETRIA ACERTADA. CIRCUNSTÂNCIAS DO ART. 59 DO CP DEVIDAMENTE APLICADAS. PLEITO DE CONCESSÃO DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE. INACOLHIMENTO. PERMANÊNCIA DOS ACUSADOS SEGREGADOS DURANTE TODA A INSTRUÇÃO PROCESSUAL. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ART. 312. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

           2) Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2012.017616-2, de Caçador, rel. Des. Torres Marques, j. 17-07-2012:

    APELAÇÕES CRIMINAIS. EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO. RECURSOS DEFENSIVOS. TESES PRELIMINARES. NULIDADE POR FALTA DE NOMEAÇÃO DE CURADOR NA FASE INDICIÁRIA AVENTADA PELO APELANTE VANDERLEI. EVENTUAL VÍCIO OCORRIDO NA FASE INQUISITORIAL QUE NÃO CONTAMINA A AÇÃO PENAL. MATÉRIA ATINGIDA PELA PRECLUSÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA ARGUIDO PELO RÉU SIDIMAR. PROVA PERICIAL PRODUZIDA NA ETAPA EXTRAJUDICIAL. CONTRADITÓRIO PRESCINDÍVEL. EXAME REALIZADO EM VIRTUDE DE REQUISIÇÃO DO DELEGADO. AGENTE RESPONSÁVEL PELO INQUÉRITO POLICIAL. NULIDADE NÃO EXISTENTE. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO NA SENTENÇA QUANTO ÀS TESES DEFENSIVAS. ARGUMENTOS APRECIADOS, AINDA QUE DE FORMA SUCINTA. VÍCIO NÃO DEMONSTRADO. PREFACIAIS ARREDADAS. MÉRITO. ABSOLVIÇÃO POSTULADA PELOS RÉUS VANDERLEI E SIDIMAR. ALEGADA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. MATERIALIDADE E AUTORIA EVIDENCIADAS. LAUDO DE VOZ DEMONSTRANDO QUE SIDIMAR ENTROU EM CONTATO COM O PAI DA VÍTIMA PARA TRATAR DO RESGATE. INTERCEPTAÇÃO DE CONVERSAS ENTRE OS RÉUS SOBRE O DELITO QUE ESTAVA EM ANDAMENTO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE FAVORECIMENTO PESSOAL INVIÁVEL. CONDENAÇÕES MANTIDAS. PLEITO ABSOLUTÓRIO FORMULADO PELO ACUSADO JOSÉ VANDERLEY. DEFENDIDA A AUSÊNCIA DE PROVAS. AUTORIA NÃO DEMONSTRADA NO CURSO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. EXISTÊNCIA DE FRÁGEIS INDÍCIOS SOBRE SUA LIGAÇÃO COM OS DEMAIS AGENTES. DÚVIDA QUE SE RESOLVE EM FAVOR DO RÉU. ABSOLVIÇÃO DECRETADA. DOSIMETRIA. REDUÇÃO DA PENA ALMEJADA POR VANDERLEI. RECONHECIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA E APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. ATUAÇÃO QUE NÃO PODE SER CONSIDERADA DE PEQUENA MONTA. REPRIMENDA CORRETAMENTE FIXADA EM SEU MÍNIMO LEGAL. MANUTENÇÃO. REGIME PRISIONAL. ALTERAÇÃO PLEITEADA PELO ACUSADO VANDERLEI. IMPOSSIBILIDADE. REGIME FECHADO QUE ESTÁ DE ACORDO COM O ART. 33, § 2º, "A", DO CP. PEDIDO INDEFERIDO.

           Portanto, inexistem dúvidas acerca da autoria do crime de extorsão mediante sequestro, o qual foi praticado por Rosicleide Rodrigues e Peterson Willian da Silva Machado, motivo pelo qual imerece guarida o pleito de absolvição postulado por ambos os apelantes.

           2.2) Da participação de menor importância (dos recursos de Peterson e Rosicleide):

           Subsidiariamente, caso não acolhida a tese absolutória, ambos os apelantes sustentam que participaram de forma secundária do crime, ao passo que pleiteiam a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 29, § 1º do Código Penal.

           Novamente, sem razão.

           Sobre essa causa de diminuição da pena, anota a doutrina (BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 193): "A participação aqui referida diz respeito exclusivamente ao partícipe e não ao coautor. Ainda que a participação do coautor tenha sido pequena, terá ele contribuído diretamente na execução propriamente do crime."

           As provas carreadas aos autos demonstram que os dois apelantes foram responsáveis pela empreitada criminosa, agindo em comunhão de vontades e desígnios, pois ambos foram responsáveis pela premeditação e execução do crime contra o patrimônio, na qualidade de coautores e não meros partícipes.

           Como muito bem destacou o Delegado Anselmo Cruz em seu depoimento alhures colacionado, enquanto Peterson era a "força bruta", Rosicleide foi a mentora do delito, a qual planejava as ações com cautela, partindo dela a tomada de decisão do arrebatamento da vítima.

           Embora não tenha realizado o núcleo do tipo, o papel desempenhado pela apelante era essencial para o sucesso da empreitada criminosa, pois muito embora não tenha arrebatado e nem tampouco exigido a quantia em dinheiro da família do infante, Rosicleide planejou o sequestro com base no conhecimento que detinha da família do menor, como também por intermédio de dados postados nas redes sociais pela própria genitora do infante.

           Acerca da coautoria, anota a doutrina (BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 188): "Na coautoria não há relação de acessoriedade, mas a imediata imputação recíproca, visto que cada um desempenha uma função fundamental na consecução do do objetivo comum. O decisivo na coautoria, segundo a visão finalista, é que o domínio do fato pertença aos vários intervenientes, que, em razão do princípio da divisão de trabalho, se apresentam como peça essencial na realização do plano global."

           Nesse contexto, não se pode aceitar ter sido de menor importância as condutas praticadas por Rosicleide e Peterson, pois verificada a coautoria entre os apelantes, bem como desde o início eram cúmplices, cada qual com sua função na prática do crime, bem determinadas, devendo a condenação ser mantida, nos moldes propostos, pois aplicada de acordo com a culpabilidade de cada um.

           Em hipóteses análogas, decidiu esta Corte de Justiça

           1) Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2015.005754-8, de São Bento do Sul, rel. Des. Marli Mosimann Vargas, j. 03-11-2015:

    APELAÇÃO CRIMINAL (RÉU PRESO). CRIMES CONTRA A SAÚDE PÚBLICA. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO (ART. 33, CAPUT, E ART. 35, CAPUT, AMBOS DA LEI N. 11.343/2006). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA DOS RÉUS. RECONHECIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA (RÉ ROSANE). SITUAÇÃO NÃO CARACTERIZADA. CONDUTA DA AGENTE QUE DEMONSTRA A PRÁTICA DIRETA E IGUALMENTE PRINCIPAL NA EXECUÇÃO DO DELITO DE TRÁFICO DE DROGAS. COAUTORIA EVIDENCIADA. HIPÓTESE DE PARTÍCIPE NÃO VERIFICADA. APLICAÇÃO DA DETRAÇÃO DO TEMPO EM QUE FICOU RECOLHIDO PREVENTIVAMENTE (RÉU EMERSON). IMPOSSIBILIDADE. EXEGESE DO ART. 66, III, "C", E ART. 111, DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO. RECURSO DO RÉU EMERSON CONHECIDO EM PARTE E DESPROVIDO. RECURSO DA RÉ ROSANE CONHECIDO E DESPROVIDO. (grifou-se).

           2) Apelação Criminal n. 2014.030176-1, da Capital, rel. Des. Moacyr de Moraes Lima Filho, j. 20-10-2015:

    APELAÇÕES CRIMINAIS. ESTELIONATOS E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA (ART. 171, CAPUT, E 288, CAPUT, AMBOS DO CÓDIGO PENAL). ACUSADOS QUE SE ASSOCIARAM PARA PRATICAR, DE FORMA REITERADA, POR VÁRIOS ANOS E CONTRA DIVERSAS VÍTIMAS, O INTITULADO ''GOLPE DO FUNDO 157'' [...] RECONHECIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. INVIABILIDADE. COAUTORIA DEMONSTRADA. Na coautoria, "não há realmente necessidade de colaboração efetiva de cada agente em cada ato executivo da infração penal, podendo haver repartição de tarefas entre os coautores. Há, na coautoria, a decisão comum para a realização do resultado e a execução da conduta [...]" (Julio Fabbrini Mirabete, 2010) [...]

           Logo, entende-se que a sentença não merece reparo no ponto.

           2.3) Da revisão da dosimetria quanto ao crime do art. 159, § 1º, do Código Penal (recursos de Peterson e Rosicleide):

           Em relação ao pleito, a fim de evitar tautologia, colhe-se do parecer do Procurador de Justiça Paulo Roberto Speck as razões de decidir:

    [...] por primeiro, constata-se que a acusada Rosicleide pleiteia a redução da pena-base para o mínimo legal, sem, no entanto, trazer razões para tanto, não tendo deixado claro em que consiste a sua irresignação.

    Todavia, extrai-se dos autos que ao proceder à fixação da pena na primeira etapa dosimétrica, a douta prolatora observou estritamente os preceitos jurídicos previstos no art. 59 do Código Penal, aplicando a pena de forma coerente com o caso concreto, sendo certo que em momento algum deixou de motivar devidamente o aumento procedido diante do reconhecimento de três circunstâncias judiciais desfavoráveis, ou incidiu em ilegalidade ou abuso de direito, como se vê às fls. 1.311/2.

    Já o réu Peterson busca a minoração da pena-se para o mínimo legal cominado ao delito em questão, afastando-se as três circunstâncias judiciais reconhecidas como desfavoráveis, quais sejam, a culpabilidade, as circunstâncias e as consequências do crime.

    Dito isso, observa-se que a ilustre magistrada a quo procedeu de forma acertada ao sopesar negativamente a culpabilidade do agente, justificando que ele agiu "[...]; mediante premeditação, tendo inclusive tentado o arrebatamento da criança por três vezes antes de efetivamente conseguir, o que confirma a sua determinação criminosa, e chegou a discutir/brigar com os outros dois comparsas na presença da criança" (fl. 1.313), circunstâncias que denotam uma maior reprovabilidade na sua conduta.

    Acerca do tema, a nossa d. Quarta Câmara Criminal assim anotou: "[...]; DOSIMETRIA DA PENA. PLEITO [...] PARA AFASTAMENTO DO AUMENTO EM RAZÃO DA CULPABILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO QUE RECONHECEU A MAIOR CULPABILIDADE DO RÉU COM SUPEDÂNEO NA FRIEZA E PREMEDITAÇÃO NO COMETIMENTO DO CRIME. DOUTRINA QUE RECONHECE COMO IDÔNEA A MOTIVAÇÃO. MANUTENÇÃO [?]" (Apelação Criminal nº 2013.084539-4, Indaial, Rela. Desa. Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, j. 28/8/2014 - destaquei).

    Por igual, no tocante às circunstâncias do crime, sendo estas consideradas pela doutrina como relativas ao lugar do delito, o tempo de sua duração e a atitude assumida pelo agente no decorrer da empreitada criminosa (v.g., GRECO, Rogério, Código Penal Comentado, 6. ed., Rio de Janeiro: Impetus, 2012, p. 166), parece mesmo que estas também se mostram desfavoráveis ao acusado, na medida em que, como destacado na sentença a quo, "[...]; a duração do sequestro serve para qualificar o delito e a idade da vítima será aplicada na segunda fase. Possível considerar que, afora essas, há circunstâncias que devem ser valoradas negativamente porque extrapolam a normalidade do delito: neste caso o crime foi cometido em concurso por quatro pessoas de modo a facilitar a execução criminosa - duas delas armadas com revólveres, o que denota maior periculosidade do grupo" (fl. 1.313).

    Outrossim, o aumento relativo às consequências do crime foi devidamente fundamentado na decisão apelada (fls. 1.313/4), restando demonstrado que ultrapassaram aquelas inerentes ao delito, na medida em que "ficou averiguado na instrução processual que a mãe do menino sequestrado tentou se matar, ingerindo remédios; o menino foi submetido a sofrimento mais intenso do que somente a privação de liberdade e afastamento dos pais, pois o crime resultou na morte de dois dos sequestradores em confronto com a polícia, o menino ficou um tempo amarrado com o cadarço de seu tênis e era alimentado uma só vez por dia, vivência demasiadamente perturbadora para um menino, tudo o que lhe demanda tratamento psicológico duas vezes por semana, além de o menino ter muito medo e falar todos os dias sobre o acontecido, tendo passado a tirar só notas 'zero' depois do sequestro".

    Ademais, cumpre ressaltar que ao magistrado incumbe, diante das diretrizes do mencionado art. 59 do CP, majorar a pena-base até o limite necessário para alcançar os objetivos da sanção criminal (reprovação e prevenção do crime), notadamente porque "a nenhum acusado é conferido o direito subjetivo à estipulação da pena-base em seu grau mínimo (...)" (JC 81/2-666).

    Já na segunda fase do cálculo dosimétrico, insurge-se a acusada Rosicleide contra o reconhecimento da circunstância agravante prevista no art. 62, inciso I, do CP. Contudo, razão mais uma vez não lhe socorre.

    Segundo o disposto no mencionado dispositivo legal, a pena será agravada quando o agente "promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes".

    Sobre a referida circunstância agravadora, retira-se do escólio de Guilherme de Souza Nucci que "esta é a hipótese que abrange a pessoa que comanda, organiza ou favorece a prática de um delito. Naturalmente, o 'cabeça' de uma quadrilha ou o 'mentor intelectual' do fato é mais perigoso que o mero executor. Este, sozinho, pode não ter condições ou coragem para o cometimento da infração penal; daí porque se pune mais gravemente quem dá força à organização da atividade delituosa" (in Código penal comentado. 9ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. págs. 420/1).

    E da análise do conjunto probatório amealhado constata-se que realmente era a mencionada ré quem organizava, comandava e dirigia a atuação dos demais corréus.

    Por outro lado, requer o apelante Peterson a exclusão da agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea 'h', do Código Penal, sob a alegação da ocorrência de bis in idem.

    Entretanto, ao contrário do que pretende fazer crer a defesa, a digna magistrada a quo reconheceu duas qualificadoras do crime de extorsão mediante sequestro (duração de mais de 24 horas e o fato de o sequestrado ser menor de 18 anos - ambas previstas no § 1º do art. 159 do CP) e a teor do reiterado entendimento jurisprudencial, utilizou uma delas para qualificar o crime e, sendo a remanescente legalmente prevista como circunstância agravante (crime ter sido praticado contra criança - art. 61, inciso II, alínea 'h' do CP), sopesou-a na segunda fase da dosimetria da pena.

    Sobre o assunto, a d. Segunda Câmara Criminal desse e. Tribunal de Justiça já decidiu que, mutatis mutandis, "[...]; quando presentes duas ou mais qualificadoras ao crime de homicídio, uma delas serve para qualificá-lo e a outra pode ser utilizada como agravante, na segunda fase, o que aconteceu nestes autos. Enquanto o recurso que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima serviu para qualificar o homicídio, o motivo fútil foi utilizado como agravante genérica, não havendo que se falar em 'bis in idem'" (Apelação Criminal nº 2011.019130-5, Pomerode, Rel. Des. Irineu João da Silva, j. 15/6/2011 - realcei).

    Igualmente, não há que se falar na aplicação da atenuante descrita no art. 65, inciso III, alínea "c", do CP, consoante postula o réu Peterson, porquanto restou comprovado que ele agiu por conta própria, não tendo sido obrigado pela codenunciada Rosicleide a praticar a conduta criminosa [...] (fls. 35/39).

           Assim, permanecem inalteradas as penas fixadas na sentença a quo para ambos os apelantes.

           2.4) Dos crimes de falsidade ideológica praticados por Peterson e sua dosimetria:

           O apelante requer a absolvição em relação aos crimes de falsidade ideológica sustentando que as provas carreadas aos autos são insuficientes para a manutenção do édito condenatório. De outra banda, caso mantida a condenação, pleiteia a aplicação do princípio da consunção com o delito de uso de documento falso.

           Do parecer do Procurador de Justiça Paulo Roberto Speck as tem-se que:

    [...] a materialidade delitiva restou comprovada pelos documentos de fls. 31/2.

    A autoria, embora negada pelo acusado, encontra-se evidenciada nos autos.

    Com efeito, conforme bem destacado pela douta magistrada sentenciante, "a justificativa apresentada pelo acusado, dando conta de que seu nome é Pretroson Silva Machado, não encontra amparo nos autos. Ora, em seu interrogatório disse que desde que nasceu até antes de ser preso em Tubarão, tinha o nome de Peterson da Silva Machado, tendo documento. Em Cristalina-GO foi incluído o nome William, passando a deter o nome de Peterson William da Silva Machado. Depois de ter sido preso em Tubarão, não retirou os documentos na delegacia que continham o nome de Peterson William da Silva Machado e, em razão disso, pediu nova certidão de nascimento na qual constava o nome de Pretroson, tendo refeito seus outros documentos em Goiânia-GO com base nessa informação. Por fim, disse que na certidão consta que nasceu em Vitória do Mearim.

    Várias foram as tentativas com a expedição de ofícios a Serventias de Registro Civil de diversos municípios dos Estados do Maranhão e do Pará no sentido de confirmar o que foi alegado pelo acusado, porém, não se constatou o registro de nascimento da pessoa de 'Pretroson Silva Machado'.

    Aliás, ao contrário do que afirma, o único registro encontrado, conforme a certidão de nascimento de fl. 917, indica a existência do Registro Civil n. 02562701551999100039061001430172, do Livro A 39, Folha 61, Termo 14301, do Cartório de Registro Civil da Comarca de Cristalina-GO, o qual atesta que o nome do acusado é Peterson William da Silva Machado, o que corresponde com a identificação do sistema penal de fatos anteriores aos analisados no presente procedimento e com a inscrição do CPF n. 001.342.861-62, conforme consulta ao INFOJUD nesta data.

    Não fosse apenas isso, apesar de sustentar em seu interrogatório, repita-se, possuir o nome de Pretroson Silva Machado, conveniente considerar que, na carta enviada à corré Rosicleide (fls. 579-580), antes mesmo da audiência de instrução e julgamento, consta a assinatura do remetente como 'Peterson William da Silva Machado' e, situação semelhante ocorreu quando o réu assinou o termo do interrogatório (fl. 768), o que demonstra que no trato pessoal faz uso do nome correto, não encontrando a versão apresentada no interrogatório nenhum amparo nos autos a lhe emprestar credibilidade.

    [?].

    Diante desse quadro, denota-se que nos quatro documentos indicados acima Cédula de Identidade n. 6069542 SSP/GO, Título Eleitoral n. 061511881090, Cartão Nacional de Saúde SUS n. 898003734327007, e Cadastro de Pessoa Física CPF n. 701.902.231-62 existem informações que não guardam correspondência com a realidade, não representam, portanto, nenhuma veracidade nas informações indicadas, pois relativas a pessoa inexistente.

    O fato típico de mais esse delito encontra-se livre de questionamentos, porquanto, a conduta comissiva dolosa de Peterson ficou demonstrada no fazer inserir declaração falsa sobre fato juridicamente relevante em documento público com a finalidade especial de prejudicar direito, criar obrigação e modificar a verdade de fato juridicamente relevante.

    A propósito, convém salientar que a declaração que o acusado fez inserir nos documentos indicados constitui elemento essencial dos atos documentados, pois diz respeito ao próprio nome civil, ou seja, a individualização da pessoa na sociedade, peculiaridade que representa o sentido fundamental do que se procurou falsificar.

    Por sua vez, a finalidade especial também se encontra estampada nos autos, porquanto, com a conduta, o acusado procurou prejudicar direito - p. ex. ao crédito -, criar obrigações - p. ex. contratou com diversas instituições financeiras a abertura de contas e a concessão das mais variadas modalidades de crédito e modificou a verdade de fato juridicamente relevante ao imputar a si identidade diversa a fim de se furtar da sua correta identificação, já que estava foragido" (fls. 1.306/7).

    Sendo assim, não há que se falar em absolvição também quanto à prática do crime de falsidade ideológica tipificado no art. 299, caput, do CP, merecendo mais uma vez confirmação a r. sentença apelada.

    D'outro norte, não há igualmente como prosperar o pedido do réu que visa a redução da pena-base para o patamar mínimo cominado a este delito, sob o argumento de que os motivos do crime não poderiam ter sido valorados negativamente durante a fixação da reprimenda.

    De fato, entendida como as razões que impulsionaram o agente a cometer o delito, mencionada circunstância judicial foi corretamente valorada de forma negativa, dado que "os motivos da alteração documental sobre fato juridicamente relevante estão relacionados à tentativa do acusado de encobrir seu passado criminoso" (fl. 1.315).

    Do mesmo modo, não merece prosperar o pleito do réu de afastamento do concurso material de crimes reconhecido pelo juízo a quo, com a aplicação da continuidade delitiva.

    É que para a incidência da continuidade delitiva devem estar presentes os requisitos de ordem objetiva (condições de tempo, lugar e modo de execução) e também os de ordem subjetiva (unidade de desígnios).

    In casu, verifica-se que o acusado agiu com desígnios autônomos, dado que os delitos de falsidade ideológica não foram realizados na mesma oportunidade, tampouco perante o mesmo órgão público.

    Além do mais, é sabido que a regra do crime continuado não pode ser aplicada ao criminoso habitual ou profissional, hipótese ocorrente no caso em apreço.

    Realmente, consoante bem destacado na r. sentença apelada, "da análise dos documentos Cédula de Identidade n. 6069542 SSP/GO, Título Eleitoral n. 061511881090, Cartão Nacional de Saúde SUS n. 898003734327007, e Cadastro de Pessoa Física CPF n. 701.902.231-62 é manifesto que os delitos de falsidade ideológica são oriundos de desígnios autônomos, porquanto, é de ciência notória que não são feitos na mesma oportunidade e perante o mesmo órgão público, o que caracteriza a pluralidade de ações e a multiplicidade de determinação de vontade, com diversas individualizações de condutas.

    Com isso, tendo o acusado feito inserir informações falsas em, no mínimo, quatro oportunidades distintas, demonstrada está a habitualidade delitiva, imperando, portanto, a regra do cúmulo material das reprimendas" (fls. 1308/9 - negritei).

    A respeito da matéria, também essa mesma c. Terceira Câmara Criminal asseverou noutra ocasião: "[...]; PLEITO DE RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA QUE NÃO É POSSÍVEL. HABITUALIDADE CRIMINOSA EVIDENCIADA. RÉU CONTUMAZ EM CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. CONCURSO MATERIAL DEVIDAMENTE APLICADO. PEDIDO AFASTADO" (Apelação Criminal nº 2013.037168-6, Itajaí, Rel. Des. Alexandre d'Ivanenko, j. 27/8/2013 - destaquei) [...] (fls. 39/44).

           2.5) Dos crimes de uso de documento falso imputados ao apelante Peterson:

           O apelante requer a absolvição em relação aos crimes de uso de documentos falsos sustentando que as provas carreadas aos autos são insuficientes para a manutenção do édito condenatório.

           Colhe-se, outrossim, do parecer do Procurador de Justiça Paulo Roberto Speck as razões de decidir:

    A materialidade delitiva restou positivada pelos documentos de fls. 180/1, 401/15, 494 e 632/3).

    No tocante à autoria, oportuno anotar que "não há dúvidas de que, com o uso de documentos que continham informações falsas, notadamente o nome 'Pretroson Silva Machado', por várias oportunidades, contratou-se com instituições financeiras e operadoras de cartões de crédito.

    Com isso, o fato típico encontra-se comprovado nos autos, porquanto, a conduta comissiva dolosa de Peterson ficou demonstrada no fazer uso empregar, utilizar quaisquer dos papéis falsificados ou alterados dispostos nos arts. 297 a 302 do CP, no caso: Cédula de Identidade n. 6069542 SSP/GO, Título Eleitoral n. 061511881090, Cartão Nacional de Saúde SUS n. 898003734327007, e Cadastro de Pessoa Física CPF n. 701.902.231-62, como se fossem autênticos ou verdadeiros, em evidente idoneidade lesiva para o bem jurídico tutelado fé pública, ilustrada na confiabilidade e autenticidade dos documentos públicos indispensáveis nas relações interpessoais. O nexo de causalidade art. 13 do CP também se apresenta estreme de dúvidas, pois o uso está unido com a ação praticada pelo acusado" (excertos da sentença à fl. 1.309).

    Destarte, não há realmente que se falar em absolvição por insuficiência de provas da autoria delitiva, devendo ser mantida integralmente a r. sentença apelada, confirmando-se a prolação do decreto condenatório também pela prática do crime tipificado no art. 304 do CP.

    E quanto à pretendida absorção do delito de uso de documento falso pelo de falsidade ideológica, tem-se que, conforme bem fundamentado pela douta Juíza sentenciante, "os delitos não guardam nenhuma relação entre si, uma vez que decorrentes de condutas autônomas e com finalidades distintas, haja vista que os delitos de falsidade ideológica tinham por objetivo, no princípio, ocultar os antecedentes criminais e os mandados de prisão expedidos contra o acusado, posteriormente, é que se fez o uso para a contratação com as instituições financeiras e operadoras de cartões de crédito.

    Assim, não se mostrando que o crime de falsidade ideológica constituiu-se em crime-meio para se alcançar o outro uso de documento falso, não se visualiza sucessão e nexo de dependência entre as figuras delitivas, de modo que o acusado deve ser responsabilizado por infração a ambos dispositivos legais art. 299 e 304 do CP. Nesse sentido conferir: STJ, CC 108321-SC, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 10-3-2010; STJ, REsp 1110651-MG, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 10-9-2009; e TJSC, Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2014.047978-9, de Criciúma, rel. Des. Rodrigo Collaço, j. 9-10-2014" (fl. 1.310 - grifei).

    Finalmente, pelas mesmas razões expostas alhures, quando da análise dos crimes de falsidade ideológica, não merece amparo a pretendida aplicação do art. 71, caput, do Código Penal (continuidade delitiva) no lugar do concurso material de crimes reconhecido pelo juízo a quo em relação aos delitos de uso de documento falso, praticados por seis vezes pelo réu Peterson [...] (fls. 44/46).

           É cediço que há dissenso na doutrina e jurisprudência pátria diante da possibilidade da aplicação do princípio da consunção entre os crimes de falsidade ideológica e uso de documento falso.

           Nesse contexto, necessário, inicialmente, verificar o nexo de dependência entre as condutas praticadas pelo denunciado, a fim de verificar se constituem, de fato, desígnios autônomos ou se a falsidade ideológica constituiu o crime-meio para o posterior uso do documento inidôneo por parte do agente.

           Cezar Roberto Bitencourt in Código Penal Comentando. 7ª ed. Niterói: Impetus, 2013, p. 901, ao lecionar sobre os princípios regentes do conflito aparente de normas penais, entre os quais o denominado princípio da consunção e/ou absorção, assevera:

    "Pelo princípio da consunção, ou absorção, a norma definidora de um crime constitui meio necessário ou fase normal de preparação ou execução de outro crime. Em termos bem esquemáticos, há consunção quando o fato previsto em determinada norma é compreendido em outra, mais abrangente, aplicando-se somente esta. Na relação consuntiva, os fatos não se apresentam em relação de gênero e espécie, mas de minus e plus, de continente e conteúdo de todo e parte, de inteiro e fração. [...] Há consunção quando o crime-meio é realizado como uma fase ou etapa do crime-fim, onde vai esgotar seu potencial ofensivo, sendo, por isso, a punição somente da conduta criminosa final do agente.

           Portanto, comprovado que as condutas de falsidade ideológica e uso de documento falso foram autônomas, não há que falar em princípio da consunção.

           Nesse diapasão, colhe-se da Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2014.047978-9, de Criciúma, rel. Des. Rodrigo Collaço, j. 09-10-2014:

    APELAÇÃO CRIMINAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA (POR QUATRO VEZES) E USO DE DOCUMENTO FALSO (ARTS. 299 DO CP E ARTS. 304, C/C ART. 297, AMBOS DO CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS BEM DEMONSTRADAS. CONDENAÇÕES MANTIDAS. PLEITO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO, COM A ABSORÇÃO DO DELITO DE USO DE DOCUMENTO FALSO PELO CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA. INVIABILIDADE. DELITOS AUTÔNOMOS E COM FINALIDADES DISTINTAS. CONSUNÇÃO DESCABIDA. DOSIMETRIA DA PENA. COMPENSAÇÃO DA AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA COM A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. PREPONDERÂNCIA AFASTADA PELO STJ. ACUSADO QUE CONTA COM UMA CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. COMPENSAÇÃO POSSÍVEL. REPRIMENDA REDUZIDA. APLICAÇÃO DA CONTINUIDADE DELITIVA. INVIABILIDADE. RÉU QUE APRESENTA HABITUALIDADE DELITIVA. BENESSE INDEVIDA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

           Mantido, portanto, o cúmulo material entre as condutas praticadas pelo apelante Peterson.

           Por conseguinte, a sentença exarada pela Magistrada a quo não merece qualquer reparo também em relação ao crime de uso de documento falso.

           Outrossim, o pedido de majoração dos honorários advocatícios para que sejam fixados de acordo com a Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, conforme o art. 22, §1º, da Lei n. 8.906/1994, não deve ser acolhido.

           Na sentença, a Magistrada sentenciante fixou o valor de R$ 1.038,00 (mil e trinta e oito reais) ao defensor nomeado ao apelante (fl. 139).

           Sobre os honorários advocatícios estabelecidos aos advogados dativos, a Seção Criminal desta Corte de Justiça estabeleceu a seguinte conclusão na sessão de 27.3.2013:

    Considerando (a) a mencionada decisão do Supremo Tribunal Federal, que declarou inconstitucional o art. 104 da Constituição do Estado de Santa Catarina e a Lei Complementar Estadual n. 155/97, (b) a superação do interstício estabelecido para a produção de efeitos, (c) a incapacidade momentânea de a Defensoria Pública de Santa Catarina suprir a demanda por defensores dativos, (d) a obrigação dos advogados de prestar assistência judiciária aos necessitados, (e) o seu direito a justa remuneração, e (f) o caráter meramente orientador da Tabela de honorários da OAB/SC, entende-se pertinente, enquanto não for possível o atendimento pela Defensoria Pública de Santa Catarina, a nomeação de advogado para atuar como defensor dativo, cuja verba honorária deverá ser fixada de forma equitativa, nos moldes do art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil c/c o art. 3º do Código de Processo Penal. [...] De forma prioritária, devem ser considerados também, como parâmetro para a fixação da verba honorária, os valores obtidos com a conversão em pecúnia do número de URHs, que seriam concedidos na forma do Anexo Único da Lei Complementar Estadual n. 155/97.

           Portanto, com fulcro nesse entendimento, entende-se adequada e suportável pelo Estado a remuneração fixada pelo Juízo a quo.

           A propósito, veja-se julgado desta Câmara Criminal (Apelação n. 0005748-44.2014.8.24.0045, de Palhoça, rel. Des. Leopoldo Augusto Brüggemann, j. 17-03-2016)

    APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO E A INCOLUMIDADE PÚBLICA. ROUBO MAJORADO PELO CONCURSO DE AGENTES, EMPREGO DE ARMA E RESTRIÇÃO À LIBERDADE DAS VÍTIMAS (ART. 157, § 2º, I, II E V, DO CP) E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ART. 14, CAPUT, DA LEI N. 10.826/2003). SENTENÇA CONDENATÓRIA. [...] PEDIDO DE FIXAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA À DEFENSORA NOMEADA ESPECIFICAMENTE PARA APRESENTAÇÃO DAS RAZÕES DE APELAÇÃO DO ACUSADO JAIRO. ACOLHIMENTO. PLEITO PELA ADEQUAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA DE ACORDO COM TABELA DE HONORÁRIOS DA OAB, FORMULADO PELA DEFESA DE JAIRO E DE RAFAEL. ATO OCORRIDO APÓS A DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 104 DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL E DA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL N. 155/1997 PELO STF, EM CONTROLE CONCENTRADO. CARÁTER MERAMENTE ORIENTADOR DA LEI N. 8.906/1994. HONORÁRIOS FIXADOS DENTRO DOS PARÂMETROS DA RAZOABILIDADE. INTELIGÊNCIA DO DISPOSTO NO ART. 20, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, APLICADO ANALOGICAMENTE, COM FULCRO NO ART. 3º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. MANUTENÇÃO DA VERBA FIXADA PELO JUÍZO A QUO. RECURSOS CONHECIDOS. DESPROVIMENTO DOS APELOS DE ISAÍAS E RAFAEL. RECURSO DE JAIRO PROVIDO EM PARTE, PARA ARBITRAR A VERBA HONORÁRIA À DEFENSORA. CORREÇÃO, DE OFÍCIO, DA DOSIMETRIA DAS PENAS DE ISAÍAS E JAIRO.

           Oportuno mencionar, nesse ponto, que, apesar da referência ao art. 20, §4º, do Código de Processo Penal vigente à época da fixação dos honorários, a sistemática não se alterou substancialmente na legislação atual (Lei n. 13.105/2015), conforme se infere dos seguintes preceitos:

    Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

    § 2o Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:

    I - o grau de zelo do profissional;

    II - o lugar de prestação do serviço;

    III - a natureza e a importância da causa;

    IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. [...]

    § 8o Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2o.

           Isso posto, conclui-se que o dispositivo citado pela defesa aplica-se às causas entre particulares, ou seja, quando o ônus não deve ser arcado pelos escassos recursos estatais, tendo em vista que, como se sabe, tal tabela não serve de norte, por vezes, mesmo nos processos de caráter privado.

           Por fim, salutar lembrar que a verba honorária fixada englobava a atuação do causídico na fase recursal.

           Entretanto, com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, Lei n. 13.105/15, no último dia 18 de março de 2016, que se aplica subsidiariamente à esfera penal, consoante artigo 3º do Código de Processo Penal, mister que se fixe ao defensor nomeado verba honorária adicional por conta do recurso ora examinado, tratada no artigo 85, §§ 1º e 11, da nova lei processual civil, a qual trouxe novo regramento acerca dos honorários a serem pagos aos defensores quando em atuação na esfera recursal.

           Dizem os parágrafos em questão que:

    § 1o São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente.

    § 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2o a 6o, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2o e 3o para a fase de conhecimento.

            E os parágrafos 2º e 6º mencionados ditam que:

    § 2o Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:

    I - o grau de zelo do profissional;

    II - o lugar de prestação do serviço;

    III - a natureza e a importância da causa;

    IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

    § 6o Os limites e critérios previstos nos §§ 2o e 3o aplicam-se independentemente de qual seja o conteúdo da decisão, inclusive aos casos de improcedência ou de sentença sem resolução de mérito.

                 Assim, utilizando-se também como parâmetro os ditames da Lei Complementar Estadual n.155/97, que estabelece o pagamento de 7,5 URH's como verba devida para apresentação de razões ou contrarrazões recursais criminais e, considerando que, uma URH equivale atualmente a R$ 76,05 (setenta e seis reais e cinco centavos), deve-se majorar a verba honorária em R$ 570,37 (quinhentos e setenta reais e trinta e sete centavos).

           Por fim, mantidas as condenações por esta Corte de Justiça, nos termos do novo posicionamento adotado pelo Supremo Tribunal Federal no HC n. 126.292/SP e das razões contidas no voto vencedor deste Relator nos autos n. 0000516-81.2010.8.24.0048, especialmente pela impossibilidade de rediscussão da matéria fática nas Instâncias Superiores, transmuda-se os fundamentos da prisão imposta a Peterson e Rosicleide, que passa de segregação cautelar para a de cumprimento de acórdão penal condenatório, iniciando-se a execução provisória da pena.

           Ante o exposto, vota-se no sentido de conhecer dos recursos, afastar as preliminares e negar-lhes provimento.

           É o voto.


Gabinete Desembargador Ernani Guetten de Almeida