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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 2015.047638-4 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Volnei Celso Tomazini
Origem: Criciúma
Orgão Julgador: Segunda Câmara Criminal
Julgado em: Tue Oct 20 00:00:00 GMT-03:00 2015
Juiz Prolator: Débora Driwin Rieger Zanini
Classe: Apelação Criminal (Réu Preso)

 


Citações - Art. 927, CPC: Repercussão Geral: 580252

Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2015.047638-4, de Criciúma

Relator Designado: Des. Subst. Volnei Celso Tomazini

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA. TRÁFICO DE DROGAS NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PRISIONAL (ART. 33, CAPUT, C/C ART, 40, III, AMBOS DA LEI 11.343/06). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE DO CRIME E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. PALAVRA DAS TESTEMUNHAS EM HARMONIA COM AS DEMAIS PROVAS EXISTENTES NOS AUTOS. APELANTE QUE, APÓS REVISTA ÍNTIMA, FOI FLAGRADA TENTANDO INGRESSAR EM ESTABELECIMENTO PRISIONAL COM 73,83G DE MACONHA, ESCONDIDA EM SUA GENITÁLIA.

PLEITEADA NULIDADE DA PROVA, EM RAZÃO DA ILEGALIDADE E/OU INCONSTITUCIONALIDADE DA REVISTA ÍNTIMA. INVIABILIDADE. REVISTA ÍNTIMA DEVIDAMENTE REALIZADA NOS MOLDES DA INSTRUÇÃO NORMATIVA N. 001/2010 DO DEAP/SC, QUE VISA ASSEGUAR A SEGURANÇA PÚBLICA (CF, ART. 6º, CAPUT, E ART. 144, CAPUT), E A INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL DOS PRESOS (CF, ART. 5, XLIX). CONFLITO APARENTE DE NORMAS. INTERESSE PÚBLICO RELEVANTE QUE SE SOBREPÕE AO DIREITO INDIVIDUAL. PROVA VÁLIDA. TESE RECHAÇADA.

PLEITEADO O RECONHECIMENTO DE CRIME IMPOSSÍVEL (ART. 14 DO CP). INOCORRÊNCIA. CONSUMAÇÃO DO ILÍCITO QUE OCORRE COM A REALIZAÇÃO DE UM DOS NÚCLEOS DO TIPO PENAL DISPOSTOS NO ART. 33, CAPUT, DA LEI DE 11.343/06. CRIME CONSUMADO ANTERIORMENTE À ENTREGA DA MERCADORIA AO DETENTO. DELITO CONFIGURADO. CONDENAÇÃO MANTIDA.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2015.047638-4, da comarca de Criciúma (2ª Vara Criminal), em que é apelante Ana Paula Prudêncio dos Santos, e apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Segunda Câmara Criminal decidiu, por maioria de votos, negar provimento ao recurso; vencido o relator. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Getúlio Corrêa (Presidente) e Des. Sérgio Rizelo. Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Gercino Gerson Gomes Neto.

Florianópolis, 20 de outubro de 2015.

Volnei Celso Tomazini

Relator DESIGNADO


RELATÓRIO

O representante do Ministério Público da comarca de Criciúma, no uso de suas atribuições legais, ofertou denúncia contra Ana Paula Prudência dos Santos, imputando-lhe a prática do crime descrito no art 33, caput, c/c art. 40, III, ambos Lei 11.343/06, em razão dos seguintes fatos:

Colhe-se do incluso caderno indiciário que no dia 14 de dezembro de 2014, por volta das 09h, durante o horário de visita, a denunciada Ana Paula Prudencio Duarte tentou ingressar ao interior reservado do Presídio Santa Augusta, situado na Rua Hortênsia Alda de Medeiros, nº 65, Bairro Santa Augusta, nesta cidade de Criciúma, trazendo consigo no interior de sua vagina: 01 (um) pacote de fumo em corda, 01 (um) pacote de plástico contendo papel seda e 73,83g (setenta e três gramas e oitenta e três centigramas) da Erva Cannabis sativa (maconha), sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, tudo destinado ao detido Alexandre de Oliveira (ver auto de apreensão de fls. 13 e laudos de fls. 15 e 31/34).

Segundo consta, na ocasião da revista (já nas dependências do estabelecimento prisional), foi a denunciada descoberta pela vigilante Silvana Florentino Duarte trazendo em seu corpo os materiais/objetos citados, oportunidade em que reconheceu perante os agentes públicos a prática do delito, não sem antes tentar negar a conduta, sendo então encaminhada ao respectivo Departamento Policial para os procedimentos de praxe, quando, então, silenciou em seu depoimento formal.

Registra-se, que Ana Paula é reincidente no delito de tráfico e contumaz em adentrar na referida unidade prisional com objetos proibidos, tendo, inclusive, sua carteira de acesso cassada por algum tempo (fls. 40-42).

Concluída a instrução processual, a Magistrada a quo julgou procedentes os pedidos formulados na denúncia para condenar a acusada Ana Paula Prudência dos Santos à pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 583 dias-multa, em razão da prática do crime descrito no art 33, caput, c/c art. 40, III, ambos Lei 11.343/06.

Irresignada com a prestação jurisdicional, a acusada interpôs recurso de apelação e, em suas razões, pugnou pela absolvição, sob o argumento de que a prova utilizada para fundamentar a condenação foi obtida de forma ilícita. Alegou a inconstitucionalidade e/ou ilegalidade da revista íntima realizadas nos Presídios Catarinenses, bem como a inabilitação da servidora que realizou o procedimento na acusada. Requereu, ainda, o reconhecimento do crime impossível, diante da ineficácia absoluta do meio utilizado (fls. 15-31).

Apresentadas as contrarrazões, Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Luiz Ricardo Pereira Cavalcanti, o qual se manifestou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.


VOTO

Trata-se de Recurso de Apelação interposto pela acusada Ana Paula Prudêncio dos Santos contra a sentença que a condenou à pena de 5 anos e 10 meses de reclusão, em regime fechado, e ao pagamento de 583 dias-multa, por infração ao disposto no art. 33, caput, c/c 40, III, ambos da Lei 11.343/06.

Extrai-se dos autos, em resumo, que a acusada foi surpreendida, enquanto passava pela revista íntima no Presídio Santa Augusta de Criciúma, com 73,83 gramas de maconha escondida na cavidade vaginal.

Inicialmente, cumpre esclarecer, é incontroverso nos autos, e não faz parte da tese recursal, o cometimento do crime de tráfico de drogas pela ré.

Por cautela, todavia, registra-se que a materialidade do delito está evidenciada no auto de prisão em flagrante (fl. 06), no boletim de ocorrência (fls. 016), no termo de apreensão (fl. 13), no laudo de constatação provisória (fl. 15), no laudo pericial (fls. 31-34), o qual constatou a presença da substância cannabis sativa (maconha), no material apreendido, bem como em toda prova oral coligida durante a persecução penal.

A autoria, por sua vez, encontra substrato na própria confissão da ré e, também, nos depoimentos prestados pelo Agente Penitenciário e pela Vigilante do presídio, a qual encontrou a droga no órgão genital da acusada, de modo que tais elementos fornecem a certeza de que Ana Paula Prudêncio dos Santos praticou os fatos descritos na denúncia.

Em seu interrogatório, a acusada admitiu que tentou entrar no presídio com a droga, justificando sua conduta no fato de ter sido ameaçada por seu ex-companheiro, então recluso naquele presídio (fl.88).

A Vigilante Silvana Florentino Duarte, a qual encontrou a droga junto a acusada, afirmou que pôde ver pelo espelho, no momento em que acusada se agachou durante o procedimento de revista íntima, um objeto alocado na sua vagina. Em razão disso, esclareceu que pediu para a acusada retirar o que estava escondendo, momento em que ela confessou que trazia consigo a droga, a qual seria destinada ao seu companheiro que estava preso.

No mesmo sentido, o agente Prisional Roni César Pereira relatou que foi acionado para conduzir a acusada até a delegacia de polícia para registrar a ocorrência, uma vez que esta teria sido flagrada tentando ingressar no presídio com drogas.

Nenhuma contradição sobressai, portanto, desses testemunhos, pois claramente revelam o modo como foi realizado o tráfico de drogas. Ressalta-se, a autoria está inequivocadamente demonstrada nos autos, mesmo porque as testemunhas inquiridas são idôneas, inexistindo motivos para questionar a veracidade de suas palavras.

Em caso análogo, já se decidiu:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A SAÚDE PÚBLICA. TRÁFICO DE DROGAS NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PRISIONAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE DO CRIME E AUTORIA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. PALAVRA DAS AGENTES PRISIONAIS EM HARMONIA COM AS DEMAIS PROVAS EXISTENTES NOS AUTOS. APELANTE QUE, APÓS REVISTA ÍNTIMA, FOI FLAGRADA TENTANDO INGRESSAR EM PRESÍDIO REGIONAL COM 2 (DUAS) PORÇÕES DE MACONHA, COM PESO TOTAL DE 20,1 (VINTE GRAMAS E UM DECIGRAMAS). CONDENAÇÃO MANTIDA. ALMEJADA DESCLASSIFICAÇÃO PARA A CONDUTA PREVISTA NO ART. 28 DA LEI N. 11.343/2006. DESCABIMENTO. CONDIÇÃO DE USUÁRIA QUE, POR SI SÓ, NÃO IMPLICA NO RECONHECIMENTO DA FIGURA PREVISTA NO ART. 28 DA LEI ANTIDROGAS. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal n. 2014.081629-3, de Biguaçu, rel. Des. Rui Fortes, j. 01-09-2015).

Com efeito, indiscutivelmente a ré foi a autora do delito contra a saúde pública ora apurado, sobretudo porque a prova oral, em conjunto à prisão em flagrante da acusada na posse das drogas, são elementos suficientes para a manutenção de sua condenação.

Esclarecidas a materialidade e a autoria delitiva, passa-se a análise da teses defensivas.

Ilegalidade/inconstitucionalidade da revista íntima

Em suas razões, a acusada alegou que a prova utilizada para fundamentar a condenação foi obtida de forma ilícita, alegando a inconstitucionalidade e ilegalidade da revista íntima realizadas nos Presídios Catarinenses.

Pois bem.

A revista íntima realizada nos estabelecimentos prisionais de Santa Catarina está prevista na Instrução Normativa n. 001/2010 do DEAP/SC, o qual descreve, com detalhes, a forma como a revista deve ser realizada. Veja-se:

Após averiguação dos procedimentos exigidos, o visitante será conduzido até a sala de busca pessoal;

A revista pessoal é feita individualmente por um Agente Penitenciário do mesmo sexo do visitante, independentemente da idade;

Com o uso de luvas descartáveis o Agente Penitenciário revistará o visitante, solicitando que o mesmo retire todo seu vestuário, revistando-o em seguida;

O Agente Penitenciário que realizar a busca pessoal, não deverá tocar no revistado como também, sempre que efetuar a revista em menor de idade deverá exigir a presença do acompanhante no interior da sala durante o procedimento, salvo nos menores que possuam dispensa judicial para acompanhante;

Com a utilização de um espelho no chão e outro na parede, para melhor observação das partes íntimas, é feita a revista pessoal objetivando impedir entrada de objetos proibidos;

Durante o procedimento de revista com o auxílio do espelho, o Agente Penitenciário posicionado de frente para o visitante deverá olhar a parte de trás através do espelho fixado na parede, observando com muita atenção costas, pernas e/ou locais que possibilitem ao visitante burlar a segurança;

O Agente Penitenciário deverá solicitar ao visitante que mostre a sola dos pés, unhas e erga seus braços ou qualquer parte do corpo que possa ser utilizada para colagem de objetos não permitidos;

É feita também a revista na boca do visitante, pedindo para que abra a mesma e levante a língua pra cima e depois para fora da boca;

Se o visitante usar cabelo comprido, estando amarrado, deverá soltá-lo; baixar a cabeça, passando os dedos entre os cabelos em movimento de pentear no sentido da raiz para ponta;

O visitante deverá entregar o par de sandálias ao Agente Penitenciário, para que seja revistada;

O Agente Penitenciário, não necessariamente, deverá seguir a seqüência relatada nos itens anteriores, podendo inverter a ordem do procedimento padrão caso achar necessário;

O familiar ou pessoa interessada no ingresso, que opor-se ao cumprimento da determinação acima, terá sua entrada proibida.

Por outro lado, o Conselho Nacional de Polícia Criminal e Penitenciária publicou em agosto de 2014 a Resolução n. 5/2014, a qual recomenda que seja vedada quaisquer forma de revista vexatória, desumanas ou degradantes. Veja-se:

CONSIDERANDO que a necessidade de prevenir crimes no sistema penitenciário não pode afastar o respeito ao Estado Democrático de Direito, resolve: recomendar que a revista de pessoas por ocasião do ingresso nos estabelecimentos penais seja efetuada com observância do seguinte:

Art. 1º. A revista pessoal é a inspeção que se efetua, com fins de segurança, em todas as pessoas que pretendem ingressar em locais de privação de liberdade e que venham a ter contato direto ou indireto com pessoas privadas de liberdade ou com o interior do estabelecimento, devendo preservar a integridade física, psicológica e moral da pessoa revistada.

Parágrafo único. A revista pessoal deverá ocorrer mediante uso de equipamentos eletrônicos detectores de metais, aparelhos de raio-x, scanner corporal, dentre outras tecnologias e equipamentos de segurança capazes de identificar armas, explosivos, drogas ou outros objetos ilícitos, ou, excepcionalmente, de forma manual.

Art. 2º. São vedadas quaisquer formas de revista vexatória, desumana ou degradante.

Parágrafo único. Consideram-se, dentre outras, formas de revista vexatória, desumana ou degradante:

I - desnudamento parcial ou total;

II - qualquer conduta que implique a introdução de objetos nas cavidades corporais da pessoa revistada;

III - uso de cães ou animais farejadores, ainda que treinados para esse fim;

IV - agachamento ou saltos.

Ainda que o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária recomende o não desnudamento parcial, a revista íntima realizada no caso não pode ser tida como ilegal, uma vez que a Resolução trata de uma recomendação a ser implementada pelos Estados.

Ressalta-se que, no procedimento de revista íntima realizado na apelante Ana Paula Prudêncio dos Santos, não houve nenhum desrespeito às regras conditas na Instrução Normativa n. 1/2010 do Departamento de Administração Prisional (DEAP), esclarecendo-se que não houve contato físico entre a servidora pública (por equiparação) e a apelante.

Ainda, vislumbra-se que, no caso concreto, conforme informações contidas no inquérito e no interrogatório da ré em Juízo, a revista foi realizada por uma servidora pública equiparada que, ao desconfiar do comportamento da ré, ordenou que retirasse o volume que trazia escondido em sua parte íntima, tendo a própria acusada entregado a droga..

Esclarece-se que a revista íntima é um procedimento essencial para a preservação da segurança pública, pois vista proteger agentes públicos, presidiários, visitantes dos estabelecimento prisionais, especialmente nos locais onde não se pode adotar procedimento diverso, por falta de equipamentos próprios, como no caso Presídio Santa Augusta de Criciúma.

A própria Resolução n. 5/2014 do CNPCP, em sua justificativa, dispõe sobre a dificuldade no cumprimento das recomendações:

A presente resolução não se propõe a determinar de modo fechado como as administrações penitenciárias estaduais devem proceder ao realizar tais vistorias, visto que cada Estado dispõe de equipamentos técnicos e humanos diferenciados, e as realidades de cada um devem ser respeitadas. Existem Estados que dispõem de equipamentos de última geração, como os scanners corporais, que proporcionam que as vistorias pessoais sejam realizadas sem qualquer contato com o corpo da pessoa revistada. Entretanto, existem outros que ainda não podem prescindir da revista manual, aquela realizada com o contato humano, vez que não dispõem de tecnologias adequadas, especialmente as unidades prisionais das cidades dos interiores mais distantes, que muitas vezes escapam ao olhar fiscalizador do Poder Público. [...]

Importa ressaltar que a revista íntima nos estabelecimentos prisionais envolve, de um lado, a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) e a intimidada (CF, art. 5º, X) e, de outro, a segurança pública (CF, art. 6º, caput, e art. 144, caput), a integridade física e moral dos presos (CF, art. 5, XLIX), bem como a dignidade da pessoa humana dos presidiários (CF, art. 1º, III).

Desse modo, havendo um conflito aparente de normas fundamentais, deve-se realizar um juízo de ponderação, conforme bem esclarece o doutrinador Robert Alexy:

"Se isoladamente considerados, ambos os princípios conduzem a uma contradição. Isso significa, por sua vez, que um princípio restringe as possibilidade jurídicas de realização do outro. Essa situação não é resolvida com a declaração de invalidade de um dos princípios e com sua consequente limitação do ordenamento jurídico. Ela tampouco é resolvida por meio da introdução de uma exceção a um dos princípios, que seria considerado, em todos os casos futuros, como regra que ou é realizada, ou não é. A solução para essa colisão consiste no estabelecimento de uma relação de precedência condicionada entre os princípios, com base nas circunstâncias do caso concreto. Levando-se em consideração o caso concreto, o estabelecimento de relações de precedências condicionadas consiste na fixação de condições sob as quais um princípio tem precedência em face do outro. Sob outras condições, é possível que a questão da precedência seja resolvida de forma contrária" (ALEXY, Robert: Teoria dos direitos fundamentais. Malheiros, 2. ed. São Paulo,2011. p. 96)

E ainda:

Em um primeiro passo deve ser comprovado o grau do não-cumprimento ou prejuízo de um princípio. A isso deve seguir, em um segundo passo, a comprovação da importância do cumprimento em sentido contrário. Em um terceiro passo deve, finalmente, ser comprovado, se a importância do cumprimento do princípio em sentido contrário justifica o prejuízo ou não- cumprimento do outro (in Constitucionalismo Discursivo, obra traduzida por Luís Afonso Heck. Porto Alege: 2007, Livraria do Advogado, p. 111).

No mais, os direitos fundamentais não são ilimitados, de modo que devem ser mitigados quando em conflito com outros direitos de status constitucional:

´[...] os direitos fundamentais podem ser objeto de limitações, não sendo, pois, absolutos. Tornou-se pacífico que os direitos fundamentais podem sofrer limitações, quando enfrentam outros valores de ordem constitucional, inclusive outros direitos fundamentais. Pietro Sanchis noticia que a afirmação de que ' não existem direitos ilimitados se converteu quase em cláusula de estilo na jurisprudência de todos os tribunais competentes em matéria de direitos humanos [...]

A leitura da Constituição brasileira mostra que essas limitações são, às vezes, expressamente previstas no Texto. Até o elementar direito à vida tem limitação explícita no inciso XLVII, a, do art. 5º, em que se contempla a pena de morte em caso de guerra formalmente declarada.

Não há, portanto, em princípio, que se falar, entre nós, em direitos absolutos. Tanto outros direitos fundamentais como outros valores com sede constitucional podem limitá-los (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Martins; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet: Curso de Direito Constitucional. 5ªed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 316-317).

Realizando-se, pois, o juízo de ponderação no caso concreto, o direito à intimidade da acusada deve ser mitigado, de modo que deve prevalecer a segurança pública, a integridade física e moral dos presos, servidores públicos, visitantes dos presídios, ou seja, o interesse público se sobrepõe ao individual.

Friza-se, a revista íntima é um dos meios de se coibir a entrada de armas, drogas, celulares, entre outros objetos proibidos no interior do estabelecimento prisional. Sem esse procedimento, estar-se-ía colocando em perigo todo o sistema carcerário, uma vez que familiares dos reclusos poderiam ingressar livremente no interior dos presídios, carregando consigo objetos indevidos, já que o Estado de Santa Catarina não possui equipamentos específicos para a realização desse controle.

Sobre a constitucionalidade e legalidade da revista íntima, esta Corte já se pronunciou:

"A revista pessoal realizada anteriormente à entrada em estabelecimento prisional, ao contrário de comprometer a dignidade do visitante, possui como finalidade exatamente evitar a introdução de objetos ilícitos e/ou proibidos no interior do estabelecimento prisional, constituindo-se, assim, meio necessário para manutenção da ordem e da segurança dos próprios visitantes e reclusos". ( Apelação Criminal n. 2014.010549-9, Rel. Des. Rodrigo Collaço).

Não destoa o entendimentos de outros Tribunais:

Tráfico de entorpecentes. Ré flagrada na posse de relevante quantidade de cocaína e maconha guardadas no interior de sua vagina quando tentava ingressar em estabelecimento prisional. Prova ilícita. Revista íntima em centros de detenção não configura prova ilícita, sendo procedimento legítimo e necessário. Coação moral irresistível. Impossibilidade. Autoria e materialidade comprovadas. Circunstâncias fáticas a evidenciar a traficância. Condenação. Penas bem dosadas. Negado provimento.(TJ-SP - APL: 0088402120108260625 SP 0008840-21.2010.8.26.0625, Relator: Guilherme de Souza Nucci, Data de Julgamento: 16/12/2013, 1ª Câmara Criminal Extraordinária, Data de Publicação: 28/01/2014).

CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISTA PESSOAL EM PRESÍDIO. LEGALIDADE. 1. Desde que obsequiados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, inexiste ilegalidade na revista pessoal de visitante em estabelecimento prisional. 2. Remessa oficial provida. (TRF-1 - REOMS: 133 AC 2000.30.00.000133-0, Relator: JUIZ FEDERAL VALLISNEY DE SOUZA OLIVEIRA (CONV.), Data de Julgamento: 12/05/2005, TERCEIRA TURMA SUPLEMENTAR, Data de Publicação: 04/08/2005 DJ p.125)

"TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE

Preliminar de nulidade em razão de revista pessoal realizada na penitenciária Alegada violação da dignidade pessoal, direito constitucionalmente garantido Prova ilícita Inocorrência Necessidade da revista pessoal Interesse público relevante que se sobrepõe ao direito individual Preliminar rejeitada (TJSP, Apelação nº 0029456-51.2009.8.26.0625, Rel. Des. Maria Tereza do Amaral, 11ª Câmara Criminal, j. 04.05.11).

"No caso em comento, em que se discute a possibilidade de realização da revista íntima para ingresso nos presídios, devem ambos os interesses em conflito ser garantidos, tantos os direitos à intimidade e á privacidade da visitante, como o direito á integridade física e segurança dos presos, ponderando-se a limitação dos princípios apenas na medida em que não se viole o seu núcleo essencial, o que os esvaziaria de sentido.

A realização da revista íntima mostra-se medida necessária para a contenção de objetos proibidos dentro dos presídios, sob pena de se anular o sentido da norma que prescreve a necessidade de se garantir a segurança daqueles que se encontram sob a custódia estatal" (TJSP, 5º Grupo de Direito Criminal, Revisão Criminal nº 0133993-91.2013.8.26.0000, Rel. Des. Rachid Vaz de Almeida, j. 9/10/ 2014).

Válido destacar, ademais, que a legalidade da revista íntima nos estabelecimentos prisionais esta sendo discutida no Mandado de Segurança n. 2015.016606-7, tendo o Relator, Desembargador Sérgio Roberto Baasch Luz, se pronunciado monocraticamente no segunte sentido:

A querela gravita em torno de direitos constitucionalmente assegurados: enquanto de um lado está o direito dos visitantes de detentos em terem sua intimidade e integridade físicas preservadas, do outro lado figura o direito à segurança pública, notadamente a segurança da sociedade em geral e também daqueles que laburam no sistema carcerários.

É sabido que inexiste hierarquia entre garantias constitucionais, portanto, quando há conflito entre elas, cabe ao magistrado uma solução de equilíbrio. [...]

Destarte, num juízo de ponderação, no enfoque do caso concreto, creio que o nó górdio da questão deva ser desatado em favor da segurança pública.

Cumpre-me, todavia, ressalvar que a atual forma como o Estado realiza as revistas em visitantes que adentram as unidades prisionais, de fato não é a mais adequada, tendo em conta a existência de recursos tecnológicos capazes de suprir tais necessidades de forma não invasiva e sem oferecer qualquer constrangimento aos visitantes.

Importante sublinhar, todavia, que os documentos encartados aos autos, informam que o Estado estaria providenciando - ainda que de forma tardia - procedimento licitatório para locação de equipamentos "Body Sacanner" (escaner corporal), o que, segundo assevera o Ente Público, tornará desnecessária a revista íntima em visitantes de detentos, uma vez que este tipo de aparelho é capaz de detectar a presença de metal, armas, drogas, telefones móveis ou quaisquer outros objetos.

Embora não concorde totalmente com a forma atual como o Estado vem realizando as revistas em pessoas que visitam detentos nas unidades prisionais, creio que, por ora, a balança da ponderação deve, neste caso, pender para o lado da segurança pública, mormente porque é pernicioso demais permitir que pessoas, utilizando-se de subterfúgios para burlar a segurança, possam acessar as unidades prisionais portando armas, telefones móveis ou materiais ilícitos, como bem sabemos que acontece. Isso significaria colocar xeque a segurança do sistema carcerário e da sociedade em geral. De outra banda, ao que tudo indica, há solução à vista, pois, como dito alhures, o Estado deflagrou procedimento licitatório para locação de equipamentos de escaner para serem instalados nas unidades prisionais. [...]

É o quanto basta para caracterizar a presença do fumus boni iuris.

O periculum in mora, a seu turno, revela-se presente enquanto perdurarem os efeitos da decisão que proibiu a realização de vistoria íntima nos visitantes de detentos, haja vista a possibilidade de ingressarem nos presídios portando os mais diversos tipos de materiais ilícitos.

Desse modo, não há nenhuma ilegalidade e/ou inconstitucionalidade no procedimento de revista íntima realizada no estabelecimento prisionai, devendo, pois, ser considerada a prova lícita.

Por fim, destaca-se que o fato de a revista íntima ter sido realizada pela Vigilante Silvana Florentino Duarte, funcionária terceirizada que laborava no Presídio Santa Augusta de Criciúma, e não por uma Agente Penitenciária, não é suficiente para caracterizar a prova como ilícita, uma vez que se trata de profissional qualificada e habilitada para o desempenho da função.

Crime impossível (CP, art. 17)

A apelante alegou, ainda, a impossibilidade de consumação do delito, em razão da minunciosa revista íntima, tratando-se, portanto, de crime impossível (art. 17 do CP).

É cediço, para configurar o crime impossível deve-se verificar a ineficácia absoluta do meio, ou a impropriedade absoluta do objeto, conforme lição de Fernando Capez:

"o crime impossível é aquele que pela ineficácia total do meio empregado ou pela impropriedade absoluta do objeto material, é impossível de se consumar o crime (?)mas a ineficácia do meio, quando relativa, leva à tentativa e não ao crime impossível (?) e a impropriedade não pode ser relativa, pois nesse caso haverá tentativa."

No mesmo sentido:

"O crime impossível apresenta uma grande afinidade com a tentativa. Em ambos os institutos, o agente deu início, segundo seu plano de ação, à execução de atividade de caráter criminoso que não atingiu à fase consumativa. Mas enquanto, na tentativa, o resultado delituoso é sempre possível porque os meios empregados pelo agente são, por sua natureza, idôneos e o objeto contra o qual dirigiu sua conduta é um bem jurídico que pode ser ofendido ou passar pelo perigo de sofrer lesão; no crime impossível, o emprego de meios ineficazes ou o ataque a objetos impróprios, isto é, a bens jurídicos que não comportam lesão ou perigo de lesão, inviabilizam aquele resultado." (STOCO, Rui. Código Penal e sua Interpretação, 8ed.2007)

No entanto, insta salientar que, por se tratar de crime de mera conduta, a consumação do delito de tráfico de drogas se dá quando o agente realiza pelo menos uma das 18 (dezoito) condutas previstas no caput do art. 33 da Lei 11.343/06.

Dos depoimentos colhidos durante a instrução processual ficou evidente que a apelante cometeu o crime de tráfico ilícito de entorpecentes, porquanto demonstrado que a acusada, embora não tenha sido flagrada no ato de entrega, trouxe consigo entorpecentes, os quais seriam destinados a seu companheiro preso, modalidade que, nas palavras de Guilherme de Souza Nucci, é do tipo "permanente (a consumação se arrasta no tempo), na formas expor à venda, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar" (Lei Penais e Processuais Penais Comentadas. 5ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 358).

Assim, no momento em que a acusada foi abordada, encontrava-se em flagrante delito, podendo ser presa antes da entrega da droga para seu companheiro, como ocorreu no caso em apreço.

Em caso análogo, já se decidiu:

APELAÇÃO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. MATERIALIDADE E AUTORIA. DEPOIMENTOS DE POLICIAIS. VALIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO EVIDENCIAM A NARCOTRAFICÂNCIA. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS COMETIDO NO INTERIOR DE UM ESTABELECIMENTO PRISIONAL. PRESENÇA DA CAUSA DE AUMENTO DE PENA PREVISTA NO ART. 40, III, DA LEI DE DROGAS. INAPLICABILIDADE DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ART. 33, § 4, DA LEI DE DROGAS. REGIME FECHADO. IMPOSSIBILIDADE DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. PROVIMENTO DO RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, PELO VOTO DO RELATOR. DIVERGÊNCIA. PREVALÊNCIA DO VOTO DA MAIORIA, COM PROVIMENTO EM MENOR EXTENSÃO. 1. A materialidade e a autoria do crime de tráfico de drogas restaram devidamente comprovadas. Substâncias entorpecentes encontradas no interior da vagina da ré. 2. Depoimentos dos agentes penitenciários harmônicos e uníssonos no sentido da responsabilização criminal da ré. Validade dos seus depoimentos, mormente quando submetidos ao crivo do contraditório e corroborados pelas demais provas colhidas e pelas circunstâncias em que ocorreu o delito. Precedentes do STF e do STJ. 3. Não há que se falar em crime impossível, com respaldo no art. 17 do Código Penal, porque para que se possa reconhecer o denominado crime impossível é imprescindível que exista a "ineficácia absoluta do meio empregado" ou a "impropriedade absoluta do objeto", o que não se verificou no caso presente. É que, no duro, a apelante estava ciente de que havia total vigilância naquele local e, mesmo assim, se arriscou e tentou ali adentrar portando substância entorpecente. Por fim, também não configura crime impossível o fato de os agentes penitenciários terem recebido denúncia anônima a respeito da possível conduta criminosa narcotraficante, já que ocorreria a revista de qualquer maneira. 4. O crime de tráfico de drogas, na modalidade "trazer consigo", não admite tentativa, sobretudo em razão da sua natureza, crime de ação múltipla ou conteúdo variado, se consumando com o início da execução da sua conduta. Precedente. [...] (TJ-SP - APL: 00285097020128260405 SP 0028509-70.2012.8.26.0405, Relator: Airton Vieira, Data de Julgamento: 30/07/2015, 1ª Câmara Criminal Extraordinária, Data de Publicação: 25/08/2015)

Mudando o que deve ser mudado:

APELAÇÃO CRIMINAL. RECURSO DA DEFESA. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, C/C ART. 40, INCISO III, AMBOS DA LEI 11.343/2006). MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. APREENSÃO EM PODER DO ACUSADO DE 492 GRAMAS DE MACONHA QUANDO RETORNAVA AO ESTABELECIMENTO PRISIONAL. NATUREZA E QUANTIDADE DE DROGA QUE CONFIRMAM A SUA DESTINAÇÃO COMERCIAL. CONFIGURAÇÃO DO CRIME EM ANÁLISE QUE NÃO EXIGE PROVA EFETIVA DA MERCANCIA, SENDO SUFICIENTE QUE O AGENTE PRATIQUE UMA DAS CONDUTAS TÍPICAS PREVISTAS NO TIPO PENAL. ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO PREVISTO NO ART. 28 DA LEI DE DROGAS. CONDIÇÃO DE USUÁRIO QUE NÃO IMPEDE O EXERCÍCIO DO NARCOTRÁFICO. PLEITO INADMISSÍVEL. PRETENSO RECONHECIMENTO DA TENTATIVA. INACOLHIMENTO. CRIME DE MERA CONDUTA. CONSUMAÇÃO DO ILÍCITO QUE OCORRE COM A REALIZAÇÃO DE UM DOS NÚCLEOS DO TIPO DISPOSTOS NO ART. 33, CAPUT, DA LEI DE 11.343/06. CRIME DE TRÁFICO CONSUMADO. A consumação do crime de tráfico se dá quando o agente comete ao menos uma das dezoito práticas elencadas no art. 33, caput, da Lei de Drogas, no caso em comento ter em depósito. (Apelação Criminal n. 2011.046407-1, de São José, rel. Desa. Marli Mosimann Vargas, j. 13.12.2011). CONDENAÇÃO MANTIDA NA ÍNTEGRA. RECURSO DESPROVIDO. (TJSC, Apelação Criminal (Réu Preso) n. 2012.012998-1, de Rio do Sul, desta relatoria, j. 05-06-2012).

Assim, houve a consumação do crime antes mesmo da revista íntima, motivo pelo qual não há falar em crime impossível, de modo que deve ser mantida a condenação da apelante Ana Paula Prudência dos Santos pelo crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33, caput, c/c art. 40, III, ambos da Lei 11.434/06.

Conclusão

Diante todo o exposto, vota-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso defensivo, para manter na íntegra a sentença objurgada, inclusive no tocante à pena, porque corretamente aplicada.

É o voto.

Declaração de voto vencido do Excelentíssimo Senhor Desembargador Getúlio Corrêa.

1. A ré foi denunciada pela prática, em tese, do crime de tráfico de drogas circunstanciado, assim tipificado na Lei n. 11.343/06:

"Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa".

"Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se:

[...]

III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais [...]".

Do contido nos autos, verifico que a acusada foi surpreendida, enquanto passava pela revista íntima no Presídio Santa Augusta de Criciúma, com 73,83 gramas de maconha na cavidade vaginal, conforme se extrai do termo de exibição e apreensão (fl. 13), do laudo de constatação (fl. 15), do laudo pericial de fls. 31-34 e das palavras da vigilante do estabelecimento prisional, Silvana Florentino Duarte. A ré, apesar de aventar ter sido coagida pelo seu ex-companheiro, também admitiu os fatos.

Isso seria suficiente, em princípio, para manter a condenação da denunciada. Todavia, verifico que todos os elementos produzidos contra ela são ilícitos, porque tanto a prova da materialidade quanto a da autoria - inclusive a confissão, já que, diante da situação em que a ré encontrava-se, não teria como argumentar em sentido contrário - foram decorrentes da revista íntima realizada. A meu ver, este procedimento viola diversos princípios constitucionais, portanto contamina as provas dele originadas, que não podem ser sopesadas contra a acusada, nos termos do art. 5º, LVI, da CF, e do art. 157 do CPP.

2. Antes disso, porém, constato haver aparente antinomia entre os atos administrativos que regulamentam a questão. Em Santa Catarina, a revista íntima realizada nos estabelecimentos prisionais está prevista na Instrução Normativa n. 001/2010 do DEAP/SC:

"Após averiguação dos procedimentos exigidos, o visitante será conduzido até a sala de busca pessoal;

A revista pessoal é feita individualmente por um Agente Penitenciário do mesmo sexo do visitante, independentemente da idade;

Com o uso de luvas descartáveis o Agente Penitenciário revistará o visitante, solicitando que o mesmo retire todo seu vestuário, revistando-o em seguida;

O Agente Penitenciário que realizar a busca pessoal, não deverá tocar no revistado como também, sempre que efetuar a revista em menor de idade deverá exigir a presença do acompanhante no interior da sala durante o procedimento, salvo nos menores que possuam dispensa judicial para acompanhante;

Com a utilização de um espelho no chão e outro na parede, para melhor observação das partes íntimas, é feita a revista pessoal objetivando impedir entrada de objetos proibidos;

Durante o procedimento de revista com o auxílio do espelho, o Agente Penitenciário posicionado de frente para o visitante deverá olhar a parte de trás através do espelho fixado na parede, observando com muita atenção costas, pernas e/ou locais que possibilitem ao visitante burlar a segurança;

O Agente Penitenciário deverá solicitar ao visitante que mostre a sola dos pés, unhas e erga seus braços ou qualquer parte do corpo que possa ser utilizada para colagem de objetos não permitidos;

É feita também a revista na boca do visitante, pedindo para que abra a mesma e levante a língua pra cima e depois para fora da boca;

Se o visitante usar cabelo comprido, estando amarrado, deverá soltá-lo; baixar a cabeça, passando os dedos entre os cabelos em movimento de pentear no sentido da raiz para ponta;

O visitante deverá entregar o par de sandálias ao Agente Penitenciário, para que seja revistada;

O Agente Penitenciário, não necessariamente, deverá seguir a seqüência relatada nos itens anteriores, podendo inverter a ordem do procedimento padrão caso achar necessário;

O familiar ou pessoa interessada no ingresso, que opor-se ao cumprimento da determinação acima, terá sua entrada proibida" (destaquei).

Em sentido oposto é o conteúdo da Resolução n. 5/2014 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária:

"Art. 1º. A revista pessoal é a inspeção que se efetua, com fins de segurança, em todas as pessoas que pretendem ingressar em locais de privação de liberdade e que venham a ter contato direto ou indireto com pessoas privadas de liberdade ou com o interior do estabelecimento, devendo preservar a integridade física, psicológica e moral da pessoa revistada.

Parágrafo único. A revista pessoal deverá ocorrer mediante uso de equipamentos eletrônicos detectores de metais, aparelhos de raio-x, scanner corporal, dentre outras tecnologias e equipamentos de segurança capazes de identificar armas, explosivos, drogas ou outros objetos ilícitos, ou, excepcionalmente, de forma manual.

Art. 2º. São vedadas quaisquer formas de revista vexatória, desumana ou degradante.

Parágrafo único. Consideram-se, dentre outras, formas de revista vexatória, desumana ou degradante:

I - desnudamento parcial ou total;

II - qualquer conduta que implique a introdução de objetos nas cavidades corporais da pessoa revistada;

III - uso de cães ou animais farejadores, ainda que treinados para esse fim;

IV - agachamento ou saltos;

[...]" (grifei).

Qual é a regra, então, aplicável: a Instrução Normativa do DEAP - inferior, especial e anterior - ou a Resolução do CNPCP - superior, geral e posterior? Para tanto, valho-me da lição de Norberto Bobbio e, constatada antinomia entre dois critério fortes (hierárquico e especialidade),

"pode-se talvez recorrer ao critério fraco, o cronológico, como critério subsidiário para estabelecer a prevalência de um ou outro dos dois critério fortes: prevalece o critério hierárquico, isto é, é válida a norma superior geral, se esta for posterior à outra [...].Em outros termos [...] uma norma superior geral sucessiva vence no confronto com uma norma inferior especial precedente" (O positivismo jurídico. Ícone. São Paulo, 1995. p. 206 - destaquei).

Incidiria no caso, então, a Resolução do CNPCP, que reputa vexatório o procedimento realizado em relação à ré. No entanto, o próprio autor ressalva não ser uma solução pacífica, motivo pelo qual examino o conteúdo dos referidos atos normativos.

3. A questão da revista íntima nos estabelecimentos prisionais envolve, de um lado, a segurança pública (CF, art. 6º, caput, e art. 144, caput) e, de outro, a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), a inadmissibilidade de tratamento degradante (CF, art. 5º, III) e a intimidade (CF, art. 5º, X). Em se tratando de colisão entre princípios, deve-se procurar, à luz dos ensinamentos de Robert Alexy, uma relação de procedência concreta a fim de averiguar qual deles possui maior peso em determinada situação e, portanto, deve subsistir, sem implicar sua invalidade ou sua expurgação do sistema jurídico. A propósito:

"Se isoladamente considerados, ambos os princípios conduzem a uma contradição. Isso significa, por sua vez, que um princípio restringe as possibilidades jurídicas de realização do outro. Essa situação não é resolvida com a declaração de invalidade de um dos princípios e com sua consequente eliminação do ordenamento jurídico. Ela tampouco é resolvida por meio da introdução de uma exceção a um dos princípios, que seria considerado, em todos os casos futuros, como regra que ou é realizada, ou não é. A solução para essa colisão consiste no estabelecimento de uma relação de precedência condicionada entre os princípios, com base nas circunstâncias do caso concreto. Levando-se em consideração o caso concreto, o estabelecimento de relações de precedências condicionadas consiste na fixação de condições sob as quais um princípio tem precedência em face do outro. Sob outras condições, é possível que a questão da precedência seja resolvida de forma contrária" (Teoria dos direitos fundamentais. Malheiros, 2. ed. São Paulo, 2011. p. 96 - destaquei).

Nessa hipótese de tensão entre o dever estatal de garantir a segurança pública e o direito da ré em ver resguardada sua intimidade, torna-se inafastável a máxima da proporcionalidade, porquanto esta guarda íntima conexão com a natureza dos princípios. O referido postulado divide-se em três sub-regras parciais: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

3.1. Ao referir-se à adequação, Virgílio Afonso da Silva ensina que "quando uma medida estatal implica intervenção no âmbito de proteção de um direito fundamental, necessariamente essa medida deve ter como objetivo um fim constitucionalmente legítimo" e, para aferir esse propósito, deve-se questionar: "a medida adotada é adequada para fomentar a realização do objetivo perseguido?" (Direitos fundamentais. Malheiros. São Paulo, 2009. p. 169-170).

A medida estatal em questão refere-se à revista íntima dos visitantes de estabelecimentos prisionais catarinenses. Neste primeiro momento, ela é adequada ao propósito de garantir a segurança pública e de proibir a entrada de materiais ilícitos e não permitidos (como drogas, armas e celulares) no sistema penitenciário, objetivos estes que encontram respaldo no ordenamento jurídico nacional.

3.2. Para ser proporcional, o ato estatal, além de adequado, deve ser também necessário. Ou seja, o emprego de outro meio, que limite em menor medida o direito fundamental atingido, não permitiria o alcance do objetivo pretendido pelo Estado com a mesma intensidade. Logo, são dois os parâmetros que devem ser examinados: "(1) a eficiência das medidas na realização do objetivo proposto; e (2) o grau de restrição ao direito fundamental atingido" (SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais. Malheiros. São Paulo, 2009. p. 171).

A pretensão de evitar a entrada de objetos ilícitos nos presídios pode ser atingida por meio de outros atos estatais igualmente - se não mais - eficientes, como por exemplo a submissão dos visitantes a detectores de metais e a aparelhos de raio-x (como aqueles constantes nos aeroportos).

Não se diga, aqui, que a falta de verba pública justificaria o emprego de meio mais gravoso aos direitos fundamentais. Isso porque, embora o Executivo, por intermédio das polícias constituídas, tenha o dever de promover a segurança pública, também está vinculado à promoção e à efetivação dos direitos fundamentais. Nesse sentido:

"O que importa é a constatação de que os direitos fundamentais vinculam os órgãos administrativos em todas as suas formas de manifestação e atividades, na medida em que atuam no interesse público, no sentido de um guardião e gestor da coletividade" (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais - uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Livraria do Advogado. 11. ed. Porto Alegre, 2012. p. 378).

Logo, o argumento da reserva do possível não pode ser aplicado ao caso, porquanto a omissão estatal no tocante à infraestrutura dos estabelecimentos prisionais atinge diretamente o núcleo central e intangível dos direitos fundamentais dos visitantes. Como bem consignou o Ministro Marco Aurélio, ao votar pelo reconhecimento da repercussão geral no tema envolvendo a cláusula da reserva do possível e a pretensão de indenização por superlotação carcerária, "descabe tomar a teoria da reserva do possível como polivalente a ponto de colocar em segundo plano a Carta da República" (STF, RG no RE n. 580252, Min. Ayres Britto, j. 17.02.2011). A omissão, a meu ver, não está embasada unicamente na escassez de verbas, mas principalmente na ausência de vontade política em atender as demandas dessa parcela da população.

Tanto o meio adotado pela administração do presídio não é necessário - no sentido aqui empregado - que a Resolução n. 5/2014 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária prioriza os demais meios e estabelece ser excepcional a revista manual, conforme o art. 1º, parágrafo único, antes mencionado.

Ademais, a revogada Resolução n. 09/2006 do CNPCP dispunha que a revista pessoal deveria ser feita "sempre que possível, no preso visitado, logo após a visita, e não no visitante" (art. 5º). Aqui, embora os direitos fundamentais do visitante ficassem resguardados, é questionável a eficiência da medida, já que os objetos que indevidamente entrassem no estabelecimento prisional poderiam ser facilmente dissipados.

Isso já seria suficiente pra considerar desproporcional o ato estatal, uma vez que as sub-regras da proporcionalidade em sentido amplo relacionam-se de forma subsidiária entre si. De toda forma, analiso o último parâmetro.

3.3. Por fim, avalio a proporcionalidade em sentido estrito, que consiste "em um sopesamento entre a intensidade da restrição ao direito fundamental atingido e a importância da realização do direito fundamental que com ele colide e que fundamenta a adoção da medida restritiva" (SILVA, Virgílio Afonso da. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais. São Paulo, v.798, abr. 2002, p. 40).

Conforme narrado pela vigilante Silvana, o procedimento padrão de revista na unidade prisional inclui o agachamento das visitantes no espelho, a fim de expor suas partes íntimas no intuito de localizar objetos não permitidos. Relatou, ademais, que isso é feito com todas as mulheres maiores de quatorze anos. Aplicado a este caso concreto, a último parâmetro pode ser resumido a um questionamento: a segurança dos estabelecimentos prisionais justifica a restrição à dignidade da pessoa humana e à intimidade dos visitantes? Não.

A segurança pública, exercida pelo Estado por intermédio das polícias constituídas, visa à "manutenção ou restauração da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio", representando "um dever do Estado (art. 144, caput), ao qual corresponde, pois, o direito do cidadão à segurança, reconhecido como direito fundamental pelo art. 5º, caput" (MEDINA, José Miguel Garcia. Constituição Federal comentada. Revista dos Tribunais. 3. ed. São Paulo, 2014. p. 581). Pretende-se, então, proteger os bens jurídicos reputados importantes para a comunidade a fim de, com isso, manter a paz social.

De outra parte, há a dignidade da pessoa humana, erigida à condição de fundamento da República (CF, art. 1º, III) e tida pela doutrina e pela jurisprudência como um sobreprincípio:

"Na resolução do caso concreto, os princípios se aproximam mais dos ideais de justiça (Dworkin) e de direito (Larenz), sendo imprescindível que se os busquem em sua fonte primordial: a Constituição. O primeiro deles - a dignidade da pessoa humana (art. 1º da CF/88) -, é considerado, mesmo, um sobreprincípio, já que constitui não só um norte para a produção e aplicação de novas regras, mas fonte comum a todos os demais princípios. A partir da dignidade da pessoa humana, a Carta Magna elencou inúmeros outros direitos, nos arts. 5º e 6º, este último que engloba a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos desamparados" (STJ, REsp n. 1251566, Min. Mauro Campbell Marques, j. 07.06.2011 - grifei).

Não se trata de um valor absoluto, pois se assim o fosse a discussão toda seria mais facilmente resolvida, cuja delimitação de conteúdo é fluida; pode-se dizer, em brevíssima síntese, ser o poder-dever conferido ao próprio ser humano e ao Estado de tratar as pessoas como fins em si mesmas, e não como instrumentos. A respeito, colho da doutrina:

"A qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra o todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida" (SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Livraria do Advogado. 9. ed. Porto Alegre. p. 73).

No preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, reconhece-se que a "dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo". Corroborando esse propósito, o art. 5º preconiza ser vedado qualquer tratamento cruel, desumano ou degradante. O mesmo caminho é seguido pela Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH, art. 5º, item 2), recepcionada no sistema jurídico nacional como norma supralegal, e pelo art. 5º, III, da CF. Garante-se, dessa forma, que o direito à integridade física e moral de todos seja respeitado, proibindo-se tratamento vexatório e humilhante.

Pois bem. No caso, por mais relevante que seja o propósito de evitar a entrada de objetos não permitidos nos estabelecimentos prisionais, é notório que a revista íntima impõe tratamento vexatório aos visitantes. Ora, conforme o relato da testemunha, todas as mulheres maiores de quatorze anos - de adolescentes a idosas -, independentemente de qualquer suspeita relevante ou de ordem judicial, são obrigadas a despirem-se e a agacharem-se em frente a um espelho para, expostas suas partes íntimas, serem observadas por uma "estranha" a procura de algo indevido a, em tese, justificar a conduta.

Tomando como conceito de intimidade "aquilo que é mais pessoal e reservado" (MEDINA, José Miguel Garcia. Constituição Federal comentada. Revista dos Tribunais. 3. ed. São Paulo, 2014. p. 84), não concebo nada mais reservado à pessoa do que seu próprio corpo. Eventual exposição deve ser manifestação da autonomia da vontade, e não da imposição estatal. Não é o que acontece aqui: se o visitante não se sujeitar ao procedimento, "terá sua entrada proibida", nos termos da Instrução Normativa do DEAP. Viola-se, também, o direito de visita assegurado ao preso no art. 41, X, da LEP.

Esse foi, inclusive, o fundamento usado pela Desembargadora Cláudia Lambert de Faria, no Agravo de Instrumento n. 2015.013400-8, originado de ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina. Em sede liminar, os efeitos da tutela foram antecipados para suspender o procedimento de revista pessoal quanto ao desnudamento, à observação de órgãos genitais nus e aos agachamentos. Colho trecho do voto:

"As revistas íntimas colocam os familiares dos detentos, sejam eles homens, mulheres, crianças ou idosos, em situação bastante vexatória e humilhante, o que, por si só, caracteriza uma afronta ao princípio constitucional da dignidade humana, previsto no inciso III, do art. 1º, da Constituição Federal".

Anoto, por oportuno, que os efeitos da decisão foram suspensos, liminarmente, no Mandado de Segurança de n. 2015.016606-7, relatado pelo Desembargador Sérgio Roberto Baasch Luz. Todavia, ainda não houve julgamento de mérito da questão.

Nada obstante, como antes transcrito, a Resolução n. 5/2014 do CNPCP é categórica ao considerar vexatório, dentre outros métodos de revista, o desnudamento e o agachamento, conforme disposto no art. 2º, parágrafo único, I e IV.

Pensar de forma contrária seria impor uma sanção indireta àqueles que ostentam a condição de parentes ou amigos de detentos. A pena, de certa forma, ultrapassaria a pessoa do condenado (CF, art. 5º, XLV), estigmatizando sobremaneira aqueles que pretendem ingressar no local.

Assim, como "é o Estado que existe em função da pessoa humana, e não ao contrário, já que o ser humano constitui finalidade precípua, e não meio de atividade estatal" (SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais. Livraria do Advogado. 9. ed. Porto Alegre. p. 80), penso que neste caso o sobreprincípio da dignidade da pessoa humana e o direito fundamental à intimidade não podem ser restringidos com vista à segurança dos estabelecimentos prisionais.

Sobre o tema, o seguinte julgado da Turma de Recursos do TJRS:

"Não há como deslembrar que o vexame, a humilhação da revista íntima, além de ferir a dignidade da pessoa humana, perpassa os limites de possibilidade de intervenção estatal em nome da segurança pública, atrelada à estrita legalidade, sentida no conceito amplo de conformação com os princípios consagrados pela Magna Carta" (Recurso Crime n. 71005297593, Dr. Edson Jorge Cechet, j. 24.08.2015).

Anoto, por fim, que o tema é objeto de Projeto de Lei que teve iniciativa no Senado (PL 480/2013) e agora aguarda aprovação na Câmara dos Deputados (PL 7764/2014). O objetivo é acrescentar à Lei n. 7.210/84 os seguintes dispositivos:

"Art. 83-A. A revista pessoal, à qual devem se submeter todos que queiram ter acesso ao estabelecimento penal para manter contato direto ou indireto com pessoa presa ou para prestar serviços, ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública necessária à segurança de estabelecimentos penais, será realizada com respeito à dignidade humana, sendo vedada qualquer forma de desnudamento ou tratamento desumano ou degradante.

Parágrafo único. A revista pessoal deverá ocorrer mediante uso de equipamentos eletrônicos detectores de metais, aparelhos de raio-x ou aparelhos similares, ou ainda manualmente, preservando-se a integridade física, psicológica e moral da pessoa revistada e desde que não haja desnudamento, total ou parcial.

Art. 83-B. Considera-se revista manual toda inspeção realizada mediante contato físico da mão do agente público competente sobre a roupa da pessoa revistada, sendo vedados o desnudamento total ou parcial, o uso de espelhos e os esforços físicos repetitivos, bem como a introdução de quaisquer objetos nas cavidades corporais da pessoa revistada [...] (sem destaques no original).

Assim, por todo o exposto, tenho que as provas contra a denunciada foram obtidas em decorrência do procedimento de revista violador de princípios constitucionais (CF, art. 1º, III e art. 5º, III e X), motivo pelo qual não podem ser valoradas com o propósito condenatório (CF, art. 5º, LVI, c/c CPP, art. 157). Logo, acolho a tese defensiva, ficando prejudicadas as demais alegações suscitadas.

4. Por essas razões, e pedindo vênia a douta maioria, restei vencido para dar provimento ao recurso e absolver Ana Paula Prudêncio dos Santos, na forma do art. 386, VII, do CPP.

Florianópolis, 03 de novembro de 2015.

Getúlio Corrêa

DESEMBARGADOR


Gabinete Des. Volnei Celso Tomazini