Acesso restrito
Pesquisa de Satisfação:

Excelente

Bom

Ruim

Observações:


FECHAR [ X ]



Obrigado.











TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 9169653-47.2013.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Pedro Manoel Abreu
Origem: Itajaí
Orgão Julgador: Órgão Especial
Julgado em: Wed Apr 06 00:00:00 GMT-03:00 2016
Juiz Prolator: Não informado
Classe: Direta de Inconstitucionalidade

 


 


Direta de Inconstitucionalidade n. 9169653-47.2013.8.24.0000

Relator: Desembargador Pedro Manoel Abreu

   Ação direta de Inconstitucionalidade. Leis Complementares Municipais n. 214 e 215, de 31 de dezembro de 2012, de Itajaí. Alegada afronta ao estatuído no art. 141, III, da Constituição do Estado de Santa Catarina. Inocorrência. Associações autoras que demonstraram pertinência temática, à exceção de uma, cujos estatutos não preveem a defesa do meio ambiente e da ordem urbanística, mas tão só a promoção dos interesses de seus associados e a continuidade da respectiva associação. Ilegitimidade ativa ad causam desta última reconhecida. Normas atacadas que foram precedidas de amplo debate popular por meio de audiências públicas. Inconstitucionalidade, neste ponto, não verificada. Composição do Conselho de Gestão Municipal atacada pela via da ação direta, além de suposta afronta à função social da propriedade. Matérias infraconstitucionais. Ofensa meramente reflexa. Demanda improcedente.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Direta de Inconstitucionalidade n. 9169653-47.2013.8.24.0000, da comarca de Itajaí Vara da F. Púb. E. Fisc. A. do Trab. e Reg. Púb. em que são Requerentes União dos Amigos da Brava - UNIBRAVA e outros e requeridos Prefeito do Município de Itajaí e outros.

           O Órgão Especial decidiu, por votação unânime, julgar extinto o feito em relação à Associação de Skate de Itajaí, ante a ilegitimidade ativa decorrente da ausência de pertinência temática, forte o art. 267, VI, do CPC e, no mérito, julgar improcedente a demanda, ante a ausência de ofensa direta ao art. 141, III, da Constituição Estadual. Custas legais.

           O julgamento, realizado no dia 06 de abril de 2016, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Torres Marques e dele participaram os Exmos. Srs. Desembargadores Pedro Manoel Abreu, Luiz Cézar Medeiros, Eládio Torret Rocha, Sérgio Roberto Baasch Luz, Fernando Carioni, Torres Marques, Rui Fortes, Marcus Tulio Sartorato, Cesar Abreu, Ricardo Fontes, Salim Schead dos Santos, Maria do Rocio Luz Santa Ritta, Cid Goulart, Jaime Ramos, Sérgio Izidoro Heil, Jânio Machado, Ronei Danielli e Ernani Gueten de Almeida.

           Florianópolis, 12 de abril de 2016.

Desembargador Pedro Manoel Abreu

Relator

 

           RELATÓRIO

           União dos Amigos da Brava - Unibrava, Associação de Surf Praias de Itajaí, Associação de Bodyboard de Itajaí, Associação de Skate de Itajaí e e Socioambientar detonaram ação direta de inconstitucionalidade com pedido cautelar em face das Leis Complementares Municipais n. 214 e 215, de 31 de dezembro de 2012, que instituíram, respectivamente, o regime jurídico da outorga onerosa do direito de construir e o código de zoneamento, parcelamento e uso do solo do Município de Itajaí. 

           Segundo os autores, a Lei Complementar Municipal n. 94/2006, resultado de cinco anos de debates e levantamentos técnicos, com ampla participação da sociedade na sua confecção e respeitando todos os critérios das normas legais pertinentes, instituiu o Plano Diretor de Itajaí.

           Afirmam que, em setembro de 2008, a Câmara Municipal aprovou a Lei Complementar n. 144/08, de iniciativa do Prefeito Municipal, que instituiu o Código de Zoneamento, Parcelamento e Uso do Solo, declarada inconstitucional pela ADIN n. 2008.064408-8, por falta de participação popular e irregularidade no Conselho Municipal de Gestão e Desenvolvimento Territorial.

           Mencionam que a Lei Complementar Municipal 97/2007, conhecida como Plandetures, também foi declarada inconstitucional pela ADIN 2011.031436-7, pois evidenciado o confronto com normas constitucionais e infraconstitucionais.

           Asseveram que a Câmara de Vereadores, ferindo diversos dispositivos regimentais e dispensando qualquer estudo técnico e consultas populares, aprovou os projetos que resultaram nas Leis ora combatidas, sancionadas e publicadas horas antes do réveillon.

           Gizam que entidades comunitárias por diversas vezes se manifestaram contra a conduta autoritária e discriminatória que as afastaram do debate, requerendo ao Prefeito Municipal e à Câmara de Itajaí a realização de audiência pública, com abaixo assinado contendo cerca de 5000 assinaturas, como forma de garantir a participação popular e a gestão democrática da cidade, com produção de estudos técnicos, legais e científicos referentes ao novo zoneamento.

           Noticiam que duas ações judiciais suspenderam os efeitos das sessões extraordinárias que eclodiram na votação das Leis em tela, sendo uma delas a ação popular n. 033.13.002343-7 e a ação civil pública n. 033.13.007805-3. As decisões judiciais proferidas nestas ações suspenderam, consequentemente, os efeitos das Leis Complementares 214 e 215/2012, objeto do pedido vestibular.

           Aduzem terem se deparado com um Conselho Municipal de Gestão e Desenvolvimento Territorial já montado a convite do Executivo local, cujos integrantes eram pessoas ligadas por interesses econômicos à aprovação das Leis em questão, tais como a Associação dos Proprietários da Praia Brava Canto Norte - APOBRAVA e o Sindicato das Indústrias da Construção Civil - SINDUSCON, além da Associação Comercial e Industrial de Itajaí - ACII.

           Segundo a exordial, tal composição teria viciado o processo democrático exigido pela Constituição Estadual (arts. 111, XII, 140 e 141) e outras leis de caráter infraconstitucional, como o Estatuto da Cidade.

           Além desse vício, atestam ainda a ausência de levantamentos técnicos e de estudo de impacto ambiental na aprovação das leis ora questionadas.

           Ao final, requereram a suspensão cautelar das Leis Complementares n. 214 e 215/2012, do Município de Itajaí e, por derradeiro, a sua invalidação, por afronta ao texto constitucional vigente.

           A cautelar na demanda foi indeferida à fl. 709, porquanto a suspensão das leis hostilizadas se deu nos autos da ação popular n. 033.13.002343-7 e na ação civil pública n. 033.13.007805-3, embora por motivos diversos dos narrados na presente demanda.

           Nas informações de fls. 850, suscitou o Prefeito Municipal a preliminar de ilegitimidade ativa ad causam das associações autoras, por ausência de pertinência temática, além de altercar que os autores não juntaram cópia legível das leis impugnadas. Verberou ainda que a ação direta de inconstitucionalidade não é o meio apropriado para discutir a alegação de que a participação popular não se deu de forma adequada, limitando-se apenas a indagar a ausência completa de participação da comunidade envolvida.

           No mérito, argumentou que foram realizadas audiências públicas, ao contrário do verberado na inicial, e os autores apenas discutem a forma entabulada nestas audiências, o que torna inadequada a via eleita e que o Conselho de Gestão Municipal atuou em perfeita legalidade, tendo sido criado, inclusive, por normas em sintonia com o ordenamento constitucional.

           Alterca que, diferentemente de casos anteriormente julgados no Poder Judiciário, a hipótese vertente contemplou a realização de diversas audiências públicas, não se confundindo com os casos em que a participação da sociedade foi inexistente.

           Para a municipalidade, o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina não declarou a inconstitucionalidade do Conselho de Gestão Municipal nos autos da ADin n. 2008.064408-8. Houve equívoco admitido quanto ao enquadramento do Canto Norte da Praia Brava, quando da confecção das LC's n. 214 e 215/2012, tendo o Município se comprometido com o enquadramento correto e a sua retificação.

           Destacaram, por fim, que as normas gozam de presunção de constitucionalidade, requerendo, ao final, a extinção do feito sem julgamento do mérito ante a ilegitimidade ativa ad causam, ou no mérito, a improcedência da demanda.

           Informações da Câmara de Vereadores às fl. 1451 e seguintes, pela improcedência dos pedidos iniciais.

           A defesa do texto legal impugnado sobreveio à fl. 1525.

           Após o indeferimento da cautelar, a Associação de Proprietários da Brava pleiteou sua intervenção no feito na qualidade de amicus curiae, o que restou deferido à fl 1584, embora não tenha constado da decisão, porque em seus estatutos a referida associação demonstrara ter interesse na preservação da ordem urbanística e ambiental (Estatuto, art. 4.º, alíneas 'a', 'b' e 'c', fls. 1518). Referida entidade, à fl. 1590, manifestou-se pela constitucionalidade das leis hostilizadas.

           A Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer do Dr. Basílio Elias De Caro, manifestou-se pela extinção do feito sem julgamento de mérito em relação à Associação de Skate de Itajaí, ante a inexistência de pertinência temática, e também por inexistir ofensa direta à Constituição do Estado de Santa Catarina.

           Este é o relatório.

 

           VOTO

           Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida por União dos Amigos da Brava - Unibrava, Associação de Surf Praias de Itajaí, Associação de Bodyboard de Itajaí, Associação de Skate de Itajaí e e Socioambientar, em face das Leis Complementares Municipais n. 214 e 215, de 31 de dezembro de 2012, que instituíram, respectivamente, o regime jurídico da outorga onerosa do direito de construir e o código de zoneamento, parcelamento e uso do solo do Município de Itajaí. 

           Centra-se a controvérsia na alegada inconstitucionalidade das leis mencionadas, sobretudo por não terem sido elaboradas com participação popular. Nesse caminho, indicam que as normas hostilizadas foram encaminhadas no "apagar das luzes" da legislatura de 2012, horas antes do réveillon. Nesse tocante, argumenta, terem se deparado com um Conselho de Gestão Municipal tendencioso, integrado por pessoas com interesse econômico na aprovação das referidas normas, como a Associação de Proprietários da Brava - APOBRAVA, o que no sentir dos autores feriria frontalmente dispositivos constitucionais, entre outros argumentos, adiante examinados.

           Antes de adentrar no mérito, impende registrar que as autoridades responsáveis pela edição dos atos impugnados, nas respectivas informações, agitaram a prefacial de ilegitimidade ativa ad causam dos autores, ante a ausência de pertinência temática para a propositura da presente ação direta de inconstitucionalidade. Luís Roberto Barroso, ao discorrer sobre o tema, elucida que

    A ideia, a rigor, mais se aproxima do conceito processual que identifica o interesse em agir: é preciso que haja uma relação lógica entre a questão versada na lei ou ato normativo a ser impugnado e os objetivos sociais da entidade requerente. Vale dizer: a norma contestada deverá repercutir direta ou indiretamente sobre a atividade profissional ou econômica da classe envolvida, ainda que só parte dela seja atingida. Essa exigência não consta da Constituição nem de lei, e tem sido objeto de críticas, mas está pacificada na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

           O Supremo Tribunal Federal, nos autos da ADI 4203, entendeu que a exigência da pertinência temática não impede o amplo conhecimento da ação, "quando o vício de inconstitucionalidade for idêntico para todos os destinatários", cabendo, no caso vertente, examinar de que forma a suposta mácula atinge os interessados. A decisão aludida está assim encartada:

    Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 5.388/99 do Estado do Rio de Janeiro. CONAMP. Obrigação de entrega de declaração de bens à Assembleia Legislativa por agentes públicos estaduais. Competência atribuída ao Poder Legislativo sem o devido amparo constitucional. Vício de iniciativa. Parcial procedência. 1. A CONAMP congrega os membros do Ministério Público da União e dos Estados, tendo legitimidade reconhecida por esta Corte (ADI nº 2.794/DF, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 30/3/07). A exigência de pertinência temática não impede o amplo conhecimento da ação, com a declaração de inconstitucionalidade da norma para além do âmbito dos indivíduos representados pela entidade requerente, quando o vício de inconstitucionalidade for idêntico para todos os seus destinatários. Precedentes. Preliminar rejeitada. 2. Lei estadual que estabeleceu, com fundamento na competência constitucional de controle externo por parte do Poder Legislativo, a obrigatoriedade de apresentação de declaração de bens por diversos agentes públicos estaduais (magistrados, membros do Ministério Público, deputados, procuradores do estado, defensores públicos, delegados etc.) à Assembleia Legislativa. 3. Modalidade de controle direto dos demais Poderes pela Assembleia Legislativa - sem o auxílio do Tribunal de Contas do Estado - que não encontra fundamento de validade na Constituição Federal. Assim, faltando fundamento constitucional a essa fiscalização, não poderia a Assembleia Legislativa, ainda que mediante lei, outorgar a si própria competência que é de todo estranha à fisionomia institucional do Poder Legislativo. 4. Inconstitucionalidade formal da lei estadual, de origem parlamentar, que impõe obrigações aos servidores públicos em detrimento da reserva de iniciativa outorgada ao chefe do Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, da CF), e da autonomia do Poder Judiciário (art. 93 da CF) e do Ministério Público (arts. 127, § 2º, e 128, § 5º, da CF) para tratar do regime jurídico dos seus membros e servidores. 5. Constitucionalidade da lei em relação aos servidores e membros da própria Assembleia Legislativa, por se tratar de controle administrativo interno, perfeitamente legítimo. 6. Ação direta julgada parcialmente procedente, declarando-se i) a inconstitucionalidade dos incisos II a V do art. 1º; dos incisos II a XII e XIV a XIX do art. 2º; das alíneas b a e do inciso XX também do art. 2º, todos da Lei nº 5.388, de 16 de fevereiro de 2009, do Estado do Rio de Janeiro, e ii) conferindo-se interpretação conforme à Constituição ao art. 5º do mesmo diploma legal, para que a obrigação nele contida somente se dirija aos administradores ou responsáveis por bens e valores públicos ligados ao Poder Legislativo (STF, ADI 4203, Relator(a):  Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 30/10/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 30-01-2015 PUBLIC 02-02-2015).

           Pelo exposto, percebe-se que o fato de as associações autoras não possuírem a representatividade de todos os destinatários das normas impugnadas, in casu, os habitantes do Município de Itajaí, não impede o ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade em face da Constituição do Estado, posto que, na esteira do precedente citado, a declaração de inconstitucionalidade têm os mesmos efeitos para todos os munícipes.

           Os autores da presente actio são: União dos amigos da Brava - UNIBRAVA, Associação de Surf Praias de Itajaí, Associação de Bodyboard de Itajaí, Associação de Skate de Itajaí e Socioambientar. Referidas entidades têm como finalidade, tendo em conta os respectivos estatutos, a defesa da preservação ambiental e o desenvolvimento sustentável. Exceção feita apenas à Associação de Skate de Itajaí, que tem os seguintes objetivos, descritos no art. 4.º, do seu estatuto:

    Art. 4.º São princípios e finalidades da Associação de Skate de Itajaí:

    a) incentivar a prática de skate como esporte;

    b) promover e organizar eventos, encontros, congressos e simpósios;

    c) manter intercâmbio entre familiares e associados;

    d) intensificar a busca de associados para o fortalecimento do grupo e de seus princípios e finalidades;

    e) estabelecer contatos e convênios com entidades congêneres nacionais e internacionais para os princípios e finalidades da Associação de Skate de Itajaí;

    f) educação à prática skate como ferramenta de inclusão social e aprimoramento do indivíduo;

    g) firmar contratos e convênios com o Poder Público Municipal e Federal, suas autarquias e fundações e com as pessoas jurídicas de direito privado.

           Como se observa dos autos, a norma atinge praticamente todas as entidades autoras que possuam entre seus objetivos estruturantes a preservação ambiental e o desenvolvimento sustentável, com exceção da Associação de Skate, pois esta tem entre suas finalidades apenas objetivos que visam à promoção do esporte, isto é, finalidades interiores, voltadas ao desenvolvimento tão só da instituição e de seus membros.

           Por tal razão, deve a Associação de Skate de Itajaí ser excluída do polo ativo ante a ausência de pertinência temática, o que conduz à conclusão de que não possui legitimidade ativa ad causam.

           No tocante ao mérito, atacam os autores a composição do Conselho Municipal de Gestão e Desenvolvimento Territorial - GMGDT, entendendo necessário o cotejo de sua composição com a Lei n. 5001/2007, de Itajaí, norma esta que estabelece critérios para a indicação dos integrantes do referido Conselho.

           É autoevidente, porém, que essa discussão não se insere no âmbito restrito de discussão do controle concentrado de constitucionalidade. Com efeito, havendo critérios infraconstitucionais a serem obedecidos por meio de Lei Municipal, é descabido perquirir sobre eventual descompasso entre a norma estabelecida a partir da interveniência do Conselho e a Constituição do Estado, bastando, nesse particular, que a norma impugnada tenha sido criada na forma constitucional e apresente conformação aos seus princípios e normas. Se tais circunstâncias estiverem presentes, é o quanto bastará ao reconhecimento de constitucionalidade da norma impugnada, que não será afetada pela eventual composição irregular do CMDGT.

           Como frisado pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer conclusivo, essa controvérsia, a par da existência de Lei específica para a composição do CMDGT, não enseja controle de constitucionalidade, pois a norma infraconstitucional supostamente violada não rende ensejo ao controle da norma em tese.

           Restam aos autores, portanto, seguir pelos caminhos normais para examinar possível afronta aos critérios de admissão no Conselho em testilha, se já não o tiverem feito nas ações popular e civil pública ainda pendentes de julgamento por esta Corte.

           Nesse compasso segue a alegação dos autores de que houve vício na tramitação dos projetos de lei que resultaram na edição das Leis Complementares n. 214 e 215, os quais teriam afrontado as disposições do Regimento Interno da Câmara de Vereadores de Itajaí.

           A verificação de ilegalidade não se traduz em parâmetro apto a ensejar controle de constitucionalidade, cediço que este somente se satisfaz com a parametricidade voltada, in casu, à Constituição Estadual.

           Por isso, toda a argumentação tendente à impugnação do Conselho Municipal de Gestão e ao procedimento empregado nos projetos de Lei em testilha é inócua na presente via concentrada, devendo, pois, ser afastada. No mesmo sentido, esta Corte já decidiu, em acórdão da lavra do signatário:

     Controle concentrado de constitucionalidade. ADIN. Leis Municipais que estabelecem a possibilidade de ingresso no serviço público em caráter temporário. Profissionais da educação. Alegada violação à regra do concurso público (CF, art. 37, II). Excepcionalidade e temporariedade, porém, descritas na norma hostilizada. Constitucionalidade. Eventual burla à norma jurídica deve ser examinada em sede controle de legalidade, no plano infraconstitucional, por meio de ação civil pública ou outro meio judicial que se mostre adequado. Precedentes da Corte. Nos termos do art. 37, II, da Constituição da República, a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração. (TJSC, Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2008.081462-3, de Campo Belo do Sul, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. 04-04-2012).

           Dito isto, as Leis Complementares n. 214 e 215/2012, ambas do Município de Itajaí, versam sobre o instrumento de outorga onerosa do direito de construir, zoneamento, parcelamento e uso do solo no respectivo âmbito territorial.

           Os autores questionam a ausência de participação popular após o encaminhamento, em 06 de dezembro de 2012, dos projetos de lei que culminaram na edição das Leis aqui hostilizadas, mediante aprovação na sessão extraordinária realizada em 31 de dezembro do mesmo ano.

           Na espécie, aos Municípios definiu-se a competência para 'promover, no que couber, o adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, consoante prevê o art. 30, VIII, da Carta da República.

           Nessa senda, a própria Carta Federal de 1988, em seu art. 182, com correspondente idêntico na Constituição do Estado, art. 140, estabelece que 'a política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público Municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes'.

           A Lei Nacional n. 10.257/2001, denominada Estatuto das Cidades, sobreveio ao texto Constitucional estabelecendo a regulação das diretrizes encartadas nos artigos suso referidos. Destaca-se, nesse mister, a finalidade estabelecida pela Lei, à política urbana e a necessidade de participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação de planos e projetos de desenvolvimento urbano:

    Art. 2.º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:

    (...)

    II - gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução, acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano.

           No plano estadual, parâmetro para a presente ADIn é a respectiva Constituição do Estado. Nesse sentido, a participação popular é assegurada no seu art. 141, III, in verbis:

    Art. 141 - No estabelecimento de normas e diretrizes relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e o Município assegurarão:

    (...)

    III - participação de entidades comunitárias na elaboração e implementação de planos, programas e projetos e no encaminhamento de soluções para os problemas urbanos.

           Destarte, é incontroverso que a elaboração de normas sobre política urbana terá necessariamente como pressuposto de validade a efetiva participação popular, que fornecerá, a partir de audiências públicas com caráter consultivo, elementos para as deliberações legislativas.

           Desde o advento da Constituição Estadual, a participação da sociedade civil em temas que envolvam a ordem urbanística é assegurada, e seu dispositivo ostenta eficácia plena, de aplicação imediata, embora admita posterior regulação. Não se trata, registre-se, norma de eficácia contida, a exigir contenção do Estado. Disso, efetivamente, não se trata.

           De todo modo, conquanto assegurada essa participação, não há qualquer critério legal que determine como se dará a captação dos anseios populares para indicação à atividade legislativa, o que significa concluir, numa palavra, que a violação à norma de regência importará em vulneração de norma infraconstitucional, não suscetível do controle concentrado de constitucionalidade. Nesse sentido, vem entendendo o STF:

    CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ESTADUAL 15.003/06. RENÚNCIA DE RECEITA. TESE DE VIOLAÇÃO AO ART. 163, I, DA CF E AO ART. 14 DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL (LRF). INÉPCIA DA INICIAL. LITÍGIO DE NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL. INADEQUAÇÃO DO PROCESSO OBJETIVO DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE. CAUSA DE PEDIR ABERTA NÃO DISPENSA ÔNUS DE FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. IMPOSSIBILIDADE DE ACRÉSCIMO EM SEDE RECURSAL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO (ADI 3789 AgR, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-036 DIVULG 24-02-2015 PUBLIC 25-02-2015).

           Diferente seria a hipótese, porém, no caso de haver mera repetição, no texto infraconstitucional, de norma da Constituição Estadual ou Federal. Nesse caso, mesmo ante a existência de norma hierarquicamente inferior, eventual ofensa continuaria a ser da Constituição e não da norma infraconstitucional repetida, na esteira do que vem, aliás, decidindo o STF:

    Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE PERANTE O TRIBUNAL DE JUSTIÇA LOCAL. LEI MUNICIPAL. CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO PARÂMETRO DE CONTROLE NORMATIVO LOCAL QUE CORRESPONDE À NORMA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA PELOS DEMAIS ENTES INTEGRANTES DA FEDERAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O recurso extraordinário de ação direta de inconstitucionalidade estadual ou distrital somente é admitido quando o parâmetro de controle normativo local corresponder a norma da Constituição Federal de observância obrigatória pelos demais entes integrantes da Federação. Assim, é pressuposto de cabimento do recurso extraordinário interposto contra acórdão prolatado em ação direta, a demonstração de qual norma de repetição obrigatória inserida na Constituição local foi violada. Precedentes: RCL nº 383, Plenário, Relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 21/05/1993; RCL nº 596-AgR, Plenário, Relator o Ministro Néri da Silveira, Plenário, DJ de 14/11/1996. 2. Ademais, ao julgar a ADI nº 3.225/RJ, esta Corte declarou constitucional o artigo 112, § 2º, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro. 3. Agravo regimental a que se nega provimento (RE 588426 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 05/02/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-039 DIVULG 27-02-2013 PUBLIC 28-02-2013).

           Na espécie, a legislação infraconstitucional disciplina como o exercício da participação popular se dará nos casos em que for aplicável, não se confundindo com o texto de reprodução obrigatória da Constituição Estadual ou quiçá, Federal. Por isso, com razão as autoridades responsáveis pela edição do ato, no sentido que de que a via da ação direta, in casu, era incabível.

           Acrescente-se ainda que a colheita dos anseios populares, em audiências públicas, não ostenta caráter vinculativo ou deliberativo, mas apenas e tão só o caráter consultivo, como não poderia aliás ser diferente, já que as formas de participação direta no processo democrático são aquelas definidas na Constituição, em que o povo toma a decisão política sem intermediários.

           Do compulsar dos autos, verifica-se terem ocorrido 20 audiências públicas entre os anos de 2011 e 2012, com a participação efetiva da comunidade, conforme denotam as listas de presença acostadas às fls. 970-1.020 e 1.215-1.220), além de 23 reuniões do Conselho Municipal de Gestão e Desenvolvimento Territorial - CMGDT, que por sua vez contaram com a participação de representantes da comunidade.

           Conclui-se ter havido amplo debate pelos dois anos que antecederam à aprovação das normas, de modo que não se infere desrespeito ao estatuído no art. 141, III, da Constituição Estadual, ainda que tais normas não correspondam aos anseios populares declinados por ocasião das audiências públicas.

           Reforça-se que eventual composição do Conselho Municipal, ainda que parcial, constitui matéria sujeita ao exame de legalidade no plano infraconstitucional, não afetando, como dito, as normas aprovadas com observância formal e material da Constituição do Estado de Santa Catarina.

           Por derradeiro, no tocante ao cumprimento do princípio da função social da propriedade, entendem, as associações autoras, que as Leis Complementares n. 214 e 215/2012, de Itajaí, o afrontam, e que este se realiza consoante estabelece o art. 182, § 2§, da CF, "quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no Plano Diretor".

           Contudo, a argumentação trazida aos autos tem como parâmetro exclusivo o art. 182, da CF, inexistindo alegação de que se teria vulnerado a Carta Estadual. Cediço, ademais, que não é possível a declaração de inconstitucionalidade, no âmbito dos Estados, com esteio em norma municipal impugnada em face de dispositivos da Constituição Federal, in verbis:

     AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 5.700/2010 QUE DISPÕE SOBRE A REGULARIZAÇÃO DE EDIFICAÇÕES CONCLUÍDAS EM DESACORDO COM O CÓDIGO DE OBRAS E ZONEAMENTO DO MUNICÍPIO DE CRICIÚMA. AVENTADA OFENSA ÀS REGRAS DE DIREITO URBANÍSTICO, CONSISTENTE NA FLEXIBILIZAÇÃO DE RECUOS E DEMAIS EXIGÊNCIAS LEGAIS (VÍCIO MATERIAL). SUPOSTA VIOLAÇÃO AO PROCESSO LEGISLATIVO, POR AUSÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO POPULAR (VÍCIO FORMAL) SUSCITADA PELO REPRESENTANTE MINISTERIAL NO CURSO DA DEMANDA. IMPOSSIBILIDADE DE ALARGAMENTO DO PEDIDO INAUGURAL. OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA ADSTRIÇÃO. EXIGÊNCIA DOS ARTIGOS 3º E 4º DA LEI ESTADUAL N. 12.069/2001. AFRONTA DIRETA À CONSTITUIÇÃO ESTADUAL NÃO VERIFICADA. EXAME DAS DISPOSIÇÕES ATACADAS AFETO AO ESTATUTO DA CIDADE (LEI FEDERAL N. 10.257/2001) E LEGISLAÇÃO MUNICIPAL PERTINENTE. DISCUSSÃO RESTRITA AO ÂMBITO INFRACONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE NA VIA DO CONTROLE CONCENTRADO ABSTRATO. PRECEDENTES DESTA CORTE. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. (TJSC, Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2014.006199-1, da Capital, rel. Des. Ronei Danielli, j. 16-09-2015).

           Mais que isso, e na esteira desse julgado da lavra do eminente Des. Ronei Danielli, a discussão entabulada a respeito do eventual descumprimento da função social da propriedade está relegada ao plano infraconstitucional, sendo certo que eventual violação se dará em relação à Lei Complementar n. 94/2006, que instituiu o Plano Diretor do Município de Itajaí, estabelecendo as exigências para que a propriedade cumpra seu mister social.

           Ante o exposto, julga-se extinto o feito em relação à Associação de Skate de Itajaí, ante a sua ilegitimidade ativa por ausência de pertinência temática, forte o art. 267, VI, do CPC e, no mérito, julga-se improcedente a demanda, ante a ausência de ofensa direta ao art. 141, III, da Constituição Estadual.

           Este é o voto.


Gabinete Desembargador Pedro Manoel Abreu