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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 0300016-35.2020.8.24.0033 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Monteiro Rocha
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Segunda Câmara de Direito Civil
Julgado em: Thu Jul 20 00:00:00 GMT-03:00 2023
Classe: Apelação

 









Apelação Nº 0300016-35.2020.8.24.0033/SC



RELATOR: Desembargador MONTEIRO ROCHA


APELANTE: LUIZIANE ESTER ZANELLA KAMMERS (EMBARGANTE) APELADO: INGA VEICULOS LTDA (EMBARGADO)


RELATÓRIO


Na comarca de Itajaí, Luiziane Ester Zanella Kammers opôs embargos à execução que lhe move Inga Veículos LTDA., arguindo, preliminarmente, nulidade da citação da pessoa jurídica Novo Trigo Comércio de Gêneros Alimentícios Ltda.
No mérito, sustentou a inexigibilidade parcial do título extrajudicial (contrato de compra e venda), a impossibilidade da cobrança de R$20.240,00 (vinte mil duzentos e quarenta reais), ante a existência de multa moratória.
Subsidiariamente, pleiteou a redução equitativa da multa compensatória.
Houve impugnação (evento 9 dos autos de origem).
Apreciando antecipadamente a lide, o magistrado a quo reconheceu a ilegitimidade ativa ad causam da embargante e julgou extinto o feito, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC (evento 40 dos autos de origem).
Irresignada com a prestação jurisdicional entregue, a embargante interpôs apelação, aduzindo que "figura como principal pagadora e responsável pelo cumprimento de todas as cláusulas e condições do contrato, conforme cláusula 5 pacto".
Alegou que "é uma das responsáveis solidárias pelo cumprimento da obrigação, sendo assim parte legítima para atuar no polo ativo da presente demanda".
Assim discorrendo, postulou o provimento do recurso, com a anulação da sentença, ante a inobservância de que a fiadora é parte legítima para figurar no polo ativo dos autos.
Pugnou pela declaração de inexigibilidade da multa compensatória, no valor de R$20.240,00 (vinte mil duzentos e quarenta reais), pela prevalência da multa moratória, pela redução equitativa da multa compensatória e redução equitativa do 'desconto comercial'.
Contrarrazões no evento 23 dos autos de origem.
É o relatório.

VOTO


Insurge-se a fiadora contra sentença proferida em embargos à execução, que reconheceu a ilegitimidade ativa ad causam e julgou extinto o feito, sem resolução de mérito.
Em suas razões recursais, alega a apelante que "figura como principal pagadora e responsável pelo cumprimento de todas as cláusulas e condições do contrato, conforme cláusula 5 pacto".
Aduz que "é uma das responsáveis solidárias pelo cumprimento da obrigação, sendo assim parte legítima para atuar no polo ativo da presente demanda".
In casu, o magistrado a quo declarou a ilegitimidade ativa ad causam da fiadora para discutir cláusulas do contrato principal, sob os seguintes fundamentos:
"O contrato de compra e venda (contratos principais) possuem natureza diversa do contrato de fiança (contrato acessório).
Diante dessa distinção, aos fiadores cabe a discussão acerca das cláusulas contratuais do contrato de fiança, sendo-lhes vedado discutir sobre a validade das cláusulas dos contratos principais - matéria reservada aos contratantes principais (verdadeiros legitimados).
Essa distinção decorre da regra processual de que não se pode pleitear direito alheio em nome próprio, nos termos do art. 18 do CPC:
Art. 18. Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico.
Parágrafo único. Havendo substituição processual, o substituído poderá intervir como assistente litisconsorcial.
[...]
Note-se, todas as alegações do executado/embargante se remetem à revisão contratual, pois visam o afastamento ou redução de encargos estabelecidos no contrato principal (contrato de compra e venda), não podendo ser conhecidas nesses autos, dada a ilegitimidade ativa dos fiadores para discussão de questões referentes ao contrato principal.
Ademais, ao contrário do que aponta a executada/embargante, o fato desta ter assumido solidariamente a responsabilidade pelo pagamento integral do contrato não a constitui como "compradora" ou "adquirente" do bem objeto do contrato de compra e venda, mas como fiadora com responsabilidade solidária.
Isso porque, compulsando atentamente o contrato de compra e venda exequendo (evento 1:4 dos autos da execução nº 0305464-23.2019.8.24.0033), consta como COMPRADORA apenas a pessoa jurídica "NOVO TRIGO COMÉRCIO DE GÊNEROS ALIMENTÍCIOS LTDA", da qual a executada/embargante era sócia à época da contratação.
A executada/embargante, por outro lado, figura como INTERVENIENTE GARANTIDORA, constando, ainda, uma cláusula que estabelece expressamente que esta se obrigou mediante FIANÇA (cláusula 05 do contrato de compra e venda do (evento 1:4 dos autos da execução nº 0305464-23.2019.8.24.0033).
Importa, ainda, repisar que, na forma do art. 49-A do CC, "a pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores", de modo que, tanto a pessoa jurídica quanto o sócio fiador, assumiram cada qual um papel completamente distinto na relação jurídica em apreço.
Assim, é de se ressaltar que a executada/embargante LUIZIANE ESTER ZANELLA KAMMERS figura apenas como fiadora com responsabilidade solidária do referido contrato.
Dito isso, para aferição da ilegitimidade ativa dos fiadores pouco importa se se trata de responsabilidade subsidiária ou solidária destes.
Isso porque, em todo caso, os fiadores possuem um interesse meramente econômico na redução do montante devido - mas que não se confunde com o interesse jurídico para fins de legitimação processual.
[...]
Assim, como os pedidos manifestados na exordial visam afastar/reduzir os encargos expressamente previstos no contrato principal de compra e venda, resta evidente a pretensão de revisar o contrato principal - pretensão para a qual os fiadores, com responsabilidade solidária ou subsidiária, não possuem legitimidade processual.
Desse modo, RECONHEÇO a ilegitimidade ativa da executada/embargante para discutir as cláusulas e penalidades impostas pelo contrato principal de compra e venda."
Preceitua o art. 818 do Código Civil que "Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra".
A fiança contratual é espécie de contrato secundário que pressupõe a existência de um contrato principal.
A relação jurídica que se estabelece entre o credor e o devedor do negócio jurídico principal - na hipótese, contrato de compra e venda de veículo celebrado entre Novo Trigo Comércio de Gêneros Alimentícios LTDA. e Inga Veículos LTDA. -, não se confunde com a relação estabelecida no contrato de fiança, pacto secundário, firmado entre aquele mesmo credor e a fiadora, que se apresenta como mera garantidora do adimplemento da obrigação principal.
O contrato principal e o contrato de fiança dizem respeito a relações jurídico-materiais distintas, razão pela qual evidencia-se a ilegitimidade da fiadora para postular, em nome próprio, a revisão do contrato principal de compra e venda de veículo, tendo em vista que as cláusulas da avença foram livremente estipuladas pelos contratantes (credor e devedor).
Diante desse contexto, o fiador não é parte legítima para postular, em nome próprio, a revisão das cláusulas e encargos do contrato principal. Sobre o tema, colaciona-se entendimento do STJ:
"RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART.535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO.MÚTUO.ILEGITIMIDADE ATIVA DO FIADOR. ACESSORIEDADE DO CONTRATO DE FIANÇA. RELAÇÃO DE DIREITO MATERIAL DE NATUREZA DISTINTA DA QUE SE ESTABELECE NO CONTRATO PRINCIPAL.1. Ação de revisão de dois contratos de mútuo firmados entre a empresa recorrente - que figura no primeiro contrato apenas como fiadora e no segundo como devedora principal - e a Caixa Econômica Federal - credora. Ilegitimidade ativa da fiadora no tocante ao primeiro negócio jurídico e prescrição da pretensão relativa à revisão da segunda avença reconhecidas pelas instâncias de origem.2. Recurso especial que veicula as pretensões de que seja: (i) reconhecida a legitimidade ativa ad causam do fiador para, exclusivamente e em nome próprio, pretender em juízo a revisão e o afastamento de cláusulas e encargos abusivos constantes do contrato principal e (ii) afastado o reconhecimento da ocorrência da prescrição da pretensão revisional relativa ao segundo contrato bancário em apreço, no qual figurou a autora da demanda como devedora principal da obrigação.3. A legitimação para agir, que não se confunde com o interesse de agir, é qualidade reconhecida ao titular do direito material que se pretenda tutelar em juízo. Daí porque o fiador, que, como consabido, não pode atuar como substituto processual, não é parte legítima para postular, em nome próprio, a revisão das cláusulas e encargos do contrato principal.4. A existência de interesse econômico da recorrente (fiadora) na eventual minoração da dívida que se comprometeu perante à recorrida (credora) garantir, não lhe confere por si só legitimidade ativa para a causa revisional da obrigação principal, sendo irrelevante, nesse aspecto, o fato de responder de modo subsidiário ou mesmo solidariamente pelo adimplemento da obrigação.5. A pretensão revisional de contrato bancário, diante da ausência de previsão legal específica de prazo distinto, prescreve em 10 (dez) anos (sob a égide do Código Civil vigente) ou 20 (vinte) anos (na vigência do revogado Código Civil de 1916), pois fundada em direito pessoal, sendo completamente descabido falar, em casos tais, na aplicação do prazo quinquenal a que se referia o art. 178, § 10, do Código Civil revogado.6. Recurso especial parcialmente provido para, afastando a prescrição indevidamente reconhecida na origem, determinar o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau para que dê regular processamento ao pleito revisional/repetitório apenas no tocante ao contrato de fls. 210/218" (REsp 926.792/SC, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/04/2015, DJe 17/04/2015)
Não destoa o entendimento deste e. Tribunal:
"Em que pese todo o alegado, é certo que a Sra. Rachelle não possui legitimidade ativa para pleitear a rescisão do contrato objeto da ação, eis que figurou nele apenas na condição de fiadora. Constituindo a fiança um contrato acessório, descabe ao fiador discutir as cláusulas do contrato principal, na medida em que por ele responderá apenas se o credor principal não o fizer (art. 818, CC). Diante disso, tem-se que o interesse do fiador é unicamente econômico, o que não o legitima para figurar no polo ativo da relação jurídico-processual a ser estabelecida nos autos da ação de rescisão do contrato principal." (TJSC, Agravo de Instrumento n. 5027879-19.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Marcus Tulio Sartorato, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 26-10-2021).
Além disso, a tese de que a fiadora embargante "é uma das responsáveis solidárias pelo cumprimento da obrigação, sendo assim parte legítima para atuar no polo ativo da presente demanda" não prospera, porquanto "Eventual interesse reflexo da fiadora, ora recorrente, pela redução da dívida resultante do possível inadimplemento da obrigação, não lhe confere por si só legitimidade ativa para a causa revisional da obrigação principal, sendo irrelevante, nesse aspecto, o fato de responder de modo subsidiário ou mesmo solidariamente pela dívida" (REsp 926.792/SC, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/04/2015, DJe 17/04/2015).
Em decorrência, mantém-se a sentença que reconheceu a ilegitimidade ativa ad causam da fiadora para revisar cláusulas do contrato principal (compra e venda) objeto de execução e extinguiu os embargos à execução, sem resolução de mérito, improvendo-se o recurso da apelante.
Resultado do julgamento
Por tais razões, conheço do recurso e nego-lhe provimento, majorando-se os honorários advocatícios de 10% para 15% sobre o valor atualizado da causa, nos moldes previstos pelo art. 85, §11, do CPC.
Dispositivo
Em decorrência, voto no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

Documento eletrônico assinado por MONTEIRO ROCHA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3398009v78 e do código CRC 2627d3d6.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): MONTEIRO ROCHAData e Hora: 24/7/2023, às 16:14:12

 

 












Apelação Nº 0300016-35.2020.8.24.0033/SC



RELATOR: Desembargador MONTEIRO ROCHA


APELANTE: LUIZIANE ESTER ZANELLA KAMMERS (EMBARGANTE) APELADO: INGA VEICULOS LTDA (EMBARGADO)


EMENTA


DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS À EXECUÇÃO - EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO - ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM - INSURGÊNCIA DA EMBARGANTE - INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXTRAJUDICIAL (CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULO) - DISCUSSÃO ACERCA DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS - INVIABILIDADE - ACESSORIEDADE DO CONTRATO DE FIANÇA - ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO FIADOR - PRECEDENTES - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO IMPROVIDO.
O fiador não é parte legítima para postular, em nome próprio, a revisão das cláusulas e encargos do contrato principal.

ACÓRDÃO


Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 20 de julho de 2023.

Documento eletrônico assinado por MONTEIRO ROCHA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3398010v8 e do código CRC cce9dae6.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): MONTEIRO ROCHAData e Hora: 24/7/2023, às 16:14:12

 

 










EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 20/07/2023

Apelação Nº 0300016-35.2020.8.24.0033/SC

RELATOR: Desembargador MONTEIRO ROCHA

PRESIDENTE: Desembargador VOLNEI CELSO TOMAZINI

PROCURADOR(A): VANIO MARTINS DE FARIA
SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: Felipe Probst Werner por LUIZIANE ESTER ZANELLA KAMMERS
APELANTE: LUIZIANE ESTER ZANELLA KAMMERS (EMBARGANTE) ADVOGADO(A): Felipe Probst Werner (OAB SC029532) APELADO: INGA VEICULOS LTDA (EMBARGADO) ADVOGADO(A): FABIO LUIS ANTONIO (OAB PR031149) ADVOGADO(A): WILLIAN SCHOLL (OAB PR045972)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 20/07/2023, na sequência 3, disponibilizada no DJe de 03/07/2023.
Certifico que a 2ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 2ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E NEGAR-LHE PROVIMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador MONTEIRO ROCHA
Votante: Desembargador MONTEIRO ROCHAVotante: Desembargador SEBASTIÃO CÉSAR EVANGELISTAVotante: Desembargador VOLNEI CELSO TOMAZINI
YAN CARVALHO DE FARIA JUNIORSecretário