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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 2012.062173-9 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer
Origem: Pomerode
Orgão Julgador: Quarta Câmara Criminal
Julgado em: Thu Aug 08 00:00:00 GMT-03:00 2013
Juiz Prolator: Iraci Satomi Kuraoka Schiocchet
Classe: Apelação Criminal

 

Apelação Criminal n. 2012.062173-9, de Pomerode

Relator: Desa. Substituta Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. VENDA DE LOTE EM LOTEAMENTO NÃO REGISTRADO NO REGISTRO DE IMÓVEIS COMPETENTE. ART. 50, PARÁGRAFO ÚNICO, INC. I, DA LEI 6.766/1979. LEI DE PARCELAMENTO DO SOLO URBANO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PLEITO PELA ABSOLVIÇÃO DO RÉU, SOB A ALEGAÇÃO DE QUE NÃO AGIU COM DOLO, POIS DESCONHECIA A ILICITUDE DA VENDA DE TERRENO SEM O DEVIDO REGISTRO DO LOTEAMENTO. NÃO ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE DOLO E DESCONHECIMENTO DA PRÁTICA DE QUE SUA CONDUTA CARACTERIZAVA CRIME QUE NÃO SE VERIFICARAM. RÉU QUE É CORRETOR DE IMÓVEIS HÁ MAIS DE 20 (VINTE) ANOS. ALEGAÇÃO DE QUE AS DEMAIS IMOBILIÁRIAS TAMBÉM AGIAM DESSA MANEIRA QUE NÃO RESTOU COMPROVADA. REGULARIZAÇÃO POSTERIOR DO TERRENO PELA PREFEITURA QUE NÃO O ILIDE DA PRÁTICA DO CRIME, BEM COMO QUE NÃO DEMONSTRA A AUSÊNCIA DE DOLO, POIS PRATICADA A CONDUTA DESCRITA COMO CRIME. ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL. DOSIMETRIA. PEDIDO PELA DIMINUIÇÃO DOS VALORES FIXADOS NA SENTENÇA CONDENATÓRIA. PENA DE MULTA FIXADA EM SEU MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE DE MINORAÇÃO, CONSIDERANDO A INEXISTÊNCIA DE CAUSAS DE DIMINUIÇÃO DE PENA. VALOR DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA QUE RESTOU FUNDAMENTADA PELO JUIZ SENTENCIANTE COM BASE NOS ELEMENTOS OBTIDOS NOS AUTOS. RÉU QUE NÃO COMPROVOU A IMPOSSIBILIDADE DE ARCAR COM OS VALORES. NÃO PREJUÍZO DE POSTERIOR PEDIDO AO JUÍZO DA EXECUÇÃO. MANUTENÇÃO DOS VALORES FIXADOS PELO JUIZ SENTENCIANTE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 2012.062173-9, da comarca de Pomerode (Vara Única), em que é apelante Wilson Krause, e apelado Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Quarta Câmara Criminal decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Desembargador Jorge Schaefer Martins (Presidente) e o Exmo. Sr. Desembargador Rodrigo Collaço.

Florianópolis, 08 de agosto de 2013.

Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer

Relatora


RELATÓRIO

O Ministério Público da Comarca de Pomerode ofereceu denúncia contra Wilson Krause, imputando-lhe o disposto no art. 50, da Lei 6.766/79, conforme os seguintes fatos narrados na peça acusatória:

Consta do incluso procedimento investigatório que no dia 8.5.2009 o denunciado vendeu à Eva de Fatima Vieira de Lara e Domasir Correia de Lara um terreno de 485,55 m², situado na Rua Erigert Jandre, bairro Testo Rega, nesta cidade, parcela não desmembrada de uma área de 15.536, 58m2, matriculada sob nº 6926 (fls. 11-13). Ou seja, o denunciado vendeu lote em loteamento/desmembramento não registrado.

Encerrada a instrução processual, sobreveio sentença (fls. 64/73), nos seguintes termos:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido constante na denúncia para condenar WILSON KRAUSE, qualificado nos autos, ao cumprimento de uma pena privativa de liberdade de 1 (um) ano de reclusão, em regime aberto, bem como ao pagamento de multa de 10 (dez) vezes o maior salário mínimo vigente na época do pagamento, por infração ao disposto no art. 50, I e parágrafo único, I, da Lei n. 6.766/79.

O acusado, inconformado, interpôs recurso de apelação (fls. 75 e 86/90) requerendo sua absolvição, alegando ter incorrido em erro de tipo, pois não se percebe a presença do elemento subjetivo consistente no dolo. No tocante à dosimetria, requereu a diminuição do valor da multa aplicada, alegando que não tem condições de arcar com tal quantia.

Foram apresentadas as contrarrazões pelo representante do Ministério Público (fls. 96/101).

Os autos ascenderam a esta Corte.

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Pedro Sérgio Steil, o qual se manifestou pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

Este é o relatório.

VOTO

O recurso deve ser conhecido, porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade.

Cuida-se de apelação criminal interposta pelo réu face a sentença prolatada pela MMa. Juíza de Direito da Vara Única da Comarca de Pomerode que condenou-o à pena de 1 (um) ano de reclusão, em regime aberto, a qual foi substituída por uma pena restritiva de direito consistente em prestação pecuniária no valor de 12 salários mínimos (6 em favor da vítima e 6 para uma entidade), bem como ao pagamento de multa de 10 (dez) vezes o maior salário mínimo vigente na época do pagamento, por infração ao disposto no art. 50, inc. I e parágrafo único, inc. I, da Lei n. 6.766/79.

Alega o apelante que deve ser absolvido, porquanto agiu em erro de tipo, pois inexistente comprovação da presença do dolo na prática da conduta a que restou condenado.

Analisando detidamente os autos, entendo que o apelo não merece prosperar.

No tocante a materialidade e autoria, o réu não insurge-se, até porque confessou que vendeu um terreno à Domasir Correia de Lara, o qual estava pendente de regularização tocante ao seu desmembramento. (áudio de fl. 59)

A conduta imputada ao acusado está insculpida no art. 50, parágrafo único, inc. I, da Lei 6.766/79 e assim disciplina:

Constitui crime contra a Administração Pública.

I - dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, sem autorização do órgão público competente, ou em desacordo com as disposições desta Lei ou das normas pertinentes do Distrito Federal, Estados e Municipíos;

II - dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos sem observância das determinações constantes do ato administrativo de licença;

III - fazer ou veicular em proposta, contrato, prospecto ou comunicação ao público ou a interessados, afirmação falsa sobre a legalidade de loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, ou ocultar fraudulentamente fato a ele relativo.

[...] Parágrafo único - O crime definido neste artigo é qualificado, se cometido.

I - por meio de venda, promessa de venda, reserva de lote ou quaisquer outros instrumentos que manifestem a intenção de vender lote em loteamento ou desmembramento não registrado no Registro de Imóveis competente.

Pois bem, insta verificar se houve a ausência de dolo por parte do acusado em cometer o crime. Segundo suas afirmações, quando vendeu o terreno ele estava em fase de regularização, sendo que atualmente já está devidamente desmembrado. Que acredita que possui uns 5 ou 6 processos relativos ao mesmo assunto. Que é corretor há 21 anos e credenciado há 19. Alegou que tomou conhecimento de que vender os terrenos da maneira como fazia estaria errado, há pouco tempo, mais ou menos uns dois anos antes. Que há 17 anos procedia com a venda de terrenos dessa maneira, e achava que não tinha problema, pois sempre entregou a escritura pública corretamente. Alega que atualmente tem conhecimento de que vender terrenos que não estejam desmembrados é errado. (áudio de fl. 59)

O erro de tipo diz respeito ao engano acerca de um dos elementos que compõem o tipo penal, punindo o agente pelo crime culposo, caso possível.

In casu, o apelante alegou que não sabia da ilicitude da venda de terrenos que não eram desmembrados, pois assim o fazia há anos, bem como que era comum entre as imobiliárias da mesma cidade. Entendo que não se trata de erro de tipo, pois todos os elementos constitutivos da norma foram infringidos.

A alegação do acusado de que não tinha ciência da ilicitude de sua conduta, é de todo improvável.

Primeiro, porque não se pode conceber que um corretor de imóveis, com mais de 20 anos de experiência na área, não tenha qualquer conhecimento das ilicitudes que envolvem a transação comercial de imóveis. Ademais, a Lei que dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano encontra-se em vigência há mais de 30 anos.

Não fosse somente isso, o apelante não comprovou que essa prática era normal entre as mesmas imobiliárias da cidade, não havendo como levar em conta sua alegação de que não agiu com o intuito de praticar crime. Salienta-se que essa incumbência era sua, tendo em vista o disposto no art. 156 do Código de Processo Penal.

Cabe consignar também que o fato do terreno, posteriormente, ter sido regularizado junto a Prefeitura, não o ilide da sua responsabilização, muito menos remonta a alegada ausência de dolo, pois a conduta consistente na venda de terreno cujo loteamento não havia sido registrado no Registro de Imóveis competente, se perpetrou.

Desse modo, não há como dar crédito em suas alegações quando diz que não houve dolo em sua conduta.

Nesse sentido, entende-se que os fatos trazidos à baila constituem o crime tipificado no artigo 50 da Lei 6.766/79.

Neste viés, eis o entendimento deste Tribunal de Justiça:

CRIME CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DESMEMBRAMENTO E LOTEAMENTO DE SOLO (LEI N. 6.766/79) - DELITO INSTANTÂNEO DE EFEITOS PERMANENTES - CONSUMAÇÃO QUE SE DÁ NO PRIMEIRO ATO DE PARCELAMENTO DO IMÓVEL - REALIZAÇÃO DE LOTEAMENTO E VENDA DE LOTE URBANO SEM AUTORIZAÇÃO DO ÓRGÃO COMPETENTE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - CONDENAÇÃO MANTIDA "A venda de parcela de solo urbano sem que o loteamento esteja regularizado nos termos da Lei n. 6.766/79, caracteriza infração ao art. 50, parágrafo único, I, da mesma lei, que se consuma com o simples comportamento do agente, independentemente da ocorrência ou não de prejuízo para qualquer indivíduo, pois a ação atinge um bem público diretamente (exigibilidade do Poder Público de ver respeitadas suas determinações), e secundariamente o do particular" (Apelação criminal n. 33.313, de Porto União, rel. Des. Nilton Macedo Machado). PRETENSÃO DE PAGAMENTO DA PENA DE MULTA EM PRESTAÇÕES - MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO - RECURSO DESPROVIDO (Apelação Criminal n. 2005.019393-9, de Timbó, rel. Des. Torres Marques. Data:23/08/2005) grifei.

Portanto, não há como negar a responsabilidade do apelante ao vender o lote irregular, consumando assim o delito e fazendo-se necessária a sua condenação.

No tocante à dosimetria, o apelante pugna pela redução do valor aplicado as multas, pois as condições impostas na sentença se tornaram muito onerosas e acima de sua capacidade financeira.

In casu, muito embora o apelante tenha se manifestado pela diminuição da pena de multa, entendo que seu pedido também está abarcando o quantum aplicado a prestação pecuniária, pois disse, conforma narrado acima, que as condições fixadas na sentença se tornaram muito onerosas.

No tocante à pena de multa, não vejo motivos para sua diminuição, visto que estabelecida em seu mínimo legal, de acordo com determinação do art. 50, parágrafo único, inc. I, da Lei 6.766/1979, considerando que inexistem causas de diminuição de pena no presente caso.

Ademais, o acusado poderá efetuar eventual pedido de parcelamento desta pena, o qual ficará à cargo do juízo da execução, nos termos do art. 50 do Código Penal e 169, da Lei 7.210/1984.

Com relação aos valores relativos à prestação pecuniária, verifica-se que o magistrado sentenciante fundamentou a fixação do valor "[...] tendo em vista que o réu é proprietário de uma imobiliária há cerca de 20 anos, que até 3 anos atrás só existiam três imobiliárias na cidade, sendo o réu o principal corretor na área de loteamentos e desmembramentos [...]". Assim, levando-se em conta esta justificativa, bem como não tendo o réu comprovado que está impossibilitado de arcar com esse valor, não vejo motivos para diminuí-la, ao menos por ora, sem prejuízo de nova reavaliação pelo juízo execucional.

Importante ressaltar que, nos demais termos da dosimetria aplicada, não há reparos a se fazer.

Ante o exposto, o recurso deve ser conhecido e desprovido.

Este é o voto.


Gabinete Desa. Substituta Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer