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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 5027470-43.2021.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Hildemar Meneguzzi de Carvalho
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Órgão Especial
Julgado em: Wed Nov 17 00:00:00 GMT-03:00 2021
Classe: Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial)

 









Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial) Nº 5027470-43.2021.8.24.0000/SC



RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO


AUTOR: Procurador Geral - MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis RÉU: Governador - ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis RÉU: ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SANTA CATARINA


RELATÓRIO


O Ministério Público de Santa Catarina, representado pelo Coordenador do Centro de Apoio Operacional do Controle de Constitucionalidade, propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade em face do art. 1º, §4º, da Lei n. 17.685/19, do Estado de Santa Catarina, em razão da violação ao art. 9º, II e XIV, e ao art. 190, ambos da Constituição do Estadual.
Sustentou que a Lei impugnada restringe direitos das pessoas surdas ou com deficiência auditiva ao permitir a substituição da legenda descritiva por linguagem de sinais em obras audiovisuais, pois "nem todas as pessoas surdas têm Libras como a primeira língua e, nesta hipótese, a exclusão da legenda impossibilitaria o acesso a ideias, mensagens e/ou informações".
Requereu, portanto, a declaração de inconstitucionalidade do art. 1º, §4º, da Lei n. 17.685/19, do Estado de Santa Catarina (Evento 1).
O Presidente da Assembleia Legislativa Estadual afirmou que a norma impugnada visa oferecer mais instrumentos de acesso às políticas públicas às pessoas com deficiência, sendo a Língua Brasileira de Sinais - Libras reconhecida como meio legal de comunicação e expressão (Evento 9).
O Governador do Estado de Santa Catarina detalhou a tramitação da Lei n. 17.685/19, bem como aduziu que "não vislumbrou qualquer inconstitucionalidade ou ainda violação ao interesse público, de maneira que o texto foi sancionado" (Evento 11).
Por seu turno, o Procurador-Geral do Estado alegou que "ao perscrutar a redação da citada norma, constata-se que a expressão 'poderá' deixa claro a ausência de obrigatoriedade na substituição, motivo pelo qual, na melhor técnica de hermenêutica, não se pode admitir que há uma restrição de direitos", bem como que "a norma ora combatida possui cunho eminentemente ampliativo de direitos, e não restritivo, possibilitando novas alternativas de acesso à informação ao deficiente auditivo e visual, além de não restar impositiva, conforme se infere de sua redação" (Evento 17).
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Dr. Fábio de Souza Trajano, que opinou pela procedência do pedido inicial (Evento 18).

VOTO


Trata-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pelo Ministério Público de Santa Catarina em face do art. 1º, §4º, da Lei n. 17.685/19, do Estado de Santa Catarina.
Confira-se o inteiro teor da referida Lei:
Art. 1º Ficam estabelecidos, nesta Lei, normas e critérios básicos de acessibilidade às pessoas com deficiência auditiva e visual em projetos e programas estaduais, nos financiados ou apoiados com recursos públicos à iniciativa privada e a órgãos da Administração Pública municipal, através de: 
I - audiodescrição; 
II - legendagem descritiva;
III - LIBRAS - Língua Brasileira de Sinais. 
§ 1º Audiodescrição correspondente a uma locução, em língua portuguesa, sobreposta ao som original do programa, destinada a descrever imagens, sons, textos e demais informações que não poderiam ser percebidos ou compreendidos por pessoas com deficiência visual. 
§ 2º Legendagem descritiva corresponde à transcrição, em língua portuguesa, dos diálogos, efeitos sonoros, sons do ambiente e demais informações da obra audiovisual que sejam relevantes para possibilitar a melhor compreensão da obra. 
§ 3º Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) é a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constitui um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil. 
§ 4º A legendagem descritiva em obras audiovisuais poderá ser substituída pela utilização da linguagem de sinais, para garantir o acesso das pessoas com deficiência auditiva ao conteúdo falado e audiodescrito.
Art. 2º Os projetos e programas estaduais divulgados por meio audiovisual, nos meios de comunicação de característica aberta e fechada deverão adotar os critérios básicos de acessibilidade descritos no art. 1º desta Lei e na forma do regulamento. 
Art. 3º É vedada a concessão de benefício fiscal e apoio financeiro a projetos que não prevejam a adoção de recursos de legendagem descritiva, para obras audiovisuais, e da audiodescrição, para todas as obras que não sejam exclusivamente auditivas. 
Parágrafo único. Todos os projetos de produção audiovisual financiados com recursos públicos geridos a partir de fundos estaduais deverão contemplar nos seus orçamentos serviços de legendagem descritiva, audiodescrição e LIBRAS - Língua Brasileira de Sinais (grifou-se).
Com efeito, a norma desrespeitou o art. 9º, II, e o art. 190, ambos da Constituição do Estadual, os quais dispõe:
Art. 9º O Estado exerce, com a União e os Municípios, as seguintes competências:
[...]
II - cuidar da saúde e assistência pública e da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;
[...]
Art. 190. O Estado assegurará às pessoas com deficiência os direitos previstos na Constituição Federal.
Ainda, está em dissonância com a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada pelo Brasil como norma constitucional, que estipula a obrigação de "possibilitar às pessoas com deficiência viver de forma independente e participar plenamente de todos os aspectos da vida", por meio de "medidas apropriadas para assegurar às pessoas com deficiência o acesso, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, ao meio físico, ao transporte, à informação e comunicação".
Isso porque a norma impugnada restringe a possibilidade de acesso das pessoas surdas ou com deficiência auditiva às obras audiovisuais, ao permitir que se utilize a linguagem de sinais em detrimento da legenda descritiva.
Como bem apontado pelo Procurador de Justiça Dr. Fábio de Souza Trajano na manifestação do Evento 18 "nem todas as pessoas surdas têm Libras como a primeira língua e, nesta hipótese, a exclusão da legenda impossibilitaria o acesso a ideias, mensagens e/ou informações".
Outrossim, extrai-se da pesquisa de mestrado realizada pela terapeuta ocupacional Juliana Valéria de Melo na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), indicativo de que a legenda descritiva, quando comparada com a projeção do intérprete de Libras, confere maior acessibilidade em filmes exibidos a adolescentes surdos:
Ao todo, seis adolescentes surdos participaram de entrevistas e assistiram os filmes A Dona da História (2004), Medianeras (2011) e Cotidiano (2012). A proposta foi avaliar a percepção desse público sobre a acessibilidade no cinema, especialmente no que se refere às legendas descritivas em português, legenda do tipo closed caption e legenda visual, com projeção do intérprete de Libras sobre o filme. 
O estudo mostrou que a legenda descritiva em português atende mais adequadamente as questões de acessibilidade, uma vez que a legenda visual compete com as imagens do filme exibido, e a legenda closed caption - gerada eletronicamente a partir do texto dublado - apresenta muitos erros de escrita. "Durante a entrevista, três alunos consideraram que para melhorar o acesso aos conteúdos dos filmes, a legenda visual seria a melhor opção. No entanto, em um segundo momento, após assistirem aos três filmes, com legendas diferentes, a opinião variou, e todos os surdos elencaram a legenda descritiva em português como a solução para os problemas de acessibilidade", afirma (http://www.fcm.unicamp.br/fcm/sites/default/files/images/user228/_pesquisa_acessibilidade_no_cinema_deve_levar_em_conta_a_percepcao.pdf).
Nesse quadro, percebe-se a inconstitucionalidade material do art. 1º, §4º da Lei Estadual n. 17.685/19, vez que restringe o acesso das pessoas surdas ou com deficiência auditiva às informações veiculadas em obras audiovisuais, na medida em que afasta a exigência de cumulação dos recursos de legenda descritiva e linguagem de sinais.
Ante o exposto, voto no sentido de prover o pedido para declarar a inconstitucionalidade material do art. 1º, §4º, da Lei Estadual n. 17.685/19.

Documento eletrônico assinado por HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1499900v18 e do código CRC 60b3ab23.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHOData e Hora: 23/11/2021, às 16:28:2

 

 












Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial) Nº 5027470-43.2021.8.24.0000/SC



RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO


AUTOR: Procurador Geral - MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis RÉU: Governador - ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis RÉU: ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SANTA CATARINA


EMENTA


AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 1º, §4º, DA LEI ESTADUAL N. 17.685/19. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DA LINGUAGEM DE SINAIS EM DETRIMENTO DA LEGENDA DESCRITIVA EM OBRAS AUDIOVISUAIS.  RESTRIÇÃO DO ACESSO DAS PESSOAS SURDAS OU COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA ÀS INFORMAÇÕES VEICULADAS. DESRESPEITO AO ART. 9º, II, E ART. 190, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL VERIFICADA. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE.

ACÓRDÃO


Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, o Egrégio órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, prover o pedido para declarar a inconstitucionalidade material do art. 1º, §4º, da Lei Estadual n. 17.685/19, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 17 de novembro de 2021.

Documento eletrônico assinado por HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 1499901v3 e do código CRC 5470cb2d.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHOData e Hora: 23/11/2021, às 16:28:2

 

 










EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 17/11/2021

Direta de Inconstitucionalidade (Órgão Especial) Nº 5027470-43.2021.8.24.0000/SC

RELATORA: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO

PRESIDENTE: Desembargador RICARDO ROESLER
AUTOR: Procurador Geral - MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis ADVOGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA RÉU: Governador - ESTADO DE SANTA CATARINA - Florianópolis RÉU: ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SANTA CATARINA MP: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 17/11/2021, na sequência 19, disponibilizada no DJe de 01/11/2021.
Certifico que o(a) Órgão Especial, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:O ÓRGÃO ESPECIAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, PROVER O PEDIDO PARA DECLARAR A INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DO ART. 1º, §4º, DA LEI ESTADUAL N. 17.685/19.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHO
Votante: Desembargadora HILDEMAR MENEGUZZI DE CARVALHOVotante: Desembargador PEDRO MANOEL ABREUVotante: Desembargador CLÁUDIO BARRETO DUTRAVotante: Desembargador LUIZ CÉZAR MEDEIROSVotante: Desembargador SÉRGIO ROBERTO BAASCH LUZVotante: Desembargador MONTEIRO ROCHAVotante: Desembargador TORRES MARQUESVotante: Desembargador RICARDO FONTESVotante: Desembargador SALIM SCHEAD DOS SANTOSVotante: Desembargadora MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTAVotante: Desembargador JAIME RAMOSVotante: Desembargador ALEXANDRE D'IVANENKOVotante: Desembargador JOAO HENRIQUE BLASIVotante: Desembargadora SORAYA NUNES LINSVotante: Desembargador RAULINO JACÓ BRUNINGVotante: Desembargador ROBERTO LUCAS PACHECOVotante: Desembargador RICARDO ROESLERVotante: Desembargadora DENISE VOLPATOVotante: Desembargador PAULO HENRIQUE MORITZ MARTINS DA SILVAVotante: Desembargadora VERA LÚCIA FERREIRA COPETTIVotante: Desembargador FRANCISCO JOSÉ RODRIGUES DE OLIVEIRA NETOVotante: Desembargador GERSON CHEREM IIVotante: Desembargador ARTUR JENICHEN FILHO
GRAZIELA MAROSTICA CALLEGAROSecretária