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TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 5003833-70.2021.8.24.0030 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Luiz Zanelato
Origem: Tribunal de Justiça de Santa Catarina
Orgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Comercial
Julgado em: Thu Dec 08 00:00:00 GMT-03:00 2022
Classe: Apelação

 


Citações - Art. 927, CPC: Súmulas STJ: 90, 486








Apelação Nº 5003833-70.2021.8.24.0030/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO


APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (EMBARGADO) APELADO: M S SUL AGENCIA MARITIMA LTDA (EMBARGANTE) APELADO: MARCELO ADAM BORBA (EMBARGANTE) APELADO: GUILHERME ADAM BORBA (EMBARGANTE)


RELATÓRIO


BANCO DO BRASIL S.A. interpôs recurso de apelação contra a sentença proferida pelo magistrado de primeiro grau Antônio Carlos Ângelo,  nos autos da ação de embargos à execução proposta por M S SUL AGENCIA MARITIMA LTDA, MARCELO ADAM BORBA e GUILHERME ADAM BORBA, em curso perante o juízo da 1ª Vara da Comarca de Imbituba, que julgou procedentes os pedidos formulados na petição inicial, nestes termos:
MARCELO ADAM BORBA, GUILHERME ADAM BORBA e M S SUL AGENCIA MARITIMA LTDA - ME, opuseram EMBARGOS À EXECUÇÃO contra eles proposta por BANCO DO BRASIL S.A., objetivando a extinção da expropriatória e declaração de impenhorabilidade do bem de família lá indicado à penhora.
A certidão acostada no Evento 5 consignou que "os presentes embargos são intempestivos, tendo em vista que o curador nomeado aos executados/embargantes citados por edital, foi intimado da decisão acerca da sua nomeação, bem como para apresentar embargos com início do prazo em 25/05/2021 e término em 15/06/2021 (eventos 223 e 231/234 da execução), sendo protocolado em 18/08/2021".
Apesar disso, a decisão lançada no Evento 7 consignou que os presentes embargos seriam processados, apesar da intempestividade, porque "além da contestação por negativa geral (prerrogativa do curador especial nomeado), foi invocada questão de ordem pública, consistente na alegada impenhorabilidade do imóvel referido"
Assim, com a impugnação da parte exequente/embargada (Evento 10), vieram os autos conclusos.
 
É O BREVE RELATÓRIO.
FUNDAMENTO E DECIDO.
 
Como é sabido, o prazo para oferecimento de embargos à execução de título extrajudicial é de 15 (quinze) dias, a contar da juntada aos autos do mandado de citação, consoante arts. 213 e 915 do CPC. 
Ocorre que, no presente caso, os embargos foram manejados por intermédio de curador especial nomeado especificamente para tal finalidade, porquanto foram os executados/embargantes citados por edital na execução/processo de origem.
Dessa feita, possível a contestação por negativa geral - prerrogativa essa do curador especial (art. 341, inc. III, CPC).
E, nesse ponto, reputo que não há qualquer indicativo que acene para eventual nulidade a ser conhecida na execução de origem (autos n. 0003419-32.1999.8.24.0030).
Os títulos extrajudiciais lá carreados possuem liquidez, certeza e exigibilidade.
Contudo, mesmo sabendo que "Embargos à Execução" (art. 915, CPC), não se confundem com os "Embargos à Penhora" (art. 854, § 3º, CPC), reputo possível conhecer - através do presente feito - da evocada impenhorabilidade do imóvel lá indicado à penhora, por ser essa uma questão de ordem pública.
É que a consulta pública realizada através do serviço disponibilizado pelo Colégio Registral Imobiliário de Santa Catarina   aponta que, de fato, na presente data e em nome do executado Guilherme Adam Borba, há registro de apenas aquele imóvel então indicado à penhora, o que demonstra ser o único a ele pertencente.
Diante disso, possível o reconhecimento da impenhorabilidade do mencionado bem, conforme disposto na Lei n. 8.009/90, in verbis:
Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.
Ademais, quando instado, o exequente não logrou comprovar a existência de outro bem imóvel do(s) executado(s), que pudesse derruir a presunção que advém da alegação do embargante e da consulta ora realizada.
Portanto, tendo em conta que os elementos então trazidos à analise conferem verossimilhança à evocada impenhorabilidade (art. 3º da Lei n. 8.009/90), tenho por bem INDEFERIR o pleito pela penhora do imóvel identificado pela Matrícula n. 6.870 (Ofício de Registro de Imóveis desta Comarca), postulada no processo principal.
DISPOSITIVO:
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos deduzidos nos embargos à execução em tela, apenas para indeferir, de plano, o pleito formulado na execução de origem - processo 0003419-32.1999.8.24.0030/SC, evento 161, PET204 - consistente na penhora do imóvel identificado pela Matrícula n. 6.870 (Ofício de Registro de Imóveis desta Comarca), pertencente ao embargante Guilherme Adam Borba, em face da sua impenhorabilidade.
Eventuais custas, se houver, pelo embargado.
Fixo a remuneração do curador especial nomeado em prol dos embargantes - Dr. David Lehmkuhl Torres (OAB/SC 53.866), em R$ 318,91 (trezentos e dezoito reais e noventa e um centavos), nos temos do que prevê a Resolução CM n. 5/2019.
Requisite-se o pagamento através do sistema AJG/PJSC.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Oportunamente, arquive-se. (Evento 14 - eproc 1g)
Irresignada, a parte embargada interpôs recurso de apelação, sob os fundamentos de que: a) a prova de que se trata de bem impenhorável deve ser robusta, ou seja, se faz necessário comprovar de forma cabal que o imóvel penhorado está revestido pelo manto da impenhorabilidade. A pretensão acerca da alegação de impenhorabilidade trazida pela parte contrária não merece prosperar. Isso porque, mesmo tendo a parte alegado a impenhorabilidade de imóvel, deixou-se de demonstrar ausência de outro bem de sua propriedade; b) a ação expropriatória tem por objetivo a satisfação do crédito, concretizando o comando normativo obrigacional previsto no título executivo. Isto é, a execução se faz no interesse do credor, conforme art. 797 do CPC. Desta forma, ao ser realizada a execução no interesse do credor, nos termos do permissivo legal supracitado, esta deve ser conduzida de forma a que se obtenha o resultado pretendido pelo exequente. Por fim, devendo o Estado-Juiz garantir a efetividade de suas decisões, a reforma da sentença e manutenção da penhora sobre o imóvel pertencente ao apelado é medida que se impõe, pelos fatos e fundamentos acima delineados (Evento 23 - eproc 1g).
Intimada a parte apelada, não foram apresentadas as contrarrazões no prazo legal.
O recurso ascendeu ao Tribunal de Justiça e foi distribuído a esta relatoria.
Os autos vieram conclusos. 
Este é o relatório.

VOTO


1. Exame de admissibilidade
Inicialmente, registra-se que se trata de recurso de apelação interposto contra sentença prolatada sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este diploma processual que disciplina o cabimento, o processamento e a análise do presente recurso, haja vista o princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais). 
Feitas estas digressões, conheço do recurso de apelação porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade. 
2. Fundamentação 
A responsabilidade patrimonial do devedor no processo executivo encontra previsão legal no artigo 798 do Código de Processo Civil, segundo o qual "o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei".
Em complemento, a norma do artigo 832 do CPC dispõe que "não estão sujeitos à execução os bens que a lei considera impenhoráveis ou inalienáveis".
Na lição de Fredie Didier Júnior, "a impenhorabilidade de certos bens é uma restrição ao direito fundamental à tutela executiva. É uma técnica processual que limita a atividade executiva e que se justifica como meio de proteção de alguns bens jurídicos relevantes, como a dignidade do executado, o direito ao patrimônio mínimo, a função social da empresa ou a autonomia da vontade. São regras que compõem o devido processo legal, servindo como limitações políticas à execução forçada. (Curso de Direito Processual Civil: execução. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 831).
Por essa razão, o legislador estabelece um rol no artigo 833 do Código de Processo Civil que prevê os principais bens considerados impenhoráveis, in verbis:
Art. 833.  São impenhoráveis:I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;II - os móveis, os pertences e as utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou os que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2o;V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do executado;VI - o seguro de vida;VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;X - a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos;XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos por partido político, nos termos da lei;XII - os créditos oriundos de alienação de unidades imobiliárias, sob regime de incorporação imobiliária, vinculados à execução da obra.§ 1º A impenhorabilidade não é oponível à execução de dívida relativa ao próprio bem, inclusive àquela contraída para sua aquisição.§ 2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º , e no art. 529, § 3º .§ 3º Incluem-se na impenhorabilidade prevista no inciso V do caput os equipamentos, os implementos e as máquinas agrícolas pertencentes a pessoa física ou a empresa individual produtora rural, exceto quando tais bens tenham sido objeto de financiamento e estejam vinculados em garantia a negócio jurídico ou quando respondam por dívida de natureza alimentar, trabalhista ou previdenciária.
Estabelece o art. 5º da Lei nº 8.009/90:
Art. 5º Para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente. (grifou-se)
Parágrafo único. Na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis e na forma do art. 70 do Código Civil.
Denota-se, pela leitura do referido dispositivo legal, que a lei não exige a comprovação de tal requisito. Pelo contrário, permite, inclusive, que o casal ou a entidade familiar possua vários imóveis, caso em que a proteção da impenhorabilidade incidirá sobre o imóvel de menor valor. 
Logo, diferentemente do que sustenta o banco apelante, não há se falar em impor ao executado que faça prova negativa de propriedade de imóveis além daquele que foi penhorado constitui ônus de produzir prova diabólica, tendo em vista a dificuldade que terá a parte de coletar certidões negativas em todos os registros imobiliários existentes para comprovar o fato. 
O ônus probatório da existência de outros imóveis, que não aquele de residência da família do devedor, deve ser atribuído ao exequente, porquanto é seu o interesse de que a constrição judicial recaia sobre imóveis de maior valor, bem como se trata de prova positiva e possível de ser produzida. 
Com efeito, lecionam Fredie Didier Júnior, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira:
Prova diabólica é aquela que é impossível, senão muito difícil, de ser produzida. "(...) é expressão que se encontra na doutrina para fazer referência àqueles casos em que a prova da veracidade da alegação a respeito de um fato é extremamente difícil, nenhum meio de prova sendo capaz de permitir tal demonstração". Um bom exemplo de prova diabólica é a do autor da ação de usucapião especial, que teria de fazer prova do fato de não ser proprietário de nenhum outro imóvel (pressuposto para essa espécie de usucapião). É prova impossível de ser feita, pois o autor teria de juntar certidões negativas de todos os cartórios de registro de imóvel do mundo... [...] É uma prova unilateralmente diabólica, isto é, impossível (ou extremamente difícil) para uma das partes, mas viável para a outra. (Curso de direito processual civil. Vol. 2. 4.ed. Salvador: Juspodivm, 2009, p. 89/90)
Não bastasse isso, o magistrado singular deixou expresso na sentença que "a consulta pública realizada através do serviço disponibilizado pelo Colégio Registral Imobiliário de Santa Catarina   aponta que, de fato, na presente data e em nome do executado Guilherme Adam Borba, há registro de apenas aquele imóvel então indicado à penhora, o que demonstra ser o único a ele pertencente" (Evento 14.
A interpretação da norma jurídica que prevê o direito à impenhorabilidade do bem da família, deve ser extraída da conjugação dos textos legais dispostos na Lei nº 8.009/90, e nos arts. 1.711 a 1.722 do Código Civil, que visam dar eficácia aos princípios constitucionais do mínimo existencial e do direito à moradia (arts. 1º, III, e 6º, ambos da CF).
Trata-se, pois, de norma que possui forte carga valorativa, o que impõe ao julgador a realização de juízo de ponderação das circunstâncias fáticas e jurídicas existentes. 
Como bem leciona Arnaldo Rizzardo, "no elenco de direitos e garantias, têm-se como da maior relevância aqueles que dizem com a vida e a dignidade do ser humano, envolvendo naturalmente a proteção à moradia, que deve constituir uma das principais metas do próprio Estado. Nesta dimensão, introduziram-se leis destinadas a proteger o patrimônio formado pelos bens utilizados para as pessoas se abrigarem e viverem individualmente ou no conjunto familiar". (Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 855)
O entendimento consolidado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça erige-se no sentido de que a interpretação do magistrado acerca da aplicação do benefício da impenhorabilidade do bem de família não deve ser restrita e literal, mas abrangente e finalística, diante da sua natureza principiológica.
Com efeito, o enunciado na Súmula 486 da Corte Superior de Justça expõe ser impenhorável o único imóvel residencial do devedor, mesmo que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família. 
Senão, vejamos:
BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL LOCADO. IRRELEVÂNCIA. ÚNICO BEM DA DEVEDORA.RENDA UTILIZADA PARA A SUBSISTÊNCIA DA FAMÍLIA. INCIDÊNCIA DA LEI 8.009/90. ART. 1º . TELEOLOGIA. CIRCUNSTÂNCIAS DA CAUSA. PRECEDENTE DA TURMA. RECURSO DESACOLHIDO.I - Contendo a Lei n. 8.009/90 comando normativo que restringe princípio geral do direito das obrigações, segundo o qual o patrimônio do devedor responde pelas suas dívidas, sua interpretação deve ser sempre pautada pela finalidade que a norteia, a levar em linha de consideração as circunstâncias concretas de cada caso.II - Dentro de uma interpretação teleológica e valorativa, calcada inclusive na teoria tridimensional do Direito-fato, valor e norma (Miguel Reale), faz jus aos benefícios da Lei 8.009/90 o devedor que, mesmo não residindo no único imóvel que lhe pertence, utiliza o valor obtido com a locação desse bem como complemento da renda familiar, considerando que o objetivo da norma foi observado, a saber, o de garantir a moradia familiar ou a subsistência da família. [...] O acórdão impugnado concluiu pela dispensa de produção de prova testemunhal, porque, mesmo que eventualmente provado não residir a executada no imóvel indicado para penhora, estaria caracterizado o bem de família. Além de ser o único bem imóvel da devedora, anotou o julgado, o valor obtido com a sua locação serve de complemento à renda familiar. A conclusão adotado pelo julgado, a meu sentir, espelha com fidelidade a teleologia da norma instituidora da impenhorabilidade do bem de família. Não se nega, é bem verdade, que, em se cuidado de norma que restringe o princípio geral do direito das obrigações, segundo o qual o patrimônio do devedor responde pelas suas dívidas, sua interpretação deve ser sempre pautada pela finalidade que a norteia, a levar em consideração as circunstâncias concretas de cada caso. (STJ. REsp 159213/ES, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 20/04/1999, DJ 21/06/1999, p. 162) (grifou-se)
Tal entendimento é esposado por esta Corte estadual, que assim tem decidido:
APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRATO PARTICULAR DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. IMPENHORABILIDADE. BEM DE FAMÍLIA. COMPROVAÇÃO DE QUE O IMÓVEL PENHORADO SERVE DE RESIDÊNCIA AOS EMBARGANTES. DEVEDORES QUE POSSUEM IMÓVEL CONTÍGUO, COM MATRÍCULA DIVERSA, EM QUE FOI EDIFICADA A MORADIA DO FILHO. PROTEÇÃO DA LEI N. 8.009/90 AO BEM DE FAMÍLIA. RECONHECIMENTO QUE PRESCINDE DA DEMONSTRAÇÃO DE QUE É O ÚNICO IMÓVEL PERTENCENTE AO NÚCLEO FAMILIAR. PRECEDENTES DA CÂMARA E DO STJ. AMPLIAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO DADA À LEI 8.009/90, DE MODO A ASSEGURAR A MANUTENÇÃO DOS IMÓVEIS DESTINADOS À RESIDÊNCIA DA ENTIDADE FAMILIAR. DIREITO FUNDAMENTAL À MORADIA. ART. 6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ART. 1º, INCISO III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 2009.069251-8, da Capital - Continente, rel. Des. Soraya Nunes Lins, j. 20-06-2013). (grifou-se)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL (CHEQUE). DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE REJEITOU PEDIDO DE IMPENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA. INSURGÊNCIA DA EXECUTADA.   MÉRITO. CONSTRIÇÃO SOBRE BEM IMÓVEL. ÚNICO REGISTRADO EM NOME DA PARTE EXECUTADA. CERTIDÕES DOS CARTÓRIOS DE REGISTROS DE IMÓVEIS NESTE SENTIDO. EXEGESE DOS ARTIGOS 1º E 5º DA LEI 8.009/90. IMÓVEL ALUGADO A TERCEIRO. VALOR APROXIMADO AO MONTANTE PAGO PELA PARTE DE ALUGUEL EM OUTRA CIDADE. DESTINAÇÃO A MORADIA DEMONSTRADA. EXEGESE DA SÚMULA 486 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DECISÃO CASSADA.   "'É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família'. (Súmula 486 do STJ.) Hipótese em que os embargantes residem em imóvel alugado, noutra cidade, diversa da em que situado o único de sua propriedade, locado a terceiro por valor similar, havendo demonstração que um dos dois imóveis penhorados encontra-se encravado dentro do outro, ausente comprovação de possuírem os embargantes mais um bem imóvel, mantendo-se a impenhorabilidade reconhecida pela sentença. Precedentes do TJRGS e STJ. [...] Apelação a que se nega seguimento". (Apelação Cível Nº 70058433228, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Julgado em 13/02/2014).   RECURSO PROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2013.077494-7, de Blumenau, rel. Des. Guilherme Nunes Born, j. 03-04-2014). (grifou-se)
 EMBARGOS DO DEVEDOR. BEM DE FAMÍLIA. ALEGAÇÃO DE QUE O EMBARGANTE NÃO RESIDE NO IMÓVEL. IRRELEVÂNCIA DO ARGUMENTO. O BEM IMÓVEL ÚNICO DE PROPRIEDADE DA ENTIDADE FAMILIAR É IMPENHORÁVEL. PRECEDENTES DA CORTE SUPERIOR.    O Superior Tribunal de Justiça "tem ampliado a interpretação dada à Lei 8.009/90, visando proteger a pessoa inadimplente da perda total de seus bens e assegurar a ela, no mínimo, a manutenção do imóvel destinado à residência, mesmo que o devedor nele não resida" (REsp 377.901/GO, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJU 11.04.05) (AgRg no REsp n. 1018814/SP, rel. Min. Castro Meira, DJe 28-11-2008). (TJSC, Apelação Cível n. 2004.035946-2, de Modelo, rel. Des. Jorge Luiz de Borba, j. 25-05-2009). (grifou-se)
Oportuno e conveniente salientar, o bem de família é um benefício legal que visa assegurar a garantia do patrimônio mínimo das pessoas e a dignidade da pessoa humana do devedor e de sua família. Para tanto, a legislação brasileira faculta às pessoas a instituição de bem de família convencional ou voluntário (art. 1.712 do CC), sem prejuízo de a própria lei proteger o imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar (Lei nº 8.009/90).
Portanto, para aferir a impenhorabilidade do bem de família, cumpre verificar a finalidade de um único imóvel do patrimônio do devedor, não sendo imprescindível que ele mesmo resida no bem, porquanto é possível que o imóvel sirva para a moradia de outros membros da entidade familiar e o executado esteja residindo em outro local, por motivos diversos. Admite-se, inclusive, a locação do bem, quando os frutos revertem a benefício da subsistência do proprietário.
Sobre o tema, extrai-se da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. EXECUÇÃO. PENHORA. BEM DE FAMÍLIA (LEI 8.009/90, ARTS. 1º E 5º). CARACTERIZAÇÃO. IMÓVEL RESIDENCIAL DO DEVEDOR. ÔNUS DA PROVA. RECURSO PROVIDO.1. Tendo a devedora provado suficientemente (ab initio) que a constrição judicial atinge imóvel da entidade familiar, mostra-se equivocado exigir-se desta todo o ônus da prova, cabendo agora ao credor descaracterizar o bem de família na hipótese de querer fazer prevalecer sua indicação do bem à penhora.2. Nos termos da jurisprudência desta Corte, não é necessária a prova de que o imóvel onde reside o devedor seja o único de sua propriedade, para o reconhecimento da impenhorabilidade do bem de família, com base na Lei 8.009/90. Precedentes.3. Recurso especial provido.(REsp 1014698/MT, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016) [destacou-se]
Admitindo-se, na pior das hipóteses, que a parte executada comprovadamente fosse proprietário de outros imóveis residenciais, ainda assim, socorre-lhe o benefício previsto no art. 5º, caput, e parágrafo único, da Lei nº 8.009/90, porquanto, a teor dessa norma, a impenhorabilidade incide sobre aquele de menor valor, exceto que outro contenha registro imobiliário específico. 
Vai daí, portanto, que, somente quando ficar demonstrada nos autos esta última hipótese, é que, havendo dúvida, ao juiz, incumbe ordenar ao executado que faça prova (porém, positiva) da existência de imóvel constituído como bem de família no registro imobiliário, nos termos do art. 5º, parágrafo único, da Lei nº 8.009/90, e, se inexistente essa condição, então, determinar a avaliação de todos os imóveis, para poder declarar a impenhorabilidade do imóvel de menor valor, situações que não se aplicam ao caso em tela. 
Diante deste panorama, considerando que a proteção à dignidade da família sobrepõe-se à da propriedade, direitos igualmente resguardados constitucionalmente, afigura-se necessário e razoável reconhecer a impenhorabilidade do bem imóvel do qual o executado é titular, tendo em vista se tratar de bem de família, nos termos art. 1º da Lei nº
À luz de todas essas considerações, mostrando-se acertada a sentença hostilizada pela via do recurso em apreciação, sua manutenção é medida que se impõe.
Sucumbência recursal prejudicada (art. 85, § 11, do CPC/15), em razão de não ter havido condenação em honorários advocatícios sucumbenciais, mas apenas remuneração do curador especial nos termos da Resolução CM n. 5/2019, sendo que sequer houve atuação do referido curador especial nesta fase recursal. 
3. Dispositivo
Ante o exposto, voto por conhecer do recurso de apelação e negar-lhe provimento. 

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Apelação Nº 5003833-70.2021.8.24.0030/SC



RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO


APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (EMBARGADO) APELADO: M S SUL AGENCIA MARITIMA LTDA (EMBARGANTE) APELADO: MARCELO ADAM BORBA (EMBARGANTE) APELADO: GUILHERME ADAM BORBA (EMBARGANTE)


EMENTA


APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EMBARGOS À EXECUÇÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARA RECONHECER A IMPENHORABILIDADE DO IMÓVEL CONSTRITO. RECURSO DO BANCO EMBARGADO.BEM DE FAMÍLIA (ARTIGO 1º DA LEI Nº 8.009/90). INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DA NORMA PROTETIVA. RECONHECIDA A IMPENHORABILIDADE DO BEM IMÓVEL ONDE RESIDE A PARTE EXECUTADA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA INEXISTÊNCIA DE OUTROS BENS IMÓVEIS PARA RECONHECIMENTO DO BEM DE FAMÍLIA. PROVA EM CONTRÁRIO NÃO PRODUZIDA PELO CREDOR. ÔNUS DE SUA INCUMBÊNCIA. ADEMAIS, POSSIBILIDADE DE O DEVEDOR SER PROPRIETÁRIO DE OUTROS IMÓVEIS RESIDENCIAIS, HIPÓTESE EM QUE A PROTEÇÃO LEGAL PREVALECE SOBRE O DE MENOR VALOR OU NAQUELE GRAVADO COM ESTA CONDIÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO COMPETENTE. PROVA NESSE SENTIDO TAMBÉM DE ATRIBUIÇÃO DO EXEQUENTE, TODAVIA NÃO FORNECIDA AOS AUTOS.  BEM CARACTERIZADO COMO IMPENHORÁVEL. CONSEQUENTE NULIDADE DA CONSTRIÇÃO JUDICIAL REALIZADA NA ORIGEM.  NOS TERMOS DA JURISPRUDÊNCIA DA CORTE SUPERIOR DE JUSTIÇA, "NÃO É NECESSÁRIA A PROVA DE QUE O IMÓVEL ONDE RESIDE O DEVEDOR SEJA O ÚNICO DE SUA PROPRIEDADE, PARA O RECONHECIMENTO DA IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA, COM BASE NA LEI 8.009/90. PRECEDENTES." (RESP 1014698/MT, REL. MINISTRO RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, JULGADO EM 06/10/2016, DJE 17/10/2016)RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO


Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 1ª Câmara de Direito Comercial do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso de apelação e negar-lhe provimento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 08 de dezembro de 2022.

Documento eletrônico assinado por LUIZ ZANELATO, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproc2g.tjsc.jus.br/eproc/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 2945043v5 e do código CRC dd041591.Informações adicionais da assinatura:Signatário (a): LUIZ ZANELATOData e Hora: 8/12/2022, às 18:34:56

 

 










EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 08/12/2022

Apelação Nº 5003833-70.2021.8.24.0030/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

PRESIDENTE: Desembargador GUILHERME NUNES BORN

PROCURADOR(A): ALEX SANDRO TEIXEIRA DA CRUZ
APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (EMBARGADO) APELADO: M S SUL AGENCIA MARITIMA LTDA (EMBARGANTE) ADVOGADO: DAVID LEHMKUHL TORRES (OAB SC053866) APELADO: MARCELO ADAM BORBA (EMBARGANTE) ADVOGADO: DAVID LEHMKUHL TORRES (OAB SC053866) APELADO: GUILHERME ADAM BORBA (EMBARGANTE) ADVOGADO: DAVID LEHMKUHL TORRES (OAB SC053866)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual do dia 08/12/2022, na sequência 258, disponibilizada no DJe de 21/11/2022.
Certifico que a 1ª Câmara de Direito Comercial, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:A 1ª CÂMARA DE DIREITO COMERCIAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO DE APELAÇÃO E NEGAR-LHE PROVIMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador LUIZ ZANELATO
Votante: Desembargador LUIZ ZANELATOVotante: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOAVotante: Desembargador MARIANO DO NASCIMENTO
PRISCILA DA ROCHASecretária