Acesso restrito
Pesquisa de Satisfação:

Excelente

Bom

Ruim

Observações:


FECHAR [ X ]



Obrigado.











TJSC Jurisprudência Catarinense
Processo: 4010780-24.2019.8.24.0000 (Acórdão do Tribunal de Justiça)
Relator: Jaime Ramos
Origem: Capital
Orgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Público
Julgado em: Tue Mar 03 00:00:00 GMT-03:00 2020
Juiz Prolator: Jaime Pedro Bunn
Classe: Agravo de Instrumento

 


Citações - Art. 927, CPC: Repercussão Geral: 870947

 


Agravo de Instrumento n. 4010780-24.2019.8.24.0000, da Capital

Relator: Desembargador Jaime Ramos

   AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE SENTENÇA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. EMBARGOS JULGADOS PROCEDENTES PARA RECONHECER O EXCESSO DE EXECUÇÃO, ANTE A AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DA PARTE EXEQUENTE. SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. REQUERIMENTO POSTERIOR DE APLICAÇÃO DA TESE DEFINIDA NO TEMA 810/STF E CONSEQUENTE ADOÇÃO DO IPCA-E COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. PLEITO INDEFERIDO PELA DECISÃO AGRAVADA AO ARGUMENTO DE QUE HÁ COISA JULGADA A RESPEITO, UMA VEZ QUE NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO DE SENTENÇA A PARTE EXEQUENTE CONCORDOU COM O CÁLCULO APRESENTADO PELA FAZENDA PÚBLICA EXECUTADA, BASTANDO QUE AGORA ELE SEJA ATUALIZADO PELA CONTADORIA DO FORO. DECISÃO ACERTADA. EXISTÊNCIA, ADEMAIS, DE COISA JULGADA ACERCA DA DEFINIÇÃO, NO TÍTULO EXEQUENDO, DO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. INAPLICABILIDADE DO TEMA 810/STF AO CASO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO ANTERIOR À RESPECTIVA DECISÃO DO STF. EXEGESE DO § 7º DO ART. 535 DO CPC. TÍTULO EXEQUENDO ACOBERTADO PELO MANTO DA COISA JULGADA (ART. 5º, XXXVI, CF/88). DECISÃO INCÓLUME. RECURSO DESPROVIDO.

   Havendo a parte exequente concordado tacitamente (porque não fez qualquer impugnação aos embargos) com o cálculo apresentado pela Fazenda Pública executada, que apontou excesso na execução, e tendo transitado em julgado a sentença que julgou procedentes os embargos à execução de sentença, não há como posteriormente pleitear a aplicação de índice de correção monetária diverso daquele consolidado pela coisa julgada.

   O Supremo Tribunal Federal, em 20/09/2017, julgou o RE 870.947, apreciando o Tema n. 810, com repercussão geral, e determinou que na cobrança de créditos judiciais contra a Fazenda Pública o índice de correção monetária deve ser o IPCA-E e não a TR. Todavia, nos termos do § 7º do art. 535 do Código de Processo Civil, tal decisão só é aplicável aos casos em que a sentença que dá origem ao título judicial exequendo conta com trânsito em julgado posterior à referida decisão da Suprema Corte. Caso contrário, por força da coisa julgada, ocorrerá a estabilização do índice de correção monetária definido no respectivo título.

           Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 4010780-24.2019.8.24.0000, da comarca da Capital Execuções contra a Fazenda Pública e Precatórios em que são Agravantes Dolores Garcia de Betio e outros e Agravados Fundação Catarinense de Educação Especial e outro.

           A Terceira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, negar provimento ao recurso. Custas legais.

           Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Desembargadores Jaime Ramos (Presidente), Ronei Danielli e Rodrigo Collaço.

           Florianópolis, 3 de março de 2020.

Desembargador Jaime Ramos

Relator

 

           RELATÓRIO

           Cuida-se de agravo de instrumento, com pedido de concessão de tutela antecipada recursal, interposto por Dolores Garcia de Betio e outros contra decisão que, nos autos da Cumprimento de Sentença n. 0044589-82.2011.8.24.0023/01, indeferiu "o pedido de fls. 163/168, tendo em vista que a parte exequente concordou, expressamente, com o cálculo apresentado pelo IPREV nos embargos à execução n. 0315013-29.2015.8.24.0023, apensados, de acordo com a sentença de fls. 144, devendo, pois, ser preservada a coisa julgada".

           Sustentam as agravantes que os índices de correção monetária utilizados na conta dos créditos apresentados com o cumprimento de sentença respeitam o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 870.947-SE (que deu origem ao Tema 810/STF); e que, contudo, o STF atribuiu efeito suspensivo ao aludido recurso, até que sejam julgados os embargos de declaração interpostos.

           Requereram a concessão de tutela antecipada recursal, e, ao final, que "seja determinado o prosseguimento do cumprimento de sentença em relação ao crédito incontroverso, com o respectivo SOBRESTAMENTO DA MATÉRIA CONTROVERSA ATINENTE À CORREÇÃO MONETÁRIA ATÉ A RESOLUÇÃO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS NO RE 870.947-SE".

           O pedido de liminar recursal foi parcialmente deferido.

           Intimada, a parte agravada deixou transcorrer "in albis" o prazo para contrarrazões.

           VOTO

           Há que se negar provimento ao recurso.

           Trata-se de cumprimento de sentença referente a verbas remuneratórias de servidoras inativas da Fundação Catarinense de Educação Especial. Em Primeiro Grau foi proclamada a improcedência do pedido inicial (fl. 346 da ação principal). As autores interpuseram recurso de apelação cujo julgamento foi afetado ao Grupo de Câmaras de Direito Público, nos termos do art. 555, § 1º, do Código de Processo Civil de 1973, procedimento hoje denominado Incidente de Assunção de Competência pelo Código de Processo Civil de 2015 (fl. 407 da ação principal). O Grupo de Câmaras de Direito Público, por votação unânime, houve por bem excluir o Estado de Santa Catarina do processo e dar provimento parcial ao recurso das autoras, por acórdão da lavra do eminente Desembargador Pedro Manoel Abreu (Apelação Cível n. 2012.061317-2) com o seguinte dispositivo (fls. 412-424 da ação principal):

    "Logo, na linha do que foi dito, o recurso das autoras deve ser parcialmente provido para garantir-lhes o direito ao percebimento da Gratificação de Produtividade instituída pela Lei n. 13.763/06, alterada pela Lei n. 15.162/10 e condenar os réus ao pagamento das parcelas vencidas e vincendas, observada a prescrição quinquenal, corrigidas monetariamente pelo INPC desde a data em que eram devidas as parcelas, até a citação, quando haverá incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (Lei 9.494/97, art. 1º-F, com redação dada pela Lei n. 11.960/09), julgando-se extinto o feito sem resolução do mérito em relação ao Estado de Santa Catarina, dada sua ilegitimidade passiva.

    "Conveniente destacar que a Fundação Catarinense de Educação Especial deverá arcar com os valores até a aposentação das autoras, momento o qual passará o Iprev a ser o responsável pelo pagamento.

    "Com esse desfecho, deverão os réus arcar com os honorários advocatícios que, com fulcro no art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil, fixa-se em 10% do valor da condenação, ficando isentos do pagamento das custas processuais.

    "As autoras, por outro lado, deverão arcar com os honorários de sucumbência em favor do Estado de Santa Catarina, os quais fixa-se em R$ 1000,00, cuja execução, entretanto, ficará suspensa por força do contido no art. 12 da Lei n. 1.060/50."

           O referido acórdão transitou em julgado em 28.01.2013.

           Escorada nas disposições veiculadas no título judicial acima referenciado, a parte agravante apresentou, perante o Juízo da Vara de Execuções Contra a Fazenda Pública e Precatórios, pleito execucional objetivando o percebimento da quantia de R$ 209.385,58 (duzentos e nove mil e trezentos e oitenta e cinco reais).

           Intimada, a Fazenda Pública Estadual opôs embargos à execução de sentença, na forma do art. 730 do Código de Processo Civil de 1973, oportunidade em que arguiu a ocorrência de excesso de execução na ordem de R$ 7.158,32 (sete mil e cento e cinquenta e oito reais), requerendo que fosse declarado o excesso de execução apontado.

           A parte embargada/exequente compareceu aos autos para informar que concordou com as alegações da embargante, no sentido da existência do excesso de execução no valor acima referido.

           Ao analisar a impugnação à execução, o digno Magistrado, Dr. Jaime Pedro Bunn, entendeu por julgar procedentes os embargos opostos em razão da ausência de resistência da parte embargada.

           A parte exequente não interpôs recurso de apelação, deixando transcorrer "in albis" o prazo para tanto, sendo certificado o trânsito em julgado do "decisum" acima referido na data de 28/10/2017.

           Com o prosseguimento da execução, a parte exequente apresentou petição (págs. 163 a 168 dos autos a execução), na data de 25/05/2018, expondo que discordou dos cálculos apresentados pela contadoria judicial (às págs. 576 a 579 dos autos a execução), na medida em que entendeu que, "a fim de resolver a sistemática de juros e correção monetária aplicada às condenações impostas à Fazenda Pública, o presente cálculo deve adotar como parâmetro os índices apontados nas teses fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça, que desanuviaram as interpretações acerca das decisões proferidas pelo STF", requerendo "o prosseguimento do feito com a retificação dos cálculos apresentados pela Contadoria a fim de que seja aplicado o IPCA-E como índice de correção monetária em todo o período"

           Ao analisar referido petitório, pela decisão ora agravada, o Juízo originário indeferiu o respectivo requerimento com os seguintes argumentos:

    "Indefiro o pedido de fls. 163/168, tendo em vista que a parte exequente concordou, expressamente, com o cálculo apresentado pelo IPREV nos embargos à execução n. 0315013-29.2015.8.24.0023, apensados, de acordo com a sentença de fls. 144, devendo, pois, ser preservada a coisa julgada.

    "No mais, encaminhe-se esta pasta digital à Contadoria para manifestação acerca da insurgência apresentada às fls. 157/158 e, em sendo o caso, seja novamente elaborado o cálculo de fls. 148/153, com vista às partes para manifestação pelo prazo individual e sucessivo de 5 (cinco) dias, iniciando pelas Exequentes.

    "Havendo concordância ou transcorrendo o prazo sem manifestação, proceda-se com o pagamento.

    "Intimem-se."

           Contra essa decisão, a parte exequente interpôs o presente agravo de instrumento defendendo a aplicação do Tema 810/STF e do Tema 905/STJ, de modo que seja considerado o IPCA-E como fator de correção monetária nos cálculos das obrigações perseguidas, e requereu o seguinte:

    "[...] o julgamento pela total procedência do agravo de instrumento, reformando-se a decisão do MM. Juiz "a quo", a fim de seja determinado o prosseguimento do cumprimento de sentença em relação ao crédito incontroverso, com o respectivo SOBRESTAMENTO DA MATÉRIA CONTROVERSA ATINENTE À CORREÇÃO MONETÁRIA ATÉ A RESOLUÇÃO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS NO RE 870.947-SE".

           Como se observa, o objeto recursal do presente agravo de instrumento é o "prosseguimento do cumprimento de sentença em relação ao crédito incontroverso, com o respectivo sobrestamento da matéria controversa atinente à correção monetária até a resolução dos embargos de declaração opostos no RE 870.947-SE". Ou seja, a questão alvo de análise recursal está relacionada com a definição do índice de correção monetária aplicável para a atualização da obrigação perseguida.

           Contudo, não tem razão a parte agravante/exequente.

           Em primeiro lugar porque, como bem decidiu o MM. Juiz, a matéria foi decidida quando os embargos à execução de sentença, em que a Fazenda Pública alegou excesso de execução, foram julgados procedentes para determinar o prosseguimento do feito com base no cálculo apresentado pelo ente público e houve trânsito em julgado dessa sentença, de modo que se tornou coisa julgada intangível, nos termos do art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal de 1988, e do art. 6º, da Lei de Introdução às normas de direito brasileiro, bastando agora apenas que a Contadoria do Foro realize a atualização daquele cálculo.

           Ou seja, não é mais possível alterar os parâmetros utilizados pela Fazenda Pública para a elaboração do cálculo que apresentou com os embargos à execução de sentença, porque com ele concordaram as autoras/exequentes, aqui agravantes, que preferiram não opor nenhuma impugnação àqueles embargos, de sorte que com ele concordaram tacitamente e, assim, não mais podem questionar o índice de correção monetária nele contido.

           Não fora isso, também se verifica a coisa julgada do índice de correção monetária eleito no acórdão que, reformando a sentença de improcedência do pedido formulado na ação principal, condenou a Fundação Catarinense de Educação Especial e o IPREV ao pagamento de verbas remuneratórias às autoras/exequentes, aqui agravantes.

           Dispõem o art. 535, inciso III, e seus §§ 5º, 6º, 7º e 8º, do Código de Processo Civil (CPC), referentes ao cumprimento de sentença para pagamento de quantia certa pela Fazenda Pública, quanto à inexequibilidade do título executivo judicial inconstitucional ou inexigibilidade da obrigação:

    "Art. 535. A Fazenda Pública será intimada na pessoa de seu representante judicial, por carga, remessa ou meio eletrônico, para, querendo, no prazo de 30 (trinta) dias e nos próprios autos, impugnar a execução, podendo arguir:

    "[...]

    "III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;

    "[...]

    "§ 5º. Para efeito do disposto no inciso III do 'caput' deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal, em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.

    "§ 6º. No caso do § 5º, os efeitos da decisão do Supremo Tribunal Federal poderão ser modulados no tempo, de modo a favorecer a segurança jurídica.

    "§ 7º. A decisão do Supremo Tribunal Federal referida no § 5º deve ter sido proferida antes do trânsito em julgado da decisão exequenda.

    "§ 8º. Se a decisão referida no § 5º for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal." (grifou-se)

           NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, ao comentarem referidos dispositivos processuais, em especial à regra instituída pelo § 7º do art. 535 do CPC, ensinam:

    "O texto normativo refere-se à declaração do STF tanto em sede de controle abstrato (ADIn, ADC ou ADPF), em razão da eficácia erga omnes do acórdão da Suprema Corte, como quando a declaração tiver emanado do caso concreto, quando os efeitos não se propagam para todos, pois se dão apenas inter partes. [...] A aplicação do CPC 535 § 5.º (decisão do STF é anterior ao trânsito em julgado da sentença que aparelha o cumprimento) dar-se-á tanto no caso de a declaração de inconstitucionalidade pelo STF ter sido proferida em sede de ADIn, de ADC ou de ADPF, quanto na hipótese de o STF proclamar a inconstitucionalidade em sede de controle concreto (v.g. no RE). [...]

    "[...]

    "Coisa julgada anterior e declaração posterior de inconstitucionalidade pelo STF (1). Título judicial é sentença transitada em julgado, acobertada pela coisa julgada. Esse título judicial goza de proteção constitucional, que emana diretamente do Estado Democrático de Direito (CF 1.º caput), além de possuir dimensão de garantia constitucional fundamental (CF 5.º XXXVI). Decisão posterior, ainda que do STF, não poderá atingir a coisa julgada que já havia sido formada e dado origem àquele título executivo judicial que aparelha o cumprimento de sentença. A decisão do STF que declara inconstitucional lei ou ato normativo tem eficácia retroativa ex tunc, para atingir situaçõçes que estejam se desenvolvendo com fundamento nessa lei. Essa retroatividade tem como limite a coisa julgada (Canotilho. Dir. Constitucional, pp. 1013/1014). Não pode alcançar, portanto, as relações jurídicas firmes, sobre as quais pesa a auctoritas rei iudicatae, manifestação do Estado Democrático de Direito (do ponto de vista político-social-coletivo) e garantia constitucional fundamental (do ponto de vista do direito individual, coletivo ou difuso). [...] Em boa hora o texto normativo comentado veio corrigir a disposições anteriores, revogadas, do CPC/1973 475-L § 1.º e 741 par. Ún., que não faziam a ressalva constante do CPC 535 § 7º. Já apontávamos essa inconstitucionalidade existente no sistema do CPC/1973, agora corrigida pelo texto comentado" (Código de Processo Civil comentado. 17ª ed. rev., atual. e ampl.. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018. p. 1513 a 1516).

           Como se conclui dessas disposições, para que a tese definida pela Suprema Corte para o Tema n. 810 possa ser aplicável, é necessário que a decisão que a fixou tenha sido proferida antes do trânsito em julgado da sentença exequenda (§ 7º do art. 535 do CPC).

           Na hipótese, o título judicial exequendo transitou em julgado na data de 28/01/2013 (p. 426, autos principais), motivo pelo qual, adianta-se, não poderá ela ser readequada ao que foi definido pelo Tema 810/STF, que conta com julgamento posterior ao trânsito em julgado da decisão que deu origem ao título judicial.

           Para bem situar a questão, vale lembrar que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADIs nºs. 4357/DF e 4425/DF, declarou a inconstitucionalidade da parte do art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009, que determinava a aplicação da TR para correção monetária dos débitos da Fazenda Pública. Tal julgamento ocorreu em data de 14.03.2013 e o acórdão respectivo foi considerado publicado no DJe em 26.09.2014.

           No entanto, como se demonstrará a seguir, o julgamento das ADIs nºs. 4357/DF e 4425/DF reputou inconstitucional somente a fixação dos juros moratórios com base na TR quanto aos débitos estatais de natureza tributária, não declarando por completo a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09.

           Daí porque, devido ao grande número de controvérsias emanadas de diversos Tribunais Pátrios sobre o alcance dos efeitos do julgamento das referidas ADIs sobre as condenações impostas à Fazenda Pública, foi que o Supremo Tribunal Federal entendeu, por necessidade da segurança jurídica e para definir orientação segura para o julgamento das ações que envolvam tal questão, manifestar-se pela existência de repercussão geral sobre a seguinte questão:

    Tema 810/STF: A validade jurídico-constitucional da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre condenações impostas à Fazenda Pública segundo os índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança (Taxa Referencial - TR), conforme determina o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09.

           A propósito, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao manifestar-se pela existência de repercussão geral sobre a questão que envolve o presente caso, no RE 870.947/SE, cuja relatoria ficou na incumbência do Ministro Luiz Fux, definindo a questão acima referida (Tema 810), teceu as seguintes considerações:

    DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS INCIDENTE SOBRE CONDENAÇÕES JUDICIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.960/09.

    1. Reveste-se de repercussão geral o debate quanto à validade da correção monetária e dos juros moratórios incidente sobre condenações impostas à Fazenda Pública segundo os índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança (Taxa Referencial - TR), conforme determina o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com redação dada pela Lei nº 11.960/09.

    2. Tendo em vista a recente conclusão do julgamento das ADIs nº 4.357 e 4.425, ocorrida em 25 de março de 2015, revela-se oportuno que o Supremo Tribunal Federal reitere, em sede de repercussão geral, as razões que orientaram aquele pronunciamento da Corte, o que, a um só tempo, contribuirá para orientar os tribunais locais quanto à aplicação do decidido pelo STF, bem como evitará que casos idênticos cheguem a esta Suprema Corte.

    3. Manifestação pela existência da repercussão geral.

    Trata-se de recurso extraordinário interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) com fundamento no artigo 102, III, alínea a, da Constituição da República contra acórdão lavrado pela Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região que, mantendo concessão de benefício de prestação continuada (Lei nº 8.742/93, art. 20) ao ora recorrido, assentou que não cabe a aplicação da Lei nº 11.960/09 quanto aos juros e à correção monetária, uma vez que o Supremo Tribunal federal, no julgamento das ADIs nº 4.357 e 4.425, reconheceu, por arrastamento, a inconstitucionalidade do artigo 5º da Lei nº 11.960/09, que deu nova redação ao artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97.

    (...)

    Há repercussão geral do ponto de vista jurídico, uma vez que o acolhimento da tese do deferimento da incidência de juros de mora e de correção monetária em desacordo com o contido no artigo 5º da Lei nº 11.960/09, uma vez que não restou declarado inconstitucional todo o artigo 5º da Lei 11.960/09, na presente demanda poderia implicar precedente ao acolhimento de sua aplicação a todos os casos similares. Outrossim, a pretendida aplicação da incidência de juros de mora e de correção monetária em desacordo com o contido no artigo 5º da 11.960/09, uma vez que não restou declarado inconstitucional todo o artigo 5º da Lei nº 11.960/09, consiste em tese que destoa da doutrina e da jurisprudência brasileira consolidada sobre a aplicação da lei, pelo que o acolhimento da pretensão resultaria em prejuízo à conceituação da questão relativa à fixação dos juros moratórios e da correção monetária, nos termos do que preceitua o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, em todas as esferas jurídicas, com o nítido prejuízo a esses cânones de suma importância em nosso ordenamento.

    Também se constata que há repercussão geral do ponto de vista econômico, porque o INSS teria de elevar os valores para pagamento em milhares de ações referentes a benefícios previdenciários, com o pagamento de juros de mora e de correção monetária em desacordo com o contido no artigo 5º da Lei nº 11.960/09, o que consistiria em enorme dispêndio dos recursos necessários à manutenção dos sistema de Previdência Social brasileiro.

    Do ponto de vista político, há repercussão geral porque a adoção da tese em referência causaria dificuldades intransponíveis na manutenção dos pagamentos dos benefícios, uma vez que o Estado brasileiro sempre dispôs, quanto à Previdência Social, proteção à saúde do trabalhador, observada a respectiva nocividade do agente e a correspondente fonte de custeio do sistema.

    Sob o ponto de vista social, cabe ressaltar que a previsão, expressa na Constituição, do direito à previdência social como direito social (art. 6º) e do sistema de Previdência como componente da Ordem Social (Título VIII, Capítulo II, Seção III) implica existência do requisito da repercussão social nos recursos extraordinários interpostos pelo INSS, entidade que, na ordem social brasileira, tem a finalidade específica de prestar a previdência pública, finalidade esta que será prejudicada se deferida a pretensão deduzida em demandas como esta.

    No mérito, o INSS aponta violação ao art. 102, caput e alínea l, e art. 195, § 5º, todos da Constituição da República, alegando, verbis (fls. 172-173 grifos no original):

    A decisão, ora recorrida, do TRF da 5ª Região, entendeu pela inaplicabilidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.690/09, afirmando que houve declaração de inconstitucionalidade, por arrastamento, do art. 5º deste diploma legal, quando do julgamento da ADI nº 4357 e ADI nº 4425, ocorrido em 14/03/13.

    Data venia, não pode o INSS se conformar com o r. acórdão, vez que o mesmo, ao entender pela inconstitucionalidade total do artigo 5° da Lei 11.960/09, findou por violar decisão do STF (art. 102, caput, e alínea l), bem como a necessidade da indicação da prévia fonte de custeio (art. 195, §5°). Por fim, como se não bastasse, o acórdão terminou por violar o art. 1°-F da Lei 11° 9.494/97, ao afastar a sua aplicação, ensejando. com isto, o recurso a essa via extraordinária.

    [...]

    Convém aduzir que a taxa aplicável dos juros de mora e da correção monetária sofreu relevante alteração com o advento da Lei 11.960/2009, que modificou a redação do artigo 1°-F, da Lei 9.494/97, independentemente da natureza da demanda contra o Poder Público.

    Ocorre, todavia, que o STF declarou parcialmente a inconstitucionalidade da norma, tendo sido mantida a taxa de juros de 0.5% estabelecida no artigo I -F, da Lei 9.494/97.

    Portanto, a decisão recorrido embargada (sic) merece ser reformada para que seja respeitada a fixação dos juros moratórios, nos termos do que preceitua o art. 1º -F, da Lei n°. 9.494/97, vale dizer, no percentual de 0,5% ao mês.

    Nesse norte, importante tecer considerações acerca do informativo de número 698 do STF, uma vez que não restou declarado inconstitucional todo o artigo 5° da Lei 11.960/09.

    [...]

    PLENÁRIO

    Precatório: regime especial e EC 62/2009- 20

    Em conclusão, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ações diretas, propostas pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e pela Confederação Nacional das Indústria - CNI, para declarar a inconstitucionalidade: a) da expressão "na data de expedição do precatório, contida no 2° do art. 100 da CF; b) dos §§ 9° e 10 do art. 100 da CF; c) da expressão "índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança", constante do § 12 do art. 100 da CF, do inciso 11 do § 1° e do § 16, ambos do art. 97 do ADCT; d) do fraseado "independentemente de sua natureza", inserido no § 12 do art. 100 da CF, para que aos precatórios de natureza tributária se apliquem os mesmos juros de mora incidentes sobre o crédito tributário; c) por arrastamento, do art. 5º da Lei 11.960/2009: e f) do § 15 do art. 100 da CF e de todo o art. 97 do ADCT (especificamente o caput e os §§ 1°, 2º, 4°, 6°, 8°, 9°, 14 e 15, sedo os demais por arrastamento ou reverberação normativa) - v. Informativos 631, 643 e 697. (g.n.)

    Apesar de, numa primeira leitura, parecer claro que o artigo 5° da Lei 11.960/09 foi declarado inconstitucional na sua totalidade, uma leitura mais atenta do informativo indica o contrário. Veja- diz o artigo 5° da Lei 11.960/09 que:

    Art. 5º O art. 1º-F da Lei n° .9.494, de 10 de setembro de 1997, introduzido pelo art. 4º da Medida Provisória nº 2. 180-35, de 24 de agosto de 2001, passa a vigorar com a seguinte redação:

    Art. 1º-F. Nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.''

    Este dispositivo regula as seguintes matérias sobre as condenações impostas à Fazenda Pública:

    a) se é aplicável a todas as condenações ou a apenas a alguma modalidade específica;

    b) que ela se refere à atualização monetária, à remuneração do capital e à compensação da mora;

    c) a quantidade de vezes que o índice estabelecido deve incidir; e

    d) informa que serão adotados os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança para atingir este mister.

    Portanto, o texto aqui discutido trata, ao menos, de 4 assuntos diferentes. Feito esse apontamento, volte-se ao trecho do informativo sobre as alíneas anteriores à declaração por arrastamento do artigo 5° da Lei 11 .960:

    "? para declarar a inconstitucionalidade:

    a) da expressão ''na data de expedição do precatório", contida no § 2° do art. 100 da CF;

    b) dos §§ 9° e 10 do art. 100 da CF;

    c) da expressão "índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança", constante do § 12 do art. 100 da CF, do inciso 11 do § 1° e do § 16, ambos do art. 97 do ADCT;

    d) do fraseado "independentemente de sua natureza", inserido no § 12 do art. 100 da CF, para que aos precatórios de natureza tributária se apliquem os mesmos juros de mora incidentes sobre o crédito tributário;

    e) por arrastamento, do art. 5º da Lei 11.960/2009;...

    Comparando-se as alíneas citadas no informativo com o artigo 5º da Lei 11.960/09 verifica-se que elas só trataram de dois dos quatro assuntos regulados pelo citado dispositivo da Lei. Ora, assim o sendo, qual seria, então, a lógica declarar-se a inconstitucionalidade de todo o artigo da Lei? Nenhuma, já que as partes restantes têm conteúdo normativo suficiente para ser aplicadas sozinhas.

    (?) todas as partes não citadas ao artigo permanecem constitucionais, principalmente a parte referente aos juros, texto que não foi declarado inconstitucional, devendo valer, em relação a este, as disposições da própria Lei 11.960/09 (Lei 9.494/97), que se aplicam a benefícios previdenciários já que trata de condenações impostas à Fazenda Pública.

    Pede então que o recurso seja conhecido e provido para reformar a decisão proferida pelo Egrégio TRF da 5ª Região na presente ação, declarando indevida a fixação de juros de mora e de correção monetária em desacordo com o contido no artigo 5º da Lei 11.960/09, uma vez que não restou declarado inconstitucional todo o artigo 5º da Lei 11.960/09, adequando-a, assim, aos parâmetros ditados pela Constituição Federal.

    O recurso foi admitido na origem (fls. 179).

    É o relatório.

    A questão jurídico-constitucional versada nestes autos diz respeito à validade da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre condenações impostas à Fazenda Pública segundo os índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança (Taxa Referencial - TR), conforme determina o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09.

    Tendo em vista a recente conclusão do julgamento das ADIs nº 4.357 e 4.425, ocorrida em 25 de março de 2015, revela-se oportuno que o Supremo Tribunal Federal reitere, agora em sede de repercussão geral, as razões que orientaram aquele pronunciamento da Corte, o que, a um só tempo, contribuirá para orientar os tribunais locais quanto à aplicação do decidido pelo STF, bem como evitará que casos idênticos cheguem a esta Suprema Corte

    Tendo em vista, porém, algumas sutilezas formais adiante explicadas, sobretudo na hipótese da correção monetária, acredito que não seja caso de reafirmação de jurisprudência pelo Plenário Virtual, devendo a questão ser apreciada pela Corte em julgamento presencial. 

    Primeira Questão:

    Regime de juros moratórios incidentes sobre as condenações impostas à Fazenda Pública

    No julgamento das ADIs nº 4.357 e 4.425, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional a fixação dos juros moratórios com base na TR apenas quanto aos débitos estatais de natureza tributária. Foi o que restou consignado na ementa daquele julgado:

    DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE EXECUÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA MEDIANTE PRECATÓRIO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 62/2009. (?) INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DO RENDIMENTO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO ÍNDICE DEFINIDOR DOS JUROS MORATÓRIOS DOS CRÉDITOS INSCRITOS EM PRECATÓRIOS, QUANDO ORIUNDOS DE RELAÇÕES JURÍDICO-TRIBUTÁRIAS. DISCRIMINAÇÃO ARBITRÁRIA E VIOLAÇÃO À ISONOMIA ENTRE DEVEDOR PÚBLICO E DEVEDOR PRIVADO (CF, ART. 5º, CAPUT ). (?)

    6. A quantificação dos juros moratórios relativos a débitos fazendários inscritos em precatórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança vulnera o princípio constitucional da isonomia (CF, art. 5º, caput) ao incidir sobre débitos estatais de natureza tributária, pela discriminação em detrimento da parte processual privada que, salvo expressa determinação em contrário, responde pelos juros da mora tributária à taxa de 1% ao mês em favor do Estado (ex vi do art. 161, §1º, CTN). Declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução da expressão independentemente de sua natureza, contida no art. 100, §12, da CF, incluído pela EC nº 62/09, para determinar que, quanto aos precatórios de natureza tributária, sejam aplicados os mesmos juros de mora incidentes sobre todo e qualquer crédito tributário.

    7. O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, ao reproduzir as regras da EC nº 62/09 quanto à atualização monetária e à fixação de juros moratórios de créditos inscritos em precatórios incorre nos mesmos vícios de juridicidade que inquinam o art. 100, §12, da CF, razão pela qual se revela inconstitucional por arrastamento, na mesma extensão dos itens 5 e 6 supra.

    (sem grifos no original)

    Destarte, a decisão do Supremo Tribunal Federal foi clara no sentido de que o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, não foi declarado inconstitucional por completo. Especificamente quanto ao regime dos juros moratórios incidentes sobre as condenações impostas à Fazenda Pública, a orientação firmada pela Corte foi a seguinte:

     Quanto aos juros moratórios incidentes sobre condenações oriundas de relação jurídico-tributária, devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário;

     Quanto aos juros moratórios incidentes sobre condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, devem ser observados os critérios fixados pela legislação infraconstitucional, notadamente os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09.

    A decisão recorrida nestes autos, porém, elasteceu o escopo do pronunciamento do Supremo Tribunal Federal, afastando a aplicação da legislação infraconstitucional com suposto fundamento nas ADIs nº 4.357 e 4.425. Não se trata de caso isolado. Em outros recursos que chegaram ao Supremo Tribunal Federal, esta mesma circunstância estava presente. Cito, a título ilustrativo, o RE nº 837.729 e o RE nº 859.973.

    Revela-se, por isso, necessário e urgente que o Supremo Tribunal Federal reitere, em sede de repercussão geral, a tese jurídica fixada nas ADIs nº 4.357 e 4.425, orientando a atuação dos tribunais locais aplicação dos entendimentos formados por esta Suprema Corte

    Segunda Questão:

    Regime de atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública

    Já quanto ao regime de atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública a questão reveste-se de sutilezas formais. Explico.

    Diferentemente dos juros moratórios, que só incidem uma única vez até o efetivo pagamento, a atualização monetária da condenação imposta à Fazenda Pública ocorre em dois momentos distintos.

    O primeiro se dá ao final da fase de conhecimento com o trânsito em julgado da decisão condenatória. Esta correção inicial compreende o período de tempo entre o dano efetivo (ou o ajuizamento da demanda) e a imputação de responsabilidade à Administração Pública. A atualização é estabelecida pelo próprio juízo prolator da decisão condenatória no exercício de atividade jurisdicional.

    O segundo momento ocorre já na fase executiva, quando o valor devido é efetivamente entregue ao credor. Esta última correção monetária cobre o lapso temporal entre a inscrição do crédito em precatório e o efetivo pagamento. Seu cálculo é realizado no exercício de função administrativa pela Presidência do Tribunal a que vinculado o juízo prolator da decisão condenatória.

    Pois bem. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADIs nº 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade da correção monetária pela TR apenas quanto ao segundo período, isto é, quanto ao intervalo de tempo compreendido entre a inscrição do crédito em precatório e o efetivo pagamento. Isso porque a norma constitucional impugnada nas ADIs (art. 100, §12, da CRFB, incluído pela EC nº 62/09) referia-se apenas à atualização do precatório e não à atualização da condenação ao concluir-se a fase de conhecimento.

    Essa limitação do objeto das ADIs consta expressamente das respectivas ementas, as quais, idênticas, registram o seguinte:

    DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE EXECUÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA MEDIANTE PRECATÓRIO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 62/2009. (...) IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE DE REMUNERAÇÃO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA. VIOLAÇÃO AO DIREITO FUNDAMENTAL DE PROPRIEDADE (CF, ART. 5º, XXII). INADEQUAÇÃO MANIFESTA ENTRE MEIOS E FINS. (...)

    (...) 5. O direito fundamental de propriedade (CF, art. 5º, XXII) resta violado nas hipóteses em que a atualização monetária dos débitos fazendários inscritos em precatórios perfaz-se segundo o índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, na medida em que este referencial é manifestamente incapaz de preservar o valor real do crédito de que é titular o cidadão. É que a inflação, fenômeno tipicamente econômico-monetário, mostra-se insuscetível de captação apriorística (ex ante), de modo que o meio escolhido pelo legislador constituinte (remuneração da caderneta de poupança) é inidôneo a promover o fim a que se destina (traduzir a inflação do período).

    (...) 7. O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09, ao reproduzir as regras da EC nº 62/09 quanto à atualização monetária e à fixação de juros moratórios de créditos inscritos em precatórios incorre nos mesmos vícios de juridicidade que inquinam o art. 100, §12, da CF, razão pela qual se revela inconstitucional por arrastamento, na mesma extensão dos itens 5 e 6 supra.

    (ADI 4357, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 14/03/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-188 DIVULG 25-09-2014 PUBLIC 26-09-2014 sem grifos no original)

    A redação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, tal como fixada pela Lei nº 11.960/09, é, porém, mais ampla, englobando tanto a atualização de requisitórios quanto a atualização da própria condenação. Confira-se:

    Art. 1º-F. Nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.

    As expressões uma única vez e até o efetivo pagamento dão conta de que a intenção do legislador ordinário foi reger a atualização monetária dos débitos fazendários tanto na fase de conhecimento quanto na fase de execução. Daí por que o STF, ao julgar as ADIs nº 4.357 e 4.425, teve de declarar a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97. Essa declaração, porém, teve alcance limitado e abarcou apenas a parte em que o texto legal estava logicamente vinculado no art. 100, §12, da CRFB, incluído pela EC nº 62/09, o qual se refere tão somente à atualização de valores de requisitórios.

    Na parte em que rege a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública até a expedição do requisitório (i.e., entre o dano efetivo/ajuizamento da demanda e a condenação), o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 ainda não foi objeto de pronunciamento expresso do Supremo Tribunal Federal quanto à sua constitucionalidade e, portanto, continua em pleno vigor.

    Ressalto, por oportuno, que este debate não se colocou nas ADIs nº 4.357 e 4.425, uma vez que, naquelas demandas do controle concentrado, o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 não foi impugnado originariamente e, assim, a decisão por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, §12, da CRFB e o aludido dispositivo infraconstitucional.

    Essa limitação, porém, não existe no debate dos juros moratórios, uma vez que, segundo a jurisprudência pacífica do STF, não incidem juros moratórios sobre precatórios (no prazo constitucional entre a sua expedição e o pagamento efetivo), de sorte que o arrastamento decidido pelo STF nas ADIs nº 4.357 e 4.425 refere-se, tal como fazia o art. 100, § 12 da CRFB, aos juros moratórios fixados na data da condenação.

    Não obstante isso, diversos tribunais locais vêm estendendo a decisão do Supremo Tribunal Federal nas ADIs nº 4.357 e 4.425 de modo a abarcar também a atualização das condenações (e não apenas a dos precatórios). Foi o que fez o TRF da 4ª Região no presente recurso extraordinário. Aponto ainda outros tribunais que têm endossado essa compreensão:

    Superior Tribunal de Justiça

    A declaração de inconstitucionalidade parcial, por arrastamento, do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI n. 4.425/DF) impõe que se fixe o INPC como índice de correção específica nas demandas que tratam de benefícios previdenciários diante de previsão específica no art. 41-A da Lei n. 8.213/91.

    (Trecho de acórdão mencionado no RE nº 855.447)

    Tribunal Regional Federal da 5ª Região

    No que se refere à incidência de juros de mora e correção monetária, diante do julgamento do STF na ADI 4.357/DF, que considerou inconstitucional o art. 5º, da Lei nº 11.960/2009, mantém-se a sentença no que concerne à aplicação de juros de 1% ao mês a partir da citação, acrescido de correção monetária.

    (Trecho do acórdão recorrido no RE nº 855.447)

    Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

    O Supremo Tribunal Federal via controle concentrado declarou a inconstitucionalidade do art. 5º da Lei nº 11.960/2009, que alterou o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, que normatizava a incidência dos consectários legais aplicáveis sobre as condenações da Fazenda Pública (ADI 4425/DF). In concreto, não houve a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, sendo de rigor reconhecer que atingem a todos, bem como retroagem à data em que a lei entrou em vigor, vinculando, ainda, os demais órgãos do Poder Judiciário.

    (Trecho do acórdão recorrido no RE nº 848.285)

    Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul

    A correção monetária, por força da declaração de inconstitucionalidade parcial do art. 5º da Lei nº 11.960/09, deverá ser calculada com base no IPCA, índice que melhor reflete a inflação acumulada no período.

    (Trecho do acórdão impugnado no RE nº 863.423)

    Essa controvérsia também está presente em diversos casos apreciados pelo Supremo Tribunal Federal. A título ilustrativo, cito os seguintes precedentes: RE 851.079, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 4/12/2014; RE 848.718, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 3/12/2014; RE 839.046, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 20/10/2014; RE 825.258, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe de 2/2/2015; e RE 848.145, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe de 25/11/2014.

    Ainda que haja coerência, sob a perspectiva material, em aplicar o mesmo índice para corrigir precatórios e condenações judiciais da Fazenda Pública, é certo que o julgamento das ADIs nº 4.357 e 4.425, sob a perspectiva formal, teve escopo reduzido. Daí a necessidade e urgência em o Supremo Tribunal Federal pronunciar-se especificamente sobre a questão e pacificar, vez por todas, a controvérsia judicial que vem movimentando os tribunais inferiores e avolumando esta própria Corte com grande quantidade de processos.

    Manifesto-me pela existência da repercussão geral da seguinte questão constitucional:

    A validade jurídico-constitucional da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre condenações impostas à Fazenda Pública segundo os índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança (Taxa Referencial - TR), conforme determina o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação dada pela Lei nº 11.960/09. (STF - RE 870947 RG, Relator(a): Min. Luiz Fux, julgado em 16/04/2015, DJe-077 DIVULG 24-04-2015 PUBLIC 27-04-2015).

           Com base nessas considerações, conclui-se que, como o julgamento das ADIs nº 4.357 e 4.425, na questão que trata da atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública até a expedição do requisitório, sob o aspecto formal, não se pronunciou quanto à constitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, não poderá servir ele de marco para aplicação do disposto no § 7º do art. 535 do CPC.

           Nessa senda, para o presente caso, que trata acerca da definição do índice de correção monetária a aplicar nas condenações impostas à Fazenda Pública Estadual até a expedição do requisitório, deve-se adotar, portanto, a data do julgamento do RE 870.947/SE, que define a questão (Tema 810).

           Sendo assim, no caso em concreto, em que o título executivo judicial transitou em julgado na data de 28/01/2013 (p. 426, autos principais), nos termos do § 7º do art. 535 do CPC, não há como ser aplicada a tese definida sobre o Tema 810/STF, na medida em que a decisão acerca deste foi proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda.

           A propósito, cabe registrar que, na sessão de julgamento do dia 03/10/2019, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar e rejeitar, por maioria de votos, os embargos declatórios opostos contra o acórdão que estabeleceu a tese do Tema 810, decidiu por aplicar o IPCA-E como fator de correção monetária desde 2009, nos exatos termos definidos no acórdão embargado (fonte: https://www.conjur.com.br/2019-out-03/stf-decide-aplicar-ipca-correcao-monetaria-2009; acesso em 03/10/2019). Daqui para diante, então, não haverá mais entraves para a aplicação do Tema 810, desde que o título judicial exequendo decorra de sentença transitada em julgado posteriormente ao referido julgamento (art. 535, § 7º, CPC).

           Portanto, pela segurança jurídica, há que se manter os índices definidos no título judicial para fins de atualização da obrigação, porquanto, no caso em concreto, o título judicial está duplamente acobertado pelo instituto da coisa julgada (art. 5º, inc. XXXVI, CF/88).

           Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso.


Gabinete Desembargador Jaime Ramos