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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 2015.040289-1 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Ronei Danielli
Origem: Criciúma
Orgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Público
Julgado em: Tue Mar 15 00:00:00 GMT-03:00 2016
Juiz Prolator: Eliza Maria Strapazzon
Classe: Apelação Cível

 

Apelação Cível n. 2015.040289-1, de Criciúma

Relator: Des. Ronei Danielli

INDENIZAÇÃO. DANOS PATRIMONIAIS E EXTRAPATRIMONIAIS. EXTRAVIO DE BAGAGEM. ALEGADAS DESPESAS IMPREVISTAS A PARTIR DO EVENTO DANOSO. ABALO ANÍMICO DECORRENTE DO SENTIMENTO DE IMPOTÊNCIA E DA FRUSTRAÇÃO DAS EXPECTATIVAS DO AUTOR EM RELAÇÃO AO TORNEIO DE FUTEBOL DE MESA PARA O QUAL SE INSCREVERA. IMPOSSIBILIDADE DE COMPETIR PELA FALTA DO UNIFORME DA DELEGAÇÃO. ALEGADA PERDA DE UMA CHANCE DE SAGRAR-SE CAMPEÃO NA MODALIDADE. PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. APELO DA EMPRESA AÉREA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. EXISTÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES A EMBASAR O RESSARCIMENTO DETERMINADO. NEXO DE CAUSALIDADE A LIGAR A PRESTAÇÃO DEFEITUOSA DOS SERVIÇOS COM O PREJUÍZO PATRIMONIAL RECONHECIDO NA SENTENÇA E COM OS DANOS EXTRAPATRIMONIAIS SOFRIDOS. RECURSO ADESIVO DO DEMANDANTE. DESPESAS TELEFÔNICAS REALIZADAS NA TENTATIVA DE RECUPERAR SEUS PERTENCES. OBRIGAÇÃO DE RESSARCIR INCONSTESTE. MAJORAÇÃO DA COMPENSAÇÃO DO ABALO ANÍMICO INDEVIDA. VERBA FIXADA COM PROPRIEDADE, ALBERGANDO, TAMBÉM, A REPARAÇÃO DA CHANCE PERDIDA. CORREÇÃO, DE OFÍCIO, DOS JUROS DE MORA. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. CONSECTÁRIO QUE DEVE CORRER A PARTIR DA CITAÇÃO. RECURSOS CONHECIDOS, PROVIDO PARCIALMENTE O DO AUTOR E DESPROVIDO DA RÉ.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2015.040289-1, da comarca de Criciúma (3ª Vara Cível), em que é apte/rdoad Rodolfo Ignácio Martinelli, e apdo/rtead VRG Linhas Aéreas S/A:

A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, conhecer dos recursos, provendo-se parcialmente o do autor e desprovendo o da ré. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Cesar Abreu, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Júlio César Knoll.

Florianópolis, 15 de março de 2016.

Ronei Danielli

Relator


RELATÓRIO

Rodolfo Ignácio Martinelli promoveu, perante a 3ª Vara Cível da comarca de Criciúma, ação de indenização de danos materiais e morais em face VRG Linhas Aéreas S/A.

Para tanto, apontou que o extravio de sua bagagem, ocorrido no aeroporto de Guarulhos (primeira etapa da viagem), acarretou-lhe prejuízos de ordem moral e material.

Relata que seguia para Salvador a fim de participar de um torneio de futebol de mesa, levando em sua mala, além de medicamentos de uso contínuo, o uniforme da delegação catarinense, roupas e objetos de higiene pessoal, tendo sido privado de seus pertences por três dias consecutivos. Em razão do ocorrido, enumera gastos extraordinários com calçado adequado ao calor, lavanderia, telefonemas, restaurantes climatizados e aluguel de automóvel para facilitar sua locomoção frequente até a loja da requerida. Relaciona ao mesmo evento, os danos morais sofridos, reclamando, ademais, a indenização pela perda da chance de vencer o campeonato em questão.

A companhia aérea defendeu-se alegando a ausência de demonstração do defeito na prestação do serviço, aduzindo que a inversão do ônus da prova não exime o consumidor de minimamente fundamentar o direito à pretensão ressarcitória (fato constitutivo de seu direito). Quanto aos danos materiais apontados, desacredita a existência de nexo de causalidade entre o suposto extravio da bagagem com as despesas de restaurante, postos de gasolina, dentre outros sem relação direta com a alegada falha na prestação do serviço. Quanto ao dano moral, limitou-se a definir a circunstância como mero aborrecimento cotidiano.

Na sentença, a magistrada Elisa Maria Strapazzon julgou parcialmente procedentes os pedidos, condenando a empresa ao pagamento de: a) R$ 25,00 (vinte e cinco reais) a título de prejuízos patrimoniais, corrigidos monetariamente a contar do desembolso e juros de mora desde o evento danoso; b) R$ 10.000,00 (dez mil reais) pelos danos morais, com incidência de juros moratórios de 1% ao mês sobre o valor da condenação, a contar do evento danoso, e de correção monetária a contar da sentença; c) custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor da condenação.

Irresignada, apela a ré, repisando as teses esposadas na contestação e pugnando, ao final, pela minoração do dano moral.

Recorreu adesivamente o autor, pleiteando a majoração dos danos material e moral, além da fixação de valor a título de perda de uma chance.

Com as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte Estadual de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de ação indenizatória promovida por consumidor prejudicado pelo extravio de sua bagagem em face da VGR linhas aéreas S/A.

O fato não enseja maiores dificuldades.

O requerente adquiriu passagens aéreas da empresa Gol para o trecho Florianópolis - Guarulhos - Salvador, com saída no dia 10.10.2007 e retorno no dia 14.10.2007, com vistas ao comparecimento em torneio esportivo.

Ao chegar no aeroporto de Guarulhos, percebeu que sua mala não estava junto com as bagagens do resto da delegação catarinense. Não obstante seus protestos, seguiu viagem sem sua mala até Salvador, com a promessa de que a entregariam o mais breve possível.

Relata, ainda, que, a despeito de inúmeros telefonemas e idas ao balcão da companhia em Salvador, sua mala somente lhe foi entregue na véspera de seu retorno. Nesse interim, ficou sem suas medicações de uso contínuo, suas vestes e seu uniforme para a competição.

Aponta que, em razão do extravio de sua mala, precisou emprestar roupas, comprar chinelo, fazer refeições somente em restaurantes climatizados e alugar um carro para facilitar seus deslocamentos até a loja da Gol, distante do hotel em que se hospedava.

Somando-se aos gastos inesperados, reclama do abalo anímico provocado pelo evento, de modo a ensejar, além do dano material, o de ordem moral. Por fim, comprova, à fl. 52, que fora impedido de participar das rodadas iniciais da competição, porquanto desprovido da farda oficial de sua delegação, ocasionando a sua desclassificação no campeonato, motivo pelo qual reclama também valor compensatório pela perda da chance de conquistar a primeira colocação.

A empresa aérea, por sua vez, insurgindo-se contra a pretensão ressarcitória, insiste na inexistência do dano moral, apontando tratar-se de mero aborrecimento da vida contemporânea e, quanto aos danos patrimoniais, ressalta a ausência de nexo de causalidade a ligar as despesas apresentadas com o extravio da bagagem do consumidor.

Pois bem. Passa-se ao exame de ambos os apelos conjuntamente, dividindo-se, por razões didáticas, em tópicos específicos de irresignação.

Preliminarmente, cumpre apreciar o pedido de gratuidade judiciária feito nessa instância pelo autor.

Registre-se que, requerida anteriormente, fora denegada a benesse em função de exercer o litigante a profissão de advogado.

No entanto, observa-se que a situação de saúde e, por conseguinte, o contexto econômico do demandante encontra-se deveras alterado. As provas juntadas aos autos demonstram que, em 30.06.2014, entrou em auxílio doença por incapacidade laborativa, sendo as fotografias de fls. 323/327 suficientes para ilustrar o teor de sua enfermidade, razão por que se concede o benefício perseguido.

1. Responsabilidade objetiva pela falha na prestação do serviço

O Diploma Consumerista consagra a responsabilidade objetiva do fornecedor pelos defeitos nas prestações de seus serviços, consoante de extrai do texto do artigo 14: "o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos".

Responde, desse modo, a empresa aérea, independente de culpa, pelos danos advindos da má prestação dos serviços próprios de seu mister, salvo provando fato de terceiro, do próprio lesado, força maior ou caso fortuito.

Inexistindo, in casu, qualquer excludente de nexo causal, e, de outro lado, tendo demonstrado satisfatoriamente o autor o fato constitutivo de seu direito, compete somente avaliar os danos decorrentes da prestação defeituosa dos serviços da ré.

2. Danos materiais

O autor reclama, a título de dano patrimonial, diversas despesas, juntando notas de restaurantes em Salvador, aluguel de carro, boleto de conta telefônica, dentre outros.

Sabe-se que o dano material precisa ser cabalmente demonstrado, mas não é só. Necessário, por óbvio, que os prejuízos comprovados guardem relação com o fato do lesante.

Nessa perspectiva, a magistrada sentenciante entendeu quanto ao nexo de causalidade estar presente "em relação ao pedido de danos materiais, somente nos gastos despendidos com as sandálias (fl. 48) [....]. As despesas feitas com restaurantes (fls. 42,44,26,49 e 50), com hospedagem (fls. 42,46 e 51), ligações telefônicas (fls. 35/40) e aluguel de carro (fl. 46), não guardam relação aparente com o extravio da bagagem e, portanto, não podem ser contabilizadas nos prejuízos materiais sofridos [...]". (fl. 265).

A decisão merece pequeno reparo, assistindo parcial razão ao recurso adesivo do autor no que pertine ao danos materiais.

Nota-se, em sua fatura de telefone, 07 (sete) ligações para o número (71) 32041283, ocorridas entre os dias 11 e 12 de outubro de 2007; 01 (uma) ligação para o numero (11) 64454311, em 11.10.2007, e outra, no mesmo dia, para o número (11) 64452945, além de mais um telefonema no dia 11.10.2007 para o número (71) 32041010. (fl.40)

Bastante crível que as despesas com tantos telefonemas para Guarulhos (DDD 11) e Salvador (DDD 71), totalizando o valor de R$ 33,05 (trinta e três reais e cinco centavos) tenham sido motivadas pelas desesperadas tentativas do consumidor de reaver sua mala.

Ademais, os números telefônicos não foram especificamente impugnados pela ré de modo a controverter o alegado (e demonstrado) pelo autor.

Diante dessas evidências, entende-se presente o nexo de causalidade entre os dispêndios com as ligações telefônicas relacionadas e o extravio da bagagem do consumidor, devendo-se somar aos danos materiais reconhecidos na sentença a quantia de R$ 33,05 (trinta e três reais e cinco centavos).

Quanto aos demais gastos, compreendidos estes pelo valor das diárias de hotel, restaurantes e aluguel de carro, faz-se coro à decisão recorrida quando discorre acerca da ausência de relação direta com a má prestação do serviço da companhia aérea, notadamente porque se traduzem em despesas ordinárias de viagem.

3. Danos morais e a perda de uma chance

Dos fatos constatados, exsurgem claros os danos de ordem moral, os quais, certamente, excedem os inconvenientes diários e, por isso mesmo, são passíveis de compensação.

Pode-se presumir da circunstância o abalo gerado ao passageiro, sobretudo pela quebra de sua expectativa de participar na competição de futebol de mesa.

Entretanto, tal frustração se encontra albergada adequadamente no pleito de dano moral, razão pela qual se percebe uma condenação acima dos valores normalmente praticados pelo simples extravio de bagagem.

Isso porque a teoria da perda de uma chance refere-se tanto à possibilidade de aferir a indenização de um dano patrimonial (ao ser perdida a chance de obtenção de uma vantagem futura ou de evitar-se um determinado prejuízo) como extrapatrimonial:

No que concerne ao dano moral, este também é indenizável no âmbito da perda da chance, pois todo prejuízo extrapatrimonial é compensável. Portanto, a perda da chance se constitui em fonte de obrigação de indenizar tanto o dano material quanto o dano moral. A perda da oportunidade de obter um benefício ou de evitar um prejuízo possui valor pecuniário, assim como pode acarretar prejuízo extrapatrimonial. Não é difícil provar, por exemplo, a dor psíquica da vítima que perde a chance de participar da Olimpíada porque o transportador extraviou sua vara de saltos. (ANDRIGHI, Vera. Reparação Moral e Material pela Perda de uma Chance. In.: ANDRIGHI, Fátima Nancy (org.). Responsabilidade Civil e Inadimplemento no Direito Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2014, p. 257)

No caso em destaque, como o autor deixa de mencionar se a classificação no torneio importava em vantagem patrimonial ou não, subentende-se tratar de dano puramente anímico.

Indiscutível que a chance de participar na competição e de lograr um bom resultado restou ceifada pelo fato da lesante, devendo-se levar em consideração, como de fato fora feito na sentença, todo o desapontamento sofrido pelo jogador - impedido de participar da disputa por não portar seu uniforme - na quantificação da indenização anímica.

Tanto é verdade, que o quantum indenizatório mostra-se arbitrado em patamar superior ao normalmente praticado por este Tribunal para a hipótese de simples extravio de bagagem. A propósito da assertiva, em casos mais complexos, destacadamente os que respeitam a atrasos ou cancelamentos de voos internacionais, com repercussões de efeito cascata em termos de perda de conexão e extravio de bagagens, esta Corte Estadual, entende como razoáveis as indenizações entre cinco e dez mil reais: AC n. 2012.032013-6, de Lages, relator Des. José Volpato de Souza, Quarta Câmara de Direito Público, j. em 16.05.2013; AC n. 2015.032493-7, de Içara, relator Des. João Henrique Blasi, Segunda Câmara de Direito Público, j. em 14.07.2015.

Assim, no caso em exame, tem-se acertado o valor fixado em primeiro grau, razão pela qual se mantém a condenação da companhia aérea no patamar consignado, desprovendo-se ambos os apelos quanto ao valor da compensação dos danos morais.

Os recursos são, portanto, conhecidos, provendo-se parcialmente o do autor para agregar à condenação pelos danos materiais já reconhecidos a importância de R$ 33,05 (trinta e três reais e cinco centavos) e desprovendo-se o da empresa aérea.

Por se tratar de matéria de ordem pública, reforma-se, de ofício, a decisão no tocante aos consectários legais, passando a incidir os juros de mora, no percentual de 1% ao mês sobre o valor total da condenação, a contar da citação (art. 405 do CC e art. 219, caput, do CPC), porquanto condizente com os ditames da responsabilidade civil contratual.

Este é o voto.


Gabinete Des. Ronei Danielli