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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 2012.066794-8 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Júlio César Knoll
Origem: Santo Amaro da Imperatriz
Orgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Público
Julgado em: Tue Jan 12 00:00:00 GMT-03:00 2016
Juiz Prolator: Cíntia Ranzi Arnt
Classe: Apelação Cível

 

Apelação Cível n. 2012.066794-8, de Santo Amaro da Imperatriz

Relator: Des. Subst. Júlio César Knoll

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CAUTELAR INOMINADA. ECAD. DIREITOS AUTORAIS. OBRAS MUSICAIS NA 14º FESTA DO MORANGO. EVENTO SEM FINS LUCRATIVOS. CONTRIBUIÇÃO POR RETRIBUIÇÃO DEVIDA. EXEGESE DA LEI N. 9.610/98. FIXAÇÃO DOS VALORES E FORMA DE CÁLCULO DE ACORDO COM O REGULAMENTO DE ARRECADAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E ACOLHIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2012.066794-8, da comarca de Santo Amaro da Imperatriz (2ª Vara), em que é apelante Escritório Central de Arrecadação e Distribuição ECAD, e apelada Associação Comunitária Distrito de Taquaras:

A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, conhecer e acolher o recurso, para reformar a sentença, e determinar o pagamento das verbas autorais, conforme parâmetros fixados na tabela de arrecadação do ECAD. Custas na forma da lei.

O julgamento, realizado no dia 12 de janeiro de 2016, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Pedro Manoel Abreu, com voto, e dele participou, o Exmo. Sr. Des. Cesar Abreu.

Funcionou como Representante do Ministério Público o Dr. Ivens José Thives de Carvalho.

Florianópolis, 12 de janeiro de 2016.

Júlio César Knoll

Relator


RELATÓRIO

Perante a Vara Única da comarca de Santo Amaro da Imperatriz, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição - ECAD, devidamente qualificado, promoveu, com fundamento nos permissivos legais, através de procurador habilitado, ação cautelar inominada, em face da Associação Comunitária do Distrito de Taquaras - ACDT.

Relatou que, a requerida, com autorização do Município de Rancho Queimado, promoveu a 14ª Festa do Morango, com a execução musical e utilização de obras protegidas, sem autorização dos titulares dos direitos autorais.

Alegou que, o promotor do evento está legalmente obrigado a obter o devido licenciamento autoral para a execução das obras programadas para o espetáculo.

Disse que, o evento é realizado com o propósito publicitário e institucional, na intenção de arrecadar fundos para a econômia do Município.

Postulou pela retribuição autoral pertinente ao evento.

Recebida, registrada e autuada a inicial, a associação requerida foi citada. No prazo legal, veio aos autos e apresentou resposta, via contestação.

Nela refutou os argumentos expostos na exordial.

Após réplica, a MMa. Juíza de Direito, Dra. Cíntia Ranzi Arnt, proferiu sentença, a saber (fls. 168-172):

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na exordial, condenando a parte vencida a arcar com o pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em favor dos patronos dos réus, no valor que, com base no art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil, se estipula para cada um em R$ 1.500,00, que se considera adequado para remunerar o trabalho realizado pelos causídicos. Em consequência, julgo extinta presente ação, bem como a cautelar em apenso. Transitada em julgado e, recolhidas as custas, procedam-se às baixas e anotações necessárias, arquivando-se na seqüência. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Inconformado, a tempo e modo, o ECAD interpôs recurso de apelação.

Disse que, os shows foram realizados sem a devida autorização dos titulares de direitos autorais, como dispõe a Lei n. 9.610/98.

No mais, repisou os argumentos iniciais e requereu a reforma da decisão de primeiro grau.

Apresentadas as contrarrazões, os autos foram enviados à douta Procuradoria-Geral de Justiça, sendo que lavrou parecer o Dr. André Carvalho, que entendeu pela desnecessidade de sua intervenção na causa.

Os autos ascenderam a esta Corte de Justiça, sendo distribuídos erroneamente à Terceira Câmara de Direito Civil, que reconheceu sua incompetência para julgar o feito, e determinou a redistribuição a uma das Câmaras de Direito Público.

Vieram conclusos.


VOTO

Porque presentes os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso.

Inicialmente, importa esclarecer que, em razão da conexão entre estes autos e a ação de cobrança de retribuição autoral n. 2012.065890-1, cujas as partes e causas de pedir são as mesmas, embora distintos os pedidos, impõe-se a apreciação conjunta, a fim de evitar decisões contraditórias.

É incontestável que a Associação Comunitária do Distrito de Taquaras - ACDT e o Município de Rancho Queimado tenham promovido a 14ª Festa do Morango.

Consoante amplo conjunto probatório, ausente demonstração de que os requeridos tenham pago ao Escritório de Arrecadação os valores referentes aos direitos autorais das músicas que foram executadas nos eventos.

Tem-se que o ora apelante1 é uma instituição privada, com o objetivo de centralizar a arrecadação e distribuição dos direitos autorais de execução pública musical.

O ECAD serve para que os usuários saibam a quem pagar, e que os titulares dos direitos tenham a garantia de que irão recebê-los.

A Lei n. 9.610/98, que atualizou a legislação sobre os direitos autorais, em seu artigo 86, aduz que, "os direitos autorais de execução musical relativos a obras musicais, lítero-musicais e fonogramas incluídos em obras audiovisuais serão devidos aos seus titulares pelos responsáveis dos locais ou estabelecimentos a que alude o § 3º do art. 68 desta Lei, que as exibirem, ou pelas emissoras de televisão que as transmitirem".

O 68, § 3º, da Lei supracitada, dispõe que:

Art. 68. Sem prévia e expressa autorização do autor ou titular, não poderão ser utilizadas obras teatrais, composições musicais ou lítero-musicais e fonogramas, em representações e execuções públicas.

[...] § 3º. Consideram-se locais de freqüência coletiva os teatros, cinemas, salões de baile ou concertos, boates, bares, clubes ou associações de qualquer natureza, lojas, estabelecimentos comerciais e industriais, estádios, circos, feiras, restaurantes, hotéis, motéis, clínicas, hospitais, órgãos públicos da administração direta ou indireta, fundacionais e estatais, meios de transporte de passageiros terrestre, marítimo, fluvial ou aéreo, ou onde quer que se representem, executem ou transmitam obras literárias, artísticas ou científicas.

A sentença de primeiro grau entendeu que, a contribuição não é devida, posto que a cobrança de ingresso não caracteriza atividade lucrativa, e que o evento não tem fins lucrativos.

Todavia, havendo a execução pública de músicas, são devidos os direitos autorais respectivos, não importando se houve cobrança de ingressos e/ou se a Municipalidade auferiu lucro, seja direto ou indireto, salvo, evidentemente, se houvesse a autorização dos autores das obras, circunstância ausente no caso em tela.

Extrai-se da jurisprudência do STJ:

DIREITOS AUTORAIS. RECURSO ESPECIAL. EVENTO PÚBLICO. RODEIO, COM EXECUÇÃO DE MÚSICAS, PROMOVIDO POR PREFEITURA MUNICIPAL, SEM COBRANÇA DE INGRESSO. EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO DE DIREITOS AUTORAIS. POSSIBILIDADE. PROVEITO ECONÔMICO PARA EXIGIBILIDADE. DESNECESSIDADE.

1. Anteriormente à vigência da Lei 9.610/98, a jurisprudência prevalente enfatizava a gratuidade das apresentações públicas de obras musicais, dramáticas ou similares, como elemento decisivo para distinguir o que estaria sujeito ao pagamento de direitos autorais.

2. Houve significativa alteração com a edição da Lei 9.610/98, pois o art. 68 do novo diploma legal revela a subtração, quando comparado com a lei anterior, da cláusula "que visem a lucro direto ou indireto", como pressuposto para a cobrança de direitos autorais.

3. O Superior Tribunal de Justiça, em sintonia com o novo ordenamento jurídico, alterou seu entendimento para afastar a utilidade econômica do evento como condição de exigência para a percepção da verba autoral. Posição consolidada no julgamento do REsp. 524.873-ES, pela Segunda Seção.

4. Portanto, é devida a cobrança de direitos autorais pela execução pública de música em rodeio, mesmo que tenha sido evento promovido por Prefeitura sem a existência de proveito econômico.

5. Recurso especial provido. (REsp 996.852/SP, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 21-6-2011.)

Verificou-se, portanto, que os direitos autorais são devidos mesmo que a execução de obras musicais em eventos públicos, sejam sem fins lucrativos.

Ademais, o montante pago aos artistas não está adstrito com a contraprestação devida ao autor da música executada, ainda que o musicista e o compositor sejam o mesmo.

Então, é cabível a arrecadação por parte do ECAD, porque o valor pago a título de remuneração em razão das apresentações ao vivo, não incorpora a cobrança dos direitos autorais.

Frisa-se que, cachê não é a mesma coisa que direitos autorais. O primeiro refere-se ao pagamento feito por qualquer pessoa que se apresente em público, enquanto o segundo é um conjunto de prerrogativas conferidas por lei à pessoa física ou jurídica criadora de obra intelectual.

Assim, nos casos de música ao vivo, o cachê recebido remunera os envolvidos nas apresentações realizadas na "Festa do Morango", já o recolhimento dos valores efetuados pelo ECAD representam a utilização de uma obra intelectual, que são repassados aos respectivos autores.

Destarte, "[...] se o compositor arvora-se em interpretar suas próprias composições, divulgando-se em shows, ele, autor intelectual da obra, que tem a disposição patrimonial dela, pode preferir ser remunerado apenas pelo cachê recebido" (REsp 812763/RS, Min. João Otávio de Noronha).

Ocorre que, não há prova nos autos que demonstrem que artistas dispõe de exclusiva autoria das obras, nem que a cobrança dos direitos foram efetuadas por eles mesmo, e nem que abriram mão de tais direitos.

Neste sentido:

Na apresentação de artista em público há, além da veiculação de criações próprias, a reprodução de músicas pertecentes a outros compositores, devendo ser feita a necessária distinção entre os direitos autorais do criador da obra e dos direitos conexos, que abarcam os intérpretes e os executantes. Desse modo, a remuneração cobrada para apresentação "ao vivo" (cachê) não afasta a necessidade do pagamento das retribuições autorais, pois somente serve de contraprestação à exposição pública do trabalho e imagem do intérprete/executante. Identificada, portanto, a legitimidade do ECAD e a existência do débito. (Ap. Cível n. 2008.010709-2, rel. Des. Henry Petry Junior, j. em 16-6-2009).

Logo, à luz da Lei 9.610/98, é cabível a cobrança de direitos autorais ainda que o evento não visa auferir lucros.

Entretanto, a fixação do quantum debeatur deve ser apurado em sede de liquidação de sentença.

Colhe-se da jurisprudência:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. ECAD. FENACHOPP. ESTIPULAÇÃO DO VALOR DEVIDO A TÍTULO DE DIREITOS AUTORAIS. COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DO ECAD DE ACORDO COM A SUA TABELA DE ARRECADAÇÃO. VALORES LEVANTADOS EM BILHETERIA A SERVIR COMO BASE DE CÁLCULO PARA O IMPORTE DEVIDO.

[...]

Os valores cobrados são aqueles fixados pela própria instituição, em face da natureza privada dos direitos reclamados, não sujeitos a tabela imposta por lei ou regulamentos administrativos. (Ap. Cível n. 2011.1001225-1, rel. Des. Saul Steil, j. em 4-5-2012).

Contudo, cabe ao requerente firmar o valor a ser pago pela utilização da obra musical, visto que tal fato é exercido através de critérios e parâmetros de cobrança já estipulados pelo ECAD em seu regulamento.

Diante dos fatos expostos, voto no sentido de conhecer e acolher o recurso, para reformar a sentença, e determinar o pagamento das verbas autorais, conforme parâmetros fixados na tabela de arrecadação.


1 http://www.ecad.org.br/pt/quem-somos/oEcad/Paginas/default.aspx



Gabinete Des. Subst. Júlio César Knoll