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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0077829-57.2019 (Acordão do Conselho da Magistratura)
Relator: Júlio César Machado Ferreira de Melo
Origem: Chapecó
Orgão Julgador:
Julgado em: Wed Dec 09 00:00:00 GMT-03:00 2020
Classe: Recurso de Decisão

 

ACÓRDÃO



Recurso Administrativo (Apelação) n. 0077829-57.2019.8.24.0710



Relator Conselheiro: Des. Júlio César M. Ferreira de Melo  



RECURSO ADMINISTRATIVO (APELAÇÃO). SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. PLEITO DE REGISTRO DE DESAPROPRIAÇÃO JUDICIAL. EXIGÊNCIA DE RETIFICAÇÃO DA DESCRIÇÃO DA ÁREA TOTAL DO IMÓVEL E DA ÁREA REMANESCENTE. DESNECESSIDADE EM HAVENDO DESCRIÇÃO PRECISA DA ÁREA EXPROPRIADA. INCIDÊNCIA DA CIRCULAR 309/CGJ-SC DE 2014 AO CASO CONCRETO. FUNDAMENTO LEGAL: DESAPROPRIAÇÃO COMO FORMA DE AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DA PROPRIEDADE. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.   



              Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Administrativo n. 0077829-57.2019.8.24.0710, da comarca da Chapecó, 1ª Vara da Fazenda Pública, em que é Requerente Foz do Chapecó Energia S.A. 



              O Conselho da Magistratura decidiu, por unanimidade, conhecer da apelação e dar-lhe parcial provimento para reformar a sentença e julgar PARCIALMENTE procedente a presente suscitação de dúvida, a fim de: (a) manter a exigência da descrição precisa da área expropriada, cuja qualificação registral caberá ao oficial registrador; e (b) se preenchido o primeiro requisito, dispensar o prévio aperfeiçoamento da descrição tabular da área total remanescente do imóvel desapropriado - nos termos da Circular n° 309/CGJ de 2014. Sem custas (art. 207 da Lei de Registros Públicos).. 



              Participaram do julgamento, realizado nesta data, os exmos. srs. des. Jose Agenor de Aragao, Des. Ricardo Jose Roesler, Des. Joao Henrique Blasi, Desa. Soraya Nunes Lins, Des. Dinart Francisco Machado, Des. Volnei Celso Tomazini, Des. Salim Schead dos Santos, Des. Carlos Adilson Silva, Des. Roberto Lucas Pacheco, Des. Odson Cardoso Filho e Des. Helio Do Valle Pereira.



              Presidiu a sessão o excelentíssimo senhor Desembargador Ricardo Jose Roesler



              Funcionou como representante do ministério público o excelentíssimo senhor procurador de justiça Mário Luiz de Melo.



              Florianópolis, 09 de dezembro de 2020.  



Desembargador Júlio César M. Ferreira de Melo



Relator 



              RELATÓRIO



              Pedido: A "Foz do Chapecó Energia S.A." requereu, perante o 1º Ofício de Registro de Imóveis de Chapecó-SC, o registro da desapropriação da área de 12.145,00 m² do imóvel de matrícula n. 28.942 do Livro n. 02 (Registro Geral), conforme determinado em sentença homologatória de acordo proferida nos autos n. 0007503-63.2009.8.0018, transitada em julgado.



              Exigências feitas: O oficial interino negou o registro, a partir das seguintes exigências: 1ª) o aperfeiçoamento da descrição tabular mediante a retificação complexa do imóvel de matrícula 28.942, bem como a precisa identificação da área desapropriada e da área remanescente da intervenção (planta, memorial descritivo e ART), conforme disposto no art. 784, § 1º, do CNCGJ/SC; 2ª) recibo de inscrição no CAR e 3ª) prévio pagamento dos emolumentos (2615062). 



              Suscitação de dúvida: Discordando, a requerente solicitou a dispensa da 1ª e da 2ª exigência, condicionantes do pagamento dos emolumentos (3ª exigência). No que toca à retificação da área remanescente, aduziu que: "a Corregedoria Geral de Justiça de Santa Catarina através da Circular 309 orientou que, se precisamente identificada a área expropriada, desnecessária a atualização de descrição tabular da área remanescente". Em caso de discordância, requereu a abertura de dúvida (2686998). 



              Explicações: O oficial dispensou, então, o recibo de inscrição no CAR (2ª exigência), porém manteve a retificação da área total, da área desapropriada e do remanescente (1ª exigência) e, por conseguinte, a necessidade de antecipação dos emolumentos (3ª exigência). Afirma que a retificação complexa servirá para: (a) "que seja possível identificar/localizar a área que foi desapropriada do imóvel, pois, para isso, é necessário primeiramente identificar/localizar a área total do bem, igualando a situação de direito (constante na matrícula) à situação fática, inserindo-se no imóvel as medidas das confrontações, bem como as coordenadas georreferenciadas" e (b) "para descrever a área que remanescerá na matrícula após o destaque da parcela desapropriada, uma vez que, não sendo feito tal ato, o fólio real restará precário, pois a matrícula não refletirá a situação real do imóvel". Aduz que a Circular n. 309/2014 "se restringe a registros de escrituras públicas de desapropriação consensual referentes a ampliações de faixa de domínio de rodovias, tendo como interessado o DNIT, conforme consta no próprio corpo de ambas as circulares" (2615062).



              Parecer ministerial: Instado a se manifestar, o ministério público opinou para "resolver-se a dúvida a favor do registro de imóveis" no que tange: (a) "à prévia retificação administrativa da área"; (b) "à necessidade de apresentação da Anotação de Responsabilidade Técnica - ART, do memorial descritivo e da planta, todos relativos à área do imóvel desapropriado" e (c) "à obrigatoriedade do pagamento dos emolumentos de maneira antecipada" (2714377). 



              Sentença (decisão administrativa): Acolhendo o parecer ministerial, o magistrado a quo julgou parcialmente procedente a suscitação de dúvida, declarando escorreitas as exigências n. 1 e 3. Afirmou que: "não é o caso de aplicação da Circular n. 309/2014 da CGJ/TJSC, uma vez que não há nos autos documentos demonstrando a precisa localização do imóvel desapropriado, daí porque a exigência do § 1.º do art. 784 do CNCGJ, sob pena de tornar letra morta aquela disposição regulamentar". Aduziu que: "nem sequer cópia da matrícula originária o interessado se dignou a juntar e, ao que consta da petição do acordo que resultou na desapropriação, há indicação de medidas geodésicas, o que, para o regular registro, deve também constar da matrícula de origem". Concluiu que: "verificadas irregularidades na matrícula da área de origem desapropriada, imprescindível a retificação e a sua precisa identificação, nos moldes do art. 213 da Lei 6.015/73 e dos arts. 649 e 784 do Código de Normas da CGJ-SC" (2744754).



              Embargos de declaração: Opostos aclaratórios (3156920), estes foram rejeitados (3157058).



              Apelação (recurso administrativo): Inconformada com a decisão, a requerente interpôs apelação. Sustenta que: (a) "a desapropriação, tal como o usucapião, é reconhecida como forma originária de aquisição da propriedade, sendo, por si mesma, suficiente para instaurar a propriedade em favor do poder público, independentemente de qualquer vinculação com o título do proprietário anterior"; (b) "se os expropriados não possuem interesse na perfeita identificação das coordenadas do seu imóvel, mas anuíram expressamente que a área objeto da lide atingia a propriedade relativa à matrícula 28.942, nada mais há para discutir, pois não compete a ora apelante a especialização de todo um imóvel porque expropriou uma parcela dele"; (c) "não há obrigação de especializar (retificar/identificar) a área remanescente, essa obrigação é dos proprietários da área que remanesceu"; (d) "é o disposto na Circular 309 de 2014, que assevera ser desnecessária a especialização da área remanescente", a qual "certamente se aplica às desapropriações judiciais", "as quais se submeteram ao crivo do judiciário"; (e) "ademais, a lei que regula a desapropriação judicial de bens imóveis (Decreto-Lei n. 3.365/41) não prevê como condição para o registro da sentença a apresentação de documentos para regularização da área remanescente" e "o título judicial passado em julgado é documento hábil para transferência do domínio" (art. 29 do Decreto-Lei 33.365/41); (f) sendo que, na hipótese, "o título judicial, imutável, não condicionou o registro da área expropriada a quaisquer outros documentos se não aqueles acostados à exordial". Com base no alegado, requer a dispensa da "especialização/retificação/aperfeiçoamento" da área remanescente do imóvel expropriado (4317984).



              Contrarrazões: Em contrarrazões, o oficial registrador reiterou os argumentos já apresentados, pugnando pelo desprovimento do recurso (4870652).



              Parecer da PGJ: Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Sonia Maria Demeda Groisman Piardi, que opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso, mantendo-se inalterada a sentença (4791851 5117820). 



              VOTO  



              1. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE



              O recurso foi interposto contra sentença assinada eletronicamente em 28/01/2020 (3157058) e, portanto, na vigência do CPC/2015 (18/03/2016). Assim, os requisitos de admissibilidade recursal devem ser exigidos na forma do novo Código de Processo Civil (enunciado administrativo n. 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016).



              No caso: (a) a apelação é o recurso cabível na espécie (art. 202 da Lei n. 6.015/73); (b) a recorrente tem legitimidade e possui interesse recursal; (c) o recurso é tempestivo e formalmente regular e (d) inexiste fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer.



              Assim, preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.  



              2. FUNDAMENTAÇÃO



              Como visto, superadas as questões já resolvidas, a controvérsia cinge-se em verificar se a segunda exigência do oficial registrador - retificação complexa do imóvel, bem como precisa identificação da área desapropriada e da área remanescente - pode ser dispensada no caso concreto.



              A questão perpassa, como observado no relatório, pela interpretação a ser dada à Circular n° 309/CGJ de 2014, que, por sua vez, busca limitar o alcance da norma contida no art. 784, § 1º, do Código de Normas da CGJ-SC.



              Importante compreender, assim, em que contexto foi editada a referida circular, para, em seguida, apreciar as questões suscitadas pelas partes:  



              2.1 Contexto da edição da Circular n° 309/CGJ-SC de 2014



              Consoante previsto no art. 784, § 1º, do Código de Normas da CGJ-SC, o oficial registrará nas matrículas as escrituras públicas de desapropriação e as sentenças judiciais respectivas e, para realização de tal registro, se necessário, exigirá o prévio aperfeiçoamento da descrição tabular e a precisa identificação da área desapropriada e remanescente. Veja-se:  



CAPÍTULO XIII DESAPROPRIAÇÃO



Art. 784. O oficial registrará nas matrículas as escrituras públicas de desapropriação e as sentenças judiciais respectivas.



§ 1º Para realização de tal registro, o oficial, se necessário, exigirá prévio aperfeiçoamento da descrição tabular e, ainda, a precisa identificação da área desapropriada e daquela remanescente da intervenção.



§ 2º Mesmo no caso de escritura de desapropriação, fica dispensada a apresentação de CCIR e do comprovante de quitação do Imposto Territorial Rural (ITR).  



              Por conta da incidência desta norma, nos autos n. 0013080-46.2014.8.24.0600, o estado de Santa Catarina requereu providências à CGJ-SC, aduzindo que o Departamento Estadual de Infraestrutura (DEINFRA), autarquia responsável pelas expropriações, estava encontrando dificuldades no registro das escrituras públicas de desapropriações consensuais. 



              Informou que, com base no dispositivo, os cartórios estavam exigindo: "que a escritura contemple, além da descrição (medidas e confrontações) da área desapropriada, também a descrição completa da área remanescente", assim como "a prévia retificação da área do imóvel sobre o qual recai a parcela desapropriada, quando aquele (área maior) encontra-se com descrição incompleta ou deficiente no registro". 



              Assim, por entender ilegais tais exigências, requereu a revogação do dispositivo, para "dispensa da descrição do remanescente" e, "quando for o caso, da prévia retificação do imóvel (área maior) sobre o qual recai a desapropriação". 



              Aduziu que: (a) a desapropriação, seja judicial ou consensual, é ato de império do poder público, de aquisição originária da propriedade; (b) apenas é imprescindível a completa caracterização da área especificamente objeto do ato expropriatório, cuja matrícula será aberta; (c) o certo é atribuir ao proprietário da área remanescente (o desapropriado) a providência da apuração do remanescente, cujo custeio há, naturalmente, de estar albergado pelo valor da indenização. 



              Ao analisar os argumentos, o eminente Juiz-Corregedor demonstrou concordar com as teses apresentadas, afirmando que a desapropriação realmente configura aquisição originária da propriedade, não dependendo do título de domínio anterior e não se subordinando ao princípio da continuidade do registro.



              Em razão disto, consignou que "o registro imobiliário passa a ter natureza precipuamente declaratória". Ademais, com base no exposto, concluiu o seguinte:  



"Ora, é de conhecimento corrente que o decreto expropriatório deve identificar com precisão a área a ser adquirida. É com base em tal providência, entre outras, que será calculada a devida indenização. O poder público não tem qualquer interesse sobre o remanescente da área - caso seja parcial a desapropriação. Ou seja, para a perfectibilização e conclusão do procedimento expropriatório é absolutamente desnecessária a apuração - ou atualização - do remanescente. Não pode o registro daquela propriedade - de aquisição originária, repita-se - ficar condicionado a tal levantamento.



Nada impede, contudo, que o particular proceda a tal atualização por sua conta e risco, seja levantar eventual área tomada e não indenizada, seja para comprovar ser terceiro prejudicado e não indenizado. Contudo, como já exaustivamente afirmado, tais providências não têm o condão de impedir a aquisição da propriedade demarcada no decreto expropriatório pela administração" (Grifo nosso)  



              Foi partindo dessas premissas que opinou pela expedição de circular aos registradores de imóveis do estado, orientando-os a: "Nos casos de registro de escritura pública de desapropriação consensual, havendo descrição precisa da área expropriada, seja dispensada a exigência contida no art. 784, § 1.º, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça", que culminou, então, na Circular n° 309/CGJ de 2014.  



              2.2 Alcance da circular 



              A primeira dúvida posta nos autos diz respeito ao alcance desta circular. 



              Como visto, o oficial registrador deixou de aplicá-la por entender que esta: "se restringe a registros de escrituras públicas de desapropriação consensual referentes a ampliações de faixa de domínio de rodovias, tendo como interessado o DNIT, conforme consta no próprio corpo de ambas as circulares" (2615062).



              Compreendo e respeito o posicionamento, porém discordo.



              Ao ler atentamente os fundamentos da decisão, vejo que o Juiz-Corregedor tratou do conceito de desapropriação - como forma de aquisição originária da propriedade e que, portanto, não depende do título do domínio anterior - de forma genérica. Não há ressalvas de que tal conclusão restringir-se-ia apenas às desapropriações consensuais efetuadas pelo DNIT.



              Da mesma forma, ao ler de forma detida os apontamentos doutrinários que embasaram a decisão, não encontrei ressalvas nesse sentido. Pelo menos, não expressamente (Circular n° 309/CGJ de 2014 - fls. 41, 42 e 43).  



              Além disso, ao buscar a resposta na jurisprudência dos Tribunais Superiores, vejo que, ao tratar sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça tampouco traz essa diferenciação. Veja-se:  



ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA. ACORDO NA FASE DECLARATÓRIA. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. REGISTRO DA PROPRIEDADE POR ESCRITURA PÚBLICA. DESNECESSIDADE DE INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. 
[...]  6. O Tribunal de origem reconheceu a ausência de interesse de agir quanto à homologação do acordo, pelos seguintes fundamentos: "Com efeito, havendo composição sobre o preço da indenização ainda na fase administrativa, deverão as partes fazê-lo através de escritura pública, que constitui o título translativo da propriedade em favor do Poder Público. (...) De outro lado, não sendo possível a realização de acordo entre as partes, cabe ao Poder Público propor a ação desapropriatória, passando a controvérsia a ser dirimida pelo Poder Judiciário. (...)Por certo, através de tratativas no âmbito administrativo, sem qualquer intervenção judicial, as partes chegaram a um acordo sobre o valor da indenização - ressalte-se - superior à oferta contida na inicial e que já foi, em parte, pago pela expropriante à expropriada, como bem demonstram os recibos colacionados aos autos (evento36, OUT2). Ora, se já houve pagamento da indenização, a desapropriação já foi ultimada, vez que esse é o seu momento consumativo (evento 36, ACORDO1). Em outras palavras, na apuração da justa e prévia indenização, não houve intervenção judicial, não sendo necessária a manifestação do juízo para lhe conferir validade, tampouco eficácia porquanto se trata de disposição entabulada entre as partes envolvidas. (...) Ora, satisfeito o pagamento da indenização devida à expropriada, a propriedade se consolida em favor do Poder Público e esse direito real não depende do registro imobiliário, vez que se trata de forma originária de aquisição, prescindindo da transcrição para ser efetivado. Dito de outra forma, se a pretensão estatal foi satisfeita no âmbito extrajudicial, desaparece o interesse do expropriante na obtenção de qualquer provimento judicial, ante a sua manifesta desnecessidade. E nem se venha argumentar sobre a necessidade de homologação judicial para conferir eficácia ao acordo firmado entre as partes. Como dito, havendo composição, ainda que na fase judicial do procedimento expropriatório, deverão as partes fazê-lo por escritura pública - se o valor do bem desapropriado ultrapassar o limite de 30 (trinta) vezes o maior salário mínimo vigente no país - sendo esse o título hábil a transcrição do domínio perante o Registro Imobiliário, não havendo a necessidade de qualquer intervenção do Poder Judiciário. Na verdade, a pretensão da expropriante se volta à obtenção de efeito adjudicatório do imóvel desapropriado sem dispor título hábil ao atingimento de tal finalidade. O ato causal do registro da propriedade em nome do Poder Público decorrente da desapropriação consensual - prévia ou posterior ao ajuizamento da ação expropriatória - é a escritura pública, não havendo qualquer interesse das partes em prosseguir com a presente ação expropriatória porquanto a eficácia da transferência independe da homologação judicial. Com efeito, valendo-se a expropriante da faculdade que lhe confere o próprio art. 10 do Decreto-Lei n. 3.365/41, que permite a desapropriação através de acordo, deverá fazê-lo com observância da forma prescrita em lei, não bastando a realização de mero acordo extrajudicial, ainda que no curso da demanda, para caracterizar a necessidade da tutela judicial". 
7. Havendo composição sobre o preço da indenização ainda na fase administrativa, deverão as partes fazê-lo através de escritura pública, que constitui o título translativo da propriedade em favor do Poder Público. 
8. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. 
(
REsp 1801831/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/05/2019, DJe 03/06/2019)  



PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 3/STJ. DESAPROPRIAÇÃO. AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DE PROPRIEDADE. EXIGIBILIDADE DE TRIBUTOS ANTERIORES À AO ATO DESAPROPRIATÓRIO. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO ENTE EXPROPRIANTE. 
RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. 
1. No caso em tela o recorrente exige do ente expropriante, em execução fiscal, os tributos (IPTU e Taxa de Limpeza Pública de Coleta de Resíduos Sólidos) incidentes sobre o imóvel desapropriado, derivados de fatos geradores ocorridos anteriormente ao ato expropriatório. 
2. Considerando o período de ocorrência do fato gerador de tais tributos, e, levando-se em consideração que a desapropriação é ato de aquisição originária de propriedade, não há a transferência de responsabilidade tributária prevista no artigo 130 do CTN ao ente expropriante. 
3. Recurso especial não provido. 
(
REsp 1668058/ES, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/06/2017, DJe 14/06/2017)  



ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. PRODUÇÃO DE PROVA INDEFERIDA PELO JUIZ. FUNDAMENTO NA INUTILIDADE DA DILIGÊNCIA. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO DIREITO DE DEFESA. DESAPROPRIAÇÃO. EVENTUAL DIVERGÊNCIA QUANTO AO DOMÍNIO. IRRELEVÂNCIA. 
1. Nos termos do art. 130 do CPC, o juiz pode indeferir as diligências que considere inúteis, desde que o faça fundamentadamente. Foi o que aconteceu no caso concreto. Portanto, não há que se falar em violação do direito de defesa da parte. 
2. Ainda que houvesse ocorrida a usucapião em favor dos agravantes, como bem frisou o acórdão, tal fato em nada alteraria o resultado da demanda. Isso porque a desapropriação é ato de império e forma de aquisição originária do bem, não estando condicionada ao fato de o justo preço ter sido pago ao legítimo proprietário. 
3. Qualquer discussão a respeito do domínio do bem apenas acarretará consequência em relação a quem deve receber a indenização, mas, de modo algum, impede a ocorrência da desapropriação. 
4. A hipótese de os agravantes terem adquirido a propriedade pela usucapião, antes de o Estado ter efetivado a desapropriação, em nada alteraria a obrigação de indenizar o ente público pelo uso indevido do imóvel no período pós-expropriatório. 
Agravo regimental improvido. 
(
AgRg nos EDcl no REsp 1263097/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/05/2012, DJe 24/05/2012)  



PROCESSUAL. ADMINISTRATIVO. INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE. DESAPROPRIAÇÃO EFETUADA POR ENTE MUNICIPAL. TERRENO DE MARINHA. DECRETO-LEI Nº 9.760/46. BEM PERTENCENTE À UNIÃO. ART. 20, II, DA CF/1988. EXPROPRIADO PROPRIETÁRIO SOMENTE DO DOMÍNIO ÚTIL DO IMÓVEL. ENFITEUSE. RESTITUIÇÃO PELO VALOR PAGO A MAIOR. POSSIBILIDADE. 
1. A desapropriação tem como pressuposto o domínio do expropriado e o domínio iminente do Poder Público, por força da supremacia dos interesses estatais. 
[...] 11. Deveras, é cediço à luz do caso concreto que: a) A inscrição da enfiteuse no RGI gerou presunção de ciência erga omnes; b) A desapropriação é forma originária de aquisição da propriedade, o que torna incompatível com garantia da evicção; c) A boa-fé é inoperante na hipótese de venda a non dominio para efeito de consolidação de propriedade, repercutindo, tão-somente, no tocante a imputação de perdas e danos; d) A aferição do valor a ser repetido é matéria insindicável no E.STJ; e) A desapropriação de bem próprio corresponde a uma não expropriação, porquanto ato inexistente na concepção privatística do ato jurídico. 
12. A ação de rito ordinário, objetivando o ressarcimento do valor pago aos ora recorrentes a título de indenização por desapropriação de imóvel, que a recorrida julgava ser de propriedade dos recorrentes, é de natureza pessoal e sua prescrição é vintenária. 
13. Inocorre erro in procedendo na apreciação do mérito quando o panorama da causa enquadra no § 3º, do art. 515, do CPC, de aferição única da instância a quo. 
14. Recurso especial improvido. 
(
REsp 798.143/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/03/2008, DJe 10/04/2008)  



ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. REGISTRO DE ÁREA NÃO-TITULADA EM NOME DO EXPROPRIANTE, QUE JÁ TINHA CIÊNCIA DA SITUAÇÃO DO BEM. IMPOSSIBILIDADE. 
1. A desapropriação é forma originária de aquisição da propriedade, pois a transferência da propriedade opera-se pelo fato jurídico em si, independentemente da vontade do expropriado, que se submete aos imperativos da supremacia do interesse público sobre o privado. 
2. Constitui efeito da sentença proferida em sede de desapropriação a sua utilização como título hábil à transcrição do bem expropriado no competente registro de imóveis, não podendo haver discussão, ao menos no âmbito da ação expropriatória, em torno de eventual direito de terceiros. 
3. Na hipótese dos autos, todavia, os recorrentes já conheciam, de antemão, a situação em que se encontrava a área objeto da presente irresignação, não se podendo falar em propriedade aparente. 
4. "Não obstante seja verdadeiro afirmar que a desapropriação é forma de aquisição originária, não se deve olvidar que não se pode retirar a propriedade de quem não a tem" (REsp 493.800/RS, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de 13.10.2003). 
5. Eventual alteração das divisas e da área do imóvel expropriado, para acrescentar aquela da qual os expropriantes detêm a posse reconhecida em juízo, deverá ser buscada mediante a utilização do procedimento adequado. 
6. Recurso especial a que se nega provimento. 
(
REsp 468.150/RS, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/12/2005, DJ 06/02/2006, p. 199) (Grifo nosso)  



              Não vejo razões, desse modo, para tal interpretação. 



              Além disso, importante ressaltar que não desconheço constar no dispositivo da circular sua aplicação "nos casos de registro de escritura pública de desapropriação consensual", ao que se poderia alegar sua inaplicabilidade para as desapropriações judiciais, como na hipótese dos autos.  



              Entendo, porém, que não foi essa a intenção quando da edição do ato normativo. 



              Isso porque, a partir da leitura integral do corpo da decisão, vejo que o então Juiz-Corregedor, ao tratar da natureza da desapropriação, não fez distinções entre as espécies consensual e judicial. Ao contrário, em um dos trechos do parecer, valeu-se de posicionamento doutrinário que as iguala como forma de aquisição originária da propriedade, o qual transcrevo abaixo:  



"Exatamente por se tratar de modo originário de aquisição, 'a desapropriação independente do registro do título translativo (que é a sentença ou o acordo) no registro imobiliário, uma vez que o registro é modo derivado de adquirir a propriedade" isso porque "o momento consumativo da desapropriação é aquele em que se verifica o pagamento ou depósito judicial da indenização fixada na sentença ou estabelecida em acordo" (SALLES, José Carlos Moraes. A desapropriação à luz da doutrina e da jurisprudência. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 437) (Circular n° 309/CGJ de 2014 - fl. 42) (Grifo nosso) 



              Com efeito, se o entendimento é válido para as desapropriações consensuais extrajudiciais, com maior razão, no meu entender, o deve ser para as judiciais, as quais submetem-se ao crivo do contraditório.



              Até mesmo porque, como bem colocado pela parte interessada, o Decreto-Lei n. 3.365/41, que dispõe sobre as desapropriações por utilidade pública, estabelece que: "efetuado o pagamento ou a consignação, expedir-se-á, em favor do expropriante, mandado de imissão de posse, valendo a sentença como título hábil para a transcrição no registro de imóveis" (art. 29).



              Assim, entendo que a Circular n° 309 do CGJ-SC de 2014 aplica-se ao caso em tela.  



              2.3 Aplicação da circular ao caso concreto e checagem dos requisitos



              - Descrição detalhada da área expropriada (necessidade)



              Como já dito, a orientação contida na circular é de que: "havendo descrição precisa da área expropriada, seja dispensada a exigência contida no art. 784, § 1.º, do Código de Normas da CGJ". 



              Portanto, para dispensa da exigência, é necessário a descrição acurada da área expropriada. 



              Com efeito, no próprio procedimento que buscava a revogação do dispositivo, o estado de Santa Catarina consignou que é "imprescindível a completa caracterização da área especificamente objeto do ato expropriatório, cuja matrícula será aberta". Isto é, independentemente da necessidade de retificação da descrição tabular do imóvel inteiro ou remanescente, a área a ser expropriada necessita de precisa descrição. 



              Assim, assiste razão ao oficial registrador quando o exige.



              Isso porque, ao que consta nos autos, ao solicitar o registro da desapropriação judicial, a parte interessada não descreveu precisamente a área expropriada e sequer juntou o respectivo memorial descritivo, com as medidas geodésicas.



              Não ignoro que, juntamente com a apelação, a recorrente apresentou documento assim intitulado (4332169). No entanto, além de extemporâneo, este apresenta formatação inapropriada e de difícil visualização, com várias partes cortadas, o que inviabiliza a análise neste grau de jurisdição, cabendo ao oficial registrador a qualificação registral.  



              - Descrição detalhada do imóvel completo e da área remanescente (desnecessidade)



              De outro lado, a orientação contida na circular é de que: "havendo descrição precisa da área expropriada, seja dispensada a exigência contida no art. 784, § 1.º, do Código de Normas da CGJ".



              Conforme já vimos, o mencionado dispositivo determina que, para o registro das escrituras públicas de desapropriação, se necessário, será exigido o prévio aperfeiçoamento da descrição tabular e, ainda, a precisa identificação da área desapropriada e daquela remanescente da intervenção.



              Assim, caso o registrador entenda que a descrição da área expropriada é precisa, a conclusão deve ser pela desnecessidade, isto é, pela dispensa da retificação da área total e da área remanescente do imóvel objeto da desapropriação. 



              Não se olvida que, com isso, a área remanescente precisará passar por uma atualização para que o direito se adeque aos fatos, como muito bem pontuado pelo oficial registrador.



              Ocorre que a atualização incumbirá aos outorgantes expropriados, se e quando necessário for. O que não se pode, conforme dito pelo Juiz-Corregedor responsável pela edição da circular, é o registro da propriedade expropriada - de aquisição originária, repita-se - ficar condicionado a tal levantamento. 



              Aliás, neste ponto, cabe ressaltar que no acordo de desapropriação homologado por sentença, ora em discussão, não consta que tal incumbência seria transferida à parte interessada. Veja-se:  



"I) a autora pagará a demandada a importância de R$ 17.504,02 pela área a ser desapropriada descrita nos autos; II) o pagamento será complementado com a importância de R$ 8.648,65, por meio de cheque administrativo da autora que será entregue diretamente em mãos do segundo demandando mediante recebido, destacando que já se encontra depositado nos autos o valor de R$ 8.835,57, que devem ser liberados imediatamente a demandada; III) a autora fica definitivamente imida na posse da área descrita na inicial; IV) custas pela parte autora e os honorários serão arcadas pelas partes respectivas" (2615062 - fl. 47).  



              Desse modo, se precisa a descrição da área expropriada, deve ser dispensada essa exigência.  



              -  Casos semelhantes



              Importante mencionar que em caso bastante semelhante ao presente, de minha relatoria, foi assim que decidiu este Colendo Conselho da Magistratura por unanimidade, cuja ementa segue abaixo:  



RECURSO ADMINISTRATIVO (APELAÇÃO). SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. REGISTRO DE ESCRITURA DE "DESMEMBRAMENTO DE IMÓVEL RURAL CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO AMIGÁVEL". EXIGÊNCIA DE RETIFICAÇÃO DA DESCRIÇÃO DA ÁREA TOTAL DO IMÓVEL E DA ÁREA REMANESCENTE. DESNECESSIDADE EM HAVENDO DESCRIÇÃO PRECISA DA ÁREA EXPROPRIADA. INCIDÊNCIA DA CIRCULAR 309/CGJ-SC DE 2014 AO CASO CONCRETO. FUNDAMENTO LEGAL: DESAPROPRIAÇÃO COMO FORMA DE AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DA PROPRIEDADE. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO (TJSC, Acórdão do Conselho da Magistratura, Recurso Administrativo n. 0014449-60.2019.8.24.0710, Relator: Desembargador Júlio César Machado Ferreira de Melo, Comarca DE Coronel Freitas, julgado em 30/04/2020) (Grifo nosso)  



              Do mesmo modo, em 12/9/2019 e 27/06/2016, assim decidiu o Conselho Superior da Magistratura de São Paulo ao analisar casos parecidos. Veja-se:



Registro de Imóveis - Desapropriação amigável - Aquisição originária da propriedade - Art. 176, § 1.º, 3 e 225, § 3.º da Lei n.° 6.015/73 - Desnecessidade de retificação da área maior, de onde será feito o desfalque - Recurso desprovido (CSM-SP, Apelação Cível n°1002421-45.2018.8.26.0347, Comarca Matão, Registro 2019.0000769229, julgado em 12/09/2019) (Grifo nosso)  



Registro de Imóveis - Escritura pública de desapropriação amigável - Modo originário de aquisição da propriedade - Desnecessidade de prévia apuração da área remanescente do registro atingido - Abertura de matrícula para a área desapropriada, com a averbação do desfalque no registro originário - Recurso a que se nega provimento (CSM-SP, Apelação Cível - 1014257-77.2015.8.26.0037 , data de inclusão 21/06/2016) 



              Extrai-se do inteiro teor: 



[...] "O registro da escritura, por força do traço distintivo da originariedade da aquisição, independe da prévia apuração do remanescente do registro atingido pela desapropriação.



O caminho a trilhar é o inverso. Isto é, aberta a matrícula e registrado o título, averbar-se-á o destaque na matrícula de origem, inscrição indispensável em atenção à eficácia extintiva da desapropriação; para que se dê conhecimento do término dos direitos reais incompatíveis com a desapropriação.



No caso, competirá ao registrador simplesmente abrir a matrícula relativa à área desapropriada e comunicar no registro originário o desfalque ocorrido" (Grifo nosso)  



              Em mesmo sentido, também decidiu o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em 09/02/2015:



PROCEDIMENTO DE DÚVIDA - REGISTRO DE IMÓVEIS - DESAPROPRIAÇÃO AMIGÁVEL - AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DA PROPRIEDADE - DÚVIDA IMPROCEDENTE - Em se tratando de aquisição originária de propriedade, não são razoáveis as exigências do Oficial de Cartório de Registro de Imóveis, devendo ser considerado improcedente o procedimento de dúvida.  (TJMG -  Apelação Cível  1.0325.12.001290-2/001, Relator: Des. Alyrio Ramos, 8ª Câmara Cível, julgado em 29/01/2015, publicação da súmula em 09/02/2015) (Grifo nosso)  



              3. CONCLUSÃO



              Ante o exposto, voto por conhecer da apelação e dar-lhe parcial provimento para reformar a sentença e julgar PARCIALMENTE procedente a presente suscitação de dúvida, a fim de: (a) manter a exigência da descrição precisa da área expropriada, cuja qualificação registral caberá ao oficial registrador; e (b) se preenchido o primeiro requisito, dispensar o prévio aperfeiçoamento da descrição tabular da área total remanescente do imóvel desapropriado - nos termos da Circular n° 309/CGJ de 2014, aplicável ao caso concreto. Sem custas (art. 207 da Lei de Registros Públicos).



              Este é o voto.