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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0303288-75.2019.8.24.0064 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Luiz Felipe Schuch
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Civil
Julgado em: Thu Oct 19 00:00:00 GMT-03:00 2023
Classe: Apelação

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STJ: 2, 5, 7, 430, 29
Súmulas STF: 5








Apelação Nº 0303288-75.2019.8.24.0064/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH


APELANTE: ODINEI JOSE DIAS (AUTOR) APELANTE: JAT ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES LTDA (RÉU) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


Acolho o relatório da sentença (evento 66/1º grau), por contemplar precisamente o conteúdo dos presentes autos, ipsis litteris:
Odinei José Dias ajuizou ação indenizatória em face de JAT Engenharia e Construções Ltda. e Banco do Brasil, alegando, em síntese, que celebrou "Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda de Bem Imóvel" com a primeira ré em 22/05/2014, para aquisição do apartamento 201, bloco "J", do empreendimento "Condomínio Quinta de Potecas".
Relatou sobre a forma de pagamento pactuada, informando ter firmado com o segundo réu, Banco do Brasil S.A, contrato de financiamento habitacional, vinculado ao Programa do Governo Federal - Minha Casa Minha Vida, e que embora vislumbre-se do contrato firmado entre os réus a data de 20/01/2016 para a conclusão das obras, o empreendimento ainda não foi entregue.
Ressaltou que o Banco do Brasil é parte passiva legítima, pois o empreendimento está sendo hipotecado e financiado pelo referido banco, além da previsão contratual de substituição da construtora em caso de atraso na obra.
Insurgiu -se contra a cláusula de tolerância e contra os "juros pré-amortização", ressaltando que o pagamento dos prêmios de seguro são de responsabilidade exclusiva da construtora, e que a forma como o contrato foi redigido, dificultou-lhe a compreensão das cláusulas.
Requereu a concessão de tutela provisória de urgência para que seja determinado à parte ré a suspensão da cobrança dos juros pré-amortização (encargos básicos - cláusula décima, parágrafo primeiro), bem como se abstenha de incluir os seu nome em cadastros de inadimplentes. 
No mérito, requereu: a) a modificação da alínea "a", do quadro VII - do prazo estimado para a entrega das obras - do contrato, para constar a data de 20/01/2014 como marco inicial para contagem do prazo de 24 (vinte e quatro) meses para entrega das chaves; b) a declaração de ilegalidade da utilização do prazo de tolerância de 180 dias; c) a declaração de atraso na entrega da obra desde 20/01/2016; subsidiariamente, desde 20/07/2016; d) a modificação da cláusula quarta do contrato, para impor as penalidades, em caso de atraso das obrigações, a ambas as partes e não apenas ao comprador; e) a condenação das rés, solidariamente, ao pagamento de multa por descumprimento contratual em razão do atraso na entrega do imóvel, consistente em 2% sobre o valor do contrato, mais juros moratórios de 1% ao mês, também sobre o valor do contrato, até a efetiva entrega das chaves; f) a condenação das rés, solidariamente, à devolução dos valores pagos a título de juros pré-amortização do período compreendido entre a declaração de atraso na entrega do imóvel e a efetiva entrega das chaves, corrigidos e acrescidos de juros legais; subsidiariamente, sejam os valores abatidos do saldo a amortizar do financiamento habitacional; g) a condenação das rés, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais em valor não inferior a R$ 15.000,00 (quinze mil reais), além do ônus sucumbencial. Com a inicial juntou documentos (evento 1).
A tutela provisória de urgência foi concedida  (evento 3).
Citado (evento 7), o réu Banco do Brasil S/A contestou (evento 12), alegando, em preliminar: a)  ilegitimidade passiva, pois o contrato firmado entre a instituição financeira e o mutuário não tem relação com a compra e venda realizada com a primeira ré, ressaltando que não possui responsabilidade sobre taxas e encargos que decorrerem da obra ou do empreendimento; b) inépcia da inicial diante da ausência de documentos indispensáveis à propositura da ação; c) ausência de interesse de agir, pois não cometeu nenhum ato ilícito.
Ainda em preliminar, impugnou o pedido de Justiça Gratuita sob o argumento de que o autor não comprovou a alegada condição de hipossuficiência econômica.
No mérito, alegou, a a ausência de responsabilidade e de obrigações em relação ao objeto da demanda, bem como do dever de indenizar, pois não praticou ato ilícito.
Requereu sejam acolhidas as preliminares e extinto o feito ou, no mérito, a improcedência dos pedidos formulados na inicial, condenando-se o autor ao pagamento do ônus sucumbencial.
Citada (evento 10), a  ré Jat Engenharia e Construções Ltda. contestou (evento 15), alegando, em preliminar, ilegitimidade passiva, pois não possui nenhuma responsabilidade pelos prejuízos invocados, pois toda e qualquer, suposta, alteração do cronograma da obra, ocorreu por culpa única e exclusiva do segundo réu, que não efetuou os repasses dos valores para a primeira ré, na forma pactuada.
No mérito, informou que entregou o imóvel no dia 06/04/2017, reiterou a ausência de responsabilidade sobre os prejuízos narrados na inicial, ressaltando que o primeiro e segundo réu formalizaram dois contratos, números 354.403.131 e 354.403.200, denominados Instrumento Particular, com Efeito de Escritura Pública, de Abertura de Crédito para Construção de Empreendimento Imobiliário, com Hipoteca em Garantia e Outras Avenças, no intuito, de viabilizar as condições financeiras, para a primeira ré edificar o empreendimento - Residencial Quinta de Potecas.
Alegou ter concluído a obra com recursos próprios e de outras instituições financeiras, observando que o réu Banco do Brasil deixou de repassar o valor de R$ 4.000.000,00, dando causa ao ajuizamento de ação de revisão contratual (autos nº 030835674.2017.8.24.0064), e ação de obrigação de fazer (autos nº 0311476-96.2015.8.24.0064), contra o banco.
Sustentou que o segundo réu dificultou a conclusão das obras, sendo o único e exclusivo responsável por qualquer alteração no cronograma e prejuízos daí decorrentes.
Outrossim, destacou que o autor estava ciente de que a data prevista para a entrega era meramente estimativa, na medida em que o prazo poderia variar em decorrência de diversos fatores, principalmente, os ocasionados por terceiros, casos fortuitos ou força maior, como as chuvas, cujo volume registrado nos anos de 2015 e 2016 foi acima da média anual.
Defendeu a legalidade do prazo de tolerância e alegou a impossibilidade de inversão da cláusula penal, pois no contrato não há previsão de multa, e que na fase de construção, o devedor deve suportar os encargos relativos aos juros de atualização monetária incidentes sobre o saldo devedor apurado, além da taxa de administração, se devida e comissão pecuniária FGHAB.
Impugnou os documentos juntados com a inicial, e sustentou que não restou caracterizada a ocorrência de danos morais, não havendo o que indenizar.
Requereu seja acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva, com a consequente extinção do feito ou, no mérito, a improcedência dos pedidos formulados na inicial, condenando-se o autor ao pagamento do ônus sucumbencial.
Em reconvenção, sustentou que o autor ofendeu a reputação da empresa por meio de suas redes sociais  e do aplicativo "whatsapp", onde alguns adquirentes, criaram um destes conhecidos "grupos", somente com o intuito de difamar e instigar, mais e mais adquirentes a ingressarem com ação em face dos réus.
Diante disso, requereu a condenação do autor ao pagamento de indenização por danos morais.
Houve réplica às contestações e contestação à reconvenção (evento 21).
Determinou-se o sobrestamento do feito (evento 24).
Diante do trânsito em julgado do Resp. nº 1.614.721/DF determinou-se o prosseguimento do feito, e a intimação das partes para especificarem provas (evento 42), as quais se manifestaram nos eventos 49, 50 e 54.
Designou-se audiência de instrução e julgamento (evento 59).
A Magistrada resolveu o processo nos seguintes termos:
Diante do exposto, nos termos do art. 487, inc. I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por ODINEI JOSÉ DIAS nesta AÇÃO INDENIZATÓRIA que move em face de JAT ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES LTDA. e BANCO DO BRASIL para, em consequência:
a) confirmar a tutela provisória de urgência (evento 3);
b) declarar a culpa solidária da parte ré pelo atraso na entrega do empreendimento objeto desta ação, cuja mora restou configurada a partir de 20/07/2016, a partir de quando incidem seus efeitos;
c) declarar indevida a incidência de "juros da obra" no período de inadimplemento da parte ré;
d) condenar a parte ré, solidariamente, a restituir ao autor, de forma simples, os valores pagos a título de "juros da obra", a contar do início do inadimplemento (20/07/2016) até a data de expedição do "habite-se",  cujo quantum deverá ser apurado em liquidação de sentença, nos termos da fundamentação;
e) determinar a inversão da cláusula penal em benefício do autor, nos termos da fundamentação, e condenar a parte ré, solidariamente, ao pagamento dos valores devidos a este título, cujo quantum deverá ser apurado em liquidação de sentença.
Considerando que o autor decaiu de parte mínima dos pedidos, condeno a parte ré, solidariamente, ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC.
Nos termos do art. 487, inc. I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na reconvenção oposta por JAT ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES LTDA.
Condeno a reconvinda ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios da reconvenção, estes em benefício do procurador do autor, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado daquela causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC.
Foram opostos embargos de declaração pela ré Jat Engenharia e Construções (evento 76/1º grau) e pelo autor (evento 81/1º grau).
Irresignado com a prestação jurisdicional entregue, o réu Banco do Brasil S. A. interpôs apelação, por meio da qual alega, preliminarmente: a) a ilegitimidade passiva; b) a inépcia da inicial; e c) a ausência de interesse processual. No mérito, aduz não ter responsabilidade pelo atraso na entrega da obra, notadamente porque é mero financiador do imóvel adquirido pelo autor. Imputa responsabilidade exclusiva pela condução da obra à corré Jat Engenharia, não sendo o caso de responsabilidade solidária. Afirma não ter praticado qualquer ato ilícito ou falha na prestação dos serviços. Aduz a legalidade da taxa de evolução da obra, de modo que entende pela impossibilidade de qualquer restituição de valor pago sob esta rubrica ou, subsidiariamente, que a restituição seja realizada apenas pela construtora. Alega, ainda, que a responsabilidade pela sucumbência deve recair em sua integralidade ao apelado, ou ao menos deve haver a minoração do percentual dos honorários advocatícios fixados em seu desfavor. Ao final, pugna o provimento do recurso, a improcedência dos pedidos iniciais e o prequestionamento dos dispositivos legais e das teses jurídicas aplicáveis à espécie (evento 86/1º grau).
Sobreveio pedido da construtora ré de revogação de decisão liminar ante a existência de fato novo (evento 98/1º grau). O autor se manifestou quanto ao requerimento no evento 117/1º grau.
Foi proferida sentença dos embargos declaratórios e de saneamento de questões processuais pendentes (evento 119/1º grau):
Ante o exposto e o que mais dos autos consta, ACOLHO PARCIALMENTE os Embargos de Declaração opostos pelas partes embargantes tão somente para, reconhecendo a omissão apontada, alterar a alínea e do dispositivo da sentença, que passa a assim dispor:
e) determinar a inversão da cláusula penal em benefício do autor, nos termos da fundamentação, e condenar as rés, solidariamente, ao pagamento dos valores devidos a este título, correspondentes à multa moratória de 2% a incidir sobre o valor do contrato particular de promessa de compra e venda de bem imóvel, acrescidos de correção monetária pelo INPC e juros de 1% ao mês a contar da data prevista para a entrega do imóvel (20/7/2016) até a data da imissão na posse do imóvel;
No mais, fica mantida a sentença proferida.
Publique-se e intime-se.
II - Diante do uso de linguagem ofensiva, DEFIRO o pedido formulado pelo procurador da parte autora em evento 17, alínea a, para DETERMINAR que seja SUPRIMIDA  a palavra contida na petição do Evento 98, página 6, parágrafo 3º, 5ª linha, antecedida pela frase "...90% dos processos capitaneados por este advogado...", com fundamento no art. 78, §2º, do CPC.
Para tanto, cumpre ao Cartório judicial cancelar a petição supra mencionada e ao procurador da demandada, em 5 (cinco) dias, acostar as autos nova versão da indigitada peça, apenas com a supressão do termo ofensivo utilizado para se dirigir ao procurador da parte autora.
Tal procedimento se faz necessário diante da impossibilidade de alteração pelo Cartório na forma determinada pelo suso citado artigo no processo eletrônico (riscar a expressão ofensiva).
Expeça-se certidão com inteiro teor das expressões ofensivas à disposição da parte interessada.
III - No mais, não obstante o teor das petições vinculadas aos eventos 98 e 117 dos autos, saliento que, uma vez publicada a sentença, incide o princípio da inalterabilidade da decisão judicial, nos termos do art. 494, do CPC, in verbis:
" Art. 494. Publicada a sentença, o juiz só poderá alterá-la:
I - para corrigir-lhe, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais ou erros de cálculo;
II - por meio de embargos de declaração."
Assim, inexistindo erro material e já analisados os embargos declaratórios opostos, não há falar em revogação ou concessão de tutela de urgência de forma a modificar/acrescer o teor da sentença já proferida, ao menos por este Juízo.
Intimem-se.
Decorrido o prazo de apelação e respectivas contrarrazões, remetam-se os autos à Corte Catarinense.
Inconformado com parte da sentença, o autor também interpôs apelação, por meio da qual alega que, embora tenha sido limitada a mora das rés na data da expedição do "Habite-se" (21-12-2017), a entrega do imóvel para o fim a que se destina ocorreu em data posterior (14-6-2018), de modo que a responsabilidade pelo atraso na obra deve ser reconhecida como cessada somente com a imissão definitiva na posse do imóvel, ocorrida no ano de 2018. Sustenta a ilegalidade do prazo de tolerância, devendo ser fixada a mora a partir de 20-1-2016. Com relação à condenação de ressarcimento dos juros de pré-amortização, aduz que o termo final deve ser "até que se inicie a fase de amortização do contrato". Salienta a necessidade de reforma da sentença também para condenar as apeladas ao pagamento de indenização por danos morais em valor não inferior a R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Postula a majoração dos honorários advocatícios recursais com base no art. 85, § 11, do Código de Processo Civil. Requer, por fim, o provimento integral do recurso e, considerando não haver óbice para o início da fase de amortização, a concessão de tutela de urgência recursal, a fim de que seja determinado ao Banco do Brasil que inicie imediatamente a fase de amortização do financiamento (evento 128/1º grau).
Também irresignada com a prestação jurisdicional entregue, a construtora ré interpôs apelação. Sustenta a validade do contrato firmado entre as partes e do termo de entrega do imóvel ao autor, inequivocamente dentro do prazo contratual, o que por si só não enseja qualquer tipo de indenização. Aduz que "o contrato foi assinado em 25-5-2014 com data de entrega para 22-11-2016, já computado o prazo de tolerância; não obstante, a parte autora repactuou a data de entrega ao assinar o contrato acostado no Evento 1/INF 13 a 14 em 20-8-2014, com entrega para 24 meses, mais o prazo de tolerância, o que findaria em 20-2-2017" (fl. 8 das razões recursais), fatos desconsiderados na sentença. Menciona que a entrega dentro do prazo previsto contratualmente não ostenta caráter indenizatório, tampouco configura mero dissabor, tanto que ao seu ver, para ser cabível a indenização por danos morais, o atraso deveria ser superior a 12 meses. Ressalta que embora "a parte apelada alegue que a placa fixada em frente ao empreendimento previa a entrega em janeiro de 2016 e a Magistrada busque contrato alheio às partes para fundamentar uma decisão completamente maculada, ignorando a repactuação do Evento 1/ INF 13 a 14, por força dos princípios do pacta sunt servanda e da boa-fé objetiva, as partes se obrigaram ao cumprimento do contrato" (fl. 9 das razões recursais). Aduz que a entrega em 6-4-2017, aproximadamente dois meses após o prazo pactuado livremente entre as partes (20-2-2017), não gera dever indenizatório. Sustenta não possuir ingerência sobre os juros de pré-amortização (juros de obra ou seguro obra), porquanto decorrentes de contrato de financiamento firmado entre a parte autora e o Banco do Brasil, competindo a este a devolução dos valores cobrados. Assevera que não houve a inversão da cláusula penal na hipótese, mas sim a criação de uma nova cláusula, o que não pode ser admitido, pois o STJ garante ao adquirente a inversão da cláusula penal em caso de atraso superior a 12 meses e jamais sobre o valor total do contrato. Pretende a redistribuição dos encargos de sucumbência. Sustenta ter cumprido com suas obrigações contratuais e imputa ao banco requerido a culpa exclusiva (ou subsidiariamente a culpa solidária) pelo atraso na conclusão do empreendimento. Ao final, pugna o provimento integral do recurso (evento 138/1º grau).
No evento 140/1º grau a construtora Jat Engenharia cumpriu anterior decisão judicial e anexou nova versão da peça protocolada no evento 98/1º grau, com a supressão do termo ofensivo utilizado para se dirigir ao procurador da parte autora.
Contrarrazões nos eventos 152, 153 e 155/1º grau.
Nesta instância, o feito foi inicialmente distribuído ao Desembargador Monteiro Rocha, integrante da Segunda Câmara de Direito Civil, que determinou a redistribuição por prevenção em razão do anterior recebimento do agravo de instrumento n. 4008085-34.2018.8.24.0000 (evento 7).
O Banco do Brasil realizou a vinculação do seu causídico no cadastro processual do sistema Eproc (eventos 12, 14, 15 e 20), nos termos da decisão do evento 16.

VOTO


1 ADMISSIBILIDADE
Os recursos preenchem os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual devem ser conhecidos.
Adianta-se, por oportuno, o não acolhimento da preliminar de inovação recursal e consequentemente não conhecimento parcial do recurso da ré Jat Engenharia, suscitada pelo autor em suas contrarrazões (evento 155/1º grau), na qual aduz que "não tendo arguido em contestação que a contagem do prazo de entrega se daria a partir da data de assinatura do contrato de promessa de compra e venda, tampouco que a referida data foi repactuada com a celebração do contrato de financiamento (o que se impugna veementemente), não pode a Ré alegá-la agora em razão da preclusão temporal, configurando-se esta imputação como verdadeira inovação recursal".
Isso porque, embora a construtora acionada não tenha indicado expressamente datas em sua defesa, amparou suas teses nos seguintes argumentos "os dois contratos preveem datas estimativas para a entrega da obra" e "tomando como base a data prevista pelo segundo réu, como data de término da obra, não impugnada pelo autor, acrescentando-se a essa o prazo de 180 dias, conclui-se a existência de alteração no cronograma, mas totalmente justificável, em decorrência da falta de repasses financeiros para a evolução da obra" (evento 15/1º grau).
Ademais, a sentença também perpassa por várias datas para concluir pelo atraso da entrega da obra, reconhecendo a mora "a partir de 20-7-2016", de modo que a defesa recursal da construtora, em confronto direto com os fundamentos da sentença, não constitui inovação.
2 (I)LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO DO BRASIL E AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL 
Sustenta o Banco requerido a sua ilegitimidade passiva, pois, "a partir do momento em que as unidades foram 'desligadas' dos empreendimentos globais, em decorrência das vendas realizadas pela construtora aos mutuários/adquirentes, estes é que necessitaram de financiamentos para as aquisições pretendidas; logo, o contrato firmado entre a instituição financeira e o mutuário é, sem dúvida, de mútuo, nada tendo a ver com a compra e venda que se estabeleceu entre o mesmo e a construtora Jat Engenharia e as cláusulas e encargos que dela decorreram" (fls. 4-5 das razões recursais).
Aponta que o relacionamento com o mutuário teve origem por ocasião do financiamento habitacional, não sendo de sua responsabilidade as taxas e encargos decorrentes da obra ou do empreendimento. Aduz que a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça também já decidiu que a instituição financeira não é responsável pela qualidade do produto adquirido por livre escolha do consumidor mediante financiamento bancário.
Salienta não haver insurgência direta do autor contra o financiamento, mas, tão somente, contra os supostos problemas existentes no produto/serviço adquirido, o qual não foi fornecido por si, de modo que deve ser afastada qualquer responsabilidade em seu desfavor.
Alega, ainda, não ter cometido nenhuma ilegalidade e/ou ato ilícito que viesse a legitimá-lo para estar no polo passivo da demanda, não sendo a pretensão exordial objetivamente razoável e não possuindo o autor interesse processual.
Razão, contudo, não lhe assiste.
Sobre esses pontos, colhe-se da sentença apelada:
O autor pretende indenização por danos materiais e morais sob o argumento de descumprimento contratual por parte da construtora ré, consubstanciado no atraso de entrega da unidade, ressaltando que há expressa disposição contratual prevendo a substituição da construtora pelo banco em caso de atraso na obra.
O Banco do Brasil alegou que é parte ilegítima passiva, pois o contrato firmado entre a instituição financeira e o mutuário não tem relação com a compra e venda realizada com a primeira ré, ressaltando que não possui responsabilidade sobre taxas e encargos que decorrerem da obra ou do empreendimento.
A ré JAT Engenharia e Construções Ltda. e Banco do Brasil S/A firmaram contrato de abertura de crédito para construção de empreendimento imobiliário vinculado ao Programa Nacional de Habitação Urbana (PNHU), vinculado ao Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV).
Embora não tenha sido juntada aos autos cópia do instrumento contratual (nº 354.403.131), a construtora faz menção expressa à sua apresentação nos autos da Ação Revisional de Contrato nº 030835674.2017.8.24.0064 em que é possível a consulta aos termos do negócio jurídico (Ev. 21 - INF 166, 168, 170, 172, 174, 176 e 178), e de onde extrai-se a obrigação do banco em fiscalizar a obra pelo interesse em que o empréstimo seja utilizado para os fins descritos no contrato de mútuo (cláusula segunda, parágrafo segundo do contrato).
A instituição financeira é solidariamente responsável, nas hipóteses em que o atraso na entrega do empreendimento decorra de inadequações no cumprimento das obrigações impostas pela Lei n. 11.977/2009, que dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas, sendo pacífico o entendimento jurisprudencial neste sentido:
RECURSO ESPECIAL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. LEGITIMIDADE DA CEF. AUSÊNCIA. AGENTE FINANCEIRO.1. Cinge-se a controvérsia a definir se a Caixa Econômica Federal possui legitimidade para responder pelo atraso na entrega de imóvel financiado com recursos destinados ao Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV).2. O exame da legitimidade passiva da CEF está relacionado com tipo de atuação da empresa pública no âmbito do Sistema Financeiro Habitacional, ora como agente meramente financeiro, em que não responde por pedidos decorrentes de danos na obra financiada, ora como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa ou baixíssima renda, em que responde por mencionados danos. Precedente.3. Para o fim de verificar o tipo de atuação da CEF e concluir pela sua legitimidade para responder por danos relativos à aquisição do imóvel, devem ser analisar os seguintes critérios: i) a legislação disciplinadora do programa de política de habitacional; ii) o tipo de atividade por ela desenvolvida; iii) o contrato celebrado entre as partes e iv) e a causa de pedir.4. No caso dos autos, considerando-se que a participação da CEF na relação jurídica sub judice ocorreu exclusivamente na qualidade de agente operador do financiamento para fim de aquisição de unidade habitacional, a instituição financeira não detém legitimidade para responder pelo descumprimento contratual relativo ao atraso na entrega do imóvel adquirido com recursos destinados ao Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV).5. Recurso especial não provido." (STJ, REsp n. 1.534.952/SC).
Considerando que o Banco do Brasil assumiu obrigações adicionais, diversas daquelas atribuídas ao mero agente fiduciante, afasto as preliminares de ilegitimidade passiva e de ausência de interesse de agir.
Em abono, compulsando o citado contrato de abertura de crédito para construção de empreendimento imobiliário n. 354.403.131 citado na sentença (o qual foi também acostado no presente processo - itens 19-23 do evento 1/1º grau), firmado entre as partes requeridas, verifica-se que o credor fiduciário/hipotecário (Banco do Brasil S. A.) atuou não apenas como agente financeiro/repassador de valores, mas também como fiscalizador da execução das obras e das vendas do empreendimento, conforme indicam, por exemplo, as cláusulas 2ª (parágrafo segundo), 3ª (itens I, II e III, alíneas "a"), 5ª (itens I, II e III), 6ª, 8ª (parágrafo quarto), 10ª e 21ª (caput e parágrafo oitavo).
Em razão do referido ajuste, houve a contratação de seguro pela devedora fiduciária/hipotecária (Jat Engenharia), com o seguinte objeto: "o presente seguro tem por finalidade garantir até o limite da importância segurada a retomada da obra sinistrada do empreendimento residencial Quinta das Potecas, Fase 01, como definido nas condições desta apólice, através da contratação de um construtor substituto sempre que a engenharia do Banco ou empresa por ele contratada constatar atraso irrecuperável na obra de acordo com o cronograma físico financeiro do projeto incluído no contrato por período igual ou superior a 30 dias, conforme estabelecido no contrato de financiamento n. 354.403.131, ou caso seja caracterizado o abandono da obra" (item 30 do evento 1/1º grau).
Este Tribunal de Justiça já reconheceu, em caso envolvendo o mesmo empreendimento, que "mais do que mero expectador com interesses limitados ao retorno financeiro do empreendimento, o réu Banco do Brasil S. A. assumiu direitos e obrigações próprias da implantação de políticas públicas de moradia popular, razão pela qual deve ser reconhecida a sua legitimidade passiva para responder solidariamente pelo prejuízo causado à parte autora" (Apelação n. 0312461-94.2017.8.24.0064, rel. Carlos Roberto da Silva, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 13-7-2023).
O Superior Tribunal de Justiça, no mesmo sentido, assim já decidiu:
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. ATRASO NA ENTREGA DE UNIDADE ADQUIRIDA NA PLANTA. INCLUSÃO DO AGENTE FINANCEIRO NO POLO PASSIVO DA DEMANDA. QUESTÃO SOLUCIONADA COM BASE NA INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL E NO EXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS N.os 5 E 7 DO STJ. BASE DE CÁLCULO DA MULTA E DOS JUROS DE MORA. FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO RECORRIDO NÃO IMPUGNADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 283 DO STF, POR ANALOGIA. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.[...].2. O entendimento do STJ é pacífico no sentido de que a eventual legitimidade da instituição financeira está relacionada à natureza da sua atuação no contrato firmado: é legítima se atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda; não o é se atuar meramente como agente financeiro. Precedentes.3. No caso vertente, as instâncias ordinárias, com base nos elementos fáticos da causa e na interpretação das cláusulas do acordo celebrado entre os mutuários e a CEF com o PROCON, concluíram que a empresa pública não atuou apenas como agente financiador, ao não cumprir o prazo ajustado para a substituição da construtora, o que configura, excepcionalmente, a sua responsabilidade para responder pelos danos decorrentes do atraso da obra. Rever tal entendimento encontra óbice nos enunciados das Súmulas nºs 5 e 7 do STJ.[...].5. Agravo interno não provido (AgInt no AREsp n. 2.048.837/RN, rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, j. 27-6-2022).
Não destoam os precedentes deste Tribunal de Justiça envolvendo o mesmo Condomínio Quinta das Potecas objeto da presente lide:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DO EMPREENDIMENTO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. PRELIMINARES. MATÉRIA NÃO DEBATIDA NO JUÍZO DE ORIGEM. NÃO CONHECIMENTO. LEGITIMIDADE PASSIVA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO CELEBRADO PARA A REALIZAÇÃO DE EMPREENDIMENTO VINCULADO AO "PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA". INSTITUIÇÃO QUE ATUOU, NO CASO CONCRETO, COMO GARANTIDORA DA IMPLANTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS FEDERAIS DE MORADIA POPULAR. ASSUNÇÃO DE OBRIGAÇÕES QUE EXTRAPOLAM OS LIMITES DA ATUAÇÃO COMO MERO AGENTE FINANCEIRO. ENTENDIMENTO FIRMADO NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRECEDENTES DA CORTE. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO. [...] (Apelação n. 0302589-55.2017.8.24.0064, rel. Ricardo Fontes, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 22-8-2023).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS CUMULADA COM OBRIGAÇAO DE FAZER E PEDIDO DE CONCESSÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA.  ATRASO NA ENTREGA DAS CHAVES. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA CONSTRUTORA RÉ. PRETENDIDO O RECONHECIMENTO DA LEGITIMIDADE PASSIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. SUBSISTÊNCIA. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE ASSUME OBRIGAÇÕES QUE EXTRAPOLAM OS LIMITES DA LIBERAÇÃO DE RECURSOS.  RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DEMONSTRADA. [...]. RECURSO DE APELAÇÃO DA RÉ CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO (Apelação n. 0304772-62.2018.8.24.0064, rel. José Agenor de Aragão, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 15-12-2022).
De qualquer sorte, apenas para complementar, é sabido que a Corte da Cidadania vem reafirmando que "as condições da ação, aí incluída a legitimidade para a causa, devem ser aferidas com base na teoria da asserção, isto é, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial" (AgRg nos EDcl no REsp n. 1.035.860/MS, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 25-11-2014).
Esta Corte de Justiça também já decidiu que "se o réu da relação jurídica processual está no polo passivo [ou ativo] da relação jurídica de direito material descrita na inicial, ele é parte legítima. Se a prova dos autos evidencia situação diversa da narrada, isso é questão de mérito e poderá importar julgamento de improcedência. Condições da ação, portanto, decorrem do exame de compatibilidade entre o descrito pelo autor e a relação processual formada em juízo; mérito, por seu turno, atine à existência de elementos de convicção demonstrativos de que os fatos se passaram conforme descrito pelo autor na sua inicial" (Apelação Cível n. 2014.052751-6, de Joaçaba, rel. Janice Goulart Garcia Ubialli, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 5-3-2015).
In casu, é incontroversa a participação do Banco réu na relação jurídica de direito material descrita na inicial, remanescendo a controvérsia na questão da sua responsabilidade, matéria que deverá ser melhor abordada no mérito.
Do mesmo modo, haverá interesse processual sempre que a parte necessitar vir a juízo pleitear seu direito e quando a tutela pretendida trouxer-lhe utilidade prática. As condições da ação também devem ser avaliadas, em qualquer caso, de forma abstrata, em consonância à teoria da asserção.
Considerados tais aspectos, e conforme já decidiu este Tribunal de Justiça, "entende-se que a necessidade de estar em Juízo perfaz tão só análise preliminar quanto a uma das condições indispensáveis ao prosseguimento da ação (art. 485, VI, do CPC), de maneira que não se admitem maiores digressões que possam implicar o exaurimento do mérito já na via prefacial" (Apelação n. 0311929-19.2017.8.24.0033, rel. Ricardo Fontes, Quinta Câmara de Direito Civil, j. 24-8-2021).
No presente caso, a necessidade de a parte autora estar em juízo é evidente e igualmente amparada na pretensão resistida dos réus, decorrente do atraso na entrega da obra, e a adequação, de sua vez, encontra suporte na pertinente eleição do meio processual (ação declaratória e indenizatória).
Desse modo, não merece acolhimento o pleito recursal do Banco nesses pontos.
3 INÉPCIA DA INICIAL
Defende o Banco recorrente que a petição inicial é inepta, porquanto desacompanhada de documentos indispensáveis ao ajuizamento da demanda. Aduz sustentar o autor "que as rés teriam descumprido o contrato por supostamente estarem procedendo com cobranças indevidas a título de seguro obra, maquiando os juros de amortização; no entanto, a parte apelada não comprova a efetiva cobrança dos juros pré-amortização que de longe refere-se ao seguro; ademais, a parte apelada não comprova a contratação de seguro; assim, ao contrário do que o autor alega, não está comprovada a cobrança do juros pré-amortização e do seguro" (fl. 8 das razões recursais), daí por que entende ser caso de extinção do feito, sem resolução do mérito, ante a ausência de documento indispensável.
Na sentença, o Juízo a quo assim decidiu:
Afasto também a preliminar de ausência dos documentos indispensáveis à propositura da ação, pois o autor instruiu a inicial com os documentos necessários ao embasamento dos seus pedidos, entre os quais o contrato de compra e venda de imóvel e financiamento bancário.
Em complemento, assinala-se que nas razões recursais o apelante limita-se a repetir o alegado em contestação nesse ponto (evento 12/1º grau), sem combater a decisão judicial quanto ao reconhecimento de que a documentação anexada na exordial é suficiente para a apreciação do requerimento relativo aos juros de pré-amortização.
Além disso, a tese recursal em questão é até mesmo contraditória com os próprios argumentos das rés de "legitimidade da cobrança dos juros de obra"; na defesa da instituição financeira, ela própria aduz ser legítima a cobrança do referido encargo, o qual menciona ter sido pago de forma consciente pelo consumidor, não havendo falar em qualquer cobrança indevida.
Após o deferimento da tutela de urgência em primeiro grau (evento 3), sobreveio informação do Banco de "cumprimento da decisão liminar de suspender a exigibilidade dos valores relativos aos juros de pré-amortização referente ao contrato objeto da lide" (evento 16/1º grau), de modo que não há como dar guarida à alegação de ausência de documento indispensável e prova de pagamento.
Também é oportuno registrar trecho da inicial (evento 1/1º grau):
Segundo dito, a famigerada quantia seria uma garantia de que a obra seja concluída em caso de falência da construtora, ou perda de sua capacidade financeira. Utilizando como prova emprestada (art. 372 do CPC/15), junta-se peças de outras duas ações movidas contra as Rés, em que os Autores confirmam que a quantia a ser paga foi informada como sendo um seguro (Processos n° 0310179- 20.2016.8.24.0064 e 0311401-23.2016.8.24.0064). Na matéria realizada junto ao Jornal do Meio Dia, exibido na Ric Tv Record, os adquirentes também afirmaram que pagam um seguro no valor de R$ 600,00 mensais.
Indagada sobre quanto seria o valor do aludido débito, a gerente do Banco do Brasil informou de que as parcelas não ultrapassariam a quantia de R$ 50,00 mensais. Porém, o que se viu no decorrer das cobranças foi um débito crescente. No início realmente foi cobrado abaixo de R$ 50,00, mas em poucos meses esse valor aumentou, chegando, atualmente, em patamares próximos ao valor final da parcela de amortização do financiamento (R$ 521,07 - vide item "C.21.1" do quadro resumo).
Importante registrar que a parte Autora é pessoa humilde e pouco entendida nas questões bancárias, tendo conseguido apenas os extratos de alguns meses da conta. Requereu em balcão tais extratos. Porém o Banco do Brasil cobrou a quantia de R$ 2,50 por mês, um verdadeiro absurdo, motivo pelo qual, com base no direito processual da inversão do ônus da prova, desde já se requer a determinação para que o Banco do Brasil junte aos autos todos os extratos de conta corrente do Autor, desde a assinatura do contrato de financiamento imobiliário, até os dias de hoje.
Por tal razão o Juízo a quo determinou a remessa da apuração desses valores para a fase de liquidação de sentença, oportunidade na qual, nos termos da sentença, "deverão ser comprovados os respectivos desembolsos pela parte autora, bem como definida a data em que houve a última cobrança dos encargos financeiros sem amortização do capital" (evento 66/1º grau).
Logo, não merece acolhida a preliminar de inépcia da inicial.
4 MÉRITO
4.1 Responsabilidade pelo atraso na entrega da obra
A ré Jat Engenharia, em suas razões recursais, sustenta a validade do contrato firmado entre as partes e do termo de entrega do imóvel ao autor, inequivocamente no seu entender dentro do prazo contratual, o que por si só não enseja qualquer tipo de indenização. Aduz que "o contrato foi assinado em 25-5-2014 com data de entrega para 22-11-2016, já computado o prazo de tolerância; não obstante, a parte autora repactuou a data de entrega ao assinar o contrato acostado no Evento 1/INF 13 a 14 em 20-8-2014, com entrega para 24 meses, mais o prazo de tolerância, o que findaria em 20-2-2017" (fl. 8 das razões recursais), fatos desconsiderados na sentença. Afirma que após constatados os atrasos financeiros por parte do Banco, as partes readaptaram os contratos e seus respectivos recebimentos, o que é completamente lícito, pois após ultrapassados os 15% de vendas exigidos pelo Banco, os demais 85% dos contratos foram readaptados em relação aos prazos de entrega e os adquirentes estavam completamente cientes. Pontua que só a valorização do imóvel já é mais que suficiente para indenizar qualquer valor e gerar lucro ao adquirente. Ressalta que embora "a parte apelada alegue que a placa fixada em frente ao empreendimento previa a entrega em janeiro de 2016 e a Magistrada busque contrato alheio às partes para fundamentar uma decisão completamente maculada, ignorando a repactuação do Evento 1/ INF 13 a 14, por força dos princípios do pacta sunt servanda e da boa-fé objetiva, as partes se obrigaram ao cumprimento do contrato" (fl. 9 das razões recursais). Aduz que a entrega em 6-4-2017, aproximadamente dois meses após o prazo pactuado livremente entre as partes (20-2-2017), não gera dever indenizatório, sendo equivocado o arbitramento da mora em 20-7-2016, porquanto sem qualquer parâmetro ou base legal e fulcrado em contrato firmado entre a construtora e o banco, ignorando-se os dois contratos firmados com o autor. Sustenta ter cumprido com suas obrigações contratuais e imputa ao banco requerido a culpa exclusiva (ou subsidiariamente a culpa solidária) pelo atraso na conclusão do empreendimento - especialmente em razão do não repasse tempestivo dos valores contratados -, sendo parte legítima para responder ao litígio, por ter atuado como agente fiscalizador, e não mero financiador. Tece comentários no sentido de que o programa "minha casa, minha vida" virou na seara judicial uma loteria à parte adquirente.
O Banco acionado, de sua vez, alega em sua irresignação recursal não ter responsabilidade pelo atraso na entrega da obra, notadamente porque, "na qualidade de agente financeiro do contrato de financiamento para construção do imóvel, não possui a responsabilidade de fiscalizar os materiais e/ou técnicas empregadas na construção dos imóveis que financia; portanto, inexiste este dever de fiscalização por parte do apelante, sendo mero financiador do imóvel adquirido pelo apelado" (fl. 9 das razões recursais). Imputa responsabilidade exclusiva pela condução da obra à corré Jat Engenharia, não sendo ao seu ver caso de responsabilidade solidária. Afirma não ter praticado qualquer ato ilícito ou falha na prestação dos serviços, pois ao seu ver todas as suas atitudes se deram em estrita observância aos normativos que regem o sistema financeiro. Explica que "o contrato firmado com a apelada suscita apenas disponibilização de um empréstimo em dinheiro para a compra do imóvel, inexiste relação jurídico-material entre o Banco do Brasil e a apelada concernente à execução da obra, configurando, portanto a sua ilegitimidade para ocupar o polo passivo da demanda" (fl. 12 das razões recursais).
Por fim, o autor aduz, em seu apelo, que a mora das rés foi limitada à data da expedição do "Habite-se" (21-12-2017), mesmo ocorrendo a entrega do imóvel para o fim a que se destina em data posterior (14-6-2018), o que impõe, ao seu ver, o reconhecimento do termo final da responsabilidade pelo atraso na obra no momento da imissão definitiva na posse do imóvel, conforme também reconhecido nas ações de reintegração de posse n. 0302091-22.2018.8.24.0064 e imissão na posse n. 0302339-85.2018.8.24.0064. Explica que os adquirentes receberam as chaves dos apartamentos no ano de 2017, mas apenas para a realização de pequenas reformas e instalação de móveis, em horários e dias pré-determinados pela construtora, sem qualquer possibilidade de utilização dos bens para moradia, havendo a instituição do condomínio Quinta de Potecas apenas em maio de 2018. Sustenta, ainda, a ilegalidade do prazo de tolerância, devendo ser fixada a mora a partir de 20-1-2016, em atendimento ao princípio da interpretação mais favorável ao consumidor.
A questão foi analisada na sentença nesses termos:
Do atraso na entrega da obra e da legalidade da cláusula de prorrogação de prazo.
Em 22/05/2014 o autor firmou contrato particular de promessa de compra e venda de bem imóvel com a construtora JAT Engenharia e Construções Ltda. (evento 1, inf. 9),  cujo empreendimento é objeto de hipotecado em favor do Banco do Brasil, substituto da construtora em caso de atraso na obra, nos termos da cláusula décima nona do contrato de financiamento bancário (evento 1, inf. 13, p. 29 do contrato).
Dispõe o contrato que a entrega do empreendimento deveria ocorrer no prazo de 24 (vinte e quatro) meses a partir da conclusão da fundação quando então serão iniciadas as obras (quadro VII, "a"), e que "poderá prorrogação por até 180 (cento e oitenta) dias úteis, se sobrevierem casos [...] que afetem o normal andamento das obras" (quadro VII, "b").
O Superior Tribunal de Justiça - STJ admitiu a validade da cláusula de prorrogação de prazo os contratos de imóveis comprados na planta:
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. ATRASO DA OBRA. ENTREGA APÓS O PRAZO ESTIMADO. CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA. VALIDADE. PREVISÃO LEGAL. PECULIARIDADES DA CONSTRUÇÃO CIVIL. ATENUAÇÃO DE RISCOS. BENEFÍCIO AOS CONTRATANTES. CDC. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. OBSERVÂNCIA DO DEVER DE INFORMAR. PRAZO DE PRORROGAÇÃO. RAZOABILIDADE. 
1. Cinge-se a controvérsia a saber se é abusiva a cláusula de tolerância nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel em construção, a qual permite a prorrogação do prazo inicial para a entrega da obra. 
2. A compra de um imóvel "na planta" com prazo e preço certos possibilita ao adquirente planejar sua vida econômica e social, pois é sabido de antemão quando haverá a entrega das chaves, devendo ser observado, portanto, pelo incorporador e pelo construtor, com a maior fidelidade possível, o cronograma de execução da obra, sob pena de indenizarem os prejuízos causados ao adquirente ou ao compromissário pela não conclusão da edificação ou pelo retardo injustificado na conclusão da obra (arts. 43, II, da Lei nº 4.591/1964 e 927 do Código Civil). 
3. No contrato de promessa de compra e venda de imóvel em construção, além do período previsto para o término do empreendimento, há, comumente, cláusula de prorrogação excepcional do prazo de entrega da unidade ou de conclusão da obra, que varia entre 90 (noventa) e 180 (cento e oitenta) dias: a cláusula de tolerância. 
4. Aos contratos de incorporação imobiliária, embora regidos pelos princípios e normas que lhes são próprios (Lei nº 4.591/1964), também se aplica subsidiariamente a legislação consumerista sempre que a unidade imobiliária for destinada a uso próprio do adquirente ou de sua família. 
5. Não pode ser reputada abusiva a cláusula de tolerância no compromisso de compra e venda de imóvel em construção desde que contratada com prazo determinado e razoável, já que possui amparo não só nos usos e costumes do setor, mas também em lei especial (art. 48, § 2º, da Lei nº 4.591/1964), constituindo previsão que atenua os fatores de imprevisibilidade que afetam negativamente a construção civil, a onerar excessivamente seus atores, tais como intempéries, chuvas, escassez de insumos, greves, falta de mão de obra, crise no setor, entre outros contratempos.
6. A cláusula de tolerância, para fins de mora contratual, não constitui desvantagem exagerada em desfavor do consumidor, o que comprometeria o princípio da equivalência das prestações estabelecidas. Tal disposição contratual concorre para a diminuição do preço final da unidade habitacional a ser suportada pelo adquirente, pois ameniza o risco da atividade advindo da dificuldade de se fixar data certa para o término de obra de grande magnitude sujeita a diversos obstáculos e situações imprevisíveis. 
7. Deve ser reputada razoável a cláusula que prevê no máximo o lapso de 180 (cento e oitenta) dias de prorrogação, visto que, por analogia, é o prazo de validade do registro da incorporação e da carência para desistir do empreendimento (arts. 33 e 34, § 2º, da Lei nº 4.591/1964 e 12 da Lei nº 4.864/1965) e é o prazo máximo para que o fornecedor sane vício do produto (art. 18, § 2º, do CDC). 
8. Mesmo sendo válida a cláusula de tolerância para o atraso na entrega da unidade habitacional em construção com prazo determinado de até 180 (cento e oitenta) dias, o incorporador deve observar o dever de informar e os demais princípios da legislação consumerista, cientificando claramente o adquirente, inclusive em ofertas, informes e peças publicitárias, do prazo de prorrogação, cujo descumprimento implicará responsabilidade civil. Igualmente, durante a execução do contrato, deverá notificar o consumidor acerca do uso de tal cláusula juntamente com a sua justificação, primando pelo direito à informação. 
9. Recurso especial não provido. (STJ. Resp. nº 1.582.318 - RJ).
Não obstante este entendimento, na hipótese, não foi indicada data para o início das obras, o que ocorreria "a partir da conclusão da fundação". Outrossim, o contrato firmado em 20/08/2014 entre a construtora, o Banco do Brasil e o autor (comprador/devedor fiduciante), prevê o prazo de construção de 18 (dezoito) meses (evento 1, inf. 13 , cláusula B 4. p. 3 do contrato).
Por sua vez, o contrato firmado entre a construtora e o Banco do Brasil para o financiamento da construção (documentos anexados nos autos nº 0311476-96.2015.8.24.0064), prevê a data de entrega da obra em 20/01/2016.
Sem embargo disso, consta da placa fixada em frente da obra durante a construção, a previsão de início em 20/01/2014 e término em 20/01/2016 (evento 1, inf. 33). Por sua vez, o registro da construção na matrícula do imóvel é de 07/02/2014 (evento 1, inf. 7).
A data a ser considerada para a entrega das obras é a que consta do contrato firmado entre a construtora e o Banco do Brasil para o financiamento da construção, qual seja, 20/01/2016.
Segundo a parte ré, o empreendimento não foi entregue na data inicial prevista em razão dos seguintes fatores: a) longo período de chuvas, muito acima da média no segundo semestre de 2015; b) ausência de repasse de valores pelo banco do Brasil para a construtora.
Sem embargo disso, observo que os fatos climáticos mencionados como circunstâncias alheias que obstaram o término tempestivo das obras, são inerentes à atividade econômica da construtora e certamente foram considerados na cláusula de tolerância. 
Também é necessário destacar que há notícia de que o Banco do Brasil não liberou para a construtora os valores necessários para a execução das obras, fato que não pode ser oponível ao consumidor, pois é terceiro estranho à relação havida entre as pessoas jurídicas.
Com efeito, as cláusulas que transferem ao consumidor os riscos da atividade desenvolvida pelo fornecedores são nulas de pleno direito (art. 51, IV, do CDC), e eventual culpa da instituição financeira deve ser apurada em ação própria, pela construtora, se assim entender de direito.
Ressalto que o imóvel foi entregue ao autor em 06/04/2017 (evento 15, inf. 77), e o habite-se emitido em 21/12/2017 (evento 15, inf. 78), ultrapassando em muito os prazos informados ao consumidor. 
O atraso na entrega do empreendimento ocorreu por culpa exclusiva da parte ré, cuja mora na hipótese destes autos, restou configurada em 20 de julho de 2016 (20 de janeiro de 2016 + 180 dias da cláusula de tolerância).
Da modificação da alínea "a' do quadro VII - do prazo estimado para a entrega das obras.
O pedido de modificação da referida cláusula resta prejudicado, na medida em que a data de 20/01/2014 foi considerada como início das obras pela parte ré, e a data de 20/01/2016 como término das obras, conforme contrato firmado entre a construtora e o Banco do Brasil para o financiamento da construção, lapsos temporais que foram considerados nesta sentença.
A sentença, contudo, merece alguns ajustes, não obstante mantido o reconhecimento da responsabilidade solidária de ambas as rés pelo descumprimento contratual (atraso na entrega do imóvel adquirido pelo autor).
Com relação à legitimidade passiva do Banco do Brasil, tal questão já foi objeto de apreciação no tópico 2 deste voto, e a tese da ré Jat Engenharia, no que diz respeito ao reconhecimento da responsabilidade solidária do Banco, beira a ausência de interesse recursal, uma vez que a sentença já reconheceu a solidariedade das rés para responderem pelos prejuízos causados ao consumidor.
De qualquer sorte, afastando-se do excesso de formalismo e primando pelo julgamento do mérito (abordagem ampla das teses dos apelos e das contrarrazões), deixa-se de declarar o não conhecimento parcial do recurso da construtora nesse ponto, até mesmo tendo em vista a pretensão recursal do próprio Banco de afastamento de sua responsabilidade, bem como a tese de imputação de culpa exclusiva da instituição financeira pela construtora.
Quanto à questão da responsabilidade do Banco propriamente dita, e como também já antecipado no referido tópico 2 ao serem citadas várias cláusulas contratuais, o requerido não apenas atuou na hipótese como agente financiador, mas primordialmente como executor/fiscalizador; houve atuação conjunta dos réus tanto na fase de construção, quanto na fase de vendas dos imóveis (inclusive aqueles sem financiamento - cláusula 21ª, fl. 17, item 19 do evento 1/1º grau). Além disso, havia a possibilidade de a instituição financeira substituir a construtora requerida em caso de não conclusão da obra dentro do prazo contratual (cláusula 19ª, fl. 29, item 13 do evento 1/1º grau), situação que igualmente denota ter sua atuação ultrapassado a figura de mero agente financeiro.
No ano de 2012, o Superior Tribunal de Justiça fez importante distinção sobre a diferença entre agentes financeiros e agentes executores atuantes no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, constando do Recurso Especial n. 1.163.228/AM (rela. Mina. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. 9-10-2012) trecho elucidativo:
Nas hipóteses em que a CEF atua meramente como agente financeiro em sentido estrito, não vejo, via de regra, como atribuir-lhe, sequer em tese - o que seria necessário para o reconhecimento da legitimidade passiva ad causam - responsabilidade por eventual defeito de construção da obra financiada.
A mera circunstância de o contrato de financiamento ser celebrado durante a construção, ou no mesmo instrumento do contrato de compra e venda firmado com o vendedor, não implica, a meu sentir, a responsabilidade do agente financeiro pela solidez e perfeição da obra.
Não se trata, aqui, de cadeia de fornecedores a ensejar solidariedade, porque as obrigações de construir e de fornecer os recursos para a obra são substancialmente distintas, guardam autonomia, sendo sujeitas a disciplina legal e contratual própria. O adquirente tem liberdade para escolher, independentemente, construtora e instituição financeira, pode optar por não financiar, pagando à vista mediante desconto, ou obter financiamento da própria construtora.
Nesta hipótese, a instituição financeira só tem responsabilidade pelo cumprimento das obrigações que assume para com o mutuário referentes ao cumprimento do contrato de financiamento, ou seja, a liberação do empréstimo, nas épocas e condições acordadas, tendo por contrapartida a cobrança dos encargos também estipulados no contrato.
Figurando ela apenas como financiadora, em sentido estrito, não tem responsabilidade sobre a perfeição do trabalho realizado pela construtora escolhida pelo mutuário, não responde pela exatidão dos cálculos e projetos, e muito menos pela execução dos serviços desenvolvidos por profissionais não contratados e nem remunerados pelo agente financeiro.
Ressalto que impor ao agente financeiro, quando atua apenas nesta qualidade, o ônus de responder por vício de construção, em caráter solidário, sem previsão legal e nem contratual (art. 896 do Código Civil), sem nexo com a atividade típica desenvolvida pelas instituições financeiras, implicaria aumentar os custos da generalidade dos financiamentos imobiliários do SFH, pois a instituição financeira passaria a ter que contar com quadros de engenheiros para fiscalizar, diariamente, a correção técnica, os materiais empregados e a execução de todas as obras por ela financiadas, passo a passo, e não apenas para fiscalizar, periodicamente, o correto emprego dos recursos emprestados.
Nestes casos em que atua como agente financeiro estrito senso, a previsão contratual e regulamentar de fiscalização da obra, pela CEF, tem o óbvio motivo de que ela está financiando o investimento, tendo, portanto, interesse em que o empréstimo seja utilizado para os fins descritos no contrato de financiamento, cujo imóvel lhe é dado em garantia hipotecária. Se constatar a existência de fraude, ou seja, que os recursos não estão sendo integralmente empregados na obra, poderá rescindir o contrato de financiamento. Em relação à construtora, a CEF tem o direito e não o dever de fiscalizar. O dever de fiscalizar surge perante os órgãos integrantes do Sistema Financeiro da Habitação, podendo ensejar sanções administrativas, mas não ser invocado pela construtora, pela seguradora ou pelos adquirentes das unidades para a sua responsabilização direta e solidária por vícios de construção.
[...].
Ressalto que, ao meu sentir, o relevante para a definição para legitimidade passiva da instituição financeira não é propriamente ser o empreendimento de alta ou baixa renda e nem a existência, pura e simples, de cláusula, no contrato, de exoneração de responsabilidade. O que importa é a circunstância de a CEF exercer papel meramente de instituição financeira, ou, ao contrário, haver assumido outras responsabilidades concernentes à concepção do projeto, escolha do terreno, da construtora, aparência perante o público alvo de co-autoria do empreendimento, o que deve ser apreciado consonante as circunstâncias legais e de fato do caso concreto.
É certo que, em geral, tais atividades desbordantes da atividade financeira típica são desempenhadas especialmente nos programas destinados às classes sociais mais carentes, no exercício, muitas vezes, de funções delegadas pelo Governo Federal, eventualmente com escassa margem de lucro, dificuldade de retorno de capital e até mesmo, em algumas situações, com recursos públicos orçamentários da União ou de programas federais. Nestes casos, a responsabilidade da CEF, promotora ou parceira do empreendimento, deverá ser aferida com base no nexo de causalidade entre os serviços de sua alçada e o dano alegado na inicial, conforme a legislação própria, a qual pode exorbitar o âmbito do direito civil e do consumidor, aproximando-se dos princípios de direito administrativo e constitucional.
Em síntese, diversamente do que ocorre quando atua como agente financeiro em sentido estrito, considero, em princípio, ter a CEF legitimidade para responder por vícios de construção nos casos em que promoveu o empreendimento, teve responsabilidade na elaboração do projeto com suas especificações, escolheu a construtora e/ou negociou os imóveis, ou seja, quando realiza atividade distinta daquela própria de agente financeiro estrito senso (cf. voto-vista proferido no Recurso Especial nº 738.071- SC, julgado em 9.8.2011, Quarta Turma, relator Min. Luis Felipe Salomão).
Tais fundamentos foram replicados em parte no julgamento do Recurso Especial n. 1.534.952/SC (rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 7-2-2017), citado na sentença ora apelada, o qual versa especificamente sobre a legitimidade e responsabilidade de instituição financeira para responder pelo atraso na entrega de imóvel financiado com recursos destinados ao Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), situação idêntica ao caso em análise.
Assim, não apenas a legitimidade passiva do Banco do Brasil está configurada, como também a sua responsabilidade solidária para responder pelos danos decorrentes do atraso da obra, relativos às inadequações no cumprimento das obrigações insertas na Lei n. 11.977/2009.
Os papéis desenvolvidos em parceria pela construtora e pelo agente financeiro evidenciaram a vinculação de ambos ao conjunto do "negócio da aquisição da casa própria", ou seja, perante o público alvo há aparência de coautoria do empreendimento, daí por que também não assiste razão à construtora requerida (indubitavelmente responsável pela execução da obra) na tese de imputação de responsabilidade exclusiva do banco.
O precedente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região anexado nas razões recursais da construtora (evento 138/1º grau) não trata da temática relativa à responsabilidade solidária da instituição financeira e da incorporadora, mas apenas sobre a possibilidade de o Banco ser condenado a indenizar os prejuízos sofridos pelos adquirentes em "contrato de financiamento no qual a Caixa Econômica Federal se responsabilizou não só em conceder o empréstimo para aquisição da casa própria, mas também pela entrega do imóvel em prazo ajustado".
Assim, eventual delimitação de responsabilidade entre as partes rés (parceiras no empreendimento) pelos fatos ocorridos no Condomínio Quinta de Potecas, notadamente oriunda da alegação da construtora de falta de repasse de valores pelo Banco, deve ser objeto de demanda própria, na qual o consumidor/adquirente do imóvel não seja a parte diretamente prejudicada.
No que diz respeito ao prazo de entrega do empreendimento, sabe-se que o Superior Tribunal de Justiça, em recurso representativo de controvérsia (tema 996), examinou a questão dos prazos condicionais que vinculam a entrega da obra a evento futuro e incerto, assentando a seguinte tese: "na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deverá estabelecer, de forma clara, expressa e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel, o qual não poderá estar vinculado à concessão do financiamento, ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância" (REsp n. 1.729.593/SP, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, j. 25-9-2019).
No inteiro teor do julgamento consta tal trecho:
O fato, portanto, de o contrato ser regido por regras de crédito associativo, a meu sentir, não pode ser utilizado como argumento para justificar a estipulação de prazo alternativo e aberto à conclusão da obra, assim como prevaleceu no Colegiado local, haja vista que os negócios firmados sob a disciplina do PMCMV não retiram do promitente vendedor o ônus relacionado ao risco da atividade econômica, além de serem lucrativos para as empresas nele envolvidas. [...]
De nada adianta, por conseguinte, a estipulação de um prazo certo e expresso, assim como entendeu o acórdão impugnado, se ele for fixado de maneira apenas estimativa e condicional, ficando vinculado, ainda, a um evento futuro, no caso, à data de obtenção do financiamento pelo adquirente ou àquela que for determinada pelo agente financeiro no referido contrato. Isso acaba por atribuir à incorporadora o direito de postergar a entrega da obra por prazo excessivamente longo e oneroso para o comprador, a ponto de afastar, inclusive, o próprio risco da atividade, que pertence à empresa. [...]
É impositivo que as incorporadoras, portanto, mediante programação administrativa e econômico-financeira prévia, estabeleçam em seus contratos o prazo para a entrega do imóvel de maneira indene de dúvidas, utilizando-se de critérios dotados de objetividade e clareza, que não estejam vinculados a nenhum negócio jurídico futuro, ainda que este se encontre associado a uma das etapas da contratação ou da realização da obra, como no caso, à data da obtenção do financiamento. Somente assim, estarão preservados os primados do direito à informação, da transparência e da boa-fé, além de assegurar às partes o necessário equilíbrio contratual, que respeite as prestações e contraprestações envolvidas.
À luz desta orientação, o prazo estabelecido pelo instrumento contratual para a entrega da obra deve estar expresso e claro na avença, de modo que revela-se abusiva qualquer vinculação a outro negócio.
No presente caso, conforme se verifica do "quadro VII", alínea "a", do contrato particular de promessa de compra e venda de bem imóvel firmado entre o autor e a construtora em 22-5-2014 (fl. 4 do item 9 do evento 1/1º grau), é latente a abusividade da cláusula que condiciona a fluência do prazo (incontroversamente de 24 meses) para início das obras à conclusão da fundação, esta sem prazo determinado, pois fica condicionado a evento futuro e incerto, em manifesta desvantagem negocial, prática vedada pelo art. 39, XII, da Lei n. 8.078/1990:
Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:[...].XII - deixar de estipular prazo para o cumprimento de sua obrigação ou deixar a fixação de seu termo inicial a seu exclusivo critério.
O Código de Defesa do Consumidor ainda complementa: "art. 51: são nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: [...] IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade".
Logo, realmente não há como estabelecer os exatos termos de início e fim da obra com base naquele contrato originário, porquanto omisso. Não obstante, há outros elementos probatórios nos autos que servem para a fixação do lapso temporal.
Em primeiro lugar, há o contrato de financiamento firmado em 20-8-2014 entre o Banco do Brasil e o autor, sendo interveniente a construtora ré, no qual expressamente constou "o prazo para a execução da construção será 24 (vinte e quatro) meses" (cláusula B.4, fl. 3, item 13 do evento 1/1º grau) e a "data prevista para o término do prazo de construção: 20-1-2016" (cláusula C.9, fl. 3, item 13 do evento 1/1º grau). Na sentença ora apelada constou equivocadamente a indicação do prazo como sendo de 18 (dezoito) meses.
Ao contrário do que tenta fazer crer a ré Jat Engenharia, não há falar que o contrato de financiamento modificou o início da contagem do prazo de 24 (vinte e quatro) para a execução da obra, porquanto não se trata de repactuação do contrato particular de promessa de compra e venda de bem imóvel firmado entre o autor e a construtora.
Além disso, a alegação recursal da construtora nem mesmo encontra suporte contratual, pois não há cláusula expressa no sentido de ser contado o prazo de 24 (vinte e quatro) da assinatura do ajuste (em 20-8-2014) e, de outro lado, ainda há expressamente no referido ajuste de financiamento, do qual participou como anuente, a data do término da construção, qual seja, 20-1-2016.
Como se não bastasse, houve fixação de placa oficial em frente à obra indicadora de que o Residencial Quinta de Potecas seria construído a partir de 20-1-2014 e finalizado em 20-1-2016, como se extrai da fotografia colacionada no item 33 do evento 1/1º grau.
Nos termos do art. 30 da Lei Consumerista, "toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado".
Assim, tendo em vista que a "publicidade suficientemente precisa" integra o contrato e que "as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor" (art. 47 do CDC), deve prevalecer o dia 20-1-2016 como a data inicialmente prevista para o término da obra, daí por que a sentença merece ser mantida no ponto, ainda que em parte por fundamento diverso.
É que a Magistrada a quo elege na sentença, entre outros fundamentos acessórios, como dia da entrega da obra "a data do contrato firmado entre a construtora e o Banco do Brasil para o financiamento da construção, qual seja, 20/01/2016" (evento 66/1º grau). Em tal ajuste não houve a participação do consumidor.
No entanto, como visto acima, nem mesmo é preciso utilizar tal lapso temporal na hipótese (não obstante coincidentemente apresente a mesma data: 20-1-2016), pois há outros elementos probatórios nos autos mais seguros: o contrato de financiamento firmado entre o autor, o Banco e a construtora, e a placa publicitária, ambos incontroversamente de conhecimento de todas as partes negociantes.
Com relação ao prazo de tolerância, dispõe o art. 43-A da Lei n. 13.786/2018 que "a entrega do imóvel em até 180 (cento e oitenta) dias corridos da data estipulada contratualmente como data prevista para conclusão do empreendimento, desde que expressamente pactuado, de forma clara e destacada, não dará causa à resolução do contrato por parte do adquirente nem ensejará o pagamento de qualquer penalidade pelo incorporador".
O tema também restou consolidado no Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial repetitivo n. 1.729.593/SP (rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, j. 25-9-2019) e reiteradamente vem se decidindo sobre a matéria: "validade da cláusula de tolerância, desde que limitada ao prazo de 180 dias corridos" (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.884.607/MG, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, j. 20-9-2021); "a cláusula de tolerância, para fins de mora contratual, não constitui desvantagem exagerada em desfavor do consumidor, o que comprometeria o princípio da equivalência das prestações estabelecidas" (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.702.692/RJ, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 30-11-2020); "é válida a cláusula de tolerância, desde que observado o direito de informação do consumidor" (AgInt no REsp n. 1.869.783/SP, rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, j. 16-11-2020); "é firme a jurisprudência do STJ no sentido de que, apesar de não considerar abusiva a cláusula de tolerância, deve-se respeitar o prazo máximo de 180 dias para fins de atraso da entrega da unidade habitacional, sob pena de responsabilização" (AgInt no REsp n. 1.737.415/SP, rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 24-9-2019).
Diante dos precedentes mencionados sobre a matéria, conclui-se que a Corte Superior consolidou as seguintes premissas: (a) é válida a cláusula de tolerância que prevê a prorrogação da entrega do imóvel; (b) o prazo máximo da cláusula de tolerância é de 180 (cento e oitenta) dias corridos; (c) a cláusula de tolerância não configura desvantagem excessiva ao comprador/consumidor; (d) a redação da cláusula de tolerância deve ser clara, expressa e inteligível; e (e) se utilizada a cláusula de tolerância a construtora deve informar ao consumidor e oferecer sua justificativa.
O referido Tribunal Superior entende que, dentro daquele período, "a empresa poderá superar eventuais imprevistos relacionados a fortuitos internos como falta de mão de obra, entraves burocráticos ou fatores climáticos", como se extrai do voto proferido naquele precedente vinculante acima descrito (REsp n. 1.729.593/SP - Tema 996), que ainda destaca outros julgados: REsp n. 1.727.939/DF, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe de 17-9-2018; REsp n. 1.582.318/RJ, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe de 21-9-2017; AgInt no REsp n. 1.698.519/SP, rela. Mina. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe de 26-9-2018; e REsp n. 1.454.139/RJ, rela. Mina. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe de 17-6-2014.
In casu, embora a sentença transcreva parte da cláusula de tolerância ("poderá haver prorrogação por até 180 (cento e oitenta) dias úteis" - fl. 4 do item 9 do evento 1/1º grau) e não faça apontamento específico sobre a impossibilidade de contagem em "dias úteis", o cálculo da sentenciante para a fixação da mora computou corretamente "dias corridos"; e não houve recurso das rés nesse tocante.
Além disso, razão não assiste ao demandante quando afirma que as "condições e formas para utilização" da cláusula de tolerância não foram demonstradas na hipótese. Este Tribunal de Justiça já decidiu que "o entendimento firmado pela Corte da Cidadania tem supedâneo, entre outros motivos, na complexidade de fatores que envolvem a definição de prazo de vencimento certo para o cumprimento de obrigação na área da construção civil, dentre os quais a imprevisibilidade das chuvas que cairão no período de execução das obras" (TJSC, Apelação n. 0312461-94.2017.8.24.0064, rel. Carlos Roberto da Silva, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 13-7-2023).
Por todas essas razões, rejeita-se o apelo do autor no ponto, o qual pretendia o afastamento da incidência da cláusula de tolerância, porquanto válida, não exatamente nos termos em que lançada no contrato (dias úteis), mas conforme a previsão do art. 43-A da Lei n. 13.786/2018, ou seja, 180 (cento e oitenta) dias corridos.
Fixadas essas premissas, acrescidos 180 (cento e oitenta) dias corridos à data prevista para entrega do imóvel (20-1-2016), estaria configurada a mora das partes requeridas decorrente do atraso na entrega da obra a partir de 18-7-2016.
Contudo, a sentença fixou a data da mora a partir de 20-7-2016 e não houve recurso das partes especificamente quanto à referida contagem, de modo que deve ser mantido o prazo indicado na sentença.
Anota-se, em consequência, a rejeição implícita das teses recursais da construtora requerida no sentido de que (a) a valorização do imóvel já seria mais que suficiente para indenizar o adquirente, (b) a entrega em 6-4-2017, aproximadamente dois meses após o prazo pactuado livremente entre as partes, não deve gera qualquer dever indenizatório e (c) o cumprimento das obrigações contratuais foi integral, sendo mera aventura jurídica o ajuizamento do presente feito.
Por fim, quanto ao termo final da mora das requeridas, assiste razão ao pleito recursal do autor de não limitação à data de expedição do "Habite-se" (21-12-2017), porquanto a posse definitiva do bem para fim de moradia ocorreu apenas em 14-6-2018, conforme consta das ações de reintegração de posse n. 0302091-22.2018.8.24.0064 e imissão na posse n. 0302339-85.2018.8.24.0064, julgadas em segunda instância por esta Quarta Câmara de Direito Civil (lides referentes ao Condomínio Quinta de Potecas).
O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Tema 996, assim decidiu: "no caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma" (REsp n. 1.729.593/SP, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, j. 25-9-2019, grifo acrescido).
Consta ainda do inteiro teor do referido julgado, que "a expedição do Habite-se é ato formal que atesta a regularidade administrativa do empreendimento, possibilitando sua averbação junto ao Cartório de Registro Imobiliário com vistas à subsequente instituição do condomínio edilício".
No presente caso, conforme o contrato anexado à exordial (item 9), a prestação assumida pela incorporadora não é somente a de entrega física da unidade autônoma, mas também a de sua entrega jurídica; portanto, não basta a mera obtenção do habite-se para considerar encerrada a mora, mas também a entrega definitiva das chaves e a respectiva imissão definitiva na posse, ocorrida em 14-6-2018, conforme se extrai da réplica apresentada pela construtora na ação de reintegração de posse n. 0302091-22.2018.8.24.0064, in verbis:
Diga-se mais, a medida liminar foi cumprida e as unidades habitacionais invadidas foram desocupadas no final do mês de abril do corrente ano. Assim, durante o mês de maio a autora, JAT Engenharia e Construções Ltda., conseguiu constituir o condomínio (Assembleia dia 08/05/2018), permitindo assim, que o síndico eleito, efetuasse a inscrição do condomínio junto à Receita Federal, com a emissão do CNPJ, viabilizando a contratação do seguro e a assinatura do contrato de comodato para fornecimento de gás, possibilitando a entrega definitiva das unidades aos adquirentes no dia 14/06/2018.
Nesse andar, o recurso do autor é provido nesse ponto.
Estabelecida a responsabilidade solidária das partes acionadas pelo atraso na entrega do imóvel adquirido pelo autor, bem como os termos inicial (20-7-2016) e final (14-6-2018) de sua incidência, passa-se à apreciação dos danos relatados na inicial.
Faz-se um adendo, contudo, que em relação ao termo final da condenação relativa aos juros de pré-amortização (tratado no tópico subsequente deste voto - 4.2), haverá um pequeno ajuste em razão da natureza do instituto.
4.2 Juros de pré-amortização
O requerido Banco do Brasil aduz em seu apelo a legalidade da taxa de evolução da obra prevista expressamente no contrato firmado com o autor, a qual é estipulada pela construtora para minimizar o seu prejuízo no que se refere aos juros decorrentes do financiamento adquirido com a instituição financeira para viabilizar o empreendimento, de modo que entende pela impossibilidade de qualquer restituição de valor pago sob esta rubrica ou, subsidiariamente, que a restituição seja realizada apenas pela construtora.
De sua vez, a ré Jat Engenharia sustenta em suas razões recursais não possuir ingerência sobre os juros de pré-amortização (juros de obra ou seguro obra), porquanto decorrentes de contrato de financiamento firmado entre a parte autora e o Banco do Brasil, competindo a este a devolução dos valores cobrados. Afirma que tal rubrica é devida durante o prazo de obra, mas sua cobrança deve obrigatoriamente cessar após a emissão do Habite-se pela municipalidade; contudo, lamentavelmente, o Banco do Brasil, agindo imbuído de completa má-fé, continuou cobrando os juros de pré-amortização dos clientes, mesmo ciente de que o Condomínio foi entregue oficialmente após emissão do Habite-se em 21-12-2017.
Por outro lado, com relação à condenação de ressarcimento dos juros de obra, o autor requerer em seu apelo que o termo final seja "até que se inicie a fase de amortização do contrato".
Sobre tais juros, a sentença assim decidiu:
Os "juros de obra" (juros de pré-amortização ou compensatórios) incidem sobre o crédito repassado à construtora/incorporadora para construir o empreendimento, isto é, sobre o valor disponibilizado para custear a aquisição do imóvel pelo financiado.
Nessa hipótese, não há amortização do capital financiado, cujo valor segue congelado até a efetiva entrega do bem, de modo que - até a conclusão da obra - o promissário comprador pagará somente encargos como juros, correção monetária, seguro de vida e de danos ao imóvel e, se for o caso, taxa de administração.
A efetiva amortização da dívida inicia com a entrega do bem, momento a partir do qual se torna ilícita a cobrança de "juros de obra", subsistindo apenas aqueles contemplados no valor da parcela de amortização da dívida, passando o devedor a ter a legítima expectativa de destinar seus recursos financeiros à quitação do seu débito. 
O consumidor não pode ser penalizado com o retardo da amortização do capital financiado quando não concorre para o atraso na conclusão da obra e, por conseguinte, na entrega do bem imóvel, tampouco pode ser o fornecedor beneficiado por sua própria inadimplência.
Portanto, é considerada ilícita a cobrança de "juros de obra" após a data prevista no contrato para entrega do imóvel ou - se for o caso - em que finda a prorrogação do prazo de entrega pactuado.
Diz a jurisprudência:
RECURSO ESPECIAL CONTRA ACÓRDÃO PROFERIDO EM INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - IRDR. ART. 1.036 DO CPC/2015 C/C O ART. 256-H DO RISTJ. PROCESSAMENTO SOB O RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA. CRÉDITO ASSOCIATIVO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. CONTROVÉRSIAS ENVOLVENDO OS EFEITOS DO ATRASO NA ENTREGA DO BEM. RECURSOS DESPROVIDOS.1. As teses a serem firmadas, para efeito do art. 1.036 do CPC/2015, em contrato de promessa de compra e venda de imóvel em construção, no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para os beneficiários das faixas de renda 1,5, 2 e 3, são as seguintes:1.1 Na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deverá estabelecer, de forma clara, expressa e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel, o qual não poderá estar vinculado à concessão do financiamento, ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância.1.2 No caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma.1.3 É ilícito cobrar do adquirente juros de obra ou outro encargo equivalente, após o prazo ajustado no contrato para a entrega das chaves da unidade autônoma, incluído o período de tolerância.1.4 O descumprimento do prazo de entrega do imóvel, computado o período de tolerância, faz cessar a incidência de correção monetária sobre o saldo devedor com base em indexador setorial, que reflete o custo da construção civil, o qual deverá ser substituído pelo IPCA, salvo quando este último for mais gravoso ao consumidor.2. Recursos especiais desprovidos. (REsp 1.729.593/SP - destaquei).
Diante desse entendimento e verificada a mora da parte ré na entrega do empreendimento, deverão ser restituídos ao autor os valores pagos a título de "juros da obra", a contar do início do inadimplemento (20/07/2016) até a expedição do "habite-se".
A restituição deverá ocorrer de forma simples, pois não restou comprovada má-fé na cobrança.
Remeto a apuração desses valores para liquidação de sentença, oportunidade em que deverão ser comprovados os respectivos desembolsos pela autora, bem como definida a data em que houve a última cobrança dos encargos financeiros sem amortização do capital, observando-se os termos acima definidos (data de início a mora e data final a expedição do "habite-se").
O decisum comporta parcial reforma.
É sabido que nos contratos de financiamento nos moldes do caso em tela, até que seja concluída a obra, as prestações pagas pelo comprador não amortizam o saldo devedor do contrato, mas apenas os juros de obra (taxa de evolução da obra) estabelecidos contratualmente. Trata-se, portanto, de uma remuneração destinada à instituição financeira pelo financiamento concedido, devida em conformidade com os repasses feitos à incorporadora/construtora, de forma gradativa e de acordo com o avanço das obras.
Ocorre que, diante do atraso na conclusão do empreendimento por culpa das rés, o autor deixou de pagar (foi impedido de começar a quitar no prazo ajustado) o efetivo saldo devedor, adimplindo apenas os juros do investimento até o momento do deferimento da tutela de urgência em primeiro grau.
Assim, o prejuízo do adquirente é notório, devendo, portanto, ser reembolsado, já que não deu causa à demora na finalização da obra, conforme aliás foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no recurso repetitivo citado na sentença, do qual colhe-se o seguinte trecho do inteiro teor (tema 996):
Com efeito, na disciplina do PMCMV, sob a modalidade do crédito associativo, é legal a incidência de juros de obra durante o período de construção do imóvel, cessando a sua aplicação com a entrega da unidade, quando terá início a fase de amortização do saldo devedor do financiamento contratado com o agente financeiro.
Durante esse período, o valor a ser financiado permanece congelado, e até que a obra seja concluída o promissário comprador pagará tão somente encargos que contemplam os juros, atualização monetária, seguro de vida e de danos ao imóvel e, se for o caso, taxa de administração. Após a entrega do bem, inicia-se efetivamente a fase de abatimento da dívida.
No caso, os recorrentes defendem a licitude da cobrança, ainda que configurado o atraso na entrega do imóvel, salvo se o pagamento pelo consumidor referir-se a fatos geradores posteriores ao prazo de conclusão da obra, incluído o prazo de tolerância, ou representar valor superior à remuneração pactuada com a instituição financeira a esse título.
Todavia, havendo atraso na entrega do empreendimento, afigura-se descabido imputar ao adquirente o ônus de arcar com juros de evolução da obra no período de mora da ré até a efetiva entrega das chaves, uma vez que não se pode penalizar o mutuário com referida incidência, considerando não ter sido ele quem deu causa ao atraso.
Desse modo, ultrapassado o prazo para a conclusão das unidades, não podem ser cobrados do adquirente encargos contratados para incidir no período de construção, entre eles, os juros de obra. Isso porque o beneficiário não pode ser responsabilizado pela remuneração do capital empregado na obra quando houver atraso por culpa imputável apenas à promitente vendedora. A cobrança de quaisquer acréscimos ou juros nesse contexto fere a essência de vários princípios norteadores do Código Civil, bem como do Código de Defesa do Consumidor, como a boa-fé objetiva e o equilíbrio contratual.
Entendimento diverso teria o efeito de postergar, de maneira injustificada, o pagamento de valores que são próprios da fase de construção da obra, em seu período regular. Contudo, impõe-se considerar que, superado o período de entrega das chaves, o comprador passa a ter a legítima expectativa de destinar recursos à amortização do saldo do seu débito. O que se frustraria, sem que, para tanto, tenha o consumidor concorrido. Deve-se ter como norte, nessas circunstâncias, o princípio de que quem dá causa ao inadimplemento do contrato não pode se beneficiar da situação, sob pena de o atraso da obra poder representar a possibilidade de vantagem financeira indevida em detrimento do adquirente do imóvel, o que seria de todo inadmissível.
Em casos semelhantes, também já decidiu este Tribunal de Justiça:
APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA - MCMV (LEI N. 11.977/2009). ALEGADA OCORRÊNCIA DE ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. PLEITOS DECLARATÓRIO E DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DA LIDE POR ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA (ART. 485, VI, CPC), DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS INICIAIS (ART. 485, I, CPC) EM RELAÇÃO À CONSTRUTORA CORRÉ E DE IMPROCEDÊNCIA DA RECONVENÇÃO (ART. 485, I, CPC). INSURGÊNCIAS DE AMBOS OS LITIGANTES.[...].JUROS DE PRÉ-AMORTIZAÇÃO (OU "JUROS DE OBRA"). ENCARGOS CUJA INCIDÊNCIA ESTÁ ATRELADA CONTRATUALMENTE À CONCLUSÃO DA FASE DE CONSTRUÇÃO DO IMÓVEL. RÉ QUE OCASIONOU O PROLONGAMENTO DESSA ETAPA AO DESCUMPRIR O PRAZO AVENÇADO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. APLICAÇÃO DO TEMA 996/STJ.[...] (Apelação n. 0312414-23.2017.8.24.0064, rel. Haidée Denise Grin, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 10-8-2023).
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE INVERSÃO DE CLÁUSULA PENAL E DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. SENTENÇA QUE RECONHECEU A ILEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO RÉU E JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS NA AÇÃO PRINCIPAL E NA RECONVENÇÃO.[...].PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO DE ENCARGOS DO CONTRATO BANCÁRIO PAGOS DURANTE O ATRASO. TESE DA CONSTRUTORA DEMANDADA DE QUE O BANCO RÉU DEVE SER RESPONSABILIZADO ISOLADAMENTE. AUTORA QUE PRETENDE A ALTERAÇÃO DO TERMO FINAL DA CONDENAÇÃO. PROVIMENTO APENAS DO APELO DA AUTORA. JUROS DE PRÉ-AMORTIZAÇÃO ATRELADOS AO TÉRMINO DA OBRA. MATÉRIA DEFINIDA PELA CORTE DA CIDADANIA EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO (TEMA 996). REPARAÇÃO DEVIDA SOBRE OS PAGAMENTOS REALIZADOS DURANTE O PERÍODO DE ATRASO E QUE NÃO REDUZIRAM O SALDO DEVEDOR DO CONTRATO BANCÁRIO."É ilícito cobrar do adquirente juros de obra ou outro encargo equivalente, após o prazo ajustado no contrato para a entrega das chaves da unidade autônoma, incluído o período de tolerância" (STJ, REsp n. 1.729.593/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, j. 25-9-2019, DJe 27-9-2019).[...] (Apelação n. 0312461-94.2017.8.24.0064, rel. Carlos Roberto da Silva, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 13-7-2023).
Com relação às teses recursais das requeridas de imputação de culpa exclusiva a cada qual nesse ponto, também razão não lhes assiste. Há que se relembrar que a responsabilidade solidária das acionadas - por todos os danos suportados pelo adquirente - já foi reconhecida no item 4.1 deste julgado, não havendo necessidade de nova rediscussão.
O recurso do autor, de outro norte, merece agasalho, para que o termo final relativo aos juros de obra seja "até que se inicie a fase de amortização do contrato".
Não faz sentido reconhecer a limitação imposta na sentença (até a data de expedição do habite-se) porque a tese repetitiva fixada pela Corte da Cidadania é clara no sentido de que "ultrapassado o prazo para a conclusão das unidades, não podem ser cobrados do adquirente encargos contratados para incidir no período de construção, entre eles, os juros de obra" e "após a entrega do bem, inicia-se efetivamente a fase de abatimento da dívida".
Conforme reconhecido recentemente em caso semelhante neste Tribunal de Justiça (Apelação n. 0312461-94.2017.8.24.0064, rel. Carlos Roberto da Silva, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 13-7-2023), "o período durante o qual os pagamentos [relativos aos juros de obra] devem ser considerados indevidos deve atender à razão por que o ressarcimento é devido - isto é, a ausência de abatimento sobre o saldo devedor do financiamento", porquanto "o que interessa é o reflexo sobre o contrato bancário".
In casu, mesmo após escoado o prazo de conclusão da obra (incluído o prazo de tolerância - data final: 20-7-2016), houve a continuidade da cobrança dos juros de obra do autor, fato ensejador do requerimento de tutela de urgência no momento do ajuizamento da ação (em 4-4-2019), acolhido na decisão do evento 3/1º grau ("Defiro o pedido acautelatório formulado, para determinar a suspensão da exigibilidade dos valores relativos aos juros de pré-amortização - descritos na cláusula décima sétima, parágrafo primeiro, fl. 47 -, relacionado ao imóvel objeto da lide").
Nos autos de origem, sobreveio informação do Banco, em 3-6-2019, de "cumprimento da decisão liminar de suspender a exigibilidade dos valores relativos aos juros de pré-amortização referente ao contrato objeto da lide" (evento 16/1º grau), de modo que é evidente a existência de cobrança dos juros de pré-amortização posteriormente ao prazo para conclusão do empreendimento (e inclusive após a imissão definitiva do autor na posse do imóvel, em 14-6-2018, oportunidade na qual também não foi iniciada a fase de amortização do saldo devedor).
Não obstante, também sobreveio informação posterior da parte autora, inclusive motivadora do pedido de tutela recursal de urgência, nos seguintes termos (item 6 das razões recursais do acionante):
Nesse diapasão, é fato incontroverso que o Apelante já recebeu as chaves do seu apartamento, sendo imitido na posse definitiva de seu imóvel em 14/06/2018, estando, atualmente, residindo nele.
Porém, o Banco Réu continua a cobrar do Apelante os Juros de Pré-amortização, ao invés iniciar o período de amortização do contrato, quando o saldo devedor efetivamente começaria a ser abatido.
Isso porque, no contrato de financiamento realizado com o Banco Réu, está disposto na Cláusula Oitava, Parágrafo Quinto (evento 01, INF13, fl. 13), o seguinte:
PARÁGRAFO QUINTO - Para efeitos deste Instrumento, entende-se que a construção estará concluída após o registro do termo de "habite-se" e conclusão de obra no competente cartório de registro de imóveis.
Como afirmado durante toda a marcha processual, a Cláusula Décima Sexta, Parágrafo Primeiro (evento 01, INF13, fl. 24), preceitua que durante o período de construção serão cobrados apenas os juros de pré-amortização e somente após a conclusão da obra se iniciaria o período de amortização, onde o Apelante veria abatido, através do pagamento das prestações, o saldo devedor.
Ou seja, a formalidade que atesta a conclusão da obra é a averbação do alvará de "habite-se" (construção) na matrícula do imóvel do Apelante. Sem isso, contratualmente falando, não seria possível a alteração da fase de construção para a de amortização.
Ocorre que, embora o "habite-se" já tenha sido expedido pela Prefeitura Municipal de São José, SC, desde o dia 21/12/2017, conforme documento anexo, somente em 21/05/2021, ou seja, três anos e meio após, a Construtora Ré levara a registro tal documento. A matrícula atualizada acostada pela própria construtora atesta tal fato (evento 98, ANEXO4). [...].
Foi por este motivo que a parte autora solicitou na inicial, Tutela Provisória de Urgência, para o fim de suspender as cobranças dos juros de pré-amortização, o que foi de pronto deferido pelo Juízo de Piso no evento 03, inclusive com a confirmação pela sentença.
Sabedor da ocorrência da averbação da construção em sua matrícula do imóvel, o Apelante se dirigiu a uma agência do Banco do Brasil, a fim de entregar o referido documento, o qual comprova a condição contratual para o início da fase de amortização do contrato.
Contudo, para sua surpresa e espanto, foi informado pelo atendente de que, apesar de inexistir qualquer comando judicial sustando a cobrança dos encargos de amortização do contrato, o Banco do Brasil somente iria iniciar as cobranças da fase de amortização contratual se houvesse determinação judicial para tanto!
E mais: no mesmo ato o Apelante foi informado de que os valores referentes aos juros de pré-amortização suspensos por força de liminar, estão sendo adicionados no saldo devedor do financiamento, fazendo com que as parcelas de amortização, indicadas no contrato para iniciar em um determinado valor (valor inicial de R$ 546,07, conforme item "C.21.3", d Quadro Resumo, do contrato do evento 01, INF13, fl. 04), comecem com um valor muito mais elevado, tudo porque, como já afirmado, os juros de pré-amortização estão sendo embutidos junto com as parcelas de amortização. [...].
Assim, considerando que não há mais quaisquer óbices para o início da fase de amortização, requer a concessão de tutela de urgência recursal, a fim de que seja determinado ao Banco do Brasil que inicie imediatamente a fase de amortização do financiamento, permitindo ao Apelante o pagamento das prestações mensais que abaterão do seu saldo devedor, nos valores descritos em contrato (valor inicial de R$ 546,07, conforme item "C.21.3", d Quadro Resumo, do contrato do evento 01, INF13, fl. 04), mantendo-se a determinação de suspensão da cobrança dos juros de pré-amortização.
O Banco nem sequer impugna especificamente tais informações em suas contrarrazões (evento 152/1º grau).
Desse modo, as rés devem responder solidariamente pelo ressarcimento dos juros de obra indevidos, ou seja, desde 20-7-2016 até a data de início da amortização do contrato (término da fase de pré-amortização do contrato bancário), porquanto na hipótese, mesmo após a entrega das chaves, não foi encerrado o período de carência contratual (pré-amortizador) e iniciado o período de amortização do saldo devedor do adquirente.
Não se olvida, contudo, que a sentença assim decidiu: "remeto a apuração desses valores para liquidação de sentença, oportunidade em que deverão ser comprovados os respectivos desembolsos pela autora, bem como definida a data em que houve a última cobrança dos encargos financeiros sem amortização do capital".
Assim, apenas os valores indevidos e efetivamente quitados pela parte autora sob tal rubrica deverão ser ressarcidos pelas rés após a apuração em liquidação de sentença; não podendo igualmente ser o acionante cobrado pelo Banco de eventual dívida constituída de juros de pré-amortização no período supracitado (de 20-7-2016 até a data de início da amortização do contrato), ou seja, não há possibilidade de inclusão/soma dos juros de obra indevidos no saldo devedor.
Anota-se, por oportuno, que fica facultado ao Banco abater/compensar os valores que serão apurados em liquidação de sentença diretamente "do saldo a amortizar do financiamento habitacional", conforme também foi requerido pelo autor na inicial.
Em consequência, considerando ainda que a procrastinação sem justificativa acerca do início da fase de amortização do contrato causa oneração excessiva nas prestações devidas pelo adquirente (mesmo já entregue as chaves, instituído o condomínio e averbado o habite-se na matrícula do imóvel), também deve ser deferido o pedido autoral de tutela recursal para determinar ao Banco acionado, no prazo de 5 (cinco) dias, o início da fase de amortização do saldo devedor, nos termos do contrato de financiamento n. 138.607.834, sob pena de multa diária em caso de descumprimento no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), limitada a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).
Tal pedido emergencial do autor também decorre do próprio reconhecimento de atraso da entrega da obra por culpa das requeridas.
Por decorrência lógica, a análise do pedido da construtora ré, de revogação da liminar concedida ao autor no evento 3/1º grau, fica prejudicada.
4.3 Cláusula penal
A construtora requerida afirma em seu apelo que não houve apenas a inversão da cláusula penal, mas sim a criação de uma nova cláusula, o que não pode ser admitido, pois o Tema 971 do STJ garante ao adquirente a inversão da referida cláusula em caso de atraso superior a 12 meses (situação não vislumbrada nos autos) e jamais sobre o valor total do contrato (cláusula penal original prevista no contrato firmado entre as partes indica a incidência tão somente sobre R$ 6.952,00).
A questão foi analisada na sentença nesses termos:
Pretende o autor a inversão da cláusula penal em seu benefício, em razão do inadimplemento da parte ré.
Sustenta a parte ré que não há previsão contratual de multa por atraso na entrega, mas unicamente multa (de 2%) e juros de 1% ao mês em seu favor no caso de atraso no pagamento pelo contratante.
A propósito, o Superior Tribunal de Justiça já firmou o seguinte entendimento:
TEMA 971/STJ. No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigações heterogêneas (obrigações de fazer e de dar) serão convertidas em dinheiro, por arbitramento judicial.
Diante disso, acolho o pedido de inversão da cláusula penal em benefício da autora, condenando-se a parte ré ao pagamento dos valores devidos a este título, nos termos da cláusula quarta, cujo quantum deverá ser apurado em liquidação de sentença.
Em sede de embargos de declaração, houve o seguinte complemento:
Por outro lado, no que se refere à inversão da cláusula penal, especificamente quanto à ausência de indicação do parâmetro a ser utilizado para incidência da multa prevista, razão assiste aos embargantes.
Isso porque, embora expressamente consignada a aplicação da cláusula quarta da avença ( Evento 1, INF9) em desfavor das rés de forma solidária, deixou-se de assentar que as respectivas penalidades (multa (de 2%) e juros de 1% ao mês) deverão incidir sobre o valor total do contrato particular de promessa de compra e venda de bem imóvel - uma vez que a parcela em atraso é a entrega do apartamento -, desde o início do  inadimplemento (20/07/2016) até a data da imissão do autor na posse do imóvel.
Ante o exposto e o que mais dos autos consta, ACOLHO PARCIALMENTE os Embargos de Declaração opostos pelas partes embargantes tão somente para, reconhecendo a omissão apontada, alterar a alínea e do dispositivo da sentença, que passa a assim dispor:
e) determinar a inversão da cláusula penal em benefício do autor, nos termos da fundamentação, e condenar as rés, solidariamente, ao pagamento dos valores devidos a este título, correspondentes à multa moratória de 2% a incidir sobre o valor do contrato particular de promessa de compra e venda de bem imóvel, acrescidos de correção monetária pelo INPC e juros de 1% ao mês a contar da data prevista para a entrega do imóvel (20/7/2016) até a data da imissão na posse do imóvel;
Não houve recurso do autor no ponto; apenas da construtora requerida.
A respeito da possibilidade em si de inversão da cláusula penal, a sentença não merece reparo, pois fundamentada em tese fixada pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento realizado sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 971 - REsp n. 1.631.485/DF, rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, j. 22-5-2019). Do inteiro teor do referido julgado paradigma, colhe-se importante lição:
Desse modo, consoante iterativa jurisprudência do STJ, na mesma linha do precedente paradigma da Terceira Turma, em caso de inadimplemento (absoluto ou relativo), se houver omissão do contrato, cabe, por imperativo de equidade, inverter a cláusula contratual penal (moratória ou compensatória), que prevê multa exclusivamente em benefício da promitente vendedora do imóvel.
No entanto, esses precedentes visam, justa e simetricamente à manutenção do equilíbrio da base contratual para a adequada reparação do dano, tomando a cláusula penal estipulada em benefício de apenas uma das partes como parâmetro objetivo, inclusive ressalvando, por exemplo, o abatimento do valor de um aluguel por mês de uso do imóvel.
[...].
À vista disso, seja por princípios gerais do direito, seja pela principiologia adotada no CDC, ou, ainda, por comezinho imperativo de equidade, mostra-se abusiva a prática de estipular cláusula penal exclusivamente ao adquirente, para a hipótese de mora ou de inadimplemento contratual absoluto, ficando isento de tal reprimenda o fornecedor em situações de análogo descumprimento da avença.
Destarte, prevendo o contrato a incidência de multa para o caso de inadimplemento por parte do consumidor, ela também deverá ser considerada para o arbitramento da indenização devida pelo fornecedor, caso seja deste a mora ou o inadimplemento absoluto.
Ademais, em sede de embargos de declaração, a Corte da Cidadania complementou:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM FACE DO ACÓRDÃO DE RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. RECURSO DE CARÁTER MERAMENTE INFRINGENTE. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 1.022 DO CPC DE 2015. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.1. Conforme tese sufragada por este Colegiado, no contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor. As obrigações heterogêneas (obrigações de fazer e de dar) serão convertidas em dinheiro, por arbitramento judicial.2. Consignou-se que a cláusula penal constitui pacto acessório por meio do qual as partes determinam previamente uma multa (usualmente em pecúnia), consubstanciando indenização para, como no caso, inadimplemento absoluto ou de cláusula especial, hipótese em que se denomina cláusula penal compensatória. Ou mesmo pode ser estabelecida para prefixação de indenização por inadimplemento relativo (quando ainda se mostrar útil o adimplemento, ainda que tardio; isto é, defeituoso), recebendo, nesse caso, a denominação de cláusula penal moratória.3. Frisou-se que, consoante iterativa jurisprudência do STJ, em caso de inadimplemento (absoluto ou relativo), se houver omissão do contrato, cabe considerar, pela necessidade de intervenção judicial para arbitramento da indenização, a cláusula contratual penal (moratória ou compensatória) que prevê multa exclusivamente em benefício da promitente vendedora do imóvel.4. Ponderou-se que a obrigação da incorporadora é de fazer (prestação contratual, consistente na entrega do imóvel pronto para uso e gozo), já a do adquirente é de dar (pagar o valor remanescente do preço do imóvel, por ocasião da entrega), por isso que só haverá adequada simetria se houver consideração dessas circunstâncias para arbitramento da indenização.5. Embargos de declaração rejeitados (EDcl no REsp n. 1.631.485/DF, rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, j. 9-10-2019).
Como se vê, o tema 971 do Superior Tribunal de Justiça é aplicável tanto para casos de inadimplemento absoluto quanto relativo, sendo necessário ajustar em cada caso concreto a cláusula contratual penal (moratória ou compensatória), daí por que a hipótese em análise se amolda ao precedente repetitivo, uma vez que o contrato (item 9 do evento 1/1º grau) em questão prevê apenas penalidade para o caso de descumprimento do ajuste pelo promitente comprador, mas nada dispõe nesse sentido para o caso de descumprimento da promitente vendedora.
Além disso, não encontra amparo a alegação da ré de que "o TEMA 971 DO STJ garante ao adquirente a inversão da cláusula penal em caso de atraso superior a 12 meses e não a criação de uma nova cláusula" (fl. 20 das razões recursais); a inversão da cláusula incide a partir da constatação da mora da vendedora, já devidamente reconhecida na hipótese.
De se notar que, considerando a eficácia vinculante dos acórdãos proferidos em recursos especiais repetitivos (art. 927, III, do Código de Processo Civil), afigura-se obrigatória a observância do precedente no julgamento de questões que apresentem idêntica situação fático-jurídica, tal como ocorre no presente caso, sendo cabível, portanto, a inversão da cláusula penal em favor do consumidor/autor, conforme reconhecido na sentença.
No que diz respeito ao pedido recursal de minoração da penalidade (porquanto no entender da construtora ré não poderia incidir sobre a integralidade do valor do contrato), cumpre registrar, em primeiro lugar, que a temática não foi suscitada na contestação da ré (evento 15/1º grau), sendo apenas objeto dos seus embargos de declaração nos autos de origem (evento 76/1º grau).
A despeito do contido nos arts. 336, 341 e 342 do Código de Processo Civil, houve análise dos referidos aclaratórios pela sentenciante, a qual decidiu na parte dispositiva do julgado o seguinte: "determinar a inversão da cláusula penal em benefício do autor, nos termos da fundamentação, e condenar as rés, solidariamente, ao pagamento dos valores devidos a este título, correspondentes à multa moratória de 2% a incidir sobre o valor do contrato particular de promessa de compra e venda de bem imóvel, acrescidos de correção monetária pelo INPC e juros de 1% ao mês a contar da data prevista para a entrega do imóvel (20/7/2016) até a data da imissão na posse do imóvel".
Sabe-se que "o valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal" e que "a penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio" (arts. 412 e 413 do Código Civil).
No presente caso, contudo, o cômputo da penalidade nos termos do dispositivo dos aclaratórios, levando-se em consideração o valor do contrato (R$ 130.000,00 - item 9 do evento 1/1º grau) e o prazo dos consectários (de 20-7-2016 até 14-6-2018), mostra-se adequado e razoável para a indenização resultante do inadimplemento reconhecido, não havendo pertinência na alegação recursal de impossibilidade de utilização do "valor do contrato", até porque, conforme decidiu a sentenciante, a prestação inadimplida pela parte ré foi a entrega do imóvel no prazo ajustado.
4.4 Danos morais
Afirma o autor em seu apelo que embora a jurisprudência nacional entenda "ser incabível a indenização por danos morais em caso de atraso na entrega de imóvel na planta decorrente de simples descumprimento contratual; há uma exceção a esta regra, que é quando o imóvel é adquirido para a moradia do comprador, ainda mais na situação de aquisição dentro do programa habitacional minha casa, minha vida, o que é o caso dos autos" (fl. 13 das razões recursais), de modo que a sentença também deve ser reformada nesse ponto para condenar as apeladas ao pagamento de indenização por danos morais em valor não inferior a R$ 15.000,00 (quinze mil reais).
Razão, contudo, não lhe socorre.
A sentença, no ponto, assim bem decidiu:
Pretende o autor seja a parte ré condenada ao pagamento de indenização por danos morais, em decorrência do atraso na entrega das obras.
O inadimplemento contratual, por si só, não é capaz de gerar direito à reparação civil fundada em abalo moral, sendo imprescindível a demonstração da ocorrência de dano de natureza extrapatrimonial, a teor do disposto nos artigos 186 e 927 do Código Civil.
 Sobre a reparação por dano moral no caso de atraso na entrega de unidade imobiliária, diz a jurisprudência:
[...] 5. A moderna jurisprudência firmada no âmbito da Terceira Turma desta Corte é no sentido de que o dano moral, na hipótese de atraso na entrega de unidade imobiliária, não se presume, configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação a direito da personalidade dos promitentes compradores.6. No caso concreto, a fundamentação do dano moral está justificada somente da frustração da expectativa da autora, que se privou do uso do imóvel pelo tempo em que perdurou o atraso na entrega da obra, sem tecer nota adicional ao mero atraso que pudesse, além dos danos materiais, causar grave sofrimento ou angústia a ponto de configurar verdadeiro dano moral.7. Agravo regimental parcialmente provido a fim de excluir a condenação por dano moral (AgRg no AREsp 847.358/MG - destaquei).
Na hipótese, não restou comprovado pelo autor a ocorrência de danos que extrapolem os meros aborrecimentos do cotidiano, motivo pelo qual não acolho o pedido de indenização por danos morais.
Em abono, cumpre esclarecer que a pretensão autoral está respaldada, em tese, na Constituição da República que agasalha a reparação do dano moral (CRFB, art. 5º, X).
O renomado Yussed Said Cahali, a partir da exclusão dos danos conceituados como materiais, apresenta importante definição, destacando que os danos morais seriam "como a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranquilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos" (Dano Moral. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 20).
Desse modo, enquanto no dano patrimonial a diminuição econômica é passível de apuração e suscetível de "ressarcimento" pelo equivalente em dinheiro, no dano moral, a impossibilidade de avaliação ou mensuração do prejuízo impede o mesmo tratamento, razão pela qual a reparação da violação de ordem moral se dá através de uma "compensação", isto é, a imposição ao ofensor do pagamento de certo montante em dinheiro em favor do ofendido, cujo quantum deverá ser "estimado", proporcionando, ao mesmo tempo, uma certa satisfação à vítima e um agravamento sobre o patrimônio do agressor (CAHALI, Yussed Said. Dano Moral. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 42).
O Superior Tribunal de Justiça, de sua vez, "entende que não há falar em dano moral como decorrência de descumprimento contratual, exceto quando verificada situação peculiar, apta a justificar o reconhecimento de violação a direito da personalidade" (AgInt no REsp 1.857.268/RN, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 29-6-2020).
Nesse palmilhar, ainda que incidente a Legislação Consumerista, competia ao autor apresentar motivos ou provas contundentes de que o atraso na entrega do imóvel ultrapassou o dissabor cotidiano, fato não consumado.
Na exordial há as seguintes alegações: "o autor se sente angustiado por não estar residindo no imóvel que tanto sonhou e planejou; impotente por não ter nenhuma resposta ou posição da construtora, como uma data concreta para a entrega o empreendimento; humilhado por ver os apartamentos serem colocados para locação, antes da entrega do seu; além disso, sente enorme desgosto por ter adquirido imóvel que lhe está dando uma enorme dor de cabeça; não se pode admitir que o atraso injustificado de um imóvel por mais de um ano e meio seja um mero dissabor; há todo um desgaste emocional e uma tristeza que presumivelmente superam a medida do razoável" (fl. 21).
Não se olvida, ainda, o extenso lapso temporal transcorrido entre a data prevista para a entrega do imóvel (janeiro de 2016 - com tolerância de mais 180 dias) - e o efetivo recebimento pelo autor (junho de 2018).
Ocorre que tal fato, o qual embora realmente cause frustração da expectativa do comprador, não é capaz de corroborar a narrativa de dano moral no presente caso, pois não houve produção de prova suficientemente tocante ao suposto abalo.
Assim, não obstante o transcurso injustificado de quase dois anos para a efetiva entrega do bem, e mesmo tendo sido o imóvel adquirido para moradia do autor pelo programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, não se trata de situação excepcional, concessa venia, que colocou o contratante em circunstância de extraordinária angústia ou humilhação.
Nesse mesmo sentido, este Tribunal de Justiça firmou orientação consubstanciada na sua Súmula 29, in verbis: "o descumprimento contratual não configura dano moral indenizável, salvo se as circunstâncias ou as evidências do caso concreto demonstrarem a lesão extrapatrimonial".
Colhe-se do repertório jurisprudencial desta Corte em julgados envolvendo o mesmo Condomínio Quinta de Potecas:
APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA - MCMV (LEI N. 11.977/2009). ALEGADA OCORRÊNCIA DE ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. PLEITOS DECLARATÓRIO E DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DA LIDE POR ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA (ART. 485, VI, CPC), DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS INICIAIS (ART. 485, I, CPC) EM RELAÇÃO À CONSTRUTORA CORRÉ E DE IMPROCEDÊNCIA DA RECONVENÇÃO (ART. 485, I, CPC). INSURGÊNCIAS DE AMBOS OS LITIGANTES.[...].DANOS MORAIS. TESE COMUM. PRETENSÃO DA CONSTRUTORA DE AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO E DA AUTORA PARA MAJORAÇÃO DA INDENIZAÇÃO. CASO CONCRETO EM QUE O DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL, POR SI SÓ, NÃO CONFIGUROU PREJUÍZO EXTRAPATRIMONIAL PASSÍVEL DE INDENIZAÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 29 DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AUSÊNCIA DE PROVA DE CIRCUNSTÂNCIA EXCEPCIONAL CAPAZ DE CONFIGURAR ABALO ANÍMICO INDENIZÁVEL. DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA REFORMADA, NO PONTO. PLEITO DA AUTORA PREJUDICADO.  [...].RECURSO DA AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DA RÉ PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO (Apelação n. 0312414-23.2017.8.24.0064, rel. Haidée Denise Grin, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 10-8-2023).
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE INVERSÃO DE CLÁUSULA PENAL E DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. SENTENÇA QUE RECONHECEU A ILEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO RÉU E JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS NA AÇÃO PRINCIPAL E NA RECONVENÇÃO.[...].TESE DE QUE NÃO HOUVE DANO MORAL. ACOLHIMENTO. ABALO ANÍMICO NÃO PRESUMIDO NO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE RELATO OU COMPROVAÇÃO DA OCORRÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS EXCEPCIONAIS DECORRENTES DA RESOLUÇÃO DO CONTRATO.[...] (Apelação n. 0312461-94.2017.8.24.0064, rel. Carlos Roberto da Silva, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 13-7-2023).
Conclui-se, portanto, pela ausência de comprovação dos danos morais, razão pela qual mantém-se a sentença neste tocante.
5 ENCARGOS SUCUMBENCIAIS
Alega o Banco requerido que a responsabilidade pela sucumbência deve recair em sua integralidade ao apelado, pois este deu causa a instauração da lide, desnecessariamente, conforme o princípio da causalidade. Aduz, em grau subsidiário, que o valor arbitrado a título de honorários sucumbenciais em seu desfavor deve ser minorado.
De sua vez, a construtora requerida menciona ser equivocado o reconhecimento da sucumbência mínima do autor, pois "só em danos morais a parte apelada sucumbiu em R$ 15.000,00, ou seja, praticamente a metade do valor da ação" (fl. 26 das razões recursais). Aponta, ainda, que a reforma da sentença em segundo grau ensejará maior sucumbência ao requerente.
As insurgências devem ser parcialmente acolhidas.
No ponto, colhe-se da sentença recorrida:
Considerando que o autor decaiu de parte mínima dos pedidos, condeno a parte ré, solidariamente, ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC.
O Código de Processo Civil, sobre o tema, assim dispõe:
Art. 82. Salvo as disposições concernentes à gratuidade da justiça, incumbe às partes prover as despesas dos atos que realizarem ou requererem no processo, antecipando-lhes o pagamento, desde o início até a sentença final ou, na execução, até a plena satisfação do direito reconhecido no título.[...].§ 2º A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou.[...].Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.§ 1º São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente.§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:I - o grau de zelo do profissional;II - o lugar de prestação do serviço;III - a natureza e a importância da causa;IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.[...].§ 8º Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.§ 8º-A. Na hipótese do § 8º deste artigo, para fins de fixação equitativa de honorários sucumbenciais, o juiz deverá observar os valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil a título de honorários advocatícios ou o limite mínimo de 10% (dez por cento) estabelecido no § 2º deste artigo, aplicando-se o que for maior. (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022)[...].§ 20. O disposto nos §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10 deste artigo aplica-se aos honorários fixados por arbitramento judicial. (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022).Art. 86. Se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas.Parágrafo único. Se um litigante sucumbir em parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e pelos honorários.
Cabe enfatizar que o princípio da sucumbência (regra estabelecida no art. 85, caput, do CPC), baseado na ideia de que o processo não deve redundar em prejuízo à parte que tenha razão, impõe a responsabilidade financeira decorrente da sucumbência ao derrotado no pleito judiciário.
De outro lado, consoante lição doutrinária de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, "a condenação pelas custas, despesas processuais e honorários advocatícios deve recair sobre quem deu causa à ação; se o réu deu causa à propositura da ação, mesmo que o autor saia vencido, pode o réu ter de responder pelas verbas de sucumbência. Aplica-se o princípio da causalidade para repartir as despesas e custas do processo entre as partes. O processo não pode causar dano àquele que tinha razão para o instaurar" (Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. pg. 430, grifos acrescidos).
Como já sedimentou o Superior Tribunal de Justiça, ao menos em regra "o princípio da causalidade é aplicado nas hipóteses de extinção do processo sem exame do mérito, em virtude de perda de objeto superveniente à propositura da demanda, impondo os honorários advocatícios à parte que, embora vencedora, deu causa ao ajuizamento da ação" (AgInt nos EDcl no AREsp 1579062/ES, Rel. Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, j. em 16-3-2020, grifos acrescidos).
Nesse andar, a análise sob o crivo da causalidade fica adstrita às hipóteses em que o princípio da sucumbência (art. 85, caput, do CPC) se mostra insuficiente para a solução de questões pertinentes aos encargos processuais.
Também conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a repartição dos encargos decorrentes da sucumbência "deve ser pautada pelo exame do número de pedidos formulados e da proporcionalidade do decaimento das partes em relação a esses pleitos" (REsp 1.255.315/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 27-9-2011).
E mais, mutatis mutandis, "a caracterização da sucumbência mínima não decorre da verificação de valores (quantum debeatur), mas do cotejamento do número de pedidos deferidos e indeferidos na pretensão proposta" (STJ, AgRg no AREsp 532029/SP, Rel. Min. Olindo Menezes - Des. Convocado do TRF 1ª Região, Primeira Turma, DJe de 11-12-2015).
Também não se pode olvidar que a diferença de expressão econômica do pedido inicial e do rejeitado na sentença enseja a distribuição dos honorários sucumbenciais de acordo com a proporcionalidade e os regramentos do art. 85 da Lei Adjetiva Civil.
In casu, a regra da sucumbência já é suficiente para o estabelecimento dos encargos sucumbenciais, notadamente porque na exordial a parte autora pretendeu o seguinte:
Ante o exposto, requer-se:
a) A concessão dos benefícios da Gratuidade da Justiça;
b) A antecipação dos efeitos da Tutela Antecipada de Urgência, in initio litis e inaudita altera parte, para determinar às Rés (Jat Engenharia e Banco do Brasil) que suspendam a cobrança dos juros pré-amortização (encargos da básicos - Cláusula Décima Sexta, Parágrafo Primeiro), bem como se abstenham de incluir, se já incluída, exclua, o nome da parte Autora dos órgãos de proteção ao crédito (SPC/SERASA/BOA VISTA), no prazo de 5 (cinco) dias, sob pena de multa diária em valor a ser definido por este Juízo;
c) A aplicabilidade do CDC - Código de Defesa do Consumidor - ao presente processo, com a consequente inversão do ônus da prova, especialmente para determinar que Banco do Brasil junte aos autos todos os extratos de conta corrente do Autor (Ag. 1386-2, C.c. ****), desde a assinatura do contrato de financiamento imobiliário (20/08/2014), até os dias de hoje;
d) Por ser público e notório que as Rés não costumam fazer acordo e em atenção ao art. 319, inciso VII, do CPC/15, a parte Autora informa que não opta pela realização de audiência de conciliação e/ou mediação;
e) A citação das Rés, no endereço supra declinado, para, querendo, contestar a presente, sob pena de não o fazendo, serem declarados revéis, com fulcro no art. 344 do CPC/15;
f) Ao final, a procedência dos pedidos para:
i) Confirmar a Tutela Antecipada de Urgência;
ii) Modificar a alínea "a", do quadro VII - do prazo estimado para a entrega das obras - do contrato firmado entre a parte Autora e a Ré Jat Engenharia e Construções LTDA, para constar a data de 20/01/2014 como marco inicial para contagem do prazo de 24 (vinte e quatro) meses para entrega das chaves;
iii) Declarar a ilegalidade na utilização do prazo de tolerância de 180 dias;
iv) Declarar o atraso na entrega da obra desde 20/01/2016; subsidiariamente, caso não for o entendimento de V. Exa., declarar o atraso na entrega da obra desde 20/07/2016;
v) Modificar a Cláusula Quarta do contrato firmado entre a parte Autora e a Ré Jat Engenharia e Construções LTDA, para impor as penalidades, em caso de atraso no cumprimento das obrigações, a ambas as partes e não apenas ao comprador;
vi) Condenar as Rés, solidariamente, ao pagamento de multa por descumprimento contratual em razão do atraso na entrega do imóvel, consistente em 2% sobre o valor do contrato, mais juros moratórios de 1% ao mês, também sobre o valor do contrato, até a efetiva entrega das chaves, conforme a Cláusula Quarta do contrato firmado entre a parte Autora e a Ré Jat Engenharia e Construções LTDA;
vii) Condenar as Rés, solidariamente, a devolução integral dos valores pagos a título de juros pré-amortização do período compreendido entre a declaração de atraso na entrega do imóvel e a efetiva entrega das chaves, corrigidos e acrescidos de juros legais; subsidiariamente, sejam os valores abatidos do saldo a amortizar do financiamento habitacional;
viii) Condenar as Rés, solidariamente, a pagar indenização por danos morais à parte Autora em valor não inferior a R$ 15.000,00 (quinze mil reais);
Após a resistência dos réus em contestação, a sentença decidiu pelo acolhimento parcial dos seis pedidos iniciais principais, não acolhendo os pleitos de dano moral (expressivo economicamente) e de declaração de ilegalidade da cláusula de tolerância, e ajustando o prazo final da mora das requeridas (habite-se).
Nesta instância, foram realizados ajustes em parte da fundamentação da sentença e pequenos reparos quanto ao termo final da mora das requeridas e quanto ao termo final de incidência dos juros de pré-amortização, os quais não seriam suficientes, por si sós, para modificar a sucumbência (alteração mínima).
No entanto, como há pedido recursal das rés, o critério norteador para a distribuição da sucumbência realmente deve ser o número de pedidos formulados e atendidos e, in casu, o fato de o dano moral e a declaração de ilegalidade da cláusula de tolerância não terem sido acolhidos efetivamente importa em sucumbência recíproca (e não sucumbência mínima como disposto na sentença), de modo que mostra-se pertinente o recurso das acionadas nesse ponto, a fim de ser efetivada a redistribuição proporcional dos encargos sucumbenciais.
A forma adequada e justa de distribuição dos encargos sucumbenciais nesse caso, considerando a condição proporcional de vencedores e vencidos das partes, é suportar o requerente 25% (vinte e cinco por cento) das despesas processuais, cabendo aos réus os 75% (setenta e cinco por cento) remanescentes.
Tocante ao percentual da verba honorária, considerando o trabalho desenvolvido pelos causídicos, o tempo de duração do processo (iniciado em abril de 2019), a inexistência de alta complexidade do tema e o valor econômico da causa - sopesados aqui o valor estimado da condenação e também o proveito econômico obtido pelos réus -, mantém-se os estipêndios em favor do patrono do autor em 10% (dez por cento) do valor da condenação e arbitram-se aqueles fixados em favor dos causídicos das partes requeridas em 10% (dez por cento) do proveito econômico obtido (valores que deixaram de pagar - pedidos julgados improcedentes).
O percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação em favor do advogado do autor, também eleito pela sentenciante, não se mostra desarrazoado em face dos elementos retirados do processo, e até mesmo configura o percentual mínimo para fixação dos honorários advocatícios, consoante os critérios elencados no art. 85, § 2º, do CPC, daí por que o apelo do Banco nesse tocante não merece acolhimento.
Em razão da justiça gratuita deferida ao acionante (evento 3/1º grau) e mantida na sentença (evento 66/1º grau), fica suspensa a exigibilidade dos encargos sucumbenciais por si devidos.
Com relação à lide reconvencional, inclusive os encargos sucumbenciais estipulados, não houve qualquer irresignação das partes.
6 HONORÁRIOS RECURSAIS
Por fim, em consonância com interpretação conferida pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgar os Embargos de Declaração no Agravo Interno no Recurso Especial 1.573.573/RJ, assinala-se ser descabida, in casu, a fixação de honorários advocatícios nos moldes do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, haja vista o provimento parcial dos presentes apelos.
7 PREQUESTIONAMENTO
Por fim, pleiteia o Banco recorrente a manifestação expressa sobre os dispositivos legais e as teses jurídicas aludidos no corpo do recurso, para fim de prequestionamento.
Todavia, é sabido que o órgão julgador não está obrigado a manifestar-se acerca de todos os dispositivos legais invocados pelas partes quando não se mostrarem relevantes para o deslinde da controvérsia, tendo em vista ser suficiente a aplicação do direito ao caso trazido à apreciação do Poder Judiciário, de forma motivada, a fim de atender ao disposto no artigo 93, IX, da Constituição Federal.
A respeito do tema, leciona a doutrina sobre o disposto no novo Código de Processo Civil:
[...] é preciso perceber que o juiz não tem o dever de rebater todos os argumentos levantados pelas partes ao longo de seus arrazoados: apenas os argumentos relevantes é que devem ser enfrentados. O próprio legislador erige um critério para distinguir entre argumentos relevantes e argumentos irrelevantes: argumento relevante é todo aquele que é capaz de infirmar, em tese, a conclusão adotada pelo julgador. Argumento relevante é o argumento idôneo para alteração do julgado. Omitindo-se o juiz na análise de argumentos relevantes, não se considera fundamentada a decisão (art. 489, § 1.º, IV, CPC), cabendo embargos declaratórios para forçar a análise dos argumentos omitidos (art. 1.022, II, CPC). Não analisados, consideram-se fictamente inseridos na decisão judicial para efeito de análise de eventual recurso especial ou extraordinário interposto pela parte interessada (art. 1.025, CPC) (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo código de processo civil comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. p. 493).
Nesse palmilhar, se a fundamentação do julgamento deve abrigar os argumentos relevantes ao deslinde da controvérsia, mostra-se desnecessária a abordagem das questões periféricas e incapazes de infirmar a solução alcançada pelo Órgão Julgador.
8 DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de a) conhecer do recurso do autor e dar-lhe parcial provimento para: a.1) fixar o termo final da mora das requeridas pelo atraso na entrega do imóvel no dia 14-6-2018, a.2) fixar o termo final da condenação solidária das rés acerca dos juros de obra na data de início da amortização do saldo devedor do autor (término da fase de pré-amortização/carência do contrato de financiamento), observada a integralidade da fundamentação do presente julgamento nesse ponto, e a.3) deferir o pedido de tutela recursal de urgência e determinar ao Banco acionado, no prazo de 5 (cinco) dias, o início da fase de amortização do saldo devedor, nos termos do contrato de financiamento n. 138.607.834, sob pena de multa diária em caso de descumprimento no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), limitada a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais); e b) conhecer dos recursos das requeridas e dar-lhes parcial provimento tão somente para redistribuir os encargos sucumbenciais na proporção de 25% (vinte e cinco por cento) das custas pelo autor e 75% (setenta e cinco por cento) a cargo das rés; quanto aos honorários advocatícios de sucumbência, mantém-se os estipêndios em favor do patrono do autor em 10% (dez por cento) do valor da condenação e arbitram-se aqueles fixados em favor dos causídicos das partes requeridas em 10% (dez por cento) do proveito econômico obtido. A exigibilidade das verbas sucumbenciais fica suspensa em face do autor em razão de ser beneficiário da justiça gratuita.

Documento eletrônico assinado por LUIZ FELIPE S. SCHUCH, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 4022333v192 e do código CRC 9dee836b.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUIZ FELIPE S. SCHUCHData e Hora: 30/10/2023, às 19:13:44

 

 












Apelação Nº 0303288-75.2019.8.24.0064/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH


APELANTE: ODINEI JOSE DIAS (AUTOR) APELANTE: JAT ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES LTDA (RÉU) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS


EMENTA


APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS E INVERSÃO DE CLÁUSULA PENAL. CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL FINANCIADO. EMPREENDIMENTO QUINTA DE POTECAS. DEMANDA AJUIZADA PELO ADQUIRENTE DE UNIDADE AUTÔNOMA CONTRA A INCORPORADORA/CONSTRUTORA E O BANCO (CREDOR FIDUCIÁRIO). SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS INICIAIS. RECURSOS DE TODAS AS PARTES.
PRELIMINAR DO AUTOR EM CONTRARRAZÕES. PLEITO DE NÃO CONHECIMENTO PARCIAL DO APELO DA CONSTRUTORA RÉ POR SUPOSTA OCORRÊNCIA DE INOVAÇÃO RECURSAL QUANTO ÀS DATAS ESTIMADAS PARA A ENTREGA DA OBRA. INACOLHIMENTO. ACIONADA QUE, EMBORA NÃO TENHA INDICADO EXPRESSAMENTE EM SUA DEFESA OS DIAS, REBATE OS ARGUMENTOS EXORDIAIS RELATIVOS À TEMÁTICA EM QUESTÃO. SENTENÇA QUE TAMBÉM PERPASSA POR VÁRIAS DATAS PARA CONCLUIR PELO ATRASO DA ENTREGA DA OBRA. CONFRONTO DIRETO DAS RAZÕES DO REFERIDO APELO COM OS FUNDAMENTOS SENTENCIAIS. RECURSO INTEGRALMENTE CONHECIDO.
PRELIMINARES RECURSAIS DO BANCO REQUERIDO.
ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. REJEIÇÃO. ATUAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA NO EMPREENDIMENTO COMO PARCEIRO E FISCALIZADOR DIRETO DA EXECUÇÃO DAS OBRAS E DAS VENDAS. EXISTÊNCIA DE VÁRIAS CLÁUSULAS NO CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO QUE AFASTAM A FIGURA DO BANCO DE MERO AGENTE FINANCEIRO E REPASSADOR DE RECURSOS PARA A EXECUÇÃO DE POLÍTICA FEDERAL PARA A PROMOÇÃO DE MORADIA. POSSIBILIDADE ATÉ MESMO DE CONTRATAÇÃO DE CONSTRUTOR SUBSTITUTO PELO BANCO. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. INCONTROVERSA PARTICIPAÇÃO DO ACIONADO NA RELAÇÃO JURÍDICA DE DIREITO MATERIAL DESCRITA NA EXORDIAL. ANÁLISE SOBRE A EVENTUAL RESPONSABILIZAÇÃO QUE DEVE SER TRATADA NO MÉRITO. NECESSIDADE DE O AUTOR ESTAR EM JUÍZO IGUALMENTE AMPARADA NA PRETENSÃO RESISTIDA DAS RÉS E DECORRENTE DO ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. MEIO PROCESSUAL ADEQUADO. PREFACIAIS ARREDADAS.
PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DA INÉPCIA DA INICIAL POR SUPOSTAMENTE ESTAR DESACOMPANHADA DE DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS AO AJUIZAMENTO DA DEMANDA. PRELIMINAR RECHAÇADA. REPETIÇÃO DAS ALEGAÇÕES DA CONTESTAÇÃO SEM COMBATE À DECISÃO JUDICIAL QUANTO AO RECONHECIMENTO DE SUFICIÊNCIA DA DOCUMENTAÇÃO DO AUTOR PARA A APRECIAÇÃO DO REQUERIMENTO RELATIVO AOS JUROS DE PRÉ-AMORTIZAÇÃO. TESE RECURSAL ATÉ MESMO CONTRADITÓRIA COM OS PRÓPRIOS ARGUMENTOS DE LEGITIMIDADE DA COBRANÇA DOS JUROS DE OBRA.
MÉRITO.
RESPONSABILIDADE PELO ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. INSURGÊNCIAS COMUNS. RESPONSABILIZAÇÃO SOLIDÁRIA DAS RÉS. CONSTATAÇÃO DE ATUAÇÃO CONJUNTA DA INCORPORADORA E DO BANCO NAS FASES DE CONSTRUÇÃO E DE VENDAS DOS IMÓVEIS. VINCULAÇÃO DE AMBOS AO CONJUNTO DO NEGÓCIO DA AQUISIÇÃO DA CASA PRÓPRIA. EMPREENDIMENTO DESENVOLVIDO EM PARCERIA PELA CONSTRUTORA E PELO AGENTE FINANCEIRO (ATUANTE NA CONDIÇÃO DE EXECUTOR E FISCALIZADOR). APARÊNCIA DE COAUTORIA AO PÚBLICO ALVO. TESES DE IMPUTAÇÃO DE RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA ENTRE AS DEMANDADAS REJEITADAS. SOLIDARIEDADE CONFIGURADA. EVENTUAL DELIMITAÇÃO DE RESPONSABILIDADE ENTRE AS RÉS PELOS FATOS OCORRIDOS NO CONDOMÍNIO QUINTA DE POTECAS, NOTADAMENTE ORIUNDA DA ALEGAÇÃO DA CONSTRUTORA DE FALTA DE REPASSE DE VALORES PELO BANCO, QUE DEVE SER OBJETO DE DEMANDA PRÓPRIA. RECURSOS DAS ACIONADAS NÃO ACOLHIDOS NESSE PONTO. PRAZO DE ENTREGA DO IMÓVEL. CONTRATO PARTICULAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL FIRMADO ENTRE O AUTOR E A CONSTRUTORA QUE CONDICIONA A FLUÊNCIA DO PRAZO DE 24 MESES PARA INÍCIO DAS OBRAS À CONCLUSÃO DA FUNDAÇÃO (ESTA SEM PRAZO DETERMINADO). LATENTE ABUSIVIDADE (ART. 51, IV, DO CDC). LAPSO CONDICIONADO A EVENTO FUTURO E INCERTO. MANIFESTA DESVANTAGEM NEGOCIAL. OMISSÃO DESSE PACTO EM ESTABELECER PRAZOS EXATOS DE INÍCIO E FIM DA OBRA. PRÁTICA VEDADA PELO ART. 39, XII, DO CDC. PRECEDENTE DO STJ EM RECURSO REPETITIVO (TEMA 996). EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS PROBATÓRIOS NOS AUTOS SUFICIENTES PARA A FIXAÇÃO DOS PRAZOS. CONTRATO DE FINANCIAMENTO FIRMADO ENTRE O BANCO E O AUTOR, COM A ANUÊNCIA DA CONSTRUTORA RÉ (INTERVENIENTE), QUE EXPRESSAMENTE INDICA A DATA PREVISTA PARA O TÉRMINO DO PRAZO DE CONSTRUÇÃO (20-1-2016). FIXAÇÃO DE PLACA OFICIAL EM FRENTE AO EMPREENDIMENTO INDICADORA DA CONSTRUÇÃO DO RESIDENCIAL QUINTA DE POTECAS A PARTIR DE 20-1-2014 ATÉ 20-1-2016. INFORMAÇÃO QUE OBRIGA OS FORNECEDORES E INTEGRA O CONTRATO (ARTS. 30 E 47 DO CDC). CONCLUSÃO DA SENTENÇA MANTIDA NO PONTO, AINDA QUE EM PARTE POR FUNDAMENTO DIVERSO. PRAZO DE TOLERÂNCIA DE 180 DIAS. VALIDADE DA CLÁUSULA. INTELIGÊNCIA DO ART. 43-A DA LEI N. 13.786/2018 E DE PRECEDENTE DO STJ EM RECURSO REPETITIVO (TEMA 996). PERÍODO PARA SUPERAÇÃO DE EVENTUAIS IMPREVISTOS RELACIONADOS A FORTUITOS INTERNOS, A EXEMPLO DOS FATORES CLIMÁTICOS CITADOS PELA CONSTRUTORA RÉ. APELO DO AUTOR NÃO ACOLHIDO NESSE TOCANTE. CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES QUE INDICA PRAZO DE TOLERÂNCIA EM DIAS ÚTEIS. NECESSIDADE DE CÔMPUTO EM DIAS CORRIDOS A PARTIR DA DATA PREVISTA PARA A ENTREGA DO IMÓVEL (20-1-2016). MORA QUE ESTARIA CONFIGURADA IN CASU EM 18-7-2016. SENTENÇA QUE ESTABELECEU A DATA EM 20-7-2016. INEXISTÊNCIA DE RECURSO DAS PARTES ESPECIFICAMENTE QUANTO À REFERIDA CONTAGEM. MANUTENÇÃO DO LAPSO TEMPORAL INDICADO NO DECISUM. DESCUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS DA PARTE REQUERIDA EVIDENCIADO. TERMO FINAL DA MORA DAS RÉS. DESACERTO NA LIMITAÇÃO DO PRAZO CONFORME A DATA DE EXPEDIÇÃO DO "HABITE-SE" (EM 21-12-2017). POSSE DEFINITIVA DO BEM PARA FIM DE MORADIA OCORRIDA APENAS EM 14-6-2018. LAPSO TAMBÉM RECONHECIDO EM AÇÕES DE REINTEGRAÇÃO E IMISSÃO NA POSSE CONEXAS. NECESSIDADE DE ENTREGA JURÍDICA DO BEM. RECURSO DO ACIONANTE ACOLHIDO NO PONTO.
JUROS DE PRÉ-AMORTIZAÇÃO (JUROS DE OBRA). IRRESIGNAÇÕES COMUNS. PRESTAÇÕES PAGAS PELO ADQUIRENTE EM CONTRATOS DE FINANCIAMENTO ORIUNDOS DO PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA QUE, ATÉ A CONCLUSÃO DA OBRA, NÃO AMORTIZAM O SALDO DEVEDOR, MAS APENAS A TAXA DE EVOLUÇÃO DA OBRA. ATRASO NA CONCLUSÃO DO EMPREENDIMENTO POR CULPA DAS RÉS QUE IMPEDIU O AUTOR DE COMEÇAR A QUITAR, NO PRAZO AJUSTADO, O EFETIVO SALDO DEVEDOR. NOTÓRIO PREJUÍZO. TEMÁTICA JULGADA PELO STJ EM RECURSO REPETITIVO (TEMA 996). IMPOSSIBILIDADE DE DAR GUARIDA À LIMITAÇÃO IMPOSTA NA SENTENÇA ATÉ A DATA DE EXPEDIÇÃO DO HABITE-SE. ILICITUDE DE QUALQUER COBRANÇA APÓS O PRAZO DE CONCLUSÃO DA OBRA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DAS RÉS PARA RESPONDEREM PELO RESSARCIMENTO DOS JUROS DE OBRA INDEVIDOS (COMPREENDIDOS DE 20-7-2016 ATÉ A DATA DE INÍCIO DA AMORTIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR DO CONTRATO DE FINANCIAMENTO). PROVIMENTO APENAS DO APELO DO AUTOR NESTE ASPECTO. CASO CONCRETO NO QUAL, MESMO APÓS A ENTREGA DAS CHAVES, NÃO FOI ENCERRADO O PERÍODO DE CARÊNCIA CONTRATUAL (PRÉ-AMORTIZADOR) E INICIADO O PERÍODO DE AMORTIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR DO ADQUIRENTE. PROCRASTINAÇÃO SEM JUSTIFICATIVA ACERCA DO INÍCIO DA FASE DE AMORTIZAÇÃO QUE CAUSA ONERAÇÃO EXCESSIVA NAS PRESTAÇÕES DEVIDAS PELO ADQUIRENTE. DEFERIMENTO DO PEDIDO AUTORAL DE TUTELA RECURSAL NESSE PONTO. DETERMINAÇÃO AO BANCO ACIONADO PARA IMPLEMENTAÇÃO DA REFERIDA FASE, NO PRAZO DE 5 DIAS, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA.
CLÁUSULA PENAL. APELO DA CONSTRUTORA RÉ. SUSCITADA A CRIAÇÃO DE UMA NOVA CLÁUSULA, AO INVÉS DA INVERSÃO. ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE DE (A) INVERSÃO EM CASO DE ATRASO INFERIOR A 12 MESES E (B) INCIDÊNCIA DA PENALIDADE SOBRE O VALOR TOTAL DO CONTRATO. TESES INACOLHIDAS. PREVISÃO NA AVENÇA APENAS EM DESFAVOR DO ADQUIRENTE. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO À PARTE CONTRÁRIA NA HIPÓTESE DE DESCUMPRIMENTO DE SUAS OBRIGAÇÕES. TEMÁTICA ENFRENTADA EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL REPETITIVO DO STJ (TEMA 971). INVERSÃO DA CLÁUSULA QUE INCIDE A PARTIR DA CONSTATAÇÃO DA MORA. APLICABILIDADE TANTO PARA CASOS DE INADIMPLEMENTO ABSOLUTO QUANTO RELATIVO. DEVIDA INVERSÃO DA MULTA CONTRATUAL EM FAVOR DO CONSUMIDOR. VALOR ESTIPULADO COM BASE NO TOTAL DO CONTRATO. PRESTAÇÃO INADIMPLIDA PELA PARTE RÉ CONSUBSTANCIADA NA FALTA DE ENTREGA DO IMÓVEL NO PRAZO AJUSTADO. MONTANTE NÃO EXPRESSIVO NA HIPÓTESE EM CONFORMIDADE COM O DISPOSITIVO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO JULGADOS NOS AUTOS DE ORIGEM. ABUSIVIDADE NÃO CONSTATADA. OBSERVÂNCIA DOS ARTS. 412 E 413 DO CÓDIGO CIVIL. MANUTENÇÃO DO QUANTUM.
DANOS MORAIS. PRETENSÃO AUTORAL DE REFORMA DA SENTENÇA. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL, DESTINADO À RESIDÊNCIA DO DEMANDANTE, POR QUASE DOIS ANOS. LAPSO TEMPORAL QUE, EMBORA LONGO, NÃO ENSEJA A PRESUNÇÃO DE ABALO MORAL INDENIZÁVEL NO PRESENTE CASO. OCORRÊNCIA DE DISSABOR INERENTE À EXPECTATIVA FRUSTRADA. SITUAÇÃO DOS AUTOS QUE NÃO RETRATA CIRCUNSTÂNCIA DE EXTRAORDINÁRIA ANGÚSTIA OU HUMILHAÇÃO AO AUTOR. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE OUTROS FATOS QUE PODERIAM CAUSAR O ABALO ANÍMICO INDENIZÁVEL (ART. 373, I, DO CPC). DEVER DE INDENIZAR NÃO CONFIGURADO. SÚMULA 29 DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRECEDENTES. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA NO PONTO.
ENCARGOS SUCUMBENCIAIS. APELOS DAS RÉS. PRETENSÃO DE REDIMENSIONAMENTO DA SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DO AUTOR RECONHECIDA EM PRIMEIRO GRAU. ACOLHIMENTO PARCIAL. ACIONANTE VENCEDOR EM QUATRO DOS SEIS PEDIDOS PRINCIPAIS. DERROTA EM RELAÇÃO AO PEDIDO SUBSTANCIAL DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E QUANTO AO PLEITO DE DECLARAÇÃO DE ILEGALIDADE DA CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA. AJUSTES QUANTO AO TERMO FINAL DA MORA DAS REQUERIDAS E QUANTO AO TERMO FINAL DE INCIDÊNCIA DOS JUROS DE PRÉ-AMORTIZAÇÃO. CONSTATAÇÃO DE SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. INTELIGÊNCIA DO ART. 86, CAPUT, DA LEI ADJETIVA CIVIL. ADEQUAÇÃO DA PROPORÇÃO DAS DESPESAS (75% A CARGO DAS RÉS E 25% AO AUTOR). VERBA HONORÁRIA TAMBÉM AJUSTADA. DISTRIBUIÇÃO PROPORCIONAL DOS ENCARGOS EFETIVADA (ART. 85 DO CPC).
PREQUESTIONAMENTO. DESNECESSIDADE DE O JULGADOR SE MANIFESTAR SOBRE TODOS OS DISPOSITIVOS APONTADOS PELAS PARTES QUANDO NÃO SE MOSTRAREM RELEVANTES PARA O DESLINDE DA CONTROVÉRSIA.
RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS.

ACÓRDÃO


Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, a) conhecer do recurso do autor e dar-lhe parcial provimento para: a.1) fixar o termo final da mora das requeridas pelo atraso na entrega do imóvel no dia 14-6-2018, a.2) fixar o termo final da condenação solidária das rés acerca dos juros de obra na data de início da amortização do saldo devedor do autor (término da fase de pré-amortização/carência do contrato de financiamento), observada a integralidade da fundamentação do presente julgamento nesse ponto, e a.3) deferir o pedido de tutela recursal de urgência e determinar ao Banco acionado, no prazo de 5 (cinco) dias, o início da fase de amortização do saldo devedor, nos termos do contrato de financiamento n. 138.607.834, sob pena de multa diária em caso de descumprimento no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), limitada a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais); e b) conhecer dos recursos das requeridas e dar-lhes parcial provimento tão somente para redistribuir os encargos sucumbenciais na proporção de 25% (vinte e cinco por cento) das custas pelo autor e 75% (setenta e cinco por cento) a cargo das rés; quanto aos honorários advocatícios de sucumbência, mantém-se os estipêndios em favor do patrono do autor em 10% (dez por cento) do valor da condenação e arbitram-se aqueles fixados em favor dos causídicos das partes requeridas em 10% (dez por cento) do proveito econômico obtido. A exigibilidade das verbas sucumbenciais fica suspensa em face do autor em razão de ser beneficiário da justiça gratuita, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 19 de outubro de 2023.

Documento eletrônico assinado por LUIZ FELIPE S. SCHUCH, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 4022334v38 e do código CRC fde8f4be.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUIZ FELIPE S. SCHUCHData e Hora: 30/10/2023, às 19:13:44

 

 










EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 19/10/2023

Apelação Nº 0303288-75.2019.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH

PRESIDENTE: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH

PROCURADOR(A): MURILO CASEMIRO MATTOS
SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: ANDRE LUIS JUNCKES por ODINEI JOSE DIASSUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: CAROLINA CESA DE MELO DE SOUZA por JAT ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES LTDA
APELANTE: ODINEI JOSE DIAS (AUTOR) ADVOGADO(A): ANDRE LUIS JUNCKES (OAB SC045416) APELANTE: JAT ENGENHARIA E CONSTRUÇÕES LTDA (RÉU) ADVOGADO(A): MARILIA SILVA TEIXEIRA (OAB SC043124) ADVOGADO(A): CAROLINA CESA DE MELO DE SOUZA (OAB SC030068) APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (RÉU) APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 19/10/2023, na sequência 310, disponibilizada no DJe de 02/10/2023.
Certifico que a 4ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 4ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, A) CONHECER DO RECURSO DO AUTOR E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO PARA: A.1) FIXAR O TERMO FINAL DA MORA DAS REQUERIDAS PELO ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL NO DIA 14-6-2018, A.2) FIXAR O TERMO FINAL DA CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DAS RÉS ACERCA DOS JUROS DE OBRA NA DATA DE INÍCIO DA AMORTIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR DO AUTOR (TÉRMINO DA FASE DE PRÉ-AMORTIZAÇÃO/CARÊNCIA DO CONTRATO DE FINANCIAMENTO), OBSERVADA A INTEGRALIDADE DA FUNDAMENTAÇÃO DO PRESENTE JULGAMENTO NESSE PONTO, E A.3) DEFERIR O PEDIDO DE TUTELA RECURSAL DE URGÊNCIA E DETERMINAR AO BANCO ACIONADO, NO PRAZO DE 5 (CINCO) DIAS, O INÍCIO DA FASE DE AMORTIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR, NOS TERMOS DO CONTRATO DE FINANCIAMENTO N. 138.607.834, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA EM CASO DE DESCUMPRIMENTO NO VALOR DE R$ 400,00 (QUATROCENTOS REAIS), LIMITADA A R$ 50.000,00 (CINQUENTA MIL REAIS); E B) CONHECER DOS RECURSOS DAS REQUERIDAS E DAR-LHES PARCIAL PROVIMENTO TÃO SOMENTE PARA REDISTRIBUIR OS ENCARGOS SUCUMBENCIAIS NA PROPORÇÃO DE 25% (VINTE E CINCO POR CENTO) DAS CUSTAS PELO AUTOR E 75% (SETENTA E CINCO POR CENTO) A CARGO DAS RÉS; QUANTO AOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA, MANTÉM-SE OS ESTIPÊNDIOS EM FAVOR DO PATRONO DO AUTOR EM 10% (DEZ POR CENTO) DO VALOR DA CONDENAÇÃO E ARBITRAM-SE AQUELES FIXADOS EM FAVOR DOS CAUSÍDICOS DAS PARTES REQUERIDAS EM 10% (DEZ POR CENTO) DO PROVEITO ECONÔMICO OBTIDO. A EXIGIBILIDADE DAS VERBAS SUCUMBENCIAIS FICA SUSPENSA EM FACE DO AUTOR EM RAZÃO DE SER BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH
Votante: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCHVotante: Desembargador HELIO DAVID VIEIRA FIGUEIRA DOS SANTOSVotante: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO
JOANA DE SOUZA SANTOS BERBERSecretária