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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 2013.081063-8 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Ricardo Roesler
Origem: Joinville
Orgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Público
Julgado em: Thu Mar 10 00:00:00 GMT-03:00 2016
Juiz Prolator: Rafael Salvan Fernandes
Classe: Apelação Cível

 


Citações - Art. 927, CPC: Repercussão Geral: 666404

Apelação Cível n. 2013.081063-8, de Joinville

Relator: Desembargador Ricardo Roesler

APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PARA O CUSTEIO DO SERVIÇO DE ILUMINAÇÃO PUBLICA (COSIP). TRIBUTO, SEGUNDO O STF, PECULIAR ("CONTRIBUIÇÃO SUI GENERIS"). CONSTITUCIONALIDADE JÁ ASSENTADA. DEDUÇÃO DE AUSÊNCIA DE EFETIVA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. IMPROPRIEDADE. TRIBUTO DESTINADO A CUSTEIO ESPECÍFICO, MAS SEM VINCULAÇÃO COM A EFETIVA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO INDIVIDUALIZADO.

VALOR. UTILIZAÇÃO DA TESTADA DO IMÓVEL COMO PARÂMETRO DE CÁLCULO. ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DESTE PARÂMETRO. CRITÉRIO ADOTADO POR IMPOSTOS. IMPERTINÊNCIA. TRIBUTO QUE NÃO SE CONFUNDE COM TAXA. LIBERALIDADE, SEGUNDO O TEXTO CONSTITUCIONAL, PARA ADOÇÃO DO CRITÉRIO PELOS MUNICÍPIOS. FATOR QUE OBSERVA, EM SEUS TERMOS, A CAPACIDADE CONTRIBUTIVA. RECURSO DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2013.081063-8, da comarca de Joinville (3ª Vara da Fazenda Pública), em que é apelante Imobiliária Zattar Ltda, e apelado Município de Joinville:

A Quarta Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, negar provimento ao recurso. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Desembargadores Nelson Schaefer Martins (Presidente com voto) e Edemar Gruber.

Florianópolis, 10 de março de 2016.

Ricardo Roesler

Relator


RELATÓRIO

Imobiliária Zattar Ltda. propôs ação declaratório-constitutiva de inexistência de relação jurídico-tributária em face do Município de Joinville, questionando a exigência da contribuição para custeio da iluminação pública. Da sentença colho o seguinte relatório:

Imobiliaria Zattar Ltda, pessoa jurídica qualificada nos autos, propôs "Ação Ordinária" em face de Município de Joinville, pessoa jurídica de direito público, igualmente qualificada, aduzindo, em suma, que é indevida a cobrança da COSIP - Contribuição para o Custeio do Serviço de Iluminação Pública, incluída pelo requerido no carnê do IPTU referente ao Loteamento Parque Residencial Parque Residencial São Francisco de Assis II, de sua propriedade. Num primeiro momento arguiu a inconstitucionalidade da cobrança da contribuição, ao argumento de que a Lei Municipal n. 136 de 30-12-2002 violaria princípios constitucionais, como o da isonomia. A cobrança também fere, segundo a autora, os arts. 2º, 3º e 11 da citada Lei, porque, segundo este último dispositivo, a ''contribuição (...) incidirá somente quando o serviço for prestado'' e não houve prestação do serviço de iluminação pública ao loteamento destacado na inicial. Por tais motivos, sustentou que os lançamentos da contribuição devam ser anulados. Por fim, alegou que os valores cobrados pela contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública são confiscatórios, pois superiores aos valores cobrados a título de IPTU.

Requereu a citação do réu para impugnar o feito, sob pena de confissão e a procedência dos seguintes pedidos: a) reconhecimento da inconstitucionalidade e ilegalidade da cobrança; b) a redução ou adequação do valor da contribuição; c) a condenação do demandado ao pagamento das custas e honorários sucumbenciais; d) a citação da CELESC para, querendo, manifestar-se no feito. Por fim, requereu a produção de todos os meios de prova, valorou a causa e juntou documentos (fls. 15/138).

Devidamente citado, o Município de Joinville apresentou contestação requerendo preliminarmente o chamamento da concessionária CELESC ao processo, tendo em vista que a ela são repassados todos os valores referentes à COSIP.

Quanto ao controle difuso de constitucionalidade, aduziu que, no Brasil, o efeito da inconstitucionalidade declarada somente seria produzido após a edição de resolução do Senado Federal. Fundamentou a constitucionalidade da cobrança da COSIP no art. 149-A da Constituição Federal e, quanto à legalidade, reportou-se à Lei Complementar Municipal n. 136, de 30-12-2002. Em relação à legalidade, asseverou que a Constituição Federal autorizou o município a instituir, por intermédio de lei, a contribuição destinada ao custeio do serviço de iluminação pública, enquanto a Lei Municipal n. 136 definiu o fato gerador, a base de cálculo, a destinação, o sujeito passivo e, no art. 11, previu que a contribuição só incidirá quando o serviço for prestado. Ponderou que a base de cálculo

que leva em conta a testada do imóvel é um indicador seguro de capacidade contributiva, que não incorreu em "cobrança casada" pelo fato de cobrar a contribuição junto ao IPTU, já que a própria constituição admite a cobrança na fatura de energia elétrica e que a jurisprudência vem admitindo a legalidade e constitucionalidade da cobrança da COSIP.

Por fim, requereu a improcedência dos pedidos e o consequente reconhecimento da legalidade e constitucionalidade da cobrança da contribuição.

Em réplica a autora reiterou os pedidos contidos na inicial, especialmente a citação da CELESC. Asseverou, na mesma oportunidade, que o réu não contestou a inexistência do serviço de iluminação pública alegado na inicial e juntou acórdão prolatado em agravo de instrumento para demonstrar a alegada inconstitucionalidade.

Em momento posterior, a requerente peticionou invocando a inversão do ônus da prova, como garantia prevista no Código do Consumidor. Na sequência, juntou sentença proferida nesta Comarca para fundamentar seus pleitos.

Houve decisão afastando os efeitos da revelia e determinando diligências de ofício (fl. 225).

A empresa CELESC manifestou-se à fls. 227 e 239.

A autora requereu a produção de prova pericial, o que foi deferido (fl. 257).

Houve impugnação à proposta de honorários periciais apresentada pelo expert, tendo sido rejeitada por meio da decisão de fls. (292/293).

Após determinação judicial (fl. 310) os autos foram restituídos pelo perito, que na mesma oportunidade apresentou seu laudo (fls. 314/327).

Sobre a perícia manifestaram-se as partes. A autora, às fls. 336/338; o réu, às fls. 334/335.

Por fim, foi deferida a expedição de alvará para levantamento

dos honorários periciais (fl. 342).

Julgado improcedente o pedido, sobreveio recurso, revisitando as teses de inconstitucionalidade, de ausência de prestação de serviço e de ilegalidade dos parâmetros adotados para o cálculo do tributo (fls. 369-378).

Houve contrarrazões (fls. 384-392).

O Ministério Público opinou pelo conhecimento e desprovimento do apelo (fls. 398-407). Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Paulo Ricardo da Silva.

É o relatório.


VOTO

No apelo, discute-se, de modo sensivelmente mais tímido que no curso da ação, a constitucionalidade da exigência da contribuição para custeio da energia elétrica (cosip) e a impropriedade de sua base de cálculo, assim como a ausência de efetiva prestação de serviços.

A contribuição criada para custear o fornecimento de energia elétrica é bastante peculiar. Quando menos, fala-se de um tributo exótico, porque não reúne nem os pressupostos que são próprios das contribuições e tampouco a vocação que lhes é própria. Afinal a iluminação pública, bem porque se trata de serviço aleatoriamente prestado a todos (ut universi), deveria rigorosamente ser remunerado pelo produto dos impostos. Aliás, bem porque sua dimensão é universal, é que a taxa que antecedeu essa "contribuição" foi declarada inconstitucional.

O que se tem, enfim, é um tributo aparentemente sem identidade, com o espécime de referência (contribuição), e sem identidade com sua destinação. Daí a crítica sobretudo doutrinária, que viu na contribuição tributo pouco afinado com a disciplina constitucional (entre outros, já referendado, José Afonso da Silva, Comentário contextual à Constituição, 2008, p. 652). E tal como ensina Geraldo Ataliba,

(...) a adoção do nomem iuris 'contribuição' - quando corresponde à finalidade de suportar financeiramente objetivos constitucionalmente prestigiados - embora acarrete certas derrogações ao regime geral dos tributos, não é palavra mágica que permita burlar as exigências constitucionais específicas a certos tributos. (Hipótese de incidência tributária, Malheiros, 2009, p. 208)

De toda sorte, creio que, em relação à constitucionalidade, pouca discussão possa ser ambientada a essa quadra. Ainda que se discuta, em repercussão geral, a exigência do tributo (STF, RE 666.404-RG/SP, Rel. Marco Aurélio), o STF tem recorrentemente autorizado a manutenção da cobrança na pendência de solução do julgamento da matéria. Mais que isso, já decidiu, também, de modo incidental, que o tributo é constitucional - quando, também, identificou sua destinação específica (em repercussão geral). A propósito:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. RE INTERPOSTO CONTRA DECISÃO PROFERIDA EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE ESTADUAL. CONTRIBUIÇÃO PARA O CUSTEIO DO SERVIÇO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA - COSIP. ART. 149-A DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI COMPLEMENTAR 7/2002, DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ, SANTA CATARINA. COBRANÇA REALIZADA NA FATURA DE ENERGIA ELÉTRICA. UNIVERSO DE CONTRIBUINTES QUE NÃO COINCIDE COM O DE BENEFICIÁRIOS DO SERVIÇO. BASE DE CÁLCULO QUE LEVA EM CONSIDERAÇÃO O CUSTO DA ILUMINAÇÃO PÚBLICA E O CONSUMO DE ENERGIA. PROGRESSIVIDADE DA ALÍQUOTA QUE EXPRESSA O RATEIO DAS DESPESAS INCORRIDAS PELO MUNICÍPIO. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA. INOCORRÊNCIA. EXAÇÃO QUE RESPEITA OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO IMPROVIDO.

I - Lei que restringe os contribuintes da COSIP aos consumidores de energia elétrica do município não ofende o princípio da isonomia, ante a impossibilidade de se identificar e tributar todos os beneficiários do serviço de iluminação pública.

II - A progressividade da alíquota, que resulta do rateio do custo da iluminação pública entre os consumidores de energia elétrica, não afronta o princípio da capacidade contributiva.

III - Tributo de caráter sui generis, que não se confunde com um imposto, porque sua receita se destina a finalidade específica, nem com uma taxa, por não exigir a contraprestação individualizada de um serviço ao contribuinte.

IV - Exação que, ademais, se amolda aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

V - Recurso extraordinário conhecido e improvido. (RE 573.675/SC. Tribunal Pleno. Rel. Min. Ricardo Lewandowski. Decisão de 25.3.2009)

Enfim, não há razão, por isso, para que se submeta à análise do órgão plenário desta Corte a matéria. A partir daí, também, outra conclusão é bastante simples: a despeito de sua natureza, a exigência daquela "contribuição" não tem relação imediata com a prestação do serviço diretamente ao contribuinte, pois serve ao custeio universal. Em outras palavras, não há em principio relação que se estabeleça em face do consumidor a ponto de eximi-lo do pagamento pela simples ausência de efetiva prestação dos serviços (eis a distinção objetiva em relação às taxas).

Daí não haver razão de ordem prática para a perícia realizada. O mais que se pode extrair da eventual ausência ou debilidade do serviço é apenas a prerrogativa de demandar o Município ou a concessionária a implementá-lo. Tendo em vista que a contribuição não serve à contraprestação de algum serviço utilizado especificamente pelo contribuinte, a falta daquela prestação não tem caráter liberatório, nem pode ser arguída como exceção ao inadimplemento.

Remanesceria, por fim, a dedução de ilegalidade da base de cálculo. Mas sucede que a alegação tem por premissa a conclusão, da recorrente, de que a cosip não seria contribuição, e sim taxa - logo, não poderia utilizar-se da base de cálculo própria dos impostos (art. 145,§ 2.º, CR). Sem esquecer que o próprio STF já desmistificou aquela disposição constitucional, assentando a possibilidade das taxas ocuparem-se de parte dos elementos próprios dos impostos (Súmula Vinculante 29), o fato de se cuidar de "contribuição sui generis" por si afastaria a incidência daquele dispositivo.

Do todo, apenas se discutir o critério adotado é que poderia animar algum debate, considerando que a legislação local ocupa-se da metragem da fachada do imóvel como critério fundamental. A LCM n. 136/02, aliás, assim dispõe:

Art. 3º A contribuição será calculada com base no custo dos serviços prestados, levando-se em conta a metragem linear de testada do imóvel, fronteiriça para o logradouro público beneficiado.

§ 1º. Possuindo o imóvel mais de uma testada fronteiriça para o logradouro público beneficiado pelo serviço, a contribuição levará em conta apenas a maior testada.

§ 2º. Na hipótese de o imóvel possuir mais de uma unidade autônoma para uma única testada, a contribuição será exigida individualmente de cada unidade integrante do imóvel, levando-se em consideração à mesma testada, não podendo a alíquota ser inferior a prevista no intervalo mínimo, conforme tabela II, do art. 4º.

§ 3º. Considera-se testada beneficiada pelo serviço de iluminação pública aquela que ficar até 50 (cinquenta) metros da luminária postada no sentido da via pública.

Mas o fato é que não se cuida de tributo ordinário, e como bem assentou o Des. Vanderlei Romer, no julgamento monocrático da AC n. 2008.001588-5, de Timbó, ficou ao critério dos Municípios estabelecer os parâmetros. E o Município de Joinville, ao que tudo indica, observou a capacidade contributiva, usando a propriedade como critério de observação (fato signo-presuntivo de riqueza, conforme preleciona Geraldo Ataliba), e que em princípio parece bem alinhado com a natureza essencialmente econômica do tributo.

Isso posto, nego provimento ao recurso.

É como voto.


Gabinete Des. Ricardo Roesler